A DIVERSIDADE DA GEOGRAFIA BRASILEIRA: ESCALAS E DIMENSÕES DA ANÁLISE E DA AÇÃO
DE 9 A 12 DE OUTUBRO
Reflexões sobre a comercialização da pesca artesanal no Brasil.
Julia Carvalho1
Resumo: O objetivo deste artigo é o refletir sobre as diferentes lógicas espaciais de
comercialização do pescado artesanal no Brasil. A situação do trabalhador da pesca
artesanal é o ponto de reflexão inicial. Posteriormente é feito um levantamento das
políticas públicas voltadas para esse setor e das iniciativas para o fortalecimento
desta cadeia produtiva que estão em curso nos níveis estaduais e nacionais. Através
deste estudo pretende-se contribuir para a identificação de gargalos e apontamento
de caminhos para gestão costeira no que diz respeito a comercialização da atividade
da pesca artesanal no Brasil.
Palavras-chave: Pesca artesanal; politicas públicas; comercialização.
Abstract: The purpose of this article is to reflect on the different spatial logic
marketing of artisanal fisheries in Brazil. The situation of artisanal fisheries worker is
the initial reflection point. A survey of public policies for this sector and initiatives to
strengthen this supply chain that are underway in the state and national levels also
compose this article. Through this study we aim to contribute to the identification of
bottlenecks and pointing ways to coastal management regarding the sale of artisanal
fishing activity in Brazil.
.
Key-words: Small-scale fishing ; public policy; commercialization
1 – Introdução
De acordo com o Ministério da pesca e Aquicultura, o consumo de pescado
no Brasil vem aumentando a cada ano que passa2. Alguns estudos apontam que
esse crescimento é baseado na crença de que o peixe é mais saudável para saúde
humana do que os outros tipos de carne3. Um fator que vale a pena ser levado em
consideração é o modelo de produção: enquanto a carne de frango ou de gado
necessita de amplos espaços e possui alta taxa de degradação ambiental
associada, com produções intensivas e extensivas, a produção de pescados tem
como seu maior problema associado as taxas de sobre-pesca relacionadas a pesca
1
- Acadêmico do Programa de Pós-Graduação em Geografia da Universidade Federal de Santa Catarina. Email de contato: [email protected]
2
http://www.mpa.gov.br/ultimas-noticias/832-consumo-de-pescado-no-brasil-aumenta-23-7-em-dois-anos
http://zh.clicrbs.com.br/rs/vida-e-estilo/vida/noticia/2012/03/substituir-carne-vermelha-por-peixe-ou-frangopode-reduzir-risco-de-morte-prematura-3693131.html
3
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industrial. A pesca artesanal em si mesma, respeitadas legislações pertinentes não é
uma atividade altamente impactante, não são necessárias criações (nem extensas
nem intensas), reúne uma gama de saberes originais de cada comunidade que a
pratica. De acordo com Vieira (2006,p.88), “os pescadores artesanais suprem 60%
da demanda nacional por pescado, o que representa cerca de 500 mil toneladas por
ano. São mais de 600 mil trabalhadores em todo o Brasil” e somados a estes, suas
famílias que estão na maior parte das vezes envolvidas no beneficiamento e
comercialização do pescado.
Cardoso (2001) observa que, no início dos anos 1990, a pesca artesanal
respondia por mais de 50% da produção nacional e por mais de 75% do valor
gerado pelo conjunto das atividades pesqueiras
A FAO projeta um aumento do consumo mundial para 2030 dos atuais 16
kg/habitantes/ano para 22,5 kg/habitantes/ano. Isso representará um aumento de
consumo de mais de 100 milhões de toneladas/ano. Além disso, o Brasil tem um
grande potencial de mercado. São 190 milhões de brasileiros que hoje consomem 7
kg/habitantes/ano. (Brasil, 2008)
Apesar de ser uma atividade de suma importância, a maior parte destes
trabalhadores se encontra com baixa escolaridade, enfrenta condições precárias de
trabalho e conta com pouca infra-estrutura para o beneficiamento e venda do
pescado.
A pesca industrial, a fiscalização ambiental ineficiente e corrupta, a
proliferação dos usos turísticos desordenados, a falta de políticas públicas eficientes
são apenas alguns dos problemas que atingem os pescadores artesanais
brasileiros.
