UNIVERSIDADE FEDERAL DO PARANÁ
PRISCILA DO ROCIO OLIVEIRA DE SOUZA
O POLITICAMENTE CORRETO E A PUBLICIDADE:
O CASO BRASILEIRO NO ANO DE 2012
CURITIBA
2014
PRISCILA DO ROCIO OLIVEIRA DE SOUZA
O POLITICAMENTE CORRETO E A PUBLICIDADE:
O CASO BRASILEIRO NO ANO DE 2012
Monografia apresentada ao curso de Bacharelado
em Ciências Sociais do Setor de Ciências Humanas
da Universidade Federal do Paraná, como requisito
parcial à obtenção do título de bacharel em Ciências
Sociais.
Orientadora: Prof.ª Drª. Maria Tarcisa Silva Bega.
CURITIBA
2014
LISTA DE ILUSTRAÇÕES
Figura 1 - Propaganda DM9 19
Figura 2 – Propaganda Azeite Gallo 25
Figura 3 – Propaganda Duloren 29
Figura 4 – Propaganda Prudence 33
Figura 5 – Propaganda Volkswagen 39
Figura 6 – Propaganda VW anos 60 43
Figura 7 – Propaganda VW anos 60 (2) 44
LISTA DE TABELA
TABELA 1 – Ranking De Venda De Automóveis Na Europa 2014 38
RESUMO
O presente trabalho analisa como o discurso do politicamente correto foi construído
ao longo dos tempos e a maneira como os movimentos sociais, principalmente, o têm
usado para combater as discriminações que são visualizadas nas peças publicitárias
de diversas empresas de publicidade e propaganda, partindo da hipótese de que o
mesmo tem influenciado de alguma forma as mesmas. São analisadas algumas
peças que sofreram, de alguma forma, críticas quanto ao conteúdo que
apresentavam, tentando identificar quais são os grupos e quais os espaços que
utilizaram para fazer suas denúncias e como a lógica do discurso foi construída para
legitimar suas críticas. Para esta verificação veremos como os movimentos sociais
têm através de pesquisas de cunho acadêmico e da sua luta em prol dos seus
direitos, denunciado os diversos tipos de preconceito que podemos encontrar nas
mais diversas camadas da sociedade e que encontra raízes numa ordem hegemônica
brasileira e como elas se empoderam da liberdade de expressão para se justificar e
se perpetuar.
Palavras-chave: politicamente correto, movimentos sociais, propaganda.
ABSTRACT
This study aims to examine how the discourse of political correctness was built over
time, and how social movements mainly has used it in order to combat discrimination.
In this work were visualized advertisements from several agencies, on the assumption
that it has influenced them in some way. Therefore, I intend to analyze the parts that
had been criticized because of the content presented, trying to identify who these
groups are and what areas they used to make their complains and how the logic of the
speech were constructed to legitimate the criticism. For this check I will seek to
demonstrate how social movements have, through academic-based studies, and their
struggle for their rights, denounced several kinds of prejudice that can be found in
plenty of these actions of society and which finds its roots in a hegemonic Brazilian
order, and empowers itself of the freedom of expression to justify and perpetuate
prejudice.
Keywords: political correctness, social movements, propaganda.
SUMÁRIO
INTRODUÇÃO............................................................................................................07
1. DO SURGIMENTO DO POLITICAMENTE CORRETO ...................................... 10
1.2 O MULTICULTURALISMO E AS IDENTIDADES ............................................... 11
1.2 LINGUAGEM E SOCIEDADE ............................................................................. 13
1.3 O POLITICAMENTE CORRETO HOJE .............................................................. 15
2. PUBLICIDADE E SOCIEDADE: O PAPEL DA PUBLICIDADE ........................ 18
2.1 MARCOS LEGAIS .............................................................................................. 20
3. ANÁLISE DE CASOS ........................................................................................ 23
3.1 AZEITE GALLO ................................................................................................... 23
3.2 DULOREN .......................................................................................................... 26
3.3 PRUDENCE ........................................................................................................ 30
3.4 VOLKSWAGEN ................................................................................................... 36
CONSIDERAÇÕES FINAIS ...................................................................................... 44
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ......................................................................... 51
ANEXOS ................................................................................................................... 53
7
INTRODUÇÃO
Esta pesquisa teve início no ano de 2012, devido a uma percepção pessoal de que as
redes sociais vêm sendo usadas cada vez mais como forma de denúncia.
Observamos que esse meio é propício para apreender as mais diversas opiniões, e
como estas têm sido expostas com argumentos que vão desde o senso comum aos
baseados no conhecimento acadêmico.
As redes sociais e a internet como um todo, têm hoje, além de um grande
alcance, uma velocidade de transmissão de todo tipo de mensagem e alcança de um
continente ao outro em segundos.
Durante nossa trajetória diária somos bombardeados com as mais diversas
imagens que vão das mais variadas formas de arte às mais simples formas visuais.
Estas imagens carregam em si mensagens implícitas ou explicitas, conforme a
intenção de quem a produz, e estas mensagens serão lidas ou entendidas de maneira
diferente por quem as recebe.
Dentre os assuntos atuais que geram grande polêmica, visto a tamanha
discordância de opiniões que sugere, encontramos o politicamente correto. Esta
categoria analítica tem sido abrangida em diversas áreas das ciências humanas
como: social, cultural e linguística.E têm como intuito demonstrar uma atitude política
que visa fazer com que o uso da linguagem – seja ela escrita, oral ou publicitária –
seja isenta de pressupostos, implícitos ou explícitos, de preconceito racial, de gênero
ou referente a qualquer outro grupo social que historicamente tenha sido subjugado
na sociedade.
Quando se busca agir de forma politicamente correta, censurando certos
comportamentos,
usos
da
linguagem
e
também
certas
representações
culturais,opera-se segundo certos valores e não conforme um único valor, ou seja,
consideram-se os diferentes sujeitos que compõem a sociedade, sobretudo no
momento em que esses novos sujeitos emergem nas esferas sociais, a partir da
segunda metade do século XX, como os negros, as mulheres, e os homossexuais.
Assim, o politicamente correto não é simplesmente uma atitude caprichosa de
pessoas que se ofendem com qualquer palavra ou ação, senão faz parte da luta de
8
minorias que exigem o respeito às suas identidades, sejam elas referentes à etnia, à
orientação sexual, classe social, etc.
Verificaremos o porquê desta categoria analítica causar polêmica e quais são
as pessoas ou grupos que a defendem e em que meios estes grupos sociais
emergem para legitimar as possíveis críticas a respeito de um determinado objeto que
apresente algum tipo de preconceito.
Veremos, assim, no decorrer do trabalho, como no ano de 2012, algumas
peças publicitárias sofreram fortes críticas dos mais diversos movimentos e nos mais
variados meios de comunicação. Examinaremos quais peças foram estas e quais os
motivos destas críticas, qual foi a posição da empresa responsável pela veiculação
delas e os desdobramentos que houve no decorrer dos processos.
Ao longo do trabalho, demonstraremos, por um lado, quem são as pessoas que
têm percepção do politicamente correto, quem o define, e como se dá a produção e a
recepção. Por outro lado, como as empresas se posicionaram diante das críticas, e o
processo de negociação que é feito quando uma peça é apontada como politicamente
incorreta. Apartir destas duas abordagens, tentaremos compreender como este
discurso tem influenciado as grandes mídias, em particular a mídia impressa que é o
foco deste trabalho.
A escolha deste tema justifica-se no sentido de contribuir pelas vias das
Ciências Sociais a uma temática que comumente se debate, mas que fica muitas
vezes atribuído à Linguística os diversos trabalhos a respeito do assunto. Na área da
Linguística vemos que o debate se desenvolve com relação à uma transformação no
léxico que se daria pelo politicamente correto, as discussões no entanto que se
desenvolvem no campo da Linguística acaba por não trazer como um todo, uma
discussão mais sociológica sobre o que de fato estas mudanças propostas
pretendem. Nas Ciências Sociais grande parte dos trabalhos na área foram
desenvolvidos fora do país e por pesquisadores estrangeiros. Meu interesse na
pesquisa se dá pelos anos de desenvolvimento de pesquisas junto ao Núcleo de
Estudos Afro-Brasileiros – NEAB com a temática das relações raciais, que têm
justamente proximidade com o tema, assim, a falta de trabalhos na área sobre tema
bastante atual, me levou à investigação da temática.
9
No primeiro capítulo é apresentado um histórico do surgimento do
politicamente correto, buscando localizar o momento em que ele começa a ser
difundido na sociedade e as suas implicações até os dias atuais pensando desde as
questões relativas às identidades dos sujeitos, até sua presença nas falas cotidianas.
Na área da linguística podemos pensar o desenvolvimento do politicamente correto
como uma transformação da linguagem, mas será que haveria uma forma de se
comunicar de maneira neutra, ou que não fosse discriminadora? Tentaremos
responder a essas questões.
O segundo capítulo se investiga como a publicidade tem importância na
sociedade e de que forma e qual linguagem ela utiliza para transmitir as mensagens
que produz, sendo não apenas um difusor de publicidade mas também cultural, visto
que, a propaganda pode ser utilizada por diversas esferas da sociedade para difundir
não apenas bens e produtos mas também ideologias e formas de viver.
O capítulo final apresenta a análise das peças publicitárias escolhidas que
sofreram com crítica sem relação ao seu conteúdo, procurando demonstrar como foi
acionado o politicamente correto e por quais vias. Analisamos como as agências de
publicidade e propaganda poderiam fazer quanto a essas críticas e processos, assim
como se o politicamente correto pode ter algum tipo de influência na sociedade e
como esta influencia-se desenvolve e porquê. A pesquisa procura esclarecer quais as
mudanças que podem ter ocorrido num campo sócio-histórico que dá embasamento
ao politicamente correto.
10
1. DO SURGIMENTO DO POLITICAMENTE CORRETO
Quanto à investigação da origem do politicamente correto, nos deparamos com
fontes que remetem à informação que seu surgimento se deu nos Estados Unidos.
O conceito de politicamente correto surge nos Estados Unidos como uma
forma combater discriminações em áreas que vão da cultura à da linguagem.
“O chamado comportamento 'politicamente correto' surgiu no final dos anos
80, mas se popularizou mesmo na década seguinte, no primeiro mandato do
ex-presidente Bill Clinton. Tinha a intenção de instaurar na indústria cultural
um clima em que ninguém ofendia ninguém. A intenção é boa, claro, mas
muita gente temia que isso fosse tirar o humor da face da Terra”.
(HALLKACK, Revista Época 2011)
Wilson (1995, p. 03) nos remete mais distante quanto ao surgimento da
palavra, data sua primeira aparição em 1793, na Suprema Corte Americana, no caso
Chisholm v. Georgia1, em que dois cidadãos da Carolina do Sul entraram com uma
ação contra aquele estado.O autor expõe ainda que foi na década de1990 que o
politicamente correto se difundiu nos Estados Unidos, segundo ele os críticos
conservadores viam o politicamente correto como uma espécie de conspiração
liderada por estudantes e professores de esquerda e, segundo as descrições de
artigos de revistas e diversos editoriais eram tidos como um reino de terror nas
universidades americanas:
Within the span of a few months, the media produced a barrage of articles
each a variation on a single theme: that leftists totalitarians had taken control
of universities and were intimidating professors, censoring conservatives,
politicizing curricula, and imposing a new „McCarthysm of Left‟ on higher
2
education. (WILSON, JOHN K, 1995, p. 01)
Wilson demonstra ao longo de sua obra como os conservadores procuram criar
mitos a respeito do politicamente correto, uma vez que seu livro está falando sobre o
espaço da universidade, um espaço que fora antes ocupado por uma determinada
elite intelectual conservadora que com o advento das ações afirmativas passa a se
1
A integra do caso pode ser acessada em:
<https://supreme.justia.com/cases/federal/us/2/419/case.html>
2
“No espaço de poucos meses, a mídia produziu uma enxurrada de artigos de uma variação cada
sobre um único tema: a de que esquerdistas totalitários tinham tomado o controle de universidades e
estavam intimidando professores, censurando conservadores, politizando currículos, e impondo um
novo „Macarthismo de Esquerda‟ no ensino superior”.
