A ALIMENTAÇÃO Nuno Santos*, Joana Ferreira** e Tânia Vaz*** * Nº55746 Mestrado Integrado em Engenharia Biomédica Instituto Superior Técnico – Departamento de Física e-mail: [email protected] ** Nº 59130 Mestrado Integrado em Engenharia Biomédica Instituto Superior Técnico – Departamento de Física e-mail: [email protected] *** Nº 59172 Mestrado Integrado em Engenharia Biomédica Instituto Superior Técnico – Departamento de Física e-mail: [email protected] Palavras-chave: Obesidade, Causas, Consequências, Tratamento, Neurofeedback. Resumo. O trabalho é referente à obesidade, sendo evidenciado a sua caracterização, causas, consequências, formas de tratamento, e uma alternativa terapêutica (solução biomédica) relativa a esta doença. A obesidade é uma doença crónica, cuja prevalência tem vindo a aumentar em todo o mundo, considerada por alguns, como a epidemia do século XXI. Apesar de se tratar de uma condição clínica individual, é vista, cada vez mais, como um sério e crescente problema de saúde pública. O excesso de peso predispõe o organismo a uma série de doenças, como: Diabetes Mellitus Tipo II, Patologias Cardíacas, Neoplasias, Osteoartrite, Patologias hepáticas, Apneia do sono, e Depressão. Sendo assim, a obesidade é caracterizada como uma doença que deve ser prevenida, monitorizada e tratada, com vista a diminuir a elevada taxa de mortalidade a ela associada. Como solução biomédica, adoptamos a prática de neurofeedback, cujo leque de utilidades é bastante extenso e com provas prestadas de eficácia. INTRODUÇÃO A alimentação é um acto inacto a todos os seres vivos, incluindo o ser humano, fazendo parte das poucas tarefas inerentes à sua sobrevivência. Quer isto dizer que, mesmo em contrário, todos os seres humanos têm de se alimentar para garantir a sua sobrevivência. Ainda assim, a alimentação é um acto voluntário que depende da vontade do indivíduo e por conseguinte a forma como nos alimentamos condiciona o nosso ser, quer física, quer psicologicamente. A alimentação é definida como sendo o processo pelo qual os organismos vivos obtêm e assimilam os alimentos, para as suas funções vitais [1]. É importante referir que existem diferenças entre a alimentação e a nutrição. A nutrição é um acto involuntário e inconsciente, em que os organismos, através dos alimentos, recebem, utilizam e eliminam os nutrientes necessários à realização das suas funções vitais. Em última análise, a alimentação é um processo de ingestão de alimentos enquanto a nutrição é os conjuntos de processos que se desenrolam subsequentemente: digestão, absorção e excreção. Existem diferentes tipos de alimentos, que possuem por sua vez variados e distintos tipos de nutrientes. O organismo humano requer diferentes nutrientes para desempenhar as diferentes tarefas. Os nutrientes são substâncias químicas presentes na alimentação e que as células do corpo usam no desempenho do crescimento, manutenção e reparação [2] . Existem seis tipos principais de nutrientes: hidratos de carbono, lípidos, proteínas, água, minerais e vitaminas. Destes nutrientes, destacam-se alguns que o organismo não é capaz de produzir por si, fazendo-o através de diferentes outros nutrientes. A estes nutrientes denominam-se essenciais, e têm de ser obtidos através da dieta. A ingestão inapropriada dos nutrientes é responsável por grande parte dos distúrbios alimentares existentes. Por esta razão é necessária uma consciencialização geral para a prática de uma alimentação adequada e variada. Com este propósito foram criadas linhas de como praticar uma alimentação saudável [2], incluindo uma pirâmide alimentar presente na Figura 1, que indica os alimentos que devem ser predominantemente ingeridos, base, e esporadicamente consumidos, topo. Assim, as directrizes a serem seguidas de forma a se praticar uma alimentação saudável são o consumo variado de alimentos, manter um peso recomendado (ideal e relacionado com a altura), preferir a ingestão de alimentos fracos em gorduras, gorduras saturadas e colesterol, mas em contrário escolher preferencialmente vegetais, frutas e produtos granulados. Por outro lado, deve-se consumir açúcar, sal e sódio em quantidades moderadas, com especial atenção ao sal (menos de 6gr diárias). O consumo de álcool deve ser tomado também em moderação, não bebendo mais do que o equivalente a uma onça1 por dia. Apesar de não existir um nível e tipos óptimos dos vários nutrientes que devem ser ingeridos, é recomendado que se forneça ao corpo entre 50 a 60% de hidratos de carbono (menos de 15% provenientes de açúcares simples), menos de 30% de gorduras (não se devendo exceder os 10% de gorduras saturadas) e 12 a 15% de proteínas [2]. A quantidade diária ingerida por um indivíduo está também estipulada variando apenas no género e idade do mesmo. No caso dos idosos e da maioria das mulheres, estes devem consumir cerca de 1600 Calorias, por sua vez as crianças, jovens raparigas, mulheres activas e a maioria dos homens devem consumir em média 2200 Calorias, enquanto os jovens rapazes e os homens activos cerca de 2800 Calorias2. 1 1 onça britânica é uma medida anglo-saxónica de capacidade, equivalente a 28,4ml [6]. Caloria, com C maiúsculo, é equivalente a 1000 calorias (c minúsculo). Por sua vez 1 caloria é uma medida energética equivalente a 4,184J [5][3]. 2 1 Figura 1. Pirâmide dos alimentos [4]. Quando a prática de uma alimentação saudável é comprometida existem certas patologias que podem aparecer e se desenvolver mais rapidamente que o normal. Estas doenças estão presentes nos vários sistemas do organismo, desde doenças cardiovasculares a doenças do foro mental. Ao contrário de perturbação de alimentação, eating disorder, as perturbações na alimentação, feeding disorder, são condições em que as crianças e bebés se recusam ou não têm vontade de comer [7]. Esta condição é muito grave uma vez que os jovens são mais frágeis que um adulto, podendo ficar mais vulnerável a infecções e outros agente nocivos. Para além disso, o próprio crescimento fundamental ao desenvolvimento físico e mental pode ficar em risco nestas situações. As patologias mais frequentes e características desta perturbação, feeding disorder, em crianças são a adipsia, que é a ausência de sede ou necessidade de beber, e a disfagia, dificuldade real ou imaginária em engolir. Para além disto, esta perturbação pode provocar a incapacidade de o indivíduo se auto alimentar, demorar muito tempo a comer, recusar terminantemente comer ou vomitar durante a refeição, praticar uma incorrecta distribuição das refeições ao longo do dia e ainda efectuar uma má escolha de alimentos, baseando-se apenas nas suas forma e aspecto [7]. As perturbações na alimentação, feeding disorder, ocorrem em cerca de 25% da população mais jovem, ou seja, uma em