Nos últimos anos, as políticas públicas relacionadas a pesca em nosso país
deram privilégio para a instalação de grandes indústrias pesqueiras, as quais na
maior parte das vezes praticam a sobre-pesca, esgotando estoques pesqueiros e
depredando os ecossistemas do fundo dos oceanos. Isto quando não são vistos
bem perto das costas passando suas redes em ambientes mais rasos que são
berçários marinhos para muitas espécies. Para Vieira (2006):
“A pesca industrial tem sido apontada como a principal responsável
pelo uso desordenado e predatório - do ponto de vista sócio-ecológico - dos
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estoques pesqueiros. Isso se deve a uma conjunção de vários fatores, a
saber: i) o direcionamento dos esforços para a captura de poucas espécies
economicamente valiosas; ii) o exagerado esforço de pesca realizado com
embarcações que podem permanecer por longos períodos no mar e que
dispõem de sofisticados equipamentos de detecção e captura dos
cardumes, visando atender à demanda do mercado internacional; iii) o uso
de técnicas desestruturadoras das comunidades bentônicas, gerando um
índice excepcionalmente elevado de capturas acidentais e de descarte
(espécies de baixo valor comercial e indivíduos juvenis); e iv) o desrespeito
às leis que regulam as técnicas empregadas, o tamanho dos indivíduos, os
períodos e as áreas de pesca permitidas – principalmente no contexto dos
países do Hemisfério Sul.” (p.84)
Isso afeta a capacidade de produção da pesca artesanal estimulando desta
forma, o comprometimento da produtividade da atividade pesqueira artesanal. Vieira
(2006) aponta que “apesar da ocorrência de práticas ilegais e predatórias,
predomina aqui a utilização de um conjunto diversificado de técnicas eficientes e de
baixo impacto sobre os ecossistemas marinho-costeiros.” (p.84)
Os pescadores artesanais possuem uma gama de conhecimentos derivados
de sua cultura material e imaterial, que são transmitidos através das gerações pela
prática da vivência e da oralidade, sendo considerados “Populações tradicionais”
devendo ser preservados sua cultura e seu conhecimento, que variam imensamente
de acordo com o ecossistema habitado.
A promulgação do Decreto de número 6.040 de 7 de fevereiro de 2007, que
institui a Política Nacional de Desenvolvimento Sustentável dos Povos e
Comunidades Tradicionais (PNCPT)4, define em seu artigo 3, inciso I, Povos e
Comunidades Tradicionais como
“grupos culturalmente diferenciados e que se reconhecem como
tais, que possuem formas próprias de organização social, que ocupam e
usam territórios e recursos naturais como condição para sua reprodução,
social, religiosa, ancestral e econômica, utilizando conhecimentos,
inovações e práticas gerados e transmitidos pela tradição”(PNCPT,2007)”
e, em seu inciso II, Territórios Tradicionais como “os espaços necessários à
reprodução cultural, social e econômica dos povos e comunidades tradicionais,
sejam eles utilizados de forma permanente ou temporária.”(Idem)
O Plano Nacional de Aqüicultura e pesca (último planejamento em escala
nacional para a pesca, vigente de 2008 a 2011) também utiliza o termo “territórios”
4
Decreto de número 6.040 de 7 de fevereiro de 2007, que institui a Política Nacional de Desenvolvimento
Sustentável dos Povos e Comunidades Tradicionais (PNCPT). Disponível em:
http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2007-2010/2007/decreto/d6040.htm
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para definir as diferentes zonas em que ocorre a pesca em nosso país. O programa
denominado “Territórios da pesca” visa levar em conta “as potencialidades,
vocações e características socioculturais” (Brasil, 2008, p.11) de cada um desses
territórios. Esse documento apresenta algumas metas dentro de suas políticas
como: agregação de valor aos produtos e subprodutos do pescado, incentivo ao
associativismo e cooperativismo, introdução do pescado na alimentação escolar e
sobretudo, o incentivo ao consumo de pescados.