11
incomodar com estes novos agregados. Os conservadores americanos travaram
assim,
uma
espécie
de
guerra
cultural,
fazendo
com
que
temas
como
multiculturalismo, os códigos de fala e ação afirmativa fossem distorcidos e
apresentados fora de proporção. Sendo assim, estes se esforçavam para apresentar
um quadro no qual, os professores estavam sendo silenciados por verdadeiros
radicais do sistema universitário, sem falar no fato de se colocarem como vítimas de
uma ideologia esquerdista que estaria ameaçando suas liberdades civis. Estas
alegações vistas nos Estados Unidos no início da década de 1990 puderam ser
visualizadas aqui no Brasil quando se debatia a implementação das ações afirmativas
nas universidades do país, do mesmo modo que os conservadores americanos
afirmavam que tais políticas arruinariam o ensino superior, o grupo hegemônico que
sempre ocupou o espaço acadêmico e demais esferas de poder na sociedade
brasileira, se posicionou com iguais argumentos. Wilson então se propõe a provar que
cada mito difundido a respeito do politicamente correto é totalmente errado e de
criação conservadora.
1.2
O MULTICULTURALISMO E AS IDENTIDADES
Como vimos acima, os conservadores passaram a atacar entre outras coisas, o
multiculturalismo. Entenderemos a seguir o porquê deste tema servir de alvo no que
diz respeito ao politicamente correto.
Stuart Hall (2003), então vai definir uma diferença entre os termos
“multicultural” e “multiculturalismo”, sendo o primeiro para ele, um termo qualificativo
que tem como intuito descrever como:
Características sociais e os problemas de governabilidade apresentados por
qualquer sociedade na qual diferentes comunidades culturais convivem e
tentam construir uma vida em comum, ao mesmo tempo em que retêm algo
de sua identidade „original‟ (pg.52).
Já o termo multiculturalismo, que é o que mais nos interessa no momento, é
definido como um substantivo, servindo como finalidade de “estratégias e políticas
adotadas para governar ou administrar problemas de diversidade e multiplicidade
gerados pelas sociedades multiculturais” (pg.52).
12
Desta forma, então, podemos dizer que o multiculturalismo que é atacado nos
Estados Unidos, é aquele que tem como principal preocupação o uso político o
chamado “direito das minorias”, sejam elas étnicas, de gênero ou classe, entre outras,
ganhando não apenas adeptos mas visibilizando-os e assim criando desconforto no
status quo. Stuart Hall ainda nos expõe que o multiculturalismo, é um termo mais
complexo do que a descrição acima, visto as diferenças multiculturais encontradas
nos diversos países em que é invocado.
Stuart Hall (2006) nos traz a discussão a respeito das identidades culturais e as
mudanças que estas estariam sofrendo na modernidade tardia. As identidades antes
tidas como fixas, passam a sofrer um descentramento, forçando assim, uma mudança
em todo o sistema social uma vez que as estruturas estariam passando por um
processo de pluralização, isso graças à globalização.
É neste momento de descentramento que vemos surgir novas variações ou
modalidades de movimentos dentro dos próprios movimentos que já existiam, ou seja,
dentro do movimento das mulheres surge o movimento das mulheres negras que
reivindicam direitos a partir das suas especificidades, no movimento dos
homossexuais este se divide entre as reivindicações das lésbicas e das/dos
transexuais. Isto ocorre porque tais grupos que antes pareciam unificados diante de
uma única bandeira de luta, trazem à tona as discriminações que sofriam tanto em
relação à sociedade quanto em relação à partilha de poder e de visibilidade no interior
do movimento, devido ao pertencimento de sua identidade cultural, e são estas
diferenças que vão dar bases para a difusão do multiculturalismo trazendo à tona as
reivindicações específicas de cada grupo.
As mudanças que ocorreram na sociedade se refletem também na academia,
nas ciências humanas vemos Margareth Rago (1999), por exemplo, demonstrar que o
surgimento de novos atores sociais, modificam a escrita da historiografia brasileira
que antes era feita por um determinado grupo hegemônico, passa então a ser
contada por aqueles que antes eram pesquisados ou até invisibilizado na História.
Sendo que isto somente foi possível devido a entrada atores destes grupos nos
cursos de pós-graduação nas décadas de 1960 e 1970.
“novos grupos sociais, étnicos e sexuais passaram a participar da vida
pública trazendo suas questões e reivindicações e, ao mesmo tempo,
ampliando formas estética e de consumo. As mulheres principalmente,
13
entraram agressivamente no mercado, participando dos cursos nas
universidades, nas escolas e em outras instituições, enquanto o movimento
feminista levou grande número às praças públicas, exigindo novos direitos
sociais e sexuais, os negros colocaram suas demandas na agenda pública,
enquanto o movimento operário se organizava nos grandes centros
industriais e propunha a criação de um importante partido político de massas;
os jovens entre os quais muitos estudantes, passaram a compor um
contingente político expressivo”. (STEPAN, 1988 apud RAGO, 1999)
Na visão de HALL (2006), o sujeito pós-moderno possui como principal
característica
uma
constantemente,
identidade
sendo
que
móvel
esta
não
que
seria
seria
formada
definida
e
transformada
biologicamente,
mas
historicamente a partir dos processos culturais que nos rodeiam, sendo então
acionada.
1.2 LINGUAGEM E SOCIEDADE
Michael Denning expõe que o politicamente correto nasce de uma vontade por
um “tipo de etiqueta ou protocolo comum que regulem as relações entre as
comunidades que não possuam laços fortes. Um código impessoal que administra
certa diplomacia entre elementos dispares da esquerda. ” (1990, apud, SHOHAT e
STAM, 2006et al., p. 443).
Para AVELAR, o que está em questão não é somente o fato de haver ou não
uma neutralidade dos sujeitos que usam a linguagem. Mas do fato de que “os próprios
vocábulos, estruturas e entonações da língua trazem consigo uma história carregada
de sentidos culturais e políticos [e], não é do interesse dos que lutam ao lado dos
mais fracos ignorar ou minimizar essa história.” (AVELAR, 2011, p. 02). Dito de outra
forma, nada é dito por acaso porque a língua não é neutra. As brincadeiras, charges,
publicidades com fundo humorístico, têm em si uma carga de valores culturais ou
políticos, depreciativos ou não, de todo e qualquer grupo. Mesmo porque, o humor é
um dos recursos usados para prender a atenção de seu interlocutor. A questão é:
quem vai decidir o que dizer ou não, ou se o que se diz é certo ou não. O Estado? O
14
mercado? A Mídia? Os movimentos sociais? As organizações não governamentais? A
sociedade civil em comum acordo?
E essa ação se manifesta no humor, na linguagem ou na publicidade acaba por
vezes não tendo o cuidado em observar se se está sendo racista, machista,
homofóbico ou se está desmerecendo algum grupo social.Por vezes, é possível dizer
que essa falta de cuidado pode ser advinda de grupos que defendem a liberdade de
expressão3 ou o ainda chamado “politicamente incorreto”.
Temos que ter em mente o fato que “tudo que é expresso em palavras,
carrega, consigo, mensagens implícitas” (ROSSONI, 2009, pág. 07), sendo assim,
certas palavras sozinhas ou acompanhadas por outras expõem uma carga cultural na
sua exposição, desta forma, “muito mais é comunicado do que simplesmente o dito
explicitamente pelo falante”(pág. 08).
A fala humana é algo natural no que diz respeito à capacidade de emitir sons,
mas é somente a partir da linguagem que estes sons ganham aspectos voltados para
a comunicação. Esta, é estruturada para informar ideias, significados e pensamentos,
e toda a construção desta linguagem passa por conteúdos e interesses culturais,
sociais e históricos. Desta forma, a linguagem pode ser utilizada das mais diversas
maneiras e fins, BAGNO expõe que a linguagem é “de todos os instrumentos de
controle e coerção social, talvez o mais complexo e sutil” (2003, apud ROSSONI,
2009et al., pág.11), assim determinados grupos que detêm certo conhecimento a
respeito da linguagem pode utilizá-la para manipular interesses pessoais ou de um
grupo.
A linguagem tem a possibilidade e poder de exprimir não só desejos,
vontades, preferências, como também ideologias e crenças. É evitando que
essa expressão possa transmitir alguma idéia errônea do que o falante
pretende ao comunicar-se que se percebeu o cuidado em “lapidar” as
palavras e expressões lingüísticas a serem usadas. (ROSSONI, 2009,
pág.13)
3
Estes grupos são formados geralmente por indivíduos do humor, como podemos ver no documentário “O riso
dos outros”, e ainda publicitários, e intelectuais dos estudos da linguagem, que veem no politicamente correto
uma forma de ditadura da linguagem.
15
Podemos pensar a partir desta perspectiva o que realmente as mudanças nos
significados das palavras nos informam? A comunicação é hoje a ferramenta mais
eficaz para o intercâmbio dos mais variados tipos. A linguagem e suas modificações
propostas demonstram que os novos atores emergidos nas décadas de 1960 e 1970
buscaram demonstrar suas identidades na sociedade de modo a reivindicar direitos
específicos para o grupo a que pertenciam, porém a partir dos anos 1980 esses
atores emergidos que antes afirmavam sua identidade, trazem diversas questões que
passam a redefinir o que diz respeito às suas identidades e sua relação na sociedade,
assim o politicamente correto surge nesta configuração sociocultural sendo apoiada
por estes atores pós-modernos que são caracterizados pela sua pluralidade,
flexibilidade, fragmentação e mobilidade. Os atores passam por um processo que os
permite que os permite assumir várias identidades convenientes a diferentes
contextos. Este processo ao qual os atores passam segundo HALL (2003) seria a
globalização
“A globalização tem, sim, o efeito de contestar e deslocar as identidades
centradas e „fechadas‟ de uma cultura nacional. Ela tem um efeito pluralizante
sobre as identidades, produzindo uma variedade de possibilidades e novas
posições de identificação [...]. Em toda parte, estão emergindo identidades
culturais que não são fixas, mas que estão suspensas, em transição, entre
diferentes posições; que retiram seus recursos, ao mesmo tempo, de
diferentes tradições culturais: e que são o produto desses complicados
cruzamentos e misturas culturais que são cada vez mais comuns num mundo
globalizado” (HALL, 2003, p. 87-88).
Sendo assim, pode-se observar que as identidades se deslocam e se cruzam
constantemente, as identidades que antes se caracterizavam como algo automático
agora figuram mais politizadas, podem ser ganhadas ou perdidas. Este processo é
visto como uma mudança de uma política de identidade de classes para uma política
de diferença, sendo esta que sustenta todo o processo. (HALL, 2003).