cada quatro crianças já sofreu ou sofre desta perturbação. No entanto, grande parte delas ocorre em crianças com problemas no desenvolvimento. A aplicação de alimento através de um tubo, quer seja por via venosa ou por qualquer outro modo, por um período mais ou menos longo pode provocar o surgimento desta perturbação. Quando um indivíduo possui um sobre-desenvolvimento do esfíncter, este pode provocar vómitos durante uma refeição. Este acontecimento, devido ao incómodo, pode fazer com que a criança recuse o alimento. Das muitas outras causas para a perturbação na alimentação, destacam-se ainda todos os outros problemas gastrointestinais como a estenose pilórica, o refluxo gastroesofágico ou até mesmo a 2 síndrome short bowel3. As perturbações de alimentação, eating disorder, são doenças de extremos, em que por um lado o indivíduo tem um desejo em se alimentar de forma incontrolada, enquanto por outro este evita de todo o consumo de alimento [9][9]. Das doenças associadas a esta perturbação destacam-se a anorexia nervosa, a bulimia nervosa e a compulsão alimentar periódica (binge-eating disorder). A primeira é caracterizada pela emancipação, ou seja, o indivíduo tenta ficar o mais magro possível, consciencializando-se que só assim consegue obter um peso saudável. Esta procura excessiva da “perfeição” está fortemente relacionada com factores psicológicos e por isso grande parte dos tratamentos são feitos a nível mental. Os indivíduos com anorexia nervosa tentam perder peso fazendo exercício físico em excesso ou através de dietas não recomendadas. Para além disso podem consumir laxantes e outras drogas semelhantes, ou até mesmo provocar o vómito impedindo o alimento ingerido de ser absorvido pelo organismo. Contrariamente a um anoréctico, um indivíduo que sofra de bulimia nervosa ou de compulsão alimentar periódica possui vários episódios em que tende a comer grandes quantidades de alimento, sentido que não possui muito controlo sobre a mesma. Adicionalmente, um indivíduo que sofra de bulimia nervosa possui ainda episódios posteriores de vómitos induzidos, toma de laxantes ou de prática de exercício físico extremo. OBESIDADE A obesidade é uma condição de excesso de massa gorda corporal em que este aumento pode provocar prejuízo na saúde do indivíduo [11]. Em termos quantitativos um indivíduo torna-se obeso quando o seu peso corporal excede os 20%4 do valor considerado padrão [2]. Esta situação ocorre porque existe um consumo de energia (em forma de alimento) superior àquela que é gasta pelo organismo [3], havendo portanto uma acumulação dessa energia na forma de tecido adiposo (gordura). No entanto, quando um indivíduo já se encontra obeso, esta condição mantém-se apenas através do equilíbrio entre a ingestão de alimento e o consumo de energia. Para haver redução da massa gorda corporal é necessário que nesta relação, o consumo de energia pelo organismo prevaleça. Um indivíduo com peso superior ao recomendado é por vezes considerado obeso. No entanto isto não é de todo verdade. Grande parte dos atletas que têm peso extra não são obesos, uma vez que possuem uma grande massa muscular (constituído por tecido muscular e não adiposo), sendo esta a verdadeira fonte de peso [13]. Relativamente à população americana, metade dos indivíduos com excesso de peso são obesos, sendo estes cerca de 30% de toda a população [12]. A caracterização mais frequente da obesidade é efectuada através da determinação da gordura corporal, verificando se esta se encontra ou não dentro dos limites aceitáveis. As formas mais correctas de se obter esse valor são efectuadas através da determinação do volume corporal, em que se coloca o indivíduo totalmente dentro de água para o efeito, ou através de um método mais robusto, um teste de raio-X denominado DEXA – Dual Energy X-Ray Absorptiometry [13]. Devido à impraticabilidade destes métodos aos 3 Síndrome short bowel – conjunto de problemas que afecta indivíduos aos quais foi removido metade ou mais do seu intestino – modo de tratamento da doença de Crohn [8]. 4 Este valor pode variar dependendo das opiniões e dos especialistas. Consultando diferentes bibliografias obtêm-se diferentes valores, como por exemplo o artigo [13] que indica uma percentagem diferente nos homens e mulheres. 3 indivíduos comuns, são utilizadas outras ferramentas mais simples, que apesar de serem menos exactas, apresentam boas estimativas da gordura corporal. A determinação da espessura da camada de gordura imediatamente por baixo da pele de diversas partes do corpo é um exemplo. Ainda assim, os resultados apresentados são muito dependentes da capacidade do profissional que execute o procedimento. Por estas razões, existem outras formas menos complicadas e que permitem obter boas estimativas, nomeadamente a recorrência a tabelas com valores padrões, ou até mesmo através da distribuição de gordura à volta da cintura (característico da obesidade central). Figura 2. Índice de massa corporal (BMI), determinado através da relação altura e peso [13]. * sem sapatos. ** sem roupa. Uma dessas tabelas é caracterizada pelo índice de massa corporal (BMI), vide Figura 2. O índice de massa corporal (BMI) é um método simples de estimação da massa de gordura corporal. O BMI apresenta relativamente bem a percentagem de gordura corporal na maioria da população adulta, sendo no entanto menos precisa em mulheres grávidas, em que a composição corporal é afectada. É calculado segundo uma expressão específica, isto é, dividindo a massa do indivíduo pelo quadrado da sua altura, BMI = kg / m2. As unidades de massa e altura utilizadas são importantes de ter em conta porque dependem das unidades da tabela que esteja a ser analisada. No caso da Figura 2, as unidades são o pound e o inch5, e por isso ao valor da expressão é necessário considerar um factor multiplicativo de 703 [13]. No entanto, a partir de agora, 5 Pound e Inch são medidas de massa e comprimento, respectivamente, correspondentes a 0,45359237Kg e 25,4mm. 4 todos os valores referidos são apresentados no sistema internacional, kg.m-2. Apesar de ser uma estimativa bastante simples e poder ser confundido facilmente o excesso de massa muscular com obesidade, na maioria das vezes o elevado BMI (superior a 30) é sinal de obesidade. As definições utilizadas actualmente para caracterizar cada valor do BMI foram instituídas pela Organização Mundial de Saúde (OMS) estabelecidas em 1997 e publicadas em 2000, prevendo os valores apresentados na Tabela 1 [11]. Tabela 1. Classificação de Obesidade, segundo o Índice de massa corporal (BMI). BMI Classificação Menos de 18,5 Abaixo de Peso 18,5–24,9 Peso Normal 25,0–29,9 Excesso de Peso 30,0–34,9 Obesidade Classe I 35,0–39,9 Obesidade Classe II Acima de 40,0 Obesidade Classe III No