Com tanto potencial de produção deste alimento nobre, o brasileiro ainda
consome abaixo do recomendado pela Organização Mundial da Saúde
(OMS). Para estimular o aumento, a qualificação e a diversificação do
consumo no mercado interno é preciso uma ação educativa de divulgação
de suas qualidades. Usar estratégias articuladas de capacitação de
profissionais que atuam na manipulação do pescado, divulgando as boas
práticas de manipulação e técnicas de comercialização. Além disso,
desenvolver políticas que facilitem a distribuição comercial do pescado,
promover a oferta direta de pescados por produtores/pescadores aos
consumidores finais. (p.15)
O objetivo de “desenvolver políticas que facilitem a distribuição comercial do
pescado” (Brasil,2008,p.15) não é muito aprofundado no texto em que a política é
apresentada. Apenas para a maricultura é apresentado como objetivo a “adoção de
princípios internacionais e códigos de condutas responsável para a aqüicultura
sustentável” . (Idem,p.18).
2 – Desenvolvimento
De acordo com a legislação vigente, a definição de „pescador artesanal‟ é dada pelo DecretoLei 221/67, em seu artigo 26, que define como sendo, “[...] aquele que matriculado na repartição
competente segundo as leis e regulamentos em vigor, faz da pesca sua profissão ou meio principal de
vida”. Esse mesmo decreto define pesca como sendo “[...] todo ato tendente a capturar ou extrair
elementos animais ou vegetais que tenham na água seu normal ou mais freqüente meio de vida”
(BRASIL, 1967).
Diegues (1983), enfatiza que para ser pescador não basta apenas viver desta atividade
econômica, mas dominar, plenamente, a “arte” da pesca:
“Podemos dizer que no caso da pesca, o domínio da arte exige um período de
experiência mais longo que nas outras formas de artesanato. Se compararmos o
pescador artesanal a um artesão de móveis, constatamos algumas diferenças
importantes. Este adapta seus instrumentos de trabalho a uma matéria-prima
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relativamente homogênea: a madeira. Já o pescador artesanal é obrigado a dominar o
manejo de diferentes instrumentos de capturas utilizados para diferentes espécies,
num meio em contínua mudança (p. 198).”
Todo esse conhecimento milenar acerca das espécies, do comportamento da natureza e das
técnicas que constituem a pesca artesanal são considerados como um patrimônio a ser preservado. O
Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional – IPHAN, é órgão governamental brasileiro
responsável pela preservação do Patrimônio Nacional, seja ele material ou imaterial. Este órgão
trabalha para concretizar o processo de resgate pela sociedade de seu Patrimônio Cultural.
O artigo 216 da Constituição de 1998 coloca que
“constituem patrimônio cultural brasileiro os bens de natureza material e imaterial,
tomados individualmente ou em conjunto, portadores de referência à identidade, à
ação, à memória dos diferentes grupos formadores da sociedade brasileira, nos quais
se incluem: I - as formas de expressão; II - os modos de criar, fazer e viver; III - as
criações científicas, artísticas e tecnológicas;
IV - as obras, objetos, documentos,
edificações e demais espaços destinados às manifestações artístico-culturais;V - os
conjuntos urbanos e sítios de valor histórico, paisagístico, artístico, arqueológico,
paleontológico, ecológico e científico.” (Brasil, 1988)
Diegues (2007) engloba os pescadores artesanais na lista de populações tradicionais
localizadas na Mata Atlântica e na zona costeira em geral. De acordo com esse autor, os pescadores
artesanais possuem características peculiares de acordo com os ecossistemas que habitam e podem
ser divididos em: “caiçaras, jangadeiros, pescadores artesanais, praieiros e Açorianos” (Diegues,
2007). A PNPCT5 também define essas populações como tradicionais, uma vez que dependem de
recursos naturais para reprodução de seu modo de vida, usam tecnologias de baixo impacto e
possuem conhecimentos acumulados passados adiante através de muitas gerações.
Como já dito anteriormente, a pesca artesanal abastece os mercados das cidades brasileiras
com diversas espécies de peixes, crustáceos e moluscos. Infelizmente ainda há muita informalidade
na atividade, tanto na atividade da pesca artesanal em si (só é considerado pescador pelo Estado e
pode participar do RGP6 aquele que vive única e exclusivamente da atividade), quanto no
beneficiamento e comercialização do pescado. Em Março de 2015 foi sancionado o decreto n.84257.