1.3 O POLITICAMENTE CORRETO HOJE
O politicamente correto tem tanta importância nos dias de hoje que o governo
federal via Secretaria Especial de Direitos Humanos, lançou em 2004 no primeiro
16
mandato do governo Lula, uma cartilha chamada: Politicamente Correto e Direitos
Humanos.
A cartilha pode ser encontrada online ainda e teve uma tiragem de 5 mil
exemplares de distribuição gratuita. Em formato de glossário, traz não apenas
palavras, mas expressões que são acompanhadas de uma explicação da mesma e a
conotação que carrega na sua expressão. A cartilha é uma espécie de manual que
traz ainda a maneira correta de se utilizar determinados termos ou expressões.
No documentário lançado em 2012 chamado: “O riso dos outros”, o cineasta
Pedro Arantes tratou da questão do politicamente correto pela via do humor e
abordou o fato de muitos humoristas do gênero stand up se utilizarem deste meio
para destilarem piadas contra alguns grupos sociais. O documentário trouxe para o
seu debate, pessoas a favor e contra o politicamente correto, no caso dos humoristas
havia uma divisão dos favoráveis e dos contrários. Entre os favoráveis a
argumentação era de que não havia necessidade de se fazer humor com
determinados grupos, tendo a possibilidade de outras formas de humor, sendo então
o ataque a esses grupos discriminados nada mais que um humor muito raso, podendo
ainda se fazer um humor voltado para o lado do opressor ao invés dos oprimidos. Os
humoristas contrários ao politicamente correto diziam que no campo do humor
sempre se tem um alvo e se as pessoas riem destas piadas é porque existe um
público pra ela, e por esta razão os humoristas ainda a utilizam.
No Brasil a discussão a respeito do politicamente correto tem se expandido,
mas ficado ainda nas áreas da Linguística e Comunicação em geral, o governo tem
um interesse a respeito, ou no mínimo demonstrou não estar totalmente avesso à
discussão, mas o tema é muito polêmico e de difícil resolução. A cartilha do
Politicamente Correto lançada, creio ter tido boas intenções, mas de certa forma tinha
propósitos muito grandes que não podem ser resolvidos apenas com a impressão de
um manual linguístico, sendo um trabalho de longo prazo pelas vias da educação e
cultura do país.
Atualmente o politicamente correto, no Brasil tem sua discussão voltada mais
para as áreas da Linguística, ficando o debate voltado às questões relacionadas aos
usos da língua, e em alguns casos para a Comunicação e Jornalismo aqui vinculado à
discussão sobre a defesa da liberdade de expressão.
Sírio Possenti é um dos pesquisadores da área de Linguística que hoje discute
o politicamente correto, pesquisa piadas e dentro destas pesquisas está sua
17
discussão sobre o politicamente correto. Possenti tem sua importância e
reconhecimento na Linguística, porém suas análises não levam em consideração os
aspectos socioculturais e históricos que a linguagem carrega em si. Em palestra
realizada em 2013 na semana de Letras da UFPR, ele chegou a defender que haveria
um lugar onde certas piadas politicamente incorretas pudessem ser feitas, sendo este
espaço, por exemplo, as casas que apresentam os chamados Stand up‟s.
O que não pode ser deixado de lado nesta discussão é que o politicamente
correto na visão pós-moderna de HALL (2003) ressalta a política da diferença como
forma de representação. No que diz respeito a linguagem, esta também sofre um
descentramento uma vez que
“A língua é um sistema social e não um sistema individual. Ela preexiste a
nós. Não podemos, em qualquer sentido simples, ser seus autores. Falar uma
língua não significa apenas expressar nossos pensamentos mais interiores e
originais; significa também ativar a gama de significados que já estão
embutidos em nossos sistemas culturais.” (HALL, 2003, pág.40)
Desta forma, não são apenas as identidades que passam por um processo de
descentramento, mas toda a estrutura social, não há como frear as demandas
advindas destes novos sujeitos que emergem com suas especificidades, também não
há como uniformizar a língua para que preconceitos sejam diminuídos no uso diário
da fala e da comunicação, tendo em vista não somente a grande heterogeneidade
social que nos informa que aquilo que é mal visto para uns pode não ser para outros e
por esta razão as liberdades não podem sofrer igual opressão, como as que são
impostas quando se nega determinadas especificidades nas identidades.
18
2.
PUBLICIDADE E SOCIEDADE: O PAPEL DA PUBLICIDADE
A publicidade surgiu da necessidade não apenas de empresas, mas de
governos de persuadir as pessoas quanto aos seus propósitos. No meio político ela
foi utilizada por Stálin intensamente para propagar a visão de que este representava o
pai do povo. Na Alemanha da década de 1930 e 1940, vemos como a propaganda foi
essencial para o desenvolvimento dos ideais do Partido Nazista. Sob a
responsabilidade de Joseph Goebbels no Ministério da Propaganda do Reich, foi
possível influenciar a sociedade alemã a partir do controle da mídia em geral, o
governo tendo o controle da imprensa, rádio, teatro, cinema, etc., difundiu não só na
sua visão de orgulho da raça ariana, como também a devoção, obediência e
fidelidade ao Führer.
A propaganda ao longo das décadas seguintes continuou a ser utilizada como
uma forma de persuadir quem tivesse acesso a ela, tanto no nível de mercado como
no nível institucional. O reconhecimento da força que a propaganda nos diferentes
meios em que é utilizada foi lembrada em 1994, na campanha da APP (Associação
Paulista de Propaganda) desenvolvida pela agência DM9, conforme nos lembra
BELLELI (2005), sendo que esta faz alusão à história do Partido Nazista.
FIGURA 1- PROPAGANDA DM9
FONTE: BELELLI (2005)
19
Na sociedade de consumo a publicidade é fundamental para a influência de
atitudes, se utiliza de artifícios argumentativos, humor, e simbolismo para convencer
as pessoas de que elas devem utilizar um bem ou produto.A publicidade e a
propaganda podem ser caracterizadas então como o braço simbólico do consumo,
como condição essencial para a sociedade industrial e de consumo. Vende tanto
sabonete, como ilusões até posições políticas.
A publicidade e propaganda se mostram assim, essenciais para a política, pois
nas campanhas eleitorais elas são uma das principais bases do partido, uma vez que
a partir da maneira como ela é feita, quais argumentos aciona para persuadir o eleitor
é que pode-se ver sua eficácia.
Há hoje em dia uma preocupação por parte da publicidade com relação ao seu
conteúdo, sendo que este não pode apresentar algo enganoso e antiético ao
consumidor. Segundo ARBACH (2005), a preocupação das agências publicitárias
com o politicamente correto, ou com uma forma de representação dos diversos
grupos sociais se dá de fato com as campanhas do espaço público, pois este já
apresenta uma preocupação em representar os diversos grupos étnicos, de geração,
gênero e deficientes da sociedade brasileira. Para ele
“A preocupação com o politicamente correto nas campanhas educativas tem
sido constante no cotidiano dos publicitários que atendem Governos, terceiro
setor e outras instituições que trabalham com a divulgação de idéias e
conceitos referentes ao comportamento social.” (ARBACH, 2005, pg. 07)
As agências que prestam serviços publicitários para o setor público podem
apenas estar preocupados com estas questões devido a um pedido do governo no
formato de suas peças, uma pesquisa mais aprofundada a respeito das agências
publicitárias poderia responder a esta questão sendo deixada de fora deste trabalho
por enquanto. Arbach nos informa que as peças do governo são desenvolvidas, “com
base em briefings4 e apresentadas a um conselho executivo responsável por avaliar a
4
Palavra inglesa que significa resumo em português. É um documento contendo a descrição da
situação de uma marca ou empresa, seus problemas, oportunidades, objetivos e recursos para
atingi-los. O briefing é umprocessoutilizado na áreaadministrativa, porprofissionais da comunicação,
relaçõespúblicas e publicitários, sendo a base de umprocesso de planejamento. Numa agência de
propaganda o briefing é umadasetapasfundamentais deprocessopublicitário. É umprocessocontínuo
e cumulativoatravés de todos os estágios do planejamento de propaganda. Significa a passagem de
informação de umapessoa para outra, especialmente do anunciante para o executivo de
20
qualidade e aprovar, ou não, a veiculação das campanhas”. (2005, pg.22). Este grupo
de briefing foi criado justamente para que os membros pudessem dar as suas
impressões a respeito das peças para que se evitasse possíveis mal-entendidos, pois
sendo o governo responsável por sua veiculação tem mais responsabilidades quanto
a qualquer tipo de discriminação com relação à população, tendo assim a
preocupação de representar/incluir todos os grupos sociais possíveis em suas
campanhas.
A propaganda, portanto, pode influenciar inclusive no preço dos produtos, um
produto mais procurado pode ter seu preço elevado visto o poder da marca. Sendo
assim a propaganda bem desenvolvida pode influenciar não apenas de formas
ideológicas mas principalmente econômicas, sua atuação está nos mais diversos
espaços da sociedade.
2.1 MARCOS LEGAIS
No Brasil, desde 1980 existe uma regulamentação da publicidade que é feita
pelo Conselho Nacional de Auto-regulamentação Publicitária (CONAR). Trata-se de
uma Organização não governamental que, segundo informações encontradas no site
do próprio conselho, encarrega-se de fazer valer o Código Brasileiro de Autoregulamentação Publicitária e tem como missão impedir que a publicidade enganosa
ou abusiva cause constrangimento ao consumidor ou a empresas e defender a
liberdade de expressão comercial.
“O Código Brasileiro de Auto-regulamentação Publicitária nasceu de uma
ameaça ao setor: no final dos anos 70, o governo federal pensava em
sancionar uma lei criando uma espécie de censura prévia à propaganda. Se a
lei fosse implantada, nenhum anúncio poderia ser veiculado sem que antes
recebesse um carimbo “De Acordo” ou algo parecido. A criação do
departamento para controle da publicidade exigiria a contratação de algumas
centenas de funcionários. As implicações burocráticas seriam inimagináveis
ainda assim desprezíveis diante do retrocesso que tal controle representaria
para um país que reconquistava a duras penas seu direito à liberdade de
expressão. Diante dessa ameaça, uma resposta inspirada: autoregulamentação, sintetizada num Código, que teria a função de zelar pela
liberdade de expressão comercial e defender os interesses das partes
atendimento e deste para os demaisprofissionaisenvolvidos no processo.Informações disponíveis
em : <http://www.significados.com.br/briefing/>. Acessoem: 06 de junho de 2014.
21
envolvidas no mercado publicitário, inclusive os do consumidor. A ideia brotou
naturalmente a partir do modelo inglês e ganhou força pelas mãos de alguns
dos maiores nomes da publicidade brasileira.” (website do CONAR)
Antes da fundação do CONAR, foi redigido em 1970, O Código Brasileiro de
Auto-regulamentação Publicitária. Em 1978 ele foi aprovado durante o 3º Congresso
Brasileiro de Propaganda, realizado em São Paulo, que fora convocado pelo
presidente da Associação Paulista de Propaganda, Luiz Celso de Piratininga, hoje
vice-presidente do CONAR. Em 1979 é fundada a Comissão Nacional de Autoregulamentação Publicitária, a CONAR, que promoveu as primeiras conciliações e
julgamentos. A Comissão é presidida por Geraldo Alonso, tendo Salles como relator
apoiado por Saulo Ramos e Fábio Monteiro. E, em 05 de maio de 1980 o CONAR é
fundado, ficando a sua sede em São Paulo (Página do CONAR).