entanto, existem algumas modificações efectuadas, relativamente à definição dada pela OMS, para situações específicas. Em alguns casos se se considerar um BMI de 35,0 ou mais elevado, na presença de pelo menos uma outra co-morbidade significativa, este é classificado como Obesidade Classe III. Por outro lado, as pessoas asiáticas apresentam excesso de peso quando tiverem um BMI entre os 23 e os 29,9 Kg/m2, enquanto que se o BMI for superior a 30 Kg/m2 o indivíduo é obeso [11]. Em alguns casos clínicos existe a necessidade de aprofundar o grau de obesidade, nomeadamente na prática cirúrgica, que divide a classe III noutras tantas categorias. BMI superior a 40 é classificado como Obesidade Grave, entre 40,0 e 49,9 é considerado Obesidade Mórbida e um BMI superior a 50 é classificado como Super Obeso [11]. A obesidade central é um tipo de obesidade particular cuja causa principal é o sedentarismo. Este tipo de obesidade caracteriza-se pelo elevado valor do diâmetro da cintura do indivíduo, devido ao excesso de acumulação de gordura visceral [15]. Neste caso particular, a obesidade pode ser classificada através do valor do diâmetro da cintura, quer seja por circunferência absoluta ou pelo índice cintura-quadril. Em última análise a obesidade pode ser verificada como possível diagnóstico ao se avaliar os factores de risco, como por exemplo dependendo da condição clínica da pessoa, o que em certos casos de doença a obesidade pode influenciar o risco de diversas complicações [11]. É empírico considerar que a quantidade de gordura corporal está directamente 5 relacionada com a disposição de um indivíduo desenvolver uma patologia em consequência da obesidade. De facto assim é. Por outro lado, a distribuição da gordura no corpo é também um factor importante que deve ter sido em conta, uma vez que existem regiões do mesmo que são mais susceptíveis à presença ou não de gordura. Um desses locais é a região abdominal, que apresenta um risco independente de desenvolver doenças devido ao excesso de tecido adiposo [12]. CAUSAS DE OBESIDADE A obesidade ocorre, como já referido, devido a um excesso de armazenamento de energia em relação ao seu consumo por parte do organismo. As razões desta incorrecta relação são variadas, sendo atribuída principalmente a factores psicogénicos, genéticos, hormonais, médicos e ambientais (sociais). Muitas destas causas por vezes não são as responsáveis por si só, havendo assim uma sinergia entre elas, que em alguns casos pode levar a casos graves de obesidade. As principais e mais importantes causas atribuídas à obesidade são os factores psicogénicos e ambientais. Desde a década de 70 que a obesidade tem aumentado substancialmente, e apesar de mesmo dentro destas causas haver inúmeras razões, as principais são as denominadas de Big Two [16], ou seja, o sedentarismo ou diminuição da actividade física e a facilidade de disponibilização dos alimentos às necessidades do indivíduo. O facto de o alimento se ter tornado um bem adquirido e de fácil aquisição [17] , originou uma diminuição da necessidade de desenvolvimento de actividades físicas, para além do evidente excesso de consumo alimentar, overeating. Por outro lado, existe actualmente uma ideia errada mas enraizada nas famílias de que para uma alimentação saudável é necessário efectuar três refeições por dia e que cada uma delas tem de ser substancial [3]. Esta situação, não só origina o oposto como também poderá ser prejudicial a certos órgãos digestivos em longo prazo, como por exemplo o pâncreas devido à sobrecarga de funcionamento nesses períodos do dia. Como já referido anteriormente existe um excesso de consumo alimentar, ou seja, é realizada actualmente por grande parte da população uma incorrecta dieta alimentar. Estas dietas são muito ricas em hidratos de carbono e também de gordura. Ainda assim, grande parte do excesso de energia ingerida provém dos hidratos de carbono, que é depois armazenada sob a forma de gordura pelo organismo por se encontrar em excesso. Relativamente à causa ambiental, existe também uma outra causa relacionada mas pouco explícita e que é bastante importante, que é o factor geográfico. A obesidade é, de longe, uma doença dos países desenvolvidos (Europa, América do Norte e Japão) ao contrário dos subdesenvolvidos em que o oposto ocorre, ou seja, grande parte da população apresenta problemas de subnutrição, vide Figura 3. Para além disso existe uma relação bastante forte entre as pessoas que viajam para nações mais desenvolvidas ficarem obesas e as que viajam para países menos desenvolvidos diminuírem a massa gorda corporal [18]. 6 1980 1990 2000 2001 2002 2003 Figura 3. Obesidade da População Adulta nos Países da OECD [46]. Actualmente com o rápido desenvolvimento da tecnologia, muitos hábitos diários foram alterados, em que na sua grande maioria originou uma maior comodidade e consequentemente menor necessidade de gasto de energia [11]. À medida que estes assuntos vão sendo mais discutidos, maior é o número de estudos efectuados nesta vertente. Actualmente já se relaciona o aumento da obesidade com a diminuição da execução de certos exercícios [19], como por exemplo a eliminação da ida a pé para a escola por parte dos jovens estudantes, pelo aparecimento do automóvel em substituição. Existe também uma relação entre o aumento da massa gorda corporal e o aparecimento de novas tarefas mais sedentárias, como por exemplo a acto de ver televisão ou jogar na consola [20]. A obesidade infantil é também uma consequência directa e indirecta destas causas, sendo em grande parte dos casos, nesta altura da vida, que surgem os obesos. Nos primeiros anos de vida a velocidade de formação de novas células adiposas é particularmente rápida [3]. Em crianças obesas esta velocidade é três vezes superior à registada em crianças de peso normal. Por esta razão, sabe-se que crianças que sejam hipernutridas durante esta fase, têm grande probabilidade de se tornarem obesas para o resto da vida. Os indivíduos que se tornam obesos na meia-idade ou velhice têm maior possibilidade de tratamento do que os outros, uma vez que grande parte das obesidades geradas são acompanhadas pelo aumento do tamanho das células adiposas, mantendo-se constante o número de células. O factor genético pode ser por si também uma causa para a obesidade. Geralmente está associado a outras causas, nomeadamente as ambientais uma vez que é necessária sempre a presença do excesso de alimento para haver aumento de massa gorda. Ainda assim, quando a causa genética está presente, a tendência para engordar é maior e portanto é mais fácil ganhar peso [11]. A incidência é ainda maior se um familiar próximo for obeso [21]. As causas genéticas são normalmente multigénicas, havendo no entanto alguns casos raros de