Esse decreto é alvo de luta pela sua revogação8, uma vez que estabelece novas regras sobre a
5
Política Nacional de Povos e comunidades tradicionais. Decreto n.6040 de 2007. Disponível
em:http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2007-2010/2007/decreto/d6040.htm
6
http://www.mpa.gov.br/monitoramento-e-controle/registro-geral-da-atividade-pesqueira-rgp/registro-geral-dapesca-rgp
7
http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_Ato2015-2018/2015/Decreto/D8425.htm
8
http://peloterritoriopesqueiro.blogspot.com.br/2015/06/carta-aberta-contra-o-decreto-8425.html
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definição de pescador artesanal, não reconhecendo mais como pescadores aqueles que fazem o
beneficiamento do pescado, apenas aqueles que realizam a captura. Esse decreto deixa de
reconhecer principalmente as mulheres que são as responsáveis pela manipulação e beneficiamento
do pescado fora d‟água porém dentro da lógica familiar de produção.
Outra dificuldade enfrentada são as várias legislações para beneficiamento e comercialização
feitas por parte dos órgãos fiscalizadores. São legislações de ordem sanitária, fiscal, tributária e
ambiental, que muitas vezes dificultam a comercialização por parte dos próprios pescadores
artesanais. Soma-se a isso o fato de que a manutenção do pescado para comercialização também
exige investimentos altos, como câmaras frias e transporte adequado. A subsistência e a venda
apenas do excedente é o objetivo final da maior parte dos pescadores artesanais, porém devido a
grande demanda crescente de pescado estes acabaram por voltar as suas redes para novos
cardumes “tornando o saber naturalístico, enquanto fator de produção” (Lima, 1997, p. 111).
Os sistemas de produção de alimentos em nosso país tanto em terra quanto no mar sempre
estiveram concentrados nas mãos dos grandes proprietários. A falta de acesso à terra para produzir
inviabiliza totalmente a reprodução dos sistemas comunitários e tradicionais, extremamente
dependentes dos recursos naturais para viabilizar seu modo de vida. Essa extrema desigualdade na
distribuição e no acesso à terra em nosso país, fez com que movimentos que reivindicam o acesso à
terra se proliferassem desde os primórdios da ocupação de nosso país. Talvez por nunca terem sido
totalmente excluídos de seu meio principal de produção, o mar, os pescadores artesanais brasileiros
não tenham sentido a necessidade de lutar para defender sua atividade. Pontualmente, estudos
acadêmicos e movimentos autônomos alertavam para a situação alarmante em que se encontravam
algumas comunidades de pescadores artesanais. Porém, nos últimos anos, com a promulgação da
PNPCT em 2008 e a lei 11.958 de 2009 que criou o Ministério da Pesca e Aqüicultura, a situação das
comunidades de pescadores artesanais vieram a tona a medida que estes começaram a reconhecer
seus diretos de acesso aos recursos do território que ocupam. O Movimento pela regularização dos
territórios tradicionais pesqueiros9 é uma iniciativa nesse sentido.
Nos últimos anos, as políticas públicas relacionadas a pesca em nosso país deram privilégio
para a instalação de grandes indústrias pesqueiras, as quais na maior parte das vezes praticam a
sobre-pesca, esgotando estoques pesqueiros e depredando os ecossistemas do fundo dos oceanos.
Isto quando seus grandes barcos não são vistos bem perto das costas passando suas redes em
9
http://peloterritoriopesqueiro.blogspot.com.br/
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ambientes mais rasos que são berçários marinhos para muitas espécies. Para Giddens, o modelo de
desenvolvimento atual, baseado no desenvolvimento industrial não consegue mais dar respostas
acerca dos riscos que incorrem a partir do seu próprio desenvolvimento. O autor esclarece que não é
a crise, mas o desenvolvimento do capitalismo que produzem e reproduzem o que ele chama de
“sociedade de risco” (Giddens, 1997). O maior risco nesse caso é que com a redução dos estoques
pesqueiros a manutenção da atividade da pesca artesanal em nosso país se prejudique cada vez
mais.