Desde sua fundação o CONAR já instaurou mais de 7 mil processos éticos e
promoveu um sem-número de conciliações entre associados em conflito. Nunca foi
desrespeitado pelos veículos de comunicação e, nas raras vezes em que foi
questionado na Justiça, saiu-se vitorioso. (Página do CONAR)
O conselho procura atender principalmente denúncias de consumidores,
autoridades, associados ou as formuladas pelos integrantes da própria diretoria. As
denúncias são julgadas pelo Conselho de Ética, com total e plena garantia de direito
de defesa aos responsáveis pelo anúncio. Quando comprovada a procedência de
uma denúncia, é sua responsabilidade recomendar alteração ou suspender a
veiculação do anúncio.
Atualmente o CONAR conta com 109 agências associadas, além de rádios,
redes de TV e jornais. O órgão é bastante respeitado tendo em vista a quantidade de
associados e levando em consideração ainda o fato de que, sendo uma organização
não-governamental suas decisões são acolhidas, mesmo que a empresa julgada não
tenha esta obrigatoriedade de cumprimento.
Em abril de 2014 o CONAR lançou uma campanha composta por dois vídeos 5
no qual criticava em certa medida o politicamente correto, a campanha dizia respeito
às reclamações excessivas que recebe, porém, acabou sendo vítima de sua própria
campanha recebendo críticas por ridicularizar as queixas dos consumidores, na
5
Disponíveis em:<http://economia.uol.com.br/noticias/redacao/2014/04/11/consumidores-reclamam-e-conarvai-julgar-anuncio-feito-pelo-proprio-orgao.htm#fotoNav=2> Acesso em: 02 de junho de 2014.
22
propaganda criada pela agência AlmapBBDO, ao final da propaganda é dito que o
CONAR é “responsável por regular a publicidade no Brasil e todos os dias recebe
dezenas de reclamações. „Muitas são justas; outras, nem tanto. Confie em quem
entende. Confie no CONAR” (UOL Economia). Dada a repercussão o CONAR optou
por se autojulgará respeito da propaganda.
No Brasil a propaganda passa a ser regulada então como medida para garantir
não somente a liberdade de expressão, mas também, que a publicidade que chegue
ao consumidor não seja de alguma forma antiética, desrespeitosa ou enganadora.
A propaganda, sua veiculação, ou até mesmo as agências, devem estar
cientes da composição heterogênea da sociedade e quando utilizarem dos diversos
grupos que compõem a sociedade nas suas peças publicitárias, o fazerem tendo a
noção mínima de podem ser cobradas quanto ao conteúdo ali reproduzido, não
somente por movimentos organizados ou individuais, mas pelo próprio CONAR que
muitas das agências brasileiras fazem parte atualmente. As agências devem
acompanhar assim como o CONAR as diversas mudanças que ocorrem na sociedade
para não esbarrarem em preconceitos que outrora naturalizados podiam ser
considerados brincadeiras.
23
3. ANÁLISE DE CASOS
Neste capítulo será feita a análise das peças escolhidas que foram de certa
forma, alvo de críticas nos meios da internet e sofreram processo por meio do
CONAR no ano de 2012. As imagens seguem juntamente com a reprodução da
decisão do processo pelo Conselho, conforme encontrado no site e sem quaisquer
alterações.
3.1 AZEITE GALLO
A marca Gallo foi fundada em Portugal em 1919, e tem se mantido no mercado
português desde então, a marca está presente em mais de 40 países, sendo líder de
vendas em Portugal, Brasil, Venezuela e Angola, e ainda a 3ª marca mais vendida de
azeite do mundo6.
A primeira campanha brasileira da empresa foi realizada em 2006 e visava
propagar a marca no país. Em 2011, já com alguma expansão e conhecimento por
parte dos consumidores brasileiros, a empresa, seguindo a tendência que outras
marcas de azeite já haviam aderido, lança a versão da embalagem em vidro escuro,
pois assim o produto chegaria à mesa do consumidor com suas características
organolépticas preservadas, uma vez que o vidro escuro protegeria o azeite da luz,
evitando assim sua oxidação e alteração de sabor.
Para divulgar a inovação a qual a marca estava inserindo no mercado,
propagandas foram criadas buscando evidenciar a característica do vidro escuro. Em
Portugal e no Brasil as propagandas tiveram um design parecido porém com texto
diferente.
Abaixo podemos visualizar a propaganda que causou polêmica, seguida da
decisão do processo pelo CONAR.
6
Segundo informações coletadas no site da marca. Disponível em: http://www.gallooliveoil.com/pt/gallolegado/historia.aspx
24
FIGURA 2 – PROPAGANDA AZEITE GALLO
FONTE: Internet
Decisão do caso no Conar conforme publicado no site do próprio Conselho:
“NOSSO AZEITE É RICO. O VIDRO ESCURO É O SEGURANÇA”
Mês/Ano
MARÇO/2012
Julgamento:
Representação nº: 279/11
Autor(a): Conar, mediante queixa de consumidor
Anunciante: Anunciante e agência: Gallo Brasil e AlmapBBDO
Relator(a): Conselheiro André Luiz Costa
Câmara: Segunda Câmara
Decisão: Alteração
Fundamentos: Artigos 1º, 3º, 6º, 19, 20 e 50, letra "b" do Código
Resumo: Por maioria de votos, o Conselho de Ética do Conar deliberou por recomendar a
alteração do anúncio em mídia impressa do Azeite Gallo, com o título "Nosso azeite é
rico. O vidro escuro é o segurança". Os conselheiros seguiram o voto do relator, que
julgou não haver no anúncio intenção racista, mas ponderou que ele permite tal
interpretação e que a comunicação não deve dar margem a associações equivocadas,
pela responsabilidade social que tem. Por isso, sugeriu uma alteração, de modo a
dirimir a possibilidade de interpretações discriminatórias. A representação foi aberta
por denúncia de consumidor de Campinas (SP).
25
Fonte: http://www.conar.org.br/
A propaganda esteve em veiculação no ano de 2011 mas somente no início de
2012 foi denunciada ao CONAR.Primeiramente a agência de publicidade responsável
pela criação da publicidade, a AlmapBBDO, informou que só se pronunciaria após o
julgamento do Conselho, e em março de 2012 (período em que a peça foi julgada) a
agência informou que estava aguardando a notificação do Conselho para decidir a
respeito da modificação que aplicaria à campanha.
Após a decisão à época, a agência divulgou em nota que não recorreria da
decisão, pois o anúncio já havia sido veiculado no ano anterior e não seria veiculado
novamente não havendo assim necessidade de tal ato.
Como dito anteriormente, propaganda semelhante foi veiculada em Portugal,
porém, o anúncio de Portugal foi feito inspirado em um dito popular português que diz:
“o sol quando nasce é para todos”, desta forma o texto do anúncio dizia: “O sol nasce
para todos os azeites, mas é só o nosso que ele não estraga” (ver imagem 1 em
anexo).
Podemos imaginar que a mesma propaganda feita em Portugal poderia ter sido
utilizada no Brasil, e ainda que no slogan da campanha poderia ter sido evitado
problemas deste tipo de conotação se no desenvolvimento da campanha tivesse sido
utilizado um “a” no lugar do “o”, ficando então: “nosso vidro escuro é „a‟ segurança”,
conforme sugere um portal de notícias na internet7.
A peça foi retirada do site oficial da Gallo no Brasil na área que traz o histórico
da empresa, sendo substituída pela peça da campanha portuguesa, enquanto no
histórico do endereço do site em Portugal, contém um vídeo da campanha
portuguesa.
7
Portal Ucho.Info, matéria disponível em:< http://ucho.info/?p=53151>. Acesso em 02 de maio de 2014.
26
3.2 DULOREN
A Duloren8 atua no mercado brasileiro há 38 anos e produz cerca de 1.500.000
de peças por mês, produzindo atualmente as marcas Duloren e Femmina.
A marca pertencente atualmente a Roni Argalji, filho do fundador, que adquiriu
a marca após a morte do pai e resolveu mudar o estilo das campanhas, mas sem
deixar de lado a polêmica que já é um fator que está associado às propagandas da
marca. As peças de propaganda da empresa passaram a apresentar modelos com
padrão diferente das usualmente contratadas, se anteriormente as modelos atendiam
ao estereótipo do mercado de moda, sendo estas modelos magras, as novas
apresentavam modelos de manequim e idades diferentes.
A Duloren ao longo dos anos 1990 já era conhecida por suas propagandas
polêmicas. Em suas campanhas temas como aborto, religião e orientação sexual
foram abordados na composição de suas peças publicitárias. As campanhas da
marca foram realizadas ao longo de sua existência por diversas agências dentre elas
a Doctor Propaganda, responsável por grande parte da publicidade da época, sendo
que algumas destas tiveram a veiculação proibida dada a polêmica que geraram.
Outras agências assumiram a marca depois da Doctor Propaganda, entre elas:
W/Brasil, a MG Comunicação em 2004 com campanhas insinuado sexo e
sadomasoquismo, a DM9 em 2006 montou a campanha mostrando homens nus
servindo de sofá e passarela para uma modelo, e atualmente a X-Tudo Comunicação
Completa é quem atende a marca, sendo a responsável pela peça a ser analisada.
Vemos que mesmo com a mudança de agência, a comunicação da marca
seguiu o mesmo padrão que mistura provocação e insinuações sexuais por figuras
femininas sensuais e independentes.
Em 2011 a marca já havia lançado campanha que trazia como diferencial do
mercado a modelo Mayara Russi no natal, visando o público plussize 9, a estratégia de
lançar coleções com numeração maior teve efeito positivo para a Duloren que durante
o mesmo ano havia registrado um aumento de 40% nas vendas de lingerie voltadas
8
Informações coletadas no website da empresa, disponível em: <http://www.duloren.com.br/#!/historia/>
Acesso em 03 de maio de 2014.
9
A numeração do vestuário é considerada plus size a partir do 46 no caso das mulheres e ainda pode
ser referida como GGG ou XG.
27
para este segmento, a marca investiu nos modelos e cores que antes não fugiam do
tradicional preto, branco ou bege, e nos tecidos utilizados na confecção também, que
agora incluíam rendas. O investimento da empresa neste segmento pode se dar
também pelo fato de que, segundo dados do Ministério da Saúde de 2013 10, a
população brasileira adulta está acima do peso ideal, sendo que a obesidade seria um
fator em crescimento também, atingindo 17% da população, atingindo a população
tanto feminina (18%) quanto masculina (16%).
No ano seguinte, visando as mudanças propostas pelo presidente da empresa,
surge o projeto “New People” que pretendia substituir as modelos por mulheres
normais do dia-a-dia. O projeto que teve durante o ano campanhas veiculadas com
mulheres mais velhas como a secretária executiva aposentada Vera Juppa da Silva
de 77 anos, que aparecia em roupas íntimas em uma cama com um homem mais
novo dormindo, juntamente com a frase de slogan: “A única coisa que eu faço com
prazer é passar o rodo”, e ainda contou com modelos plussize em outras.