obesidade monogénica, sendo estas mais severas e originando obesidade mórbida desde a adolescência, estando na maioria das vezes associadas a alterações dos genes da leptina ou melanocortina. Apesar de ser uma causa bastante importante, existe ainda pouca sabedoria relativamente aos genes que estão na causa directa da obesidade, devido principalmente há elevada complexidade, havendo no entanto inúmeros estudos que apontam mais de uma centena de possíveis genes 7 responsáveis [21]. Associado a factores genéticos estão algumas alterações genéticas que aumentam a possibilidade de desencadeamento da obesidade, nomeadamente a síndrome Prader-Willi (caracterizado por polifagia e alterações alimentares), síndrome Bardet-Biedl (caracterizado por obesidade, hipogonadismo, deficiência mental, retinitis pigmentosa, polidatilismo e falência renal), síndrome de MOMO (Macrosomia, Obesity, Macrocephaly and Ocular abnormalies), mutação do receptor de leptina (proteína que estimula a diminuição da ingestão alimentar e aumenta o metabolismo energético) e do receptor da melanocortina [11][13]. Em alguns casos de obesidade a origem da condição deveu-se a substâncias farmacêuticas ingeridas ou até mesmo a outras patologias diagnosticadas. Das patologias que podem originar indirecta ou directamente obesidade destacam-se as referidas anteriormente incluindo as genéticas e as de perturbações alimentares, pelas razões mencionadas também em cima. Por outro lado, existem outras doenças em que parte do tratamento passa pela ingestão de medicamentos, cujo efeito secundário comum é o aumento de peso por consumo excessivo de alimento. A privação de sono pode ser uma causa para o aumento de peso, podendo também ocorrer o contrário [13][16], ou seja, o excesso de peso pode originar apnea de sono, sendo esta uma das consequências da obesidade. A diminuição das horas diárias de sono influencia directa e indirectamente o risco de obesidade, uma vez que estimula e aumenta a fome e o apetite e indirectamente está associada a alterações de mecanismos psicológicos, nomeadamente na secreção das hormonas de estimulação da tiróide e da leptina. A diminuição ou a total cessação do consumo de tabaco possibilita também o aumento do peso corporal [16]. A razão está associada à cessação do consumo de nicotina, que apresenta ambos os efeitos termogénicos e de supressão de apetite. Nas décadas de 80 e 90 existiu uma diminuição do consumo do tabaco nos Estados Unidos da América, sendo que um quarto da população que sofreu aumento excessivo de peso foi consequência dessa diminuição. Por último existe ainda uma outra causa, a composição da flora intestinal, que apesar de pouco referida na literatura, apresenta alguma relevância, nomeadamente em estudos realizados em animais [22]. A importância da flora intestinal reside na variação da sua composição, uma vez que existem certos organismos que controlam a aquisição de nutrientes no intestino assim como regulam a sua energia. Existem certos estudos que indicam a diminuição da gordura corporal em animais, sem necessidade de haver diminuição da ingestão de alimento ou aumento das necessidades metabólicas (através do exercício físico, por exemplo) [23]. Esta diminuição é resultado de um aumento da quantidade de CLA (conjugated linoleic acid) no intestino. No entanto, existe uma discrepância nos resultados obtidos nomeadamente nos estudos com animais e em seres humanos [24], uma vez que esta diminuição não ocorre de todo como seria esperado, ao se fazer variar a flora intestinal em humanos. Paradigma da Obesidade Apesar dos copiosos efeitos negativos comprovados e relacionados com a obesidade, existem certos casos observados de indivíduos obesos, que melhoraram a sua saúde noutros casos patológicos, apesar da sua condição. A este efeito é denominado de paradigma da obesidade, obesity-survival paradox [11]. Sem se ter obtido uma razão clara para o fenómeno, a verdade é que existem estudos que corroboram a ideia. Num deles [25], existe a indicação que um grupo de indivíduos com problemas cardíacos e com um BMI elevado teve melhores condições de sobrevivência que um grupo de pessoas de peso normal, nas mesmas condições. Apesar de incerta a razão deste 8 resultado, foi indicado que o facto de se perder peso quando um indivíduo possui certas patologias, nomeadamente quando há privação de alimento ou perda de apetite, faz com que os doentes com baixo valor calórico no corpo tenham mais riscos na saúde do que os obesos. Concluindo existe uma certa relação entre a presença de patologias e o benefício do excesso de massa gorda corporal. Ainda assim, existem contrapartidas que devem ser tidas em conta, nomeadamente o grau de obesidade, ou seja, é preciso considerar os benefícios (não comprovados totalmente) da obesidade na taxa de sobrevivência noutras patologias e os seus efeitos negativos na saúde do doente. CONSEQUÊNCIAS DA OBESIDADE A obesidade é considerada como uma das principais causas de morte a nível europeu sendo na maioria dos países europeus, uma epidemia em grande crescimento, afectando cerca de 10 a 40% da população adulta, vide Figura 4 [30]. O seu risco de mortalidade varia consoante o BMI, sendo mais baixo o risco e o valor do BMI, entre 21 e 24, em indivíduos não fumadores e entre 24 e 27, em fumadores. Essa variação indica que quanto maior o valor do índice de gordura corporal maior é o risco de morte. Suiça Hungria Noruega Holanda Itália França Suécia Bélgica Dinamarca Espanha Portugal Eslováquia Escócia Alemanha Finlândia Inglaterra República Checa Roménia Homens Mulheres Grécia Jugoslávia Figura 4. Prevalência da Obesidade na Europa por género [47]. A obesidade, relativamente a não fumadores e ex-fumadores, aumenta o risco de morte, sendo que um BMI acima de 32 pode estar associado a um duplo risco de morte. Em média, esta doença reduz a expectativa de vida da população cerca de 6 a 7 anos, sendo que a obesidade severa, com BMI superior a 40, reduz cerca de 20 anos para os homens, e de 5 anos para as mulheres [31]. A nível de morbilidade, a obesidade encontra-se associada a diversas condições físicas e mentais, sendo que os principais aspectos são consequência dos efeitos do aumento da massa de gordura corporal ou do aumento do número de células adiposas, como se pode observar na Tabela 2. 