O plano do Brasil para salvar a Floresta Amazônia
Rhett A. Butler, mongabay.com
Traduzido por Marcela V.M. Mendes
February 17, 2010
Responsável por metade do desflorestamento tropical entre 2000 e 2005, o Brasil é o
fornecedor mais importante quando se trata do desenvolvimento de uma estrutura
climática que inclui as emissões reduzidas advindas do desflorestamento e degradação
das florestas (REDD). Mas a posição do Brasil sobre o REDD contrasta com as
propostas colocadas por outros países tropicais, incluindo a Coalition for Rainforest
Nations, um bloco de negociação de 15 países. Ao invés de defender uma abordagem
de Mercado para o REDD, onde os créditos gerados a partir da conservação florestal
seriam tratados entre os países, o Brasil está pedindo um gigante fundo de
financiamento com doações das nações industrializadas. Os que contribuíssem não
estariam elegíveis para os créditos de carbono que poderiam ser usados para atender
a os obrigações de redução de emissões sob o tratado climático vigente.
A atual postura do Brasil é compreensível—o
país é hesitante em assinar um acordo que iria
potencialmente comprometer seu crescimento
para se tornar uma super economia global. Além
do mais, como outras economias emergentes, o
Brasil sente que por causa da mudança climática
ser um problema criado pelos países ricos, o
resultado de 150 anos de emissões, a
responsabilidade é em maior parte deles, de
identificar o problema. Em outras palavras, o
Brasil não está desejoso de deixar os maiores
poluidores da história—os Estados Unidos e
Europa—fora do contexto sem reduzir suas
próprias emissões.
"O Brasil não está interessado em dar aos países
industrializados créditos de carbono baratos
advindos da proteção da Amazônia se eles não
vão parar de construir usinas de carvão," disse
William Boyd, professor de direito da
Universidade de Colorado que tem trabalhado
extensivamente nas questões políticas do
REDD.
O conceito de REDD é simples: as florestas tropicais
armazenam cerca de 25 por cento do carbono
terrestre do planeta, mais de 300 bilhões de
toneladas. Quando as florestas são cortadas—sua
vegetação é queimada e sua Madeira convertida em
produtos—muito do seu carbono é liberado na
atmosfera como dióxido de carbono. O desmatamento
de 50.000 milhas quadradas de floresta tropical
anualmente é responsável por aproximadamente 20
por cento das emissões globais advindas das
atividades humanas—uma parcela maior que a de
todos os aviões, navios, carros e caminhões do
planeta juntos. Em outras palavras, apesar da
atenção dada á auto-suficiência de combustível dos
carros e o numero de vôos que as celebridades
pegam, estacionando todos os jets e carros do mundo
ainda não seriam suficientes para compensar as
emissões anuais do desflorestamento global.
No entanto o Brasil está bem consciente dos
impactos projetados da mudança climática. Os
cientistas esperam que a mudança climática
aumente o nível de chuvas no coração da
Amazônia, agravando o risco de enchentes.
Paradoxalmente, o sul irá sofrer com aumentada
incidência da seca, que poderia devastar sua
agricultura, e minar sua auto-suficiência em
Mas reduzir o desflorestamento não é um esforço
energia (bicombustíveis e poder hidrelétrico), e
simples. As florestas estão sendo destruídas como
tornar vastas áreas de floresta tropical e savana
uma conseqüência das forças da economia global—a
demanda por madeira, polpa, carne, soja e palmeira
em um barril de pólvora. O Brasil já provou o
de óleo—bem como a agricultura de subsistência.
Reduzir ou eliminar o desflorestamento significa
gostinho deste futuro. Uma severa seca em
identificar esses condutores ao tornar as florestas
2005—provocada por temperaturas acima do
valiosas como entidades vivas, ao invés de valer
somente pelo que pode ser produzido quando elas
normal no Atlântico Tropical—causou muitos
são desmatadas. E a questão vai muito além da
incêndios, reduzido fornecimento de eletricidade
economia. Boa governança, incluindo reforço da lei,
reconhecimento do direito ás terras, e justa
das usinas hidrelétricas, e transformaram rios em
distribuição dos benefícios, é a questão que exaltará
ou prejudicará o REDD.
lagoas lamacentas, isolando comunidades e
paralisando o comercio sediado nos rios.
Enquanto isso, mês passado, os registros das enchentes mataram centenas e
deixaram mais de 500 mil sem abrigo.