A primeira peça a ser realizada deste projeto foi justamente a que foi
denunciada ao CONAR no início do ano de 2012. A peça contava com a presença da
depiladora Ana Paula Conceição Soares, de 29 anos e moradora da Rocinha e foi
descoberta pela própria marca na comunidade.
A campanha denunciada obteve críticas não somente quanto ao racismo, mas
também de desrespeito à polícia. Os comentários na página oficial da marca no
Facebook chegaram a citar Gilberto Freire, lembrando dos estereótipos da mulher
negra e que estariam, na opinião dos seguidores da página, sendo reforçados e a
marca dando um passo atrás fazendo uma apelação neste tom em sua campanha.
Os conselheiros do CONAR demonstraram opinião semelhante no julgamento
do caso, o relator em seu voto se referiu à Duloren como campeã absoluta da
apelação publicitária no país, lembrando que havia outras formas de se anunciar o
produto, e que no caso em julgamento a campanha despeitava todas as partes
envolvidas na peça (mulher e polícia). Assim o Conselho votou pela suspensão da
campanha, a empresa recorreu mas a decisão do Conselho foi mantida.
10
Dados disponíveis em: <http://portalsaude.saude.gov.br/index.php/o-ministerio/principal/portaldcnt/noticias-portal-dcnt/6118-mais-da-metade-da-populacao-brasileira-tem-excesso-de-peso> Acesso
em: 15/06/2013.
28
FIGURA 2 – PROPAPAGANDA DULOREN
FONTE: Internet
Decisão do caso no Conar conforme publicado no site do próprio Conselho:
"PACIFICAR FOI FÁCIL, QUERO VER DOMINAR".
Mês/Ano
JULHO/2012
Julgamento:
Representação nº: 75/12, em recurso ordinário
Autor(a): Grupo de consumidores
Anunciante: Duloren
Relator(a): Conselheiros Clementino Fraga Neto e Renata Garrido
Câmara: Terceira Câmara e Câmara Especial de Recursos
Decisão: Sustação
Fundamentos: Artigos 1º, 3º, 6º, 19, 20 e 50, letra "c" do Código
Resumo: Numerosos consumidores questionaram anúncio em internet de marca de lingerie que
mostra foto de uma jovem negra trajando roupas íntimas e segurando um quepe militar
com ar desafiador. Ao fundo, aparece um homem ressonando, com uniforme
29
desabotoado que lembra a farda dos policiais cariocas, tudo ambientado no que
sugere ser a laje de uma casa em uma favela carioca. O anúncio foi veiculado nos
dias seguintes à operação de pacificação pela polícia da favela da Rocinha, no Rio de
Janeiro. Para os consumidores, a imagem sugere desrespeito ao trabalho da polícia e
também à imagem feminina, além de expressar racismo e machismo.
Em sua defesa, a Duloren discorda de tal interpretação, vendo na peça publicitária
reconhecimento da posição de destaque que a mulher conquistou na sociedade.
Em primeira instância, o Conselho de Ética votou por unanimidade pela sustação,
atendendo sugestão do relator. "O anúncio em tela é apenas mais uma incursão
midiática da Duloren, dessa vez sem o brilho polêmico de algumas de suas peças de
outros tempos, que a fizeram merecer o título irrefutável de campeã absoluta da
apelação publicitária no Brasil", escreveu ele em seu voto, sugerindo também a
divulgação pública da posição do Conar, levando em conta a reincidência do
comportamento do anunciante.
A Duloren recorreu da decisão, alegando que é inerente à publicidade atrair a atenção
dos consumidores sem desrespeitá-los. É o que ela acredita ter conseguido com esse
anúncio. Considera que a mensagem da peça deva ser entendida como: "Pode-se
pacificar um morro, mas nem homem nem soldado nenhum é capaz de dominar uma
mulher com lingerie Duloren".
Tais argumentos não convenceram a relatora do recurso. "Existem muitas formas
criativas de anunciar lingerie sem ferir as normas da boa propaganda. O anúncio aqui
discutido tentou inovar e foi infeliz, pois vulgariza a mulher e banaliza o programa de
pacificação das favelas, desrespeitando todas as partes envolvidas", escreveu ela em
seu voto, ratificando a recomendação de sustação, aprovada por unanimidade.
Fonte: http://www.conar.org.br/
A peça acima foi retirada pela empresa de suas redes sociais e do site da
empresa, sendo encontrada na página do Facebook apenas duas imagens que dizem
respeito à campanha, uma delas anterior à polêmica ter tomado grandes proporções e
outra da modelo da peça sendo maquiada.
Na primeira11 a empresa traz uma reprodução do jornal O Globo em que cita a
nova campanha polêmica da marca, sendo esta a primeira do seu projeto “New
People”. Nesta postagem há apenas quatro comentários sendo que apenas um deles
é uma crítica quanto ao teor da peça, mas que data de um mês depois que esta
imagem foi publicada na página. A segunda imagem que seria um making-off12obteve
51 comentários sendo na sua maioria críticas contra a campanha, tendo inclusive
consumidoras expondo que não usarão mais as roupas da marca devido à
propaganda.Apesar das propagandas retiradas do ar, a Duloren obteve vantagem
11
Disponível em: <https://www.facebook.com/photo.php?fbid=321746127874819&set=pb.103541576361943.2207520000.1398055659.&type=3&theater> Acesso em 03 de maio de 2014.
12
Disponível em: <https://www.facebook.com/photo.php?fbid=326085804107518&set=pb.103541576361943.2207520000.1398055659.&type=3&theater> Acesso em 05 de maio de 2014.
30
uma vez que seus lucros aumentaram na década de 1990, saltando de 80 milhões de
dólares de faturamento em 1993 para 140 milhões em 199713.
3.3 PRUDENCE
A Prudence é uma empresa subsidiária da DKT Internacional, sendo esta uma
organização sem fins lucrativos, cuja missão é não apenas a prevenção de DST/AIDS, mas
de oferecer opções seguras para planejamento familiar. A DKT Internacional foi fundada em
1984, e tem sua sede em Washington D.C, NO Brasil a DKT está presente desde 1990.
A empresa desenvolve ainda programas de Marketing Social em 19 países, e
somente em 201114 vendeu a nível mundial, mais de meio bilhão de preservativos
além de quase 70 milhões de pílulas anticoncepcionais, 12 milhões de contraceptivos
injetáveis, 800.000 DIUs, bem como pílulas de contracepção de emergência e
implantes hormonais. No Brasil a empresa possui a maior linha de preservativos, géis
lubrificantes e brinquedos eróticos, sendo a primeira a comercializar preservativos
femininos no país.
No Brasil a empresa tem parceria com as ONG‟sBarong e Equipe Voluntária
Brasil, que recebem os produtos da DKT podendo vendê-los em pontos de venda não
convencionais, podendo a ONG ficar com o valor de venda para o desenvolvimento
de seus projetos de prevenção de DST/AIDS e planejamento familiar, que são
geralmente em comunidades carentes. Quando uma empresa escolhe utilizar o
marketing social como parte de sua missão, ela está priorizando vender um
comportamento desejado, diferente do marketing comercial no qual o processo gira
em torno da venda de produtos e serviços.
O marketing social não deixa de ter em vista o lucro, mas está muito mais
voltado para o desenvolvimento dos projetos sociais que a empresa tem ligação. No
caso da DKT os proprietários dos estabelecimentos que fazem as vendas dos
produtos passam a ser considerados multiplicadores na promoção do comportamento
da comunidade, pois facilitaria o acesso ao preservativo a preços acessíveis.
Segundo a DKT do Brasil:
13
Revista Veja de 21/01/98. Disponível em: <http://veja.abril.com.br/210198/p_028.html> Acesso em 05 de maio
de 2014.
14
Dados disponíveis em: <http://www.dkt.com.br/dkt-internacional/>. Acesso em 22 de junho de 2014.
31
“As ONGs vendem os produtos na periferia, em pequenos comércios que
muitas vezes não conseguem efetuar compras nos grandes atacadistas. Com
isso, consegue-se disponibilizar os produtos Prudence nos mais diversos
tipos de PDVs, a um preço justo. Essa também é uma característica do
marketing social: usar a rede comercial já existente para a promoção de um
produto de cunho social.Por conta disso, é necessário que os produtos sejam
vendidos, pois o valor que o consumidor atribui ao produto aumenta quando
ele precisa ser adquirido. O importante é que esse produto seja
acessível.Além da venda, as ONGs trabalham nessas comunidades com a
parte educacional. O trabalho de conscientização para a prevenção das
DSTs/AIDS
e
planejamento
familiar
se
inicia
pelo
proprietário
do
estabelecimento. É ele quem precisa se envolver com a causa e comprar a
ideia, precisa entender que o produto tem que estar bem exposto e a um
custo acessível para a população, se tornando, assim, um multiplicador que
promove a mudança de comportamento da comunidade" (site DKT Brasil)
Segundo a ONG Equipe Voluntária Brasil15, até agosto de 2011, em 8 anos de
projeto de marketing social haviam sido disponibilizados 3.558.181 preservativos
através de venda e distribuição gratuita.
Abaixo vemos a imagem compartilhada via Facebook da Prudence que gerou
denúncias e discussões via internet.
15
Dados disponíveis em: <http://evb.org.br/evb/projetos/marketing-social/> . Acesso em 23 de junho de
2014.
32
FIGURA 3 – PROPAGANDA PRUDENCE
FONTE: Internet
Decisão do caso no Conar conforme publicado no site do próprio Conselho:
DKT – DIETA DO SEXO
Mês/Ano
SETEMBRO/2012
Julgamento:
Representação nº: 184/12
Autor(a): Conar, mediante queixa de consumidor
Anunciante: DKT do Brasil
Relator(a): Conselheira Mônica Gegrori
33
Câmara: Sexta Câmara
Decisão: Sustação e advertência
Fundamentos: Artigos 1º, 3º, 6º, 19, 21, 22 e 50, letras "a" e "c" do Código
Resumo: Fabricante de preservativos apôs a sua marca a uma piada que circulava havia
tempos na internet e a veiculou em mídias sociais. Cerca de 1.200 pessoas enviaram
e-mail ao Conar considerando a peça abusiva, desrespeitosa e que poderia incentivar
violência sexual contra a mulher.
O anunciante informa em sua defesa que suspendeu a exibição da peça logo que as
primeiras reclamações chegaram, tendo publicado no mesmo espaço um pedido de
desculpas. No mérito, alega tratar-se de uma brincadeira originada em um livro da
década de 1970, que foi veiculada durante anos na internet.
A relatora não aceitou esses e outros argumentos da defesa e propôs a sustação,
agravada por advertência à DKT. "É de conhecimento notório que na internet é
possível encontrar textos, depoimentos e conteúdos que não só são de extremo mau
gosto, mas que também constituem verdadeiras aberrações, abuso da liberdade de
expressão e atos ilícitos", escreveu ela em seu voto. "Este fato não exime de
responsabilidade uma marca ao veicular um anúncio nesse meio, pois entende-se que
o anunciante tem responsabilidade pelo conteúdo disseminado." Seu voto foi aceito
por unanimidade.
Fonte: http://www.conar.org.br/
A peça data do primeiro semestre de 2012, tendo gerado grande polêmica nas
redes sociais por ser interpretada como apologia ao estupro, uma vez que na
segunda linha informa a quantidade de calorias que alguém gastaria tirando a roupa
de uma mulher sem o consentimento da mesma.