9 Tabela 2 – Principais consequências da obesidade [48]. A obesidade é uma doença que se encontra relacionada com uma variedade de implicâncias, algumas directa ou outras indirectamente causadas por esta. Uma das ligações mais evidentes entre a obesidade e as condições particulares, é a diabetes mellitus tipo 2, sendo que o excesso de peso encontra-se em cerca de 64% de casos de diabetes em homens e 77% em mulheres. Como podemos verificar na Tabela 2, a obesidade também se encontra associada ao aparecimento de vários tipos de cancro, sendo que existe uma probabilidade mais elevada de homens obesos desenvolverem cancro do cólon, recto e próstata, em comparação com os homens não obesos. Por outro lado as mulheres obesas têm maior probabilidade de desenvolver cancro do útero e ovários [13]. As doenças cardiovasculares são, no entanto, daquelas que se relacionam com a obesidade, as que apresentam maiores problemas aos indivíduos. No indivíduo de peso normal, a deposição da gordura ingerida é controlada, distribuindo-se em todo o organismo. Como a quantidade de gordura armazenada é baixa, os problemas vasculares são baixos ou desenvolvem-se a longo prazo. Em contrapartida um indivíduo obeso, armazena quantidades superiores de ácidos gordos e por consequência o risco de desenvolver um enfarte ou sofrer de hipertensão aumenta significativamente. Em suma, pessoas obesas têm geralmente uma maior probabilidade de desenvolver certas doenças. A nível de efeitos sociais e psicológicos, o sofrimento emocional é compreendido como uma das mais dolorosas partes da obesidade; sendo as mulheres mais prejudicadas devido às características de beleza, a magreza. Pessoas obesas normalmente são prejudicadas a nível do trabalho, na escola e em situações sociais, sendo assim pessoas com sentimentos de rejeição, vergonha, e depressão [13]. No entanto, embora a maioria das consequências da obesidade sejam negativas, em certos grupos esta parece melhorar positivamente com o aumento de BMI, sendo este fenómeno designado por paradigma da obesidade, explicado anteriormente. FORMAS DE TRATAMENTO Consoante as diferentes causas que originam a obesidade existem, para cada uma delas, tratamento adequado, havendo no entanto por vezes sinergia e tratamentos semelhantes para várias causas [13]. A forma mais simples de tratamento, mas por vezes mais difícil de se obter resultados, passa pela realização de dietas equilibradas e exercício físico adequados [11]. O grande problema e dificuldade deste tratamento reside no facto de ser preciso manter a mesma dieta para o resto da vida para manter o mesmo 10 peso. Em curtos períodos de tempo, existem programas específicos que, se seguidos correctamente, permitem reduzir substancialmente a massa gorda corporal, diminuindo o BMI. A dieta seguida para redução do peso corporal depende da quantidade de calorias ou hidratos de carbono ingeridas diariamente, podendo ser de baixo, muito baixo valor calórico ou de baixa, muito baixa constituição de hidratos de carbono [26]. As dietas de baixo valor calórico, low-calorie diets, são ricas em hidratos de carbono, baixas em gordura e energeticamente reduzidas. Estas dietas são bem aceites pelo organismo que o pratique, apresentando uma diminuição média do peso corporal de 8% num curto período de tempo. Por si só, estas dietas são ainda caracterizadas por corresponderem a um sucesso na manutenção da perda de peso até um período máximo de cinco anos. É importante referir ainda que estas dietas são ricas em fibras e possuem baixo valor de índice glicémico uma vez que estão associadas a um aumento da saciedade. Por outro lado, existem as dietas baixas em hidratos de carbono e ricas em gorduras, lowcarbohydrate diets, nas quais se incluem as dietas Protein Power e de Atkins. A justificação do aparecimento destas dietas baseia-se no problema da facilidade de absorção de açúcares pelo intestino. Em contrapartida, estas dietas não são muito bem aceites pelas associações de cardiologia, devido ao elevado teor das dietas em gorduras. As dietas de muito baixo valor calórico, very-low-calorie, apresentam uma supressão elevada de gorduras e proteínas, sendo muito eficazes na diminuição do peso corporal em curto período de tempo. Em contrapartida, o organismo ressente-se mais e por isso, não é aconselhável manter uma dieta destas num período igual ou superior a 16 semanas. Por este motivo, são recomendadas estas dietas apenas a indivíduos com BMI superior a 30 (obesidade classe I, vide Tabela 1), tendo de ser prescritas por um médico para evitar desequilíbrios electrolíticos e no balanço de azoto. Adicionalmente, deve-se ter o cuidado de garantir na dieta as proteínas e ácidos gordos essenciais e ainda vitaminas e minerais. Por último, as dietas de muito baixo valor em gorduras, very-lowfat diets, são caracterizadas, como o nome indica, numa dieta com valores muitíssimo baixos em ácidos gordos, fazendo parte desta categoria os programas Ornish e Pritikin. Estas dietas são semelhantes ao estilo vegetariano, sendo ricas em hidratos de carbono e fibras, não possuindo mais de 10% de gordura. Estas dietas devem ser acompanhadas de exercício aeróbio, gestão de stress e, quando presente, na cessação do consumo de tabaco. Tal como no caso anterior, estas dietas devem ser seguidas por um profissional de saúde, no sentido de garantir bons níveis de triglicéridos no plasma sanguíneo e manter uma dieta adequada em nutrientes. O exercício físico é uma ferramenta que tem sido apontada como um bom meio de redução da massa gorda corporal em excesso nos indivíduos com excesso de peso. Ainda assim, é necessário que seja implementada com outros métodos de redução de peso, como a dieta por exemplo. Estima-se que cerca de trinta minutos diários de exercício físico de intensidade moderada seja o adequado para um indivíduo manter um peso saudável, sem dispensar a dieta equilibrada [13]. Por outro lado, no sentido de prevenir um aumento de peso em indivíduos adultos é aconselhável efectuar um exercício físico de cerca de uma hora. No caso de um indivíduo com excesso de peso ou obeso, essa duração estende-se a noventa minutos para garantir uma diminuição do peso. Convém salientar que, apesar de a maioria dos indivíduos adultos não necessitar de consulta prévia com um profissional de saúde para efectuar exercício físico, a faixa etária acima dos 40 (homens) e 50 (mulheres) anos, ou que possuam uma doença crónica, devem recorrer a um médico para identificar o programa mais adequado ao seu organismo e/ou patologia. Apesar de as propostas anteriores apresentarem resultados positivos, existem 11 excessos de peso e até mesmo obesidades que não são reduzidas totalmente, apenas com recurso a esses métodos. Desta forma, existem ainda outras formas de redução de peso, nomeadamente através do uso de medicamentos ou recorrendo à cirurgia. Os medicamentos existentes para a redução de peso são variados e em grande número, devido em grande parte ao aumento do número de pessoas com excesso de peso, como referido anteriormente [27][28]. Apesar dos bons resultados que estas drogas apresentam, é importante salientar o aspecto negativo e efeitos secundários que podem surgir da toma destas substâncias. Desta