Reconhecendo essas ameaças á sua economia e antecipando algumas formas de
acordos climáticos nos anos por vir, o Brasil anunciou ano passado um plano para
reduzir o desflorestamento em 70 por cento baseado em 1996-2005, um movimento
que cortaria emissões do desflorestamento—fonte de quase 80 por cento das emissões
do país—em 4.8 bilhões de toneladas entre 2006 e 2017, uma quantidade maior que as
emissões anuais do Canadá e da União Européia juntos. Para pagar o programa, o
Presidente Luiz Inácio Lula da Silva criou o Fundo Amazônico, que ele quer financiar
em torno de $21 bilhões através de doações dos países industrializados, individuais e
empresas privadas. Mas sob o esquema atual, o esquema seria algo semelhante á
ajuda ao desenvolvimento ao invés de um Mercado com compensações de carbono.
Alvos propostos do Brasil para reduzir o desflorestamento:
2006-2009 11,400 sq. km por ano (2006-2008 média 12,500)
2010-2013, 7,980 sq. km por ano
2014-2017, 5,586 sq. km por ano
Mas os detalhes de como o Fundo Amazônico irá de fato reduzir o desflorestamento é
algo abstrato, o governo da Noruega já concordou em doar até $1 bilhão—dependendo
do sucesso do Brasil na redução do desflorestamento. Mas até então nenhum outro
país colocou dinheiro no Fundo.
Brenda Brito, diretora executiva da Imazon, um Instituto de Pesquisa brasileiro, que
está esboçando uma resolução para o Fórum da Amazônia Sustentável para
apresentar nas próximas negociações climáticas, sugere que as doações podem não
estar próximas, porque os países estão esperando para ver o que acontece nas
próximas negociações climáticas das Nações Unidas em Copenhagen no mês de
Dezembro.
"Eu acho que o fundo é uma boa iniciativa para demonstrar que é possível ter um
mecanismo nacional de controle para concentrar recursos internacionais para o REDD,
mas ao mesmo tempo não está claro se o fundo será compatível com um possível
regime do REDD a ser criado em Copenhagen," disse ela a mongabay.com. "Por
exemplo, se houver uma decisão para criar um fundo internacional para o REDD, os
outros países ainda iriam fazer doações para o Fundo Amazônico? Eu acho que tal
incerteza pode estar afetando outras possíveis doações para o fundo e que as
decisões em Dezembro serão fundamentais para determinar o futuro do Fundo
Amazônico quanto ao ―desejo
dos países de se fazer
doações."
Outros são céticos de que uma
abordagem baseada num fundo
irá gerar dinheiro suficiente
(estimado em $15-40 bilhões
por ano) para prover incentivos
para efetivamente reduzir o
desflorestamento em uma
escala global. Depois de tudo,
os retornos da conservação de
carbono terão que competir com
os condutores do
desflorestamento incluindo a
criação de gado, agricultura
industrial, atividade madeireira e
plantações florestais.
Sergio Abranches, um jornalista
ambiental brasileiro e
comentador de radio, sugere
uma terceira possibilidade para
a falta de apoio: preocupações
sobre a responsabilidade e
governança. Há questões sobre
se um esquema para reduzir o
desflorestamento pode ser
Na ultima década mais de 10 milhões de hectares – uma área do tamanho da Islândia – foi
implantado pelo Banco Nacional
desmatada para pastagens de gado conforme o Brasil se tornou o maior exportador de
carne do mundo. Agora o governo visa dobrar suas exportações no Mercado da carne para
de Desenvolvimento do Brasil,
60% até 2018 através de empréstimos com baixas parcelas, expansão da infra-estrutura, e
BNDES, que é conhecido por
outros incentivos para os produtores. A maior parte desta expansão é esperada ocorrer na
Amazônia onde a terra é barata e disponível. 70 por cento da expansão do gado no país
financiar projetos que tem
entre 2002 e 2006 ocorreram na região.
levado ao desmatamento
florestal do que pela proteção ambiental. Alguns observadores questionam se o Brasil
pode realmente controlar o desflorestamento, notando que o recente desflorestamento
na Amazônia brasileira reflete muito mais nas tendências econômicas do que o reforço
do governo.
Há também preocupações com o fato de se o Brasil usará o Fundo Amazônico para
bloquear outras, mais eficientes, propostas de conservação ambiental.
"O fundo também será usado pelo Governo Brasileiro para se opor a propostas
melhores estruturadas do REDD," Abranches disse a mongabay.com. "Não há modelo
algum por trás dele, ele está sendo estruturado no ar. Não há políticas claras quanto ao
uso do dinheiro que ele arrecadaria."