Esta publicação sofreu processo via CONAR, apesar da peça ter sido retirada
do ar antes da decisão do conselho que ocorreu somente em setembro.
A imagem foi lançada no dia 16 de julho e retirada do ar da página do
Facebook da empresa no dia 30 do mesmo mês devido a repercussão que gerou.
Após tal fato, a empresa lançou duas notas ainda dizendo que o texto era
apenas uma reprodução que já ocorria na internet e que apenas usou o texto em sua
campanha lamentando o ocorrido, podemos verificar o printscreen da nota da
empresa a seguir sendo a primeira do início da tarde do dia 30 de julho:
34
Fonte: https://www.facebook.com/preservativos.prudence/posts/351623448245189
A segunda nota reiterando o pedido de desculpas foi lançada no final da tarde
às 17hrs, reproduzida logo abaixo:
Fonte:https://www.facebook.com/preservativos.prudence/posts/351704694903731?stream_re
f=10
35
As duas publicações juntas, obtiveram um total de 638 comentários e 169
compartilhamentos. Algumas das reações do público após a retratação da empresa
podem ser vistas abaixo:
Lucas Gurgel Sociedade hipócrita..hoje em dia qualquer comentário já vem 500 pessoas ofendidas
fazendo barulho.. não tinha nada de desrespeitoso e nenhum tipo de incitação a violência no referido
post.. o problema está na cabeça dessas pessoas que vêem violência e discriminação em tudo!
30 de julho de 2012 às 13:02 · Curtir · 4
Caio Phox Agora melhorou... E Lucas Gurgel, espero que mantenha esse pensamento caso algum dia
um homem tente enfiar o pênis dele no seu ânus sem o seu consentimento. Se o problema estiver só
em nossas cabeças, então tudo o que vai acontecer com você é que você vai perder umas calorias a
mais. 30 de julho de 2012 às 13:11 · Curtir ·
Julio Capucho qundovc olha uma imagem e ve algo de errado nela ´sinal de qe a maudadeesta na
sua mente
31 de julho de 2012 às 19:28 · Curtir · 2
Carlos Eduardo Vilas Boas Covardes 'politicamente corretos'.... amarelaramprá um bando de
hipócritas..
9 de agosto de 2012 às 02:31 · Curtir
Roberto Rizzo Saccamano NOSSA, QUE FRESCURA!! Mulherada cheia de não-me-toque...
31 de julho de 2012 às 22:21 · Curtir · 2
Elisa Gargiulo Porque vocês não fazem uma campanha interna, pra educar os funcionários da
empresa?
1 de agosto de 2012 às 09:43 · Curtir · 4
Thaís Nunes Boicote total... não existem desculpas pra uma campanha tao ridícula totalmente
ofensiva...só falta a marcar se unir ao Maluf "estupra mas não mata...e use camisinha prudence"
30 de julho de 2012 às 21:03 · Curtir · 7
Lorena Alves Errou publicamente, fez a retratação - com todas as letras - finalmente, e esse é o
mínimo que merecemos da publicidade. Aguardo a campanha que, se ética e coerente, contará com o
apoio de muit@s de nós.31 de julho de 2012 às 01:43 · Curtir · 5
Estes são apenas algumas das reações que podemos encontrar, blogs e sites
reiteraram a denúncia informando endereços eletrônicos em que se poderia fazer a
denúncia, além do site nacional e internacional oficiais da empresa outros como:
CONAR, Safernet e Polícia Federal. No site “Vi o Mundo”16 e no blog “Escreva Lola
Escreva”17, a matéria a respeito da propaganda ensinava como fazer a denúncia
sendo que no site mencionado havia ainda a sugestão de texto para denúncia, sendo
este: “a propaganda faz apologia clara ao estupro e reforça estereótipos machistas”.
16
Matéria disponível em:<http://www.viomundo.com.br/denuncias/lira-alli-camisinha-prudente-faz-apologia-aoestupro.html>Acesso em 11 de maio de 2014.
17
Matéria disponível em: <http://escrevalolaescreva.blogspot.com.br/2012/07/guest-post-propaganda-acimado-bem-e-do.html> Acesso em 11 de maio de 2014.
36
3.4 VOLKSWAGEN
A Volkswagen18opera inicialmente na década de 1930 com o projeto de
construção do Fusca, a montadora surge oficialmente em 28 de maio de 1937 na
Alemanha com o nome Gesellschaftzur Vobereitungdes Deutchen Volkswagens
GmbH (Companhia para a Preparação dos Carros do Povo Alemão). Em 1933, Adolf
Hitler visita o Salão Internacional do Automóvel de Berlim e vê no Volkswagen, uma
forma eficiente de propaganda nazista, e passa a defender a ideia de “carro do povo”
como se fosse sua. O carro da marca que mais obteve sucesso em sua história, o
fusca, foi uma tentativa de uniformização automotora da raça ariana. O nome da
montadora foi revisto no mesmo ano de sua fundação sendo reduzido apenas para
Volkswagen, “carro do povo”, traduzindo então a ideia de produzir um veículo barato,
possibilitando transportar dois adultos e três crianças, podendo ser adquirido por um
sistema de poupança voltado especialmente para sua aquisição.
O carro idealizado pelo engenheiro Ferdinand Porsche vendeu na época cerca
de 336 mil unidades sendo inicialmente batizado de KDF-Wagen, a tradução de
KDF(Kraft Durch Freude) significa “força através da alegria”, sendo este um dos
lemas do Partido Nacional-Socialista dos Trabalhadores Alemães, o conhecido
Partido Nazista. Desta forma, o governo investiu subsídios para que a empresa fosse
criada, tendo sua sede na cidade Wolfsburg, e sendo operada pela Frente
Trabalhadora Alemã. Em 1939 quando deu início a Segunda Guerra Mundial a fábrica
passou a produzir veículos voltados para a mesma, como jipes e carros anfíbios.
Em 1949 o Fusca foi lançado nos Estados Unidos, mas não obteve sucesso,
por ser considerado feio ainda o “carro de Hitler”. Bill Bernbach responsável pela
propaganda da empresa no país, mudou o ponto de vista que se tinha a respeito do
carro, com o slogan “Think Small” (pense pequeno) as vendas aumentaram e outras
propagandas criativas passaram a fazer sucesso tendo resultados impressionantes.
No Brasil a marca chegou em 1953 após uma pesquisa no mercado latino
americano indicar o Brasil para receber a primeira fábrica da montadora fora da
Alemanha. A empresa obteve sucesso na venda do Fusca e da Kombi, e a empresa
ganhou um novo impulso em 1956 quando o governo brasileiro criou condições para
18
Dados obtidos em: <http://mundodasmarcas.blogspot.com.br/2006/05/volkswagen-quem-conhceconfia.html> e <http://pt.wikipedia.org/wiki/Volkswagen> . Acesso em 22 de junho de 2014.
37
instalar no Brasil a indústria automobilística, fixando bases para o desenvolvimento do
setor. No mesmo ano a empresa começa a construção de sua fábrica em São
Bernardo do Campo, sendo oficialmente inaugurada em novembro de 1959, contando
com a presença do então presidente Juscelino Kubistescheck. Em 1970 a fábrica
marca os primeiros recordes de produção chegando ao seu primeiro milhão de
veículos vendidos no país. A fábrica procurou satisfazer o gosto do consumidor
brasileiro e em 1974lançou o Passat, que diferente dos modelos anteriores possuía
motor de quatro cilindros, de porte médio, tração dianteira e refrigerado à água. O
sucesso do modelo deu-se não somente no Brasil, mas no exterior, sendo que 200 mil
unidades foram exportadas para o Iraque.
Atualmente a montadora é a segunda maior da Europa ficando atrás apenas da
japonesa Toyota, no mercado mundial ocupa o primeiro lugar segundo dados de
janeiro deste ano conforme podemos ver abaixo:
TABELA 1 – RANKING DE VENDAS DE AUTOMÓVEIS NA EUROPA 2014
Ranking
Marca
jan/13
jan/14
1
Volkswagen
510805
526299
3,03%
2
Toyota
459194
490795
6,88%
3
Ford
364952
375327
2,84%
Fonte: JATO Dynamics / Brasil
Evolução [%]
19
Atualmente a montadora se denomina Grupo Volkswagen, sendo composto de
doze marcas de sete países europeus: VolkswagenPassengerCars , Audi, Seat,
Skoda , Bentley, Bugatti, Lamborghini , Porsche, Ducati , Volkswagen Veículos
Comerciais , Scania e MAN. Sendo que cada marca opera independentemente, tendo
suas próprias originalidades, variando de carros pequenos a veículos de luxo, de pickups a caminhões e ônibus. O grupo ainda fabrica motores de grande porte para áreas
marítimas, compressores e reatores químicos, turbinas eólicas, e ainda serviços
financeiros a clientes, atividades bancárias e de seguro. A montadora está presente
19
Disponível em:<http://www.car.blog.br/2014/03/volkswagen-deixa-toyota-e-e-maior-do.html>Acesso em: 20
maio de 2014.
38
em 153 países, com um total de 106 fábricas em 19 países da Europa e em mais oito
países das Américas, Ásia e África20.
Abaixo veremos a peça que foi denunciada no Conselho, e quais foram as
acusações contra esta, e mais adiante uma breve discussão sobre as propagandas já
feitas pela montadora.
FIGURA 4 – PROPAGANDA VOLKSWAGEN
FONTE: Blog “Escreva Lola Escreva” (04/05/2012)
20
Informações compiladas disponível
em:<http://www.volkswagenag.com/content/vwcorp/content/en/the_group.html> Acesso em 20 de maio de
2014.
39
Decisão do caso no Conar conforme publicado no site do próprio Conselho:
VW – CUIDADO: ELA TAMBÉM DIRIGE
Mês/Ano
JULHO/2012
Julgamento:
Representação nº: 114/12
Autor(a): Conar, mediante queixa de consumidor
Anunciante: VW
Agência: Almap/BBDO
Relator(a): Conselheiro Antônio Jesus Cosenza
Câmara: Terceira Câmara
Decisão: Arquivamento
Fundamentos: Artigo 27, nº 1, letra "a" do Rice
Resumo: Anúncio em jornal com o título acima mostra foto de mulher tentando consertar uma
torradeira elétrica com uma faca. A peça atraiu reclamação de consumidoras de
Florianópolis (SC) e Niterói (RJ). Elas consideraram o anúncio discriminatório.
Anunciante e agência se defenderam, discorrendo sobre os objetivos da campanha divulgar itens de segurança veicular - e juntando outros anúncios, nos quais homens
e
mulheres
também
incorrem
em
atitudes
de
risco
extremo.
O relator aceitou esse ponto de vista e sugeriu o arquivamento, voto aceito por
unanimidade.
A imagem da campanha, segundo pesquisa realizada teve suas primeiras
denúncias no blog “Escreva Lola Escreva” que é de autoria da professora da UFSC
Lola Aronovich, doutora em Literatura em Língua Inglesa, seu blog feminista sempre
atualizado recebe cerca de nove mil visitas por dia sendo assim bastante
reconhecido. A blogueira recebeu a imagem acima de uma estudante e então uma
matéria de maio de 2012, intitulada: “Neandertais ainda acham que mulheres não
sabem dirigir”, foi postada no seu blog e teve 133 comentários a respeito da mesma.