forma, as drogas com efeitos anti-obesidade devem ser consumidas apenas por obesos (BMI≥30), e por recomendação de um médico e como adjuvante de outro tratamento, onde devem ser considerados todos os benefícios e prejuízos, tendo sempre de se garantir que os benefícios são superiores aos outros. Resumidamente, os medicamentos de redução do peso corporal actuam principalmente por intermédio [27] de supressores de apetite, nomeadamente catecolaminas e seus derivativos, por aumento do consumo metabólico ou ainda por impedimento da absorção de nutrientes específicos. Estas drogas, que actuam por impedimento de absorção, podem realizá-lo tanto por meio do tracto digestivo, ou seja, impedindo a absorção de nutrientes no intestino, ou através da supressão da criação de ácidos gordos ao nível da circulação sanguínea. Como no caso dos medicamentos, a cirurgia, designada de cirurgia bariátrica, pode ser também um meio, mais evasivo, para reduzir a gordura corporal. Por esse motivo, e devido ao elevado número de complicações pós-operatório [29], a cirurgia só é recomendada a indivíduos com um índice de massa corporal superior a 40 e cujos tratamentos, como os referidos anteriormente, não tenham tido sucesso significativo [11]. As principais cirurgias bariátricas utilizadas no tratamento da obesidade são baseadas em diferentes métodos teóricos. As bandas gástricas e derivados são utilizados para diminuir o volume do estômago simulando a condição de saciedade ao obeso. Por outro lado, é possível diminuir o comprimento do tracto intestinal, removendo parte do intestino, de modo a que os nutrientes tenham menos área de contacto para serem absorvidos (cirurgia de bypass). Estas técnicas permitem ao indivíduo perder grande parte do peso nos primeiros tempos pós-cirurgia, mantendo-se o resultado posteriormente. Adicionalmente, os riscos provenientes de outras complicações patológicas relacionadas, como por exemplo a diabetes mellitus ou as doenças cardiovasculares, são também diminuídos. Complementarmente aos tratamentos referidos anteriormente, existe ainda um meio de reduzir o peso corporal através de terapia comportamental [11], ou seja, mudando hábitos e tendências, aplicando dietas correctas e efectuando exercício físico, e efectuando terapias específicas acompanhadas ao longo de sessões com especialistas. CONTROLO ALIMENTAR Regulação da ingestão alimentar A regulação do apetite é um processo complexo que envolve a secreção de diversas hormonas, assim como a actuação do sistema gastrointestinal e do sistema nervoso central (SNC) e autónomo [33]. O SNC é constituído pelo encéfalo, dividido em cérebro, cerebelo, diencéfalo e tronco cerebral, e espinal medula. O diencéfalo é constituído pelo tálamo e pelo hipotálamo (situado sob o tálamo), estando este relacionado com a regulação da temperatura corporal, do balanço hídrico, da função da glândula pituitária, da expressão emocional e da fome [32]. O hipotálamo adapta a sua resposta conforme os 12 estímulos que recebe de várias hormonas, tal como a leptina (hormona controladora do apetite, da massa corporal, entre outros), grelina (hormona estimuladora do apetite), PYY (hormona controladora da saciedade), hipocretina ou orexina (neuropeptido importante na regulação do ciclo sono-vigília) e colecistoquinina (hormona gastrointestinal) [32][33]. No hipotálamo existem dois centros envolvidos na regulação da ingestão alimentar. A destruição do núcleo ventromedial hipotalâmico, considerado o “centro da saciedade”, causa hiperfagia e obesidade. Por outro lado, a destruição do núcleo lateral hipotalâmico, conhecido também como o “centro da fome”, resulta em cessação da ingestão (afagia). Conclui-se portanto que quando o desejo de comer é satisfeito, o “centro da saciedade” inibe o “centro da fome”. No entanto, se o “centro da saciedade” for destruído, o controlo sobre a fome é perdido. Sabe-se também que o “centro da saciedade” tem como função concentrar glicose e responder a aumentos nos níveis de glicose sanguínea através do aumento da actividade eléctrica [32]. Electroencefalograma O electroencefalograma, EEG, consiste na medição da actividade eléctrica produzida pelo cérebro mediante vários eléctrodos colocados em diferentes locais à superfície da cabeça. Numa extremidade encontram-se os neurónios, especializados na condução de impulsos nervosos, enquanto na outra extremidade encontra-se a actividade medida pelo EEG que conjuga a diferença de potencial eléctrico dos milhões desses neurónios [32][34]. Os sinais do EEG (na ordem dos mV) são amplificados e digitalizados antes de serem processados, podendo essa informação ser utilizada para fins de diagnósticos ou de investigação [34]. O EEG é descrito sobre a forma de actividade rítmica e transiente. A actividade rítmica é dividida em bandas de frequência (atribuiu-se uma designação aos padrões de onda cerebrais conforme a frequência da actividade rítmica), uma vez que a actividade rítmica dentro de um intervalo de frequências evidencia uma determinada distribuição ao longo do escalpe, podendo ter significado biológico. A maioria dos sinais registados no EEG apresenta frequências entre 1 a 20 Hz [34]. Os padrões de ondas cerebrais identificados com o EEG são designados de Delta, Teta, Alfa e Beta. As ondas Delta são as mais lentas (frequências entre 0,5 e 3,5Hz), apresentando no entanto a maior amplitude. Estas ondas são frequentemente associadas ao estado de sono no adulto adulto, sendo também comummente detectadas nos bebés. As ondas Teta, de frequências entre os 4 e os 8Hz, são características dos estados de meditação, sonolência, indolência e apatia nos adultos, estando também presente em crianças. Em níveis muito lentos, a actividade da onda teta está associada a um estado de relaxação, representando o limite entre o acordar e o dormir. As ondas Alfa são caracteristicamente largas e lentas (frequências entre 8 e 12Hz), estando associadas ao estado de relaxação e reflexão, bem como ao acto de fechar os olhos. Por último, as ondas Beta são de baixa amplitude e de frequência elevada (entre os 13 e 30Hz), estando associadas ao estado mental, alerta, actividade intelectual e concentração [34][35][38]. NEUROFEEDBACK História A descoberta da técnica de neurofeedback foi feita por Joe Kamiya, em 1958 na Universidade de Chicago, quando decidiu examinar se o ser humano possui a capacidade de diferenciar subjectivamente os tipos de ondas geradas pelo próprio 13 cérebro, e obteve resultados impressionantes [39][39]. Efectuou-se uma versão aperfeiçoada do dispositivo, transmitindo automaticamente o sinal de feedback sob a forma de som nos momentos de prevalência das ondas alfa. Usando o dispositivo, ele demonstrou que era possível aprender a controlar conscientemente a