O empobrecimento das comunidades de pescadores artesanais foi de certa maneira inevitável:
o modelo de ocupação do litoral, altamente urbanizado e praticamente sem infra-estrutura sanitária
adequada, a especulação imobiliária e turística, a criação de unidades de conservação, a
concorrência desleal da pesca industrial e os olhos vendados da fiscalização que a privilegia, foram
fatores responsáveis por esse acontecimento. Outros fatores como a falta de recursos para
investimento em embarcações, beneficiamento, estruturas de conservação e comercialização do
pescado, agravam ainda mais a situação dos trabalhadores do mar. Como observa Abramovay (2004)
entre os grupos sociais que enfrentam situações de risco econômico, existem diversos arranjos locais
utilizados para enfrentar tal condição e apesar dessas condições existe uma “densa vida financeira
observada em grupos sociais em situação de pobreza” (Abramovay, 2004) . Esses arranjos locais
são representados pelas famílias que beneficiam o pescado, filetam fazem bolinho de peixe,
hambúrguer, empanam, saem para vender para os restaurantes e para as casas do bairro.
Wilkinson (2009) chama a tenção para as “zonas de confronto entre lógicas produtivas são o
lugar privilegiado da inovação adaptativa – inovações produtivas ou organizacionais destinadas a
minimizar as consequências das descontinuidades técnicas” (Wilkinson, 2009).
Giddens coloca que a sociedade de risco em que nos encontramos corresponde a
modernidade industrial
onde “os riscos sociais, políticos econômicos e individuais tendem cada
vez mais a escapar das instituições para o controle e proteção da sociedade industrial” (Beck,
1997 p.15). Há uma tendência geral que faz com que as responsabilidades do Estado, como a de
criar políticas públicas para o setor passem cada vez mais para as mãos das instituições privadas.
No caso especifico da pesca artesanal, além da iniciativa de alguns grandes mercados (Walmart)
que vem tentando comercializar produtos sustentáveis10 também tomam a frente dessas ações de
10
http://www.walmartbrasil.com.br/sala-de-imprensa/sustentabilidade/walmart-monitora-pescados-e-ampliaprojetopara-desenvolver-produtos-mais-sustentveis-450.html
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melhoria da pesca artesanal algumas ONG's, que vem criando alguns programas de incentivo á
pesca artesanal (Conservação internacional).11 Outro mecanismo que tem se proliferado é a
certificação através de certificadoras internacionais, como a MSC, a Friend of the sea e Krav 12.
Uma novidade é o acordo13 para a venda de peixe certificado nas olimpíadas de 2016. Porém,
devido à alta demanda, provavelmente esse peixe será todo comprado de pescas industriais
certificadas, conforme informação obtida em entrevista com Laurent Viguié, gerente da MSC.
A construção de políticas públicas eficientes para a manutenção da pesca artesanal e
comercialização do pescado proveniente desta modalidade de pesca depende do conhecimento
acerca das lógicas territoriais e das cadeias produtivas inerentes a estes Territórios de pesca e de
suas especificidades.
Comercialização de pescarias artesanais
De acordo com Vieira (2006,p.88), “os pescadores artesanais suprem 60% da demanda
nacional por pescado, o que representa cerca de 500 mil toneladas por ano. São mais de 600 mil
trabalhadores em todo o Brasil” e somados a estes, suas famílias que estão na maior parte das vezes
envolvidas no beneficiamento e comercialização do pescado.
Cardoso (2001) observa que, no início dos anos 1990, a pesca artesanal respondia por mais de
50% da produção nacional e por mais de 75% do valor gerado pelo conjunto das atividades
pesqueiras.
A FAO projeta um aumento do consumo mundial para 2030 dos atuais 16 kg/habitantes/ano
para 22,5 kg/habitantes/ano. Isso representará um aumento de consumo de mais de 100 milhões de
toneladas/ano. Além disso, o Brasil tem um grande potencial de mercado. São 190 milhões de
brasileiros que hoje consomem 7 kg/habitantes/ano. (Brasil, 2008)
11
https://www.youtube.com/watch?v=ufgez76RsXE
http://www.estadao.com.br/noticias/geral,peixe-com-selo-verde-chega-ao-consumidor-imp-,660137
http://ibd.com.br/pt/Krav.aspx
http://www.friendofthesea.org/
12
13
https://www.google.com.br/url?sa=t&rct=j&q=&esrc=s&source=web&cd=2&cad=rja&uact=8&ved=0CCMQFj
AB&url=http%3A%2F%2Fwww.organicsnet.com.br%2F2013%2F12%2Frio-2016-assina-acordo-para-servirapenas-pescado-certificado-nos-jogos%2F&ei=z4EdVbKdFvi1sQTo1IDAAQ&usg=AFQjCNHynXgi7VpwuXWXpZ_F91TNCS8LA&sig2=shwDaZdFJ-5YcbuxWEt_lg&bvm=bv.89744112,d.cWc
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Apesar de ser uma atividade de suma importância, a maior parte destes trabalhadores se
encontra com baixa escolaridade, enfrenta condições precárias de trabalho e conta com pouca infraestrutura para o beneficiamento e venda do pescado.