Uma espécie de campanha foi desencadeada nas redes sociais da
VolksWagem conforme informa o blog, ao que uma leitora recebeu uma resposta por
email da empresa e encaminhou ao blog, sendo a mesma divulgada posteriormente.
O conteúdo segue conforme reprodução online:
“Sra. Ana,
Agradecemos o seu contato.
40
Em atenção a sua mensagem, lamentamos sinceramente o fato de que a nossa comunicação
publicitária tenha sido percebida por V.Sa. como ofensiva ou mesmo discriminatória.
Obviamente, não foi nossa intenção causar qualquer tipo de desconforto a quem quer que seja,
porque sabemos que conquistar a simpatia das pessoas é um fator essencial para nosso êxito.
A VW é uma empresa de abrangência mundial que faz questão de respeitar crenças, hábitos e
procedimentos de todas a sociedade, em qualquer parte onde ela tenha sua base de operação.
Contando com sua compreensão, colocamo-nos a disposição.
Atenciosamente,
Renata Moreira
21
Central de Relacionamento com Clientes Volkswagen”
Como vimos no processo, a denúncia foi feita por consumidoras de
Florianópolis e do Rio de Janeiro, é muito provável que as denúncias de Santa
Catarina tenham sido impulsionadas por pessoas que acompanham o blog da
professora da UFSC, sendo que foi ela a primeira a divulgar a imagem na internet, a
denúncia de moradoras do Rio de Janeiro também pode ter sido feita por pessoas
que acompanham o blog, tendo em vista a média de público que o acessa
diariamente.
No blog da Lola após o resultado do processo não foi relatado mais nada,
apenas uma matéria em outro blog chamado “A Terceira Margem da Academia”, de
Gabi Azevedo, estudante de Letras da USP, demonstra seu ponto de vista a respeito
do processo como um todo e a autora ainda cita o blog da Lola. Para a autora do
texto, o fato de haver outras imagens da mesma campanha com o mesmo slogan não
muda o fato da propaganda ainda assim ter um tom machista, tendo em vista o
contexto da foto. A autora alerta ainda para o fato de que as imagens apresentam o
estereótipo de uma divisão de trabalho por gênero, uma mulher na cozinha e não um
homem, um homem trocando uma lâmpada, etc.
Além dos estereótipos de gênero a autora ainda argumenta a respeito das
imagens apresentarem na verdade um “American Way Of Life”, tendo em vista as
torradeiras que não são comuns no Brasil, e nas outras propagandas que mostram
uma escada com corrimão de madeira, balaústre de beijinho, chão de carpete,
paredes beges e um homem num pijama azul, que configurariam na visão da autora
21
Disponível em:<http://escrevalolaescreva.blogspot.com.br/2012/05/volks-responde-sobre-anunciomachista.html> Acesso em 22 de maio de 2014.
41
casas iguais às dos filmes hollywoodianos. A autora finaliza seu texto dizendo que
não escolheria um carro da desta marca devido suas propagandas22.
A denúncia parece não ter afetado tanto a Volkswagen, pois, no mesmo ano a
mesma campanha ganhou em segundo lugar da categoria “Produtos e Serviços
Automotivos” de mídia impressa do Prêmio Colunistas Propaganda São Paulo 2012.
(Ver imagem 5 em anexo). No ano de 2013 a Volkswagen voltou a ser denunciada no
CONAR e teve mais de mil reclamações devido a sua propaganda intitulada
“Superstição”. A propaganda que foi veiculada na televisão no mês de fevereiro
demonstrava um condutor que espantava um gato preto do capô de seu carro com a
água do limpador do para-brisa. Segundo consumidores protetores de animais, isso
reforçava uma superstição popular e incentivava maus-tratos contra os gatos pretos.
A empresa já havia retirado do ar o comercial quando o CONAR decidiu por sua
alteração, e afirmou ainda que "em nenhum momento, no comercial, a Volkswagen
quis estimular/sugerir qualquer tipo de desrespeito aos animais" (Economia UOL,
05/02/2013), tendo utilizado como argumentos em sua defesa que já havia inclusive
utilizado animais em suas campanhas anteriores.
A Volkswagen procurou ao longo de sua existência fabricar não somente o
carro do povo, como era designado em seu início, mas o carro da família. O público
feminino foi focado em suas campanhas desde a década de 1960,como vemos nas
imagens abaixo, porém as propagandas feitas naquela década demonstravam a
mulher no papel da dona-de-casa, mãe, etc., ou seja, o lugar da mulher é demarcado
socialmente nas propagandas, não deixando de ocorrer o mesmo, como vimos na
peça publicitária de 2012.
22
Informações disponível em: <http://3margemdaacademia.blogspot.com.br/2012/05/propaganda-machista-
parte-ii.html>Acesso em: 21 de maio de 2014.
42
Ao longo dos anos a montadora alemã inclui a mulher nas suas publicidades,
mas a tentativa de criatividade dos responsáveis pelo desenvolvimento das peças
acabou esbarrando em estereótipos não apenas de gênero (a empresa parece não ter
deixado para trás a imagem tradicional da mulher em suas propagandas que exibia o
carro da família), e mais tarde os movimentos em prol dos animais também
lembraram dos estigmas com relação a estes.Caberia a Volkswagen repensar
juntamente com as agências responsáveis pela produção publicitária da empresa a
recorrência de tais estereótipos que se reproduzem desde a década de 1960, e que já
estão por demais ultrapassados.
43
44
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Atualmente quem se dedica ao estudo das relações de gênero, classe, racial,
entre outros, apontam as mais variadas formas de preconceito que estes grupos
sociais estão submetidos. Pode-se dizer que o politicamente correto é uma
consequência das reivindicações dos movimentos sociais e o desenvolvimento de
pesquisas nas diversas áreas de conhecimento, que buscam demonstrar através de
pesquisas acadêmicas as diversas formas que o preconceito pode atuar socialmente,
sendo de forma velada até as mais explícitas. A somatória disso será a vigilância
constante que diversos ativistas no combate as discriminações e o apontamento das
mesmas nas propagandas publicitárias tendo em vista que o consumidor de hoje está
mais do que atento à linguagem que a publicidade está usando, qualquer deslize
pode ser entendido e interpretado de diversas formas, uma interpretação negativa
pode vir despertar o ressentimento no consumidor que pode se posicionar contra
inclusive boicotando o consumo de uma determinada marca ou produto.
Podemos visualizar entre as peças selecionadas que há um grupo de pessoas
que acompanha tudo que é produzido, e cobra de seus responsáveis da marca uma
posição mediante a produção publicitária que em uma forma de interpretação
apresenta algum tipo de discriminação, seja na imagem, no texto, ou o contexto como
um todo.
Pode-se dizer que o politicamente correto é hoje uma espécie de vigilante que
atua pelos indivíduos que estão principalmente ligados aos movimentos sociais. As
denúncias que o Conar recebe nem sempre são apresentadas por um movimento
organizado, por vezes, como é o caso do Azeite Gallo, a denúncia foi feita por um
morador de Campinas, outras vezes é o próprio conselho que instaura o processo a
respeito de uma determinada peça publicitária.
Se pensarmos o processo que as peças percorreram desde sua concepção ao
público, podemos elencar da segunda forma:
PRODUÇÃO DA PEÇA → RECEPÇÃO DO PÚBLICO → PROCESSO DE
NEGOCIAÇÃO
45
Nas peças apresentadas pudemos verificar a peça já pronta e não como se
deu seu processo de produção, em seguida a recepção pode ser visualizada
mediante as críticas que muitas tiveram após a publicação da mesma pelas empresas
responsáveis.
É possível afirmar mediante as peças apresentadas, que na atualidade o
politicamente correto tem grande peso nos diversos setores da sociedade. A
sociedade está repleta de pessoas que, individualmente ou em conjunto participando
de movimentos, parecem estar dispostas a lutar contra os mais diversos tipos de
opressão que são apresentadas nas várias esferas da sociedade, vide por exemplo, a
Marcha das Vadias que nasceu como resposta à criminalização de uma vítima de
estupro por parte do policial Michael Sanguinetti no Canadá23, que declarou que:
“women should avoid dressing like sluts in order not to be victimized”24, o movimento
então teve início em janeiro de 2011 quando ocorreu tal declaração, se
internacionalizou e hoje ocorre anualmente para reivindicar os direitos das mulheres
frente aos abusos e discriminação que ainda ocorrem em diversos países incluindo o
Brasil.
Quando um grupo sente que seus direitos são violados buscam por uma
resposta daqueles que lhes impôs tal violação. Comumente podemos visualizar nas
redes sociais, campanhas de confronto a certas opressões, sendo elas televisivas
(com seus personagens estereotipados nas novelas, seriados e demais programas de
humor), nas propagandas televisivas/impressas, e ainda nos discursos de grupos ou
indivíduos que ocupam cargos de poder na sociedade ou na mídia em geral.
Atualmente os processos de participação social que o sistema democrático
permite, oferece autoridade para que os movimentos sociais têm para apontar aquilo
que lhes parece errado, e estes vão se reforçando e se reformulando ao longo dos
tempos.
Os grupos sociais vêm lutando pelos seus direitos há anos e informando para a
sociedade aquilo que não aceitam mais, como por exemplo, termos que outrora eram
utilizados e hoje são vistos como discriminatórios e/ou estereótipos que continuam a
23
Demais informações podem ser acessadas no site oficial da organização canadense. Disponível em:
<http://www.slutwalktoronto.com/about/why> Acesso em 20 de junho de 2014.
24
“A mulheres devem evitar se vestir como vadias para não serem vítimas. ”
46
se reproduzir, etc. Isto de certa forma, é fruto principalmente do desenvolvimento de
trabalhos acadêmicos que, como vimos no primeiro capítulo segundo Rago (1999), se
deu pela entrada dos novos sujeitos nos cursos de pós-graduação, e ainda da luta
diária ao longo das décadas destes sujeitos.Por esta razão os movimentos sociais
acabam por ter grande legitimidade para informar à sociedade aquilo que não pode
mais ser tolerado.
Podemos afirmar que o politicamente correto tem atuado diariamente no
combate às opressões e discriminações e tem sido de certa forma, se podemos dizer
assim, utilizado pelo próprio CONAR que quando percebe algo que possa ser
entendido como discriminatório, instaura ele próprio processo para verificação do
conteúdo publicado, isso demonstra que o órgão está absorvendo em certa medida as
reivindicações que os movimentos sociais estão pautando. É visível que o
politicamente correto tem sim influência nas imagens publicitárias, se não na sua
produção, ao menos na sua recepção.
Como pode-se verificar, as imagens que sofreram críticas quanto ao seu
conteúdo em redes sociais e blogs, foram denunciadas diretamente ao conselho e
tiveram que se adequar à decisão daquele e ainda outras foram suspensas segundo
decisão do mesmo, como é o caso da propaganda da Duloren. Empresas como a
Prudence, por exemplo, retirou sua peça do ar devido à quantidade de críticas que
sofreu e ainda se retratou ao seu público.
Os movimentos sociais têm apresentado tanta força quanto o CONAR nos
últimos anos, sendo que, como vimos, as empresas tentam manter um
relacionamento com seus clientes e buscam ouvir não apenas seus elogios e
sugestões, mas também as críticas que estes apresentam quanto ao seu produto ou
prestação de serviço, uma vez que estas necessitam seguir a lógica do mercado e
produzir de acordo com as demandas dos seus clientes, sendo estas também
alteradas com o tempo dada a dinâmica cultural, histórica ou social.