actividade do cérebro, e consequentemente o estado de consciência e a qualidade de funcionamento da mente [39]. Apesar da descoberta em meados dos anos 60, apenas em 1971 se iniciou a aplicação terapêutica do neurofeedback, nomeadamente em estudos para redução da frequência de ataques epilépticos. Estudos efectuados (inicialmente em gatos) na Universidade da Califórnia (UCLA) por Barry Sterman, verificaram que era possível “treinar” e condicionar o padrão de ondas cerebrais, no intuito de controlar a epilepsia, aumentando a actividade das ondas alfa para aumentar a relaxação [37][39]. A meio dos anos 70, Joel Lubar na Universidade do Tennessee alargou as aplicações do método a crianças com défices de atenção e hiperactividade [37][39][39]. Durante os anos 80 foi efectuada uma extensa investigação, e em 1989, Eugene Peniston (Fort Lyon (CO) VA Medical Center) efectuou um estudo em alcoólicos submetidos a neurofeedback alfa-teta, além da terapia convencional, onde se verificou 5 anos mais tarde que 70% dos participantes se mantinham abstinentes [39]. Actualmente o método de neurofeedback tem vindo a ter um número crescente de aplicações noutras perturbações psico-fisiológicas e aplicações não terapêuticas. A disseminação deste tipo de técnica esteve dependente da aceitação pelos profissionais, de noções que iam além do paradigma "mecanicista" das ciências naturais de então, da ética envolvente e de equipamentos a um preço acessível. Tal só se verificou nos anos 90, após lançamento da primeira monografia dedicada ao neurofeedback pela Academic Press (e posteriores criações de Fundações e Sociedades acerca do tema), e quando a evolução tecnológica do software tornou os dispositivos relativamente acessíveis (1 a 5 mil dólares), comparativamente aos primórdios (5 a 20 mil dólares) [39]. Descrição da técnica Esta técnica é aplicada com o indivíduo sentado e confortável, em que pode estar com os olhos fechados, abertos ou a efectuar uma tarefa, dependendo do tipo de terapia que se pretende efectuar [37], vide Figura 5. Os eléctrodos são aplicados no escalpe para registar as ondas de actividade cerebral. O sinal é processado por computador, ou seja, as ondas são convertidas em sinais de feedback mediante uma interface homem/máquina usando um computador e software. Recorrendo ao feedback sonoro, táctil ou visual (a maior parte das vezes a informação é apresentada sob a forma de jogo de vídeo) é produzido um determinado condicionamento operante do cérebro, de forma a promover ou diminuir a actividade cerebral, como desejado. Na maior parte do processo o indivíduo está efectivamente a jogar um jogo de vídeo, sendo o seu cérebro o “comando” do mesmo [38]. Eventualmente as ondas de actividade cerebral são modeladas de acordo com a performance mais desejável e regulável. As frequências que pretendemos alcançar e a localização específica de colocação dos eléctrodos, são específicas para a patologia e indivíduo em estudo [35][36]. 14 Figura 5. Simulação de uma técnica de neurofeedback [49]. Aplicações da técnica O Neurofeedback é uma técnica que consiste no treino da função cerebral para ajudar a melhorar a sua capacidade de regular todas as funções corporais, bem como do próprio cérebro [39]. É um processo de aprendizagem gradual, em que se observa o cérebro em acção de momento a momento, mostra-se essa informação ao indivíduo e “recompensa-se” o cérebro alterando a sua própria actividade para padrões mais apropriados [36]. Dito de outra forma, o neurofeedback funciona como um espelho; ao utilizar-se o sinal de feedback, aprende-se a modelar melhor estes processos [39]. Quando se dá uma informação ao cérebro acerca de si próprio, ele tem uma enorme capacidade de mudança. O neurofeedback torna a informação disponível para o cérebro quase instantaneamente, e solicita-o a fazer ajustes. O cérebro tem uma rápida capacidade de resposta [38]. O conceito de neurofeedback pode ainda ser designado por EEG Biofeedback, uma vez que se baseia no registo e análise automática da actividade eléctrica do cérebro, o electroencefalograma (EEG), que evidencia quando o cérebro não está a funcionar adequadamente [39][39]. Alterações no EEG devido ao feedback tendem a correlacionarse com uma melhoria comportamental, da disposição, regulação e atenção. Alterações no comportamento do EEG são o reflexo directo de alterações da actividade neural. O treino que o EEG confere no neurofeedback melhora a activação, inibição, e estabilidade cortical, enquanto influenciam os mecanismos de regulação do estado de concentração associada à região tálamo-cortical. O tálamo tem um desempenho importante no estado de alerta e concentração, apresentando circuitos de feedback entre o tronco cerebral e o córtex [38]. O neurofeedback optimiza a auto-regulação do funcionamento interno do organismo, uma componente fundamental que permite ao SNC funcionar melhor [36]. O domínio de actuação da técnica de neurofeedback subdivide-se em dois treinos: um deles realizado em altas frequências (entre os 12 e 19Hz) e o outro em baixas frequências (entre os 4 e 12Hz). O primeiro é definido como o treino SMR-beta (Sensory Motor Rhythm), e é indicado principalmente para a normalização psicológica. Por outro lado, o segundo é definido como o treino alfa-teta, e utiliza-se nos casos de necessária resolução e integração psicológica [39]. O neurofeedback aborda diversos problemas de desregulação cerebral, tais como ansiedade, comportamentos suicidas, depressão, défices de atenção/hiperactividade, 15 desordens de comportamento, distúrbios de sono, dores de cabeça e enxaquecas, dores crónicas, distúrbios emocionais, espasmos, paralisia cerebral, síndrome de stress póstraumático, vícios, zumbido, entre outros [35][36][37][38][39][39]. Além disso, pode também ter aplicações não terapêuticas, nomeadamente na manutenção da saúde mental, ou seja, ajuda a manter uma boa função cerebral à medida que a pessoa envelhece. Adicionalmente, pode ser utilizado para melhorar a performance, como é no caso de atletas de alta competição, profissionais com cargos stressantes e exigentes a nível psíquico, entre outros, no intuito de desenvolver o potencial da mente com o intuito de aumentar imunidade ao stress [36][39][39]. O aspecto positivo desta prática de neurofeedback é que qualquer cérebro, independentemente do seu nível de funcionamento, pode ser treinado para funcionar melhor, e o leque de utilidades do neurofeedback pode ser de facto bastante extenso [36][37][39]. A percepção dos efeitos da actuação desta técnica tem várias fases, e depende da tipologia da patologia. A quantidade de sessões necessárias para que sejam perceptíveis resultados varia entre a 3ª e a 5ª sessão (no máximo à 10ª sessão). No entanto, para que sejam mantidos