"Eu tenho medo de que isso beneficiará empresas e projetos que pouco estão
relacionados á conservação florestal e uso sustentável, em detrimento de comunidades
locais e investimento em ciência e tecnologia para desenvolver um novo e avançado
modelo econômico para a Amazônia. Poderia, por exemplo, financiar criadores e
exportadores de gado (os mesmo que aparecem em Análise recente do Greenpeace
sobre criação de gado e desflorestamento) a melhorar suas atividades, ao invés de
financiar empreendimento econômicos alternativos que poderiam se tornar uma
alternativa á criação de gado na Amazônia."
"Se o governo Brasileiro continuar a se opor á inclusão de florestas/REDD ao acordo
climático é muito provável que as mais importantes organizações ambientais,
representantes corporativos engajados e diversas autoridades da Amazônia
venham publicamente se opor á posição do governo."
Contudo o comprometimento do Brasil em reduzir o desflorestamento é monumental
com credibilidade nacional e
somas substanciais de dinheiro
ligadas ao projeto.
Stephan Schwartzman, codiretor do Programa
Internacional do Fundo de
Defesa Ambiental que ajudou o
conceito pioneiro das bases
nacionais (essencialmente
emissões) para o REDD sob
uma estrutura climática, diz que
é importante colocar em
contexto os desafios do Brasil.
A Indústria é agora a maior condutora do desflorestamento, maior do que as atividades de
"A razão pela qual Lula estava
subsistência.
disposto a ficar de pé em frente
á comunidade internacional e se comprometer a reduzir o desmatamento nacional do
Brasil em 70 por cento na próxima década é que ele acredita mesmo que o Brasil pode
reduzir sua taxa de desflorestamento. Ele e o Ministro do Meio Ambiente Carlos Minc
têm motivos reais para crer nisso. O governo criou uma área de novas áreas protegidas
do tamanho da França em cinco anos, entre 2003 e 2008, bem no meio da fronteira de
expansão agrícola—não nas regiões de fim do mundo onde ninguém se importa com a
terra."
"O Fundo Amazônico é um passo importante e inovador. É a primeira vez que um
grande país tropical estabelece esse tipo de mecanismo para tentar criar meios para
compensar uma rede toda de atores que terão de beneficiar o mecanismo se um
programa de nível nacional para reduzir o desflorestamento for estabelecido. Eu acho
que podemos esperar um projeto onde não haverá falhas. Se você olhar para a
situação de uma perspectiva histórica – tem havido muitas fronteiras agrícolas no curso
da história deste planeta. Todo o Oeste Europeu foi um dia uma floresta. Todo o leste
dos Estados Unidos foi floresta nativa um dia. Nunca houve um exemplo de iniciativa
de uma nação para regular e controlar os efeitos ecológicos e ambientais da expansão
da fronteira. Este é um território novo—não tem receita pronta para isto. As pessoas
que estão preocupadas com o Fundo Amazônico precisam ajudá-lo a cumprir o que ele
promete."
Ainda assim, dentro do Brasil
não há nenhum debate em vigor
sobre a proposta, especialmente
entre o governo federal e os
governos dos estados. O estado
do Amazonas—abrigo para
mais de 1.57 milhões de
quilômetros quadrados de
floresta úmida, uma área maior
que a Mongólia ou estado do
Alaska—está bem á frente do
resto do Brasil quando se trata
do desenvolvimento de projetos
Desde 2003 o Brasil estabeleceu 523.592 quilômetros quadrados de áreas protegidas,
de carbono e o estado quer ser
sendo responsável por 74 por cento do total de terra protegida do mundo durante o
pago diretamente, via
período.
mecanismos de mercado, por
seu esforço. O estado do Amazonas teme que o dinheiro dirigido ao governo central
em Brasília seja desviado pela burocracia, reduzindo a viabilidade dos programas
inovadores de financiamento de carbono. Estes projetos estão consagrados no Projeto
da Reserva Juma de Desenvolvimento Sustentável e pagamentos da Bolsa Floresta
para os serviços da iniciativa do ecossistema, que compensam as populações rurais
para usar a sustentabilidade das florestas. Juma, o primeiro projeto de carbono florestal
no mundo a se ater ao Padrão Ouro da Aliança do Clima, Comunidade e
Biodiversidade (um padrão de certificação) para sua salvaguarda, está pagando a
6.000 famílias que voluntariamente concordam a limitar o desmatamento da floresta. O
projeto elevou a renda per capita em 30 por cento entre os membros e é esperado
reduzir emissões numa área florestal, que poderia de outra forma ser desflorestada em
190 milhões de toneladas de dióxido de carbono até 2050.
