“O poder de influência Peer to Peer” (por Vanessa Mathias, Account Director – Ipsos MediaCT)
A cena não é mais incomum: ao prestar atenção na mesa ao lado de um restaurante, a
filha conta aos pais sobre sua entrevista para estágio, problemas com o namorado. A
mãe, ao lado, com a atenção na telinha: faz check-in no Swarm, envia um Share
Location para o pai encontra-las através do WhatsApp, edita fotos com ela para postar
no Facebook.
A constante conectividade é, sim, um fenômeno recente. A difusão dos aparelhos
mobile permitiu que os usuários trocassem os momentos esporádicos de “sessões
online“ pela prontidão de estarem sempre disponíveis, a qualquer hora, em qualquer
local.
Mas já faz mais de quatro anos que muitos ao nosso redor confirmam esta
experiência: filmam shows em vez de vê-los, publicam seus pratos de macarrão em vez
de comê-los.
O que mudou no Brasil nos últimos dois anos, entretanto, foi o poder de expansão e de
ampliação para todos os segmentos demográficos. Deixou o universo restrito do jovem
de classe alta e saltou para o da mãe, do pai, do porteiro.
Em um país marcado pela profunda diferenciação social, é digno de nota o
recebimento de um WhatsApp da faxineira para não se esquecer de comprar sabão em
pó.
A base de smartphones no Brasil cresceu 3,4X em dois anos*, incluindo os mais velhos
(crescimento de 4X entre os adultos com mais de 55 anos*). O acesso à internet no
celular entre os usuários de móvel, nas classe C/D e E, passou de 34% para 50%.*
Hoje, um cobrador de ônibus do interior do Ceará tem, em seu smartphone de
R$399,00, acesso a um volume de informações maior do que o presidente dos EUA
tinha há quinze anos. E, com isso, amplia infinitamente suas possibilidades para
tomada de decisão.
E o que a massificação da tecnologia muda no comportamento do brasileiro?
O poder da influência, há pouco centralizado nas principais mídias e no Estado, muda
sua força vetorial com o crowdsourcing. A informação é pulverizada; e sua
popularidade, determinada pela aprovação entre as redes interconectadas.
Isso é particularmente notório nos eventos de comoção nacional ou ampla magnitude.
Fonte Ipsos: Estudos Marplan EGM – 13 Mercados – 1º trimestre. Filtro (em mil): Pop Geral 2012 (47421), 2013 (48642), 2014 (61895) - *Possui smartphone 2012 (2%), 2013
(4%), 2014 (8%). ** Possui smartphone 55+ anos 2012 (138), 2013 (241), 2014 (619). ***Possui telefone celular, Classe CDE 2012 (20814), 2013(22218), 2014 (27603), Acessa
Internet no celular 2012 (7029), 2013 (8909), 2014 (13684).
Um exemplo foram as manifestações em 20131. Reforma política, transporte público,
corrupção... Foram múltiplas as razões para participar. Diferentemente de outros
momentos, motivados por temas e lideranças definidas, cada um defendia sua
participação com uma razão. Fossem elas individuais, fossem de pequenas redes. Mas
o comportamento era “de todos”. A “individualidade coletiva”.
Os usuários digitais se deslumbraram com a rapidez e com o alcance da internet.
Mudaram seu comportamento, direcionados principalmente por um motivo:
descobriram que podiam.
Os “rolezinhos” 2são outra expressão dessa tendência. Os jovens sempre quiseram se
encontrar, conhecer, relacionar. Porém, a classe C percebeu a força das redes para
ocupar os espaços físicos “mais nobres”. Mudaram seu comportamento. Porque
descobriram que podiam.
Durante a Copa, após a goleada de 7 x1, houve alguns minutos de luto.
Repentinamente tomados por uma enxurrada de memes vindos de todas as redes, os
brasileiros, de modo igualmente súbito, alteraram o ‘mood’, para rir de si mesmos. E
mudaram seu comportamento.
E o que isso representa para as mídias e para as marcas?
As plataformas de mídias vêm se adaptando ao comportamento da nova massa digital.
Ocupam um novo espaço, não sendo apenas noticiadores, mas “curadores” da
informação.
Em plenas eleições, em 13/08/14, a notícia da morte de um candidato à Presidência
chegava ao WhatsApp e ao Messenger antes mesmo das principais plataformas
digitais. Quando os veículos de comunicação começaram a noticiar, a timeline no
Facebook já pipocava as principais teorias da conspiração.
Os veículos tradicionais, por sua vez, eram buscados pelos usuários digitais para dar
credibilidade à informação, reunir especialistas e prever impactos no cenário político
brasileiro.
O espaço “da notícia” transformou-se no espaço “dos especialistas” e do “ponto de
vista”. O “aconteceu” já é velho.
As marcas também adaptam suas estratégias de comunicação para obterem mais
influência no meio digital.
1
Também conhecidas como "jornadas de junho", foram uma onda de protestos, iniciadas nas grandes capitais brasileiras, mas com
rápida expansão para todo o país. Inicialmente motivadas pelo aumento nas passagens de transporte coletivo, as manifestações
rapidamente tiveram as pautas expandidas para demandas mais amplas. Analogamente a outros protestos ocorridos em outras partes
do mundo no mesmo período (como a "Primavera Árabe"), as manifestações brasileiras tiveram importante base nas redes sociais.
2
Movimento de ocupação, por jovens de periferia, dos espaços físicos tradicionalmente ocupados pelas elites, sobretudo shopping
centers. O termo se origina do diminutivo de "rolê" ou "rolé", empregado por esses jovens para "passeios". As redes sociais
desempenharam função crucial para que os encontros dos jovens se concretizassem.
No universo online, pessoas querem conversar com pessoas, não com grandes
corporações. As marcas percebem a efetividade do laço afetivo e começam a
humanizar seu discurso nas redes. Incorporam os assuntos do dia e memes a suas
narrativas. Fazem amizade e dialogam com pessoas, e até com outras marcas.
O diálogo, aliás, é essencial para gerar influência no meio online. O ser digital não é
recipiente da informação, é copartícipe.
Ele decide com quem quer falar, o que quer ver. Para realmente ser influente, é
necessário que ele escolha ativamente consumir sua informação. E um dos maiores
desafios das marcas é gerar essa relevância.
No universo transmidiático, para destacar seu conteúdo nesse nível de complexidade,
é imprescindível adaptá-lo à plataforma. O volume de informações concorrentes nunca
foi tão grande quanto hoje. O attention spam do brasileiro digital tem a mesma
duração de uma lista de dez itens no BuzzFeed.
Em resumo...
O ingresso de diversos segmentos demográficos no mundo da “constante
conectividade” massifica o acesso à inteligência coletiva e traz mudanças intrínsecas à
sociedade. O brasileiro tomou consciência do poder de amplificação do conteúdo de
pessoas e para as pessoas e é influenciado como uma das principais, senão principal,
fonte midiática. E, diante dessa dinâmica, muda seu comportamento.
Para os veículos de mídia e marcas, tornar-se relevante é transitar e dialogar com o
novo consumidor, permitir participar. Ser transparente, ter um ponto de vista. Adaptar
o conteúdo à plataforma. Ajudar o usuário a alcançar seu fim, independentemente do
meio. Pois, nesse mundo, o fim justifica os meios. Bem-vindos à era do maquiavelismo
digital.
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