A comercialização do pescado ainda é privilégio de poucos. A maior parte do pescado
artesanal é comprado e distribuído por atravessadores que acabam por ficar com o lucro maior desse
comércio. A comercialização dos produtos oriundos das pescarias artesanais é realizada na forma “in
natura”, assim que o pescador regressa do mar, ou beneficiado e congelado. A comercialização “in
natura” é dependente da figura do intermediário, chamado de atravessador/pombeiro. Esta
intermediação possibilita o rápido escoamento da produção principalmente para atacadistas e
mercados de peixe de outras localidades. Em cada núcleo pesqueiro podem atuar um ou mais
intermediários, que são importantes para o custeio da produção ao financiarem a compra de
combustível e a manutenção das embarcações. Em contrapartida, exigem fidelidade e pagam muito
pouco pela produção, segundo depoimentos de pescadores entrevistados. Burigo (2013) aponta para
a existência de sistemas financeiros paralelos aos governamentais, onde o atravessador perpetua
“laços de dominação sócio cultural e formas de coerção econômico financeiras de pescadores
artesanais” (p.85), uma vez que praticamente inexistem acordos e compras diretas entre grandes
instituições comerciais e os pescadores artesanais. A falta de infra-estrutura de manutenção e
transporte do pescado é um dos maiores obstáculos para a venda direta ao consumidor final. A lógica
da produção, cada vez mais especializada e da distribuição, cada vez mais dependentes de infraestruturas disponibilizadas pelos estados e pelas empresas, dificulta a articulação entre produtores e
consumidores. Porém já existem inciativas de comercialização que pretendem ser “sustentáveis” na
comercialização do pescado artesanal.
Como coloca Guivant (2009), “a sustentabilidade tem passado a ser uma bandeira cada vez
mais central nas estratégias do setor de supermercados, algo obviamente possível devido à
imprecisão do conceito”.(Guivant, 2009). A venda de pescado artesanal nos mercados de grande
porte a partir de sistemas de rastreamento ainda é incipiente. A iniciativa do Walmart parece ser
pioneira14, porem existem alguns outros programas de comercialização como o da Conservação
Internacional
15
(projeto pesca mais Sustentável). A MSC-Brasil, Marine Stewardship Council16 faz
uma certificação de pescarias, mas não foca no pescado artesanal, dando prioridade para pescarias
sustentáveis, sejam elas industriais ou artesanais. Mas como o processo tem um custo elevado, é
14
http://www.walmartbrasil.com.br/sustentabilidade/programas-de-sustentabilidade/pescados/
http://www.conservation.org.br/onde/ecossistemas/index.php?id=100042 e https://vimeo.com/101030875
16
http://www.msc.org/?set_language=pt
15
2350
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preciso que as organizações representativas da pesca artesanal busquem parcerias com entidades e
governos locais, na intenção de financiar tal processo.
Existem algumas políticas de crédito disponíveis para os pescadores artesanais, como o
PRONAF (Programa nacional da Agricultura Familiar), no qual os pescadores foram inclusos a partir
de 2003 e o seguro defeso, além de algumas outras linhas de crédito para compra e reforma de
embarcações17. Atualmente inexistem no MPA quaisquer politica de incentivo a comercialização do
pescado artesanal. A criação recente do sistema de gestão compartilhada (SGN)18 pelo governo
federal, é um esforço no sentido de criar mecanismos que tornem a pesca mais sustentável no Brasil.