Virgilio Viana, Secretário de
Meio Ambiente do Amazonas
que ajudou a projetar e
implementar o programa Bolsa
Floresta, argumenta que as
abordagens em nível de projeto
ou sub-nacional são atualmente
mais apropriadas para a
compensação do mercado
direto do que um fundo
nacional. Por exemplo, a Bolsa
Floresta e Juma tem recebidos
financiamento do setor privado:
Floresta Úmida e soja na Amazônia Brasileira
Bradesco, um banco Brasileiro;
a cadeia de hotéis Marriott, que
solicita contribuições dos hóspedes; e outras empresas. Viana acredita que
diferentemente dos outros estados, os projetos do Estado do Amazonas estão prontos
para os mecanismos do Mercado agora.
Essas preocupações em nível de projeto versus nível nacional são compartilhadas
entre comunidades indígenas que estão explorando as possibilidades do REDD. Os
grupos indígenas estão também preocupados que devido ao fato de eles terem
historicamente servido como guardiões das florestas—as taxas de desflorestamento
nos territórios indígenas são mais baixas do que nos parques e áreas não protegidas—
eles não sejam qualificados para os pagamentos do REDD, que recompensam as
atividades que reduzem o relativo desmatamento florestal á uma base do
desflorestamento passado.
"O REDD deveria chegar ao
reconhecimento de que os
povos indígenas tem mantido o
estado de suas florestas, e não
penalizá-los por esta
administração,‖ disse Vasco van
Roosmalen, diretor da Equipe
Brasil de Conservação da
Amazônia, uma ONG que tem
ajudado a tribo a desenvolver
um projeto de carbono no
estado do Acre.
As taxas de desflorestamento tropical de 2000-2005, elencadas em ordem descendente
pela mais alta quantidade de perda anual florestal para 25 países baseados nas
Os direitos á terra são uma
informações da Organização de Alimentos e Agricultura das Nações Unidas (FAO).
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questão. Enquanto vastas áreas
têm sido demarcadas para uso indígena, esses grupos não têm titulo legal da terra, que
ainda pertence ao governo. Mas uma recente analise da lei Brasileira e precedente
legal por Baker McKenzie concluiu que os povos indígenas tem direitos aos
pagamentos do carbono florestal em seus territórios, abrindo as portas para os projetos
indígenas de carbono. Alguns temem que o prospecto dos pagamentos de carbono
aumentará a especulação de terra, levando a maiores conflitos na floresta.
Paulo Moutinho, um especialista em política florestal do Instituto de Pesquisa Ambiental
da Amazônia (IPAM), uma ONG Brasileira, diz que estruturar o Fundo da Amazônia
sob os corretos princípios que garantem a igual distribuição de benefícios entre os mais
importantes acionistas será a chave para identificar algumas dessas preocupações e
tornar o Fundo um meio efetivo para a redução do desflorestamento.
"Ha muitos desafios envolvendo o Fundo, mas ele foi construído com uma grande
participação da sociedade Brasileira," Moutinho contou a mongabay. "Cada setor desta
sociedade agora está representada pelo comitê organizacional do Fundo."
Moutinho ainda acredita que o Fundo precisará estar aberto para algumas formas de
Mercado de carbono para ser efetivo.
Consensus building
O estado do Amazonas parece
estar se acostumando com a
idéia de que precisam deixar de
lado as diferenças para formar
um consenso sobre como
implementar e financiar
atividades para reduzir o
desflorestamento. Em Abril,
governadores dos maiores
estados da Amazônia assinaram
a Declaração Cuiabá, que os
compromete com a formação de
um consenso até a conferência climática em Copenhagen. Os estados têm uma
posição de força—juntos eles são responsáveis por mais de um terço do
desflorestamento tropical.
Mas enquanto o Brasil apresentará uma frente unificada em Copenhagen, é improvável
que sua insistência em um mecanismo somente baseado em financiamento seja
estabelecido sobre o nada. O país esta bem consciente de que um sistema baseado no
Mercado pode ser a forma mais lucrativa para ele capitalizar o valor potencial de seus
vastos recursos naturais incluindo carbono florestal, água e biodiversidade.
Consultancy McKinsey & Co. estima que sob um cenário relativamente conservador o
Brasil pode angariar 30 bilhões por ano em pagamentos por serviços do ecossistema
até 2030 tornando-se a "Arábia Saudita dos serviços de ecossistemas."
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