os resultados são necessárias no mínimo 15 a 20 sessões de terapia nos casos de ansiedade e insónias, cerca de 40 sessões nos casos de défices de atenção e desordens de comportamento e aprendizagem, e até 100 sessões como nos casos de epilepsia [37][38][39]. Normalmente, cada sessão tem uma duração total de 30 minutos, devem ser repetidas 2 a 4 vezes por semana [37][38]. O objectivo principal é completar o treino e aprendizagem suficientes para garantir benefícios duradouros e consistentes, tal vai variar conforme o indivíduo e a sua indicação clínica [38][39]. À medida que as mudanças incutidas pelo neurofeedback sejam aprendidas e praticadas, os efeitos tendem a manter-se durante algum tempo, pelo menos para alguns problemas. Como o próprio cérebro aprende a melhorar a sua própria regulação, permite que nas patologias em que a medicação não actuava devidamente, essas venham a ter os efeitos terapêuticos desejados, e faz com que por vezes se reduza a dependência de medicamentos [38]. Algumas aplicações comprovadas de neurofeedback Ao longo dos tempos os tratamentos farmacológicos administrados a indivíduos com défices de atenção/hiperactividade (ADHD - attention-deficit/hyperactivity disorder) têm sido o único tipo de intervenção eficaz para reduzir os sintomas deste distúrbio. Durante os últimos 30 anos estudaram-se os efeitos do EEG biofeedback aplicados a esta condição clínica e verificou-se que houve uma melhoria na atenção e controlo comportamental, aumento da activação cortical no EEG e evoluções verificadas em testes de inteligência; tudo isto como resposta a este tipo de tratamento. Actualmente, considera-se que o EEG biofeedback é provavelmente eficaz no tratamento de ADHD, com 75% de sucesso terapêutico [41]. Os efeitos do neurofeedback no traçado EEG de crianças com dificuldades de aprendizagem (LD - Learning Disabled) evidenciaram consequências benéficas no comportamento e performance cognitiva. Imediatamente após o primeiro tratamento existe uma melhoria, no entanto, só se verificaram alterações no EEG depois de 2 meses de terapia. Após terapia verificou-se no EEG uma redução na frequência da banda teta e alfa, previamente elevada nestas crianças, confirmando a eficácia desta terapia neste distúrbio [42]. A aplicação de EEG biofeedback tem sido aplicada como prática terapêutica em viciados em substâncias (SUD - substance use disorder), que possuem uma série de distúrbios complexos com comorbilidades frequentes e anormalidades nos diversos 16 registos de EEG. O treino alfa-teta isolado no tratamento do alcoolismo, ou combinado com treino beta no tratamento de viciados em drogas e com programas de tratamento, é provavelmente eficaz [43]. O distúrbio associado ao zumbido corresponde a diferentes níveis desse mesmo zumbido. O estudo de neurofeedback é aplicado em duas fases, primeiro com atenção centrada num tom e depois sem tom. Verificou-se num estudo que quanto maior o zumbido que a pessoa sente, menores são as alterações dos potenciais de eventos relacionados, ERP - Event Related Potentials, comparativamente com aqueles de baixo zumbido que apresentam uma redução significativa dos ERP [44]. A dor crónica é um problema cada vez mais comum entre a população idosa, e com o dobro da prevalência que nos jovens adultos. Alguns estudos evidenciam que em programas multidisciplinares de controlo da dor, os idosos adquirem rapidamente as competências psicológicas auto-reguladoras ensinadas no treino de relaxação assistido por biofeedback, e alcançam diminuições de dor superiores às sentidas sem execução deste tipo de tratamento [45]. Aplicação de Neurofeedback como solução biomédica no tratamento da Obesidade A obesidade pode ser o resultado, como já referido anteriormente, de uma condição física intrínseca (e.g. desregulação hormonal), de factores psicológicos (e.g. depressão), entre outros [32]. Vários factores podem contribuir para um determinado caso de obesidade onde o neurofeedback é relevante, principalmente no factor da regulação do apetite. No entanto, é possível haver uma associação entre as componentes de ansiedade e depressão, comportamentos alimentares compulsivos e/ou historial traumático que sustente esta patologia [36]. Se os cuidados prestados no tratamento da obesidade com estes factores forem combinados com uma alimentação cuidada e uma atenção à função intestinal adequada, a potencial recuperação pode ser significativamente melhorada. A solução biomédica que propomos consiste no desenvolvimento de um equipamento e software para treino cerebral, dependendo das causas directas ou subjacentes da obesidade, maioritariamente os factores psicológicos (incluem-se os ambientais). Após algumas sessões com o terapeuta e avaliação do estado clínico, o neurofeedback seria um adjuvante às terapias convencionais. A técnica necessitaria de um dispositivo portátil, cujas características exclusivas facilitariam o treino individual do neurofeedback, tais como, portabilidade, controlo automático do contacto dos eléctrodos, e alta imunidade a interferência externas, na semelhança à aplicação de neurofeedback noutras situações [38]. Efectuaríamos um estudo padrão das ondas de EEG dos obesos mediante demonstração (estímulo) de determinados tipos ou características de alimentos durante o registo – população alvo; e compararíamos as ondas, com o mesmo tipo de estudo, em indivíduos de peso normal – população padrão. Ao efectuar o neurofeedback, teríamos que estabelecer como limites das frequências de onda do EEG, aqueles da população padrão. A essência do treino consistiria em aprender as relações entre o nosso comportamento físico, ou as atitudes internas, e a qualidade de funcionamento do cérebro, com o uso do feedback de parâmetros EEG. A experiência adquirida deste modo permite uma orientação mais intencional do trabalho da mente e a alocação dos seus recursos de forma mais eficiente [38]. 17 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFIAS [1] Página de internet que define alimentação e descreve alguns processos de comportamento alimentar animal, pertencente ao grupo Wikipedia; <http://en.wikipedia.org/wiki/Feeding>; 24 de Outubro de 2008; Acedido a 25 de Novembro de 2008. [2] Tortora, Gerard J., Grabowski, Sandra R.; Introduction to Human Body, the Essentials of anatomy and physiology; Wiley, 6th Edition; 2004. [3] Guyton, Arthur C., Hall, John E.; Tratado de Fisiologia Médica; Guanabara Koogan, décima edição; 2000. [4] Página de internet que disponibiliza informação referente à pirâmide dos alimentos, pertencente ao Massachusetts Institute of Technology; <http://web.mit.edu/athletics/sportsmedicine/wcrfoodpyr.html>; 12 de Dezembro de 2005; Acedido a 25 de Novembro de 2008. 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