Porém de acordo com Burigo (2013) essas políticas ainda registram pouco alcance social:
“As estratégias governamentais de incentivo à pesca têm subestimado as
potencialidades dos territórios de pesca, tanto na criação de arranjos produtivos que
agregassem valor aos produtos capturados como no desenvolvimento de outras
capacidades das populações locais em termos sociais, culturais, etc.” (Burigo, 2013
p.85)
A inserção do pescado artesanal nas escolas como parte da merenda escolar é adotadapor
alguns estados, mas encontra algumas resistências devido principalmente as espinhas de peixe que
podem ser um risco para as crianças. A manipulação do pescado deve ser feita com cuidado e na
maior parte das vezes o peixe tem que ser servido bem processado, em forma de bolinhos e
hamburguers de peixe. Programas de aquisição de alimentos encontram dificuldades de conseguir
comprar o pescado artesanal devido a informalidade e não cadastro da maior parte dos pescadores
no sistema de compras do PRONAF. Algumas iniciativas por parte do Governo federal vão na direção
de servir nas escolas a carne de peixe mecanicamente separada (CMS)19
3 - Conclusões
O incremento contínuo da oferta de produtos pesqueiros e a aproximação entre o produtor e o
consumidor final só serão possíveis através de estudos acerca deste circuito espacial produtivo, como
proposto por Santos:
(...) Mas para entendermos o funcionamento do território é preciso captar o
movimento, daí a proposta de abordagem que leva em conta os circuitos espaciais da
produção. Estes são definidos pela circulação de bens e produtos e, por isso,
oferecem uma visão dinâmica, apontando a maneira como os fluxos perpassam o
território. (SANTOS;SILVEIRA, 2001, P.143)
17
http://www.mpa.gov.br/index.php/pesca/artesanal
http://www.mpa.gov.br/index.php/pesca/gestao-compartilhada
19
http://www.mpa.gov.br/index.php/infraestrutura-e-fomento/62-fomento/147-pescado-na-alimentacao-escolar
18
2351
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O delineamento de políticas públicas que levem em conta essa realidade em que se
inserem os circuitos espaciais da produção da pesca artesanal é reconhecida pelo governo federal,
porém estas ainda são muito incipientes e generalizantes, uma vez que inserem os pescadores
artesanais na mesma gama de políticas voltadas para os agricultores familiares, sem levar em conta
as especificidades deste tipo de atividade. É de extrema importância que as políticas públicas sejam
“Construídas a partir da articulação das decisões locais e das demandas sociais.
Assim, para o caso brasileiro, são necessárias políticas que propiciem incremento e
distribuição da renda e dos meios de produção a contingentes maiores da população
que carecem de inclusão social no cenário atual.” (Brasil,2007).
Aprofundar o conhecimento acerca das estratégias econômicas utilizadas pelos pescadores
artesanais para comercializar sua produção pode colaborar para a criação de políticas públicas que
valorizem esse tipo de atividade, que é praticada em todo litoral brasileiro, porém carece ainda de
sistemas de financiamento e comercialização levando em consideração acima de tudo suas
demandas e especificidades territoriais. Concordando com Wilkinson (1999): “o sistema agroalimentar,
se é um sistema orientado para seu suporte natural e por sua finalidade alimentar, não é contudo um
sistema homogêneo, mas antes, produtos das histórias particulares de cada cadeia ou subconjunto de
cadeias ligadas entre si” (Wilkinson,1999)
4-Referências Bibliográficas
ABRAMOVAY, R. 2004. A densa vida financeira das famílias pobres. In: R. ABRAMOVAY (org.), Laços
financeiros na luta contra a pobreza. São Paulo, Annablume, p. 21-67.
BRASIL, Ministério da Pesca e Aqüicultura. Plano mais pesca e aqüicultura Pesca e aqüicultura.
Plano
de
desenvolvimento
sustentável.
2008.
Disponível
em
http://www.mpa.gov.br/mpa/seap/Jonathan/mpa3/planos_e_politicas/docs/politica_territorial.pdf
Consultado em:20/10/2008.
BRASIL. Decreto-Lei nº 221, de 28 de fevereiro de 1967. Dispõe sobre a proteção e estímulo à pesca
e dá outras providências. Disponível em: [Legislação/Decretos-Leis]. Disponível em:
<http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto-lei/Del0221.htm>. Acesso em: 23 fev. 2010.
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Reflexões sobre a comercialização da pesca artesanal no Brasil. 1