Dada a abrangência de interpretações de imagens e palavras, as agências
publicitárias deveriam tomar certo cuidado na confecção de suas peças, uma vez que
todo o processo de montagem da propaganda pode causar a perda não apenas
tempo e dinheiro, mas também acarretar uma má impressão no público e deixar a
marca de certa forma associada a um determinado episódio tido como discriminatório.
47
Podemos citar um exemplo da denúncia de racismo recebido pelo CONAR do
Azeite Gallo, que segundo decisão do conselho de ética do mesmo, o relator que
julgou não haver no anúncio intenção racista, mas ponderou que ele permite tal
interpretação e que a comunicação não deve dar margem a associações
equivocadas, pela responsabilidade social que tem.
Entre as empresas analisadas, vemos que a Prudence é mantenedora de
projetos sociais, e que antes mesmo do processo já havia apagado de sua página
oficial a postagem que causou polêmica. Pela característica da empresa, que trabalha
com marketing social, um processo via CONAR no qual a campanha é acusada de
fazer apologia ao estupro é prejudicial para uma empresa que tem responsabilidades
sociais não somente no país mas nos demais países que atua ao redor do mundo.
Pensar que as agências não se dão conta que um determinado conteúdo pode
ser interpretado de maneira errônea à inicial pensada pelos seus idealizadores seria
muita ingenuidade. Uma peça publicitária quando está em processo de montagem e
mesmo depois de pronta, passa pela mão de várias pessoas entre6 setores na
agência: direção de criação, redação, direção de arte (responsável pela parte visual),
produção gráfica, atendimento (responsável pela comunicação entre agência e
cliente) e aprovação. Na empresa que contrata o serviço da agência o responsável de
marketing é quem aprova a peça. Se pensarmos nas peças analisadas que ao passar
por todas as etapas de sua produção há muitas pessoas envolvidas e com
experiência em comunicação com o público,não é possível imaginar que ninguém se
deu conta e procurou em algum momento alertar quanto ao conteúdo dúbio ou
preconceituoso, tanto em determinadas frases ou imagens como podendo gerar
tamanha polêmica dada às interpretações possíveis. Também, em algumas situações
como no caso da DuLoren, a estratégia era realmente a de criar polêmica. Já no caso
da Prudence, parece ser mais um deslize da equipe, apesar do óbvio que estava ali
exposto.
O politicamente correto acaba então por operar não no fato explícito como tal
somente, mas na sua potencialidade visto a diversidade de interpretação e
compreensão de uma mesma estrutura de linguagem em uma sociedade como a
brasileira que possui uma cultura tão plural.
48
Uma breve busca via internet sobre o assunto do politicamente correto, nos
revelam matérias e artigos nos quais não apenas autores mas boa parte do públicoem
seus comentários demonstram ser contrário a ele, e se utilizam da liberdade de
expressão como principal argumento para se posicionar neste assunto.
A publicidade e propaganda hoje em dia ocupam um espaço grande na
sociedade e é importante não somente para o mercado de venda de produtos e
serviços, mas também para o Estado, ONG‟s, e demais organizações que necessitem
de alguma visibilidade na sociedade. Exatamente por trabalhar num espaço social
onde padrões de identidade podem existir mas estes operam juntamente com tantos
outros, é que deveria se levar em consideração esta diversidade quando da produção
não somente publicitária mas de produção visual em geral que visa um grande
público.
A ideia não é de impedir ou podar a criatividade dos que trabalham nestas
áreas, mas lembrar que a atual sociedade busca expressar suas especificidades e
reivindica sua positividade, ou reclamar de sua negatividade de representação
quando assim lhe parece.
Desta forma, a propaganda e seus idealizadores devem estar atentos quanto a
reprodução de estereótipos, pois, as minorias sociais demonstram não aceitar mais
determinadas reproduções que se escondem atrás da liberdade de expressão como
argumento de defesa para a reprodução da sua visão estereotipada. Se a máxima
publicitária que diz que “a propaganda é alma do negócio”, então esta precisa se
adequar ao seu público que muda frequentemente visto que a cultura é dinâmica e
não homogênea.
Existem reclamações excessivas sim, mas é difícil encontrar um ponto de
consenso visto a heterogeneidade social, o que pode ser visto como normal ou
engraçado para alguns pode ser extremamente ofensivo para outros. No
documentário “O Riso dos Outros” vemos um consenso entre os humoristas quando
dizem que uma das bases do humor/piada é o estereótipo e o preconceito.
Jean Wyllys em depoimento no documentário lembra que geralmente este tipo
de piada é feita por alguém que não pertence a um determinado grupo discriminado,
diz ainda “que há a possibilidade de trazer as minorias para o humor, mas não
49
necessariamente humilhando-os”. Obviamente há diversas formas de se fazer humor
e propaganda, porém, a primeira a ser utilizada é aquela que se demonstra mais fácil,
quando são utilizadas especificidades de determinadas pessoas e grupos para seu
fim cômico ou de venda. Da mesma forma em que se utilizavam pessoas negras nos
zoológicos humanos o humor utiliza da exposição de determinados grupos para se
fazer rir. Ainda no documentário vemos a seguinte declaração do ator e palhaço Hugo
Possolo “o humorista não é responsável pelas mazelas da sociedade ele está apenas
expressando e retratando à sua maneira [...], então não culpem o humorista de fazer
piada por coisas que acontece na sua sociedade”. (O Riso dos Outros, 13‟). Pondé
(2011) ainda chega a classificar como imoral a posição do politicamente correto.
“o politicamente correto acabou se transformando numa espécie de censura.
Na vida acadêmica acabou se transformando numa espécie de lobby para
eliminar pessoas que não concordam com quem tem poder institucional. No
fundo se transformou numa espécie de patrulha. E, nesse sentido, me
[parece] bastante imoral.” (Folha Ilustrada, 2011)
O politicamente correto hoje está calcado na nossa sociedade e cada vez mais
demonstra sair em defesa dos diversos grupos da sociedade, vemos no caso da
Volkswagen a reclamação feita pelos defensores dos direitos dos animais. Quem não
acompanha estes movimentos de defesa talvez tenham visto o comercial do gato
preto e não tenham feito a leitura que outras pessoas fizeram. Realmente há uma
grande dificuldade em acompanhar as reivindicações e leituras sociais, dos diversos
grupos reivindicatórios. Para a percepção das formas de preconceitos, é necessária
uma base material ou simbólica, mas ainda assim a percepção depende do sujeito e
toda sua subjetividade, sua visão de mundo. E o refinamento dessa percepção das
diversas formas discriminatórias leva tempo, não somente de estudo, mas para poder
fazer uma leitura e constatar de imediato a ocorrência de algo dentro de um padrão
discriminatório. O uso de estereótipos não serve para nada além de reforçar visões
que são conservadoras/tradicionais no mínimo, além de naturalizar o preconceito.
O politicamente correto vem expor não apenas as formas discriminatórias da
sociedade, mas também um problema da pós-modernidade, que diz respeito a essas
50
várias identidades que não conseguem sempre ser atendidas na sua totalidade, ou na
tentativa de não se expressar de forma discriminatório, acaba por tomar medidas que
acabam sendo vistas como exageradas, como foi o caso da cartilha do politicamente
correto desenvolvida pela Secretaria Especial de Direitos Humanos, em 2004, ou
ainda o caso dos livros de Monteiro Lobato, que sendo considerados com teor racista
tiveram grande debate sendo por fim, recomendado a utilização da obra pela
Secretaria de Alfabetização e Diversidade, quando os professores tivessem a
compreensão dos processos históricos que geraram o racismo no Brasil.
Talvez uma pouca compreensão a respeito da quantidade de identidades que
formam hoje a sociedade ou uma vontade de combater discriminações diversas,
façam com que medidas sejam tomadas imediatamente como forma de impedir a
promulgação de preconceitos, porém, muitas pessoas que buscam combater
preconceitos, tem entendimento mais acadêmico a respeito das demandas sociais e
ainda assim cometem excessos. O politicamente correto hoje age numa sociedade
que de um lado luta contra as opressões, mas também tenta se equilibrar para não
oprimir.
51
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
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Reflexões sobre a preocupação do politicamente correto nas campanhas e
anúncios do governo brasileiro. Monografia de graduação em Comunicação Social.
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Disponível em: <https://www.youtube.com/watch?v=uVyKY_qgd54>. Acesso em 10
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PONDE, Luiz Felipe. Politicamente correto chega a ser imoral. Folha Ilustrada,
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Dísponível
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RAGO, Margareth. A Nova Historiografia Brasileira. Anos 90 – Revista do
Programa de Pós-Graduação em História da UFRGS. Vol. 07, nº 11, 1999.
ROSSONI, Roberta Justo. A Escolha Lexical Quando Do Uso Da Linguagem
Politicamente Correta: Uma Análise De Acordo Com A Teoria Das Implicaturas
De Grice. Dissertação de Mestrado. Faculdade de Letras. PUC-RS. 2009. 84 pg.
52
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Crítica da imagem
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Disponível em: <http://economia.uol.com.br/noticias/redacao/2013/02/05/vw-decidetirar-do-ar-comercial-polemico-com-gato-preto.htm>Acesso em 06 de junho de 2014.
WILSON, JonhK. The Myth of Political Correctness: The Conservative Attack on
Higher Education. Duke University Press, 1995
Internet
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www.facebook.com
http://veja.abril.com.br
http://www.viomundo.com.br/denuncias/lira-alli-camisinha-prudente-faz-apologia-aoestupro.html
53
ANEXOS
Figura 1
Propaganda do Azeite Gallo veiculada em Portugal.
54
Figura 2
Propaganda Volkswagen veiculada em jornal de Santa Catarina.
55
Figura 3
Propaganda da Volkswagen veiculada em jornal de Santa Catarina.
56
Figura 4
Propaganda da Volkswagen veiculada em jornal de Santa Catarina.
57
Figura 5
Prêmio ganho pela Volkswagen em 2012
58
Figura 6
Processo via CONAR contra propaganda da Volkswagen em 2013.
VOLKSWAGEN - GATO PRETO
Mês/Ano
MARÇO/2013
Julgamento:
Representação nº: 036/13
Autor(a): Grupo de consumidores
Anunciante: VW
Agência: AlmapBBDO
Relator(a): Conselheiro Licínio Motta Neto
Câmara: Sétima Câmara
Decisão: Alteração
Fundamentos: Artigos 1º, 3º, 6º, 25, 36 e 50, letra "b" do Código
Resumo: Perto de mil consumidores de todo o país escreveram ao Conar, protestando contra campanha
da VW em que um gato preto seria associado ao azar. Os consumidores temem que o filme
reforce um mito popular e que justifique maus-tratos contra o animal, inclusive pela impressão de
que foi esguichada água sobre o gato quando ele pulou sobre o capô do carro.
A defesa enviada por anunciante e agência nega tal interpretação, procurando esclarecer que
toda estruturação do filme visa ilustrar como seria um motorista supersticioso e como isso se
torna
inútil
diante
dos
itens
presentes
no
modelo
anunciado.
O relator votou pela alteração, por considerar que o filme desrespeita mandamentos do Código,
em particular quanto à exploração da superstição e maus-tratos contra animais. Seu voto foi
acolhido por maioria.
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Monografia - Setor de Ciências Humanas