EFEITO DAS CONDIÇÕES DE TRATAMENTO TÉRMICO NA
MICROESTRUTURA E PROPRIEDADES MECÂNICAS DE AÇOS
FERRAMENTA
Rafael Agnelli Mesquita (1)
Daniel Rodrigo Leiva (2)
Celso Antonio Barbosa (3)
Os aços ferramenta são principalmente empregados em moldes, matrizes ou outras
ferramentas na conformação de materiais metálicos, em alta ou baixa temperatura, bem
como na conformação de polímeros e materiais cerâmicos. Em todas essas aplicações,
o tratamento térmico é fundamental para que as propriedades finais sejam obtidas e o
desempenho esperado atingido. Portanto, o presente trabalho avalia diversas
condições de tratamento térmico em dois aços ferramentas típicos: o aço VH13ISO®,
para ferramentas de trabalho a quente, e o aço VF800AT®, para trabalho a frio. As
condições de tratamento térmico são simuladas e as propriedades mecânicas,
especialmente a tenacidade, são medidas e correlacionadas com a microestrutura. Os
resultados evidenciam a dependência significativa de tais propriedades das condições
de tratamento térmico, mostrando que a dureza obtida não é condição suficiente para o
bom desempenho da ferramenta.
Palavras-chave: aço ferramenta, tratamento térmico, tenacidade, desempenho.
(1)
Engenheiro de Materiais, Mestre em Ciência e Engenharia de Materiais, Pesquisador da Villares Metals S. A.,
Sumaré, SP, Brasil, e-mail: [email protected].
(2)
Engenheiro de Materiais, Mestrando do Programa de Pós Graduação em Ciência e Engenharia de Materiais,
Universidade Federal de São Carlos, e-mail: [email protected].
(3)
Engenheiro Metalurgista, Gerente de Tecnologia da Villares Metals S. A., Sumaré, SP, Brasil, e-mail:
[email protected].
1. INTRODUÇÃO
Aços ferramenta podem ser definidos como ligas ferrosas, aplicadas como
moldes, matrizes, punções ou outras ferramentas em processos de conformação de
outros materiais, na temperatura ambiente ou em altas temperaturas. Aços ferramenta
são também empregados numa vasta variedade de outras aplicações, que necessitem
de propriedades como alta resistência mecânica, ao desgaste ou tenacidade. A
composição química desses materiais pode variar muito, desde aços baixa liga até aços
altamente ligados. Contudo, o que difere tal classe de materiais dos aços convencionais
são o processo de manufatura especial e a significativa modificação de propriedades
após os tratamentos térmicos [1]. Os tratamentos térmicos mais usuais são a têmpera e
revenimento, que propiciam dureza e propriedades mecânicas adequadas para maioria
das aplicações.
O presente trabalho está focado em dois aços ferramenta, VH13ISO e VF800AT.
O primeiro é aplicado em trabalho a quente e o segundo em trabalho a frio. O termo
ferramentas de trabalho a frio é aplicado para um grande número de ferramentas,
empregadas em trabalho e moldagem de metais em temperaturas abaixo de 200 ºC,
tipicamente na temperatura ambiente. A Indústria metal-mecânica é a principal
envolvida em conformação a frio, especialmente na conformação de aço. Por exemplo,
destacam-se operações de corte e conformação de chapas, como em processos de
estampagem, pentes e rolos laminadores de roscas, facas industriais para cortes por
cisalhamento, punções e matrizes para cunhagem e ferramentas para forjamento a frio.
Ferramentas de conformação a quente, por outro lado, são aplicadas em
processos em que o material conformado possui temperatura significativamente
superior à ambiente, tipicamente acima de 500 ºC. Tais ferramentas são empregas em
diversos ramos industriais, focadas na produção de peças destinadas a aplicações
mecânicas e, principalmente, peças automobilísticas. A variedade de processos
utilizados pode ser dividida basicamente em três operações básicas: ferramentas de
forjamento a quente e a morno, moldes e matrizes para fundição de ligas não ferrosas e
matrizes de extrusão de ligas não ferrosas.
O tratamento térmico possui muita importância nas propriedades e,
consequentemente, no desempenho dos aços ferramenta. Apesar disso, a grande
maioria das falhas prematuras de ferramentas são resultado de um tratamento térmico
incorreto1.
O presente trabalho, portanto, discute possíveis incorreções nos tratamentos
térmicos e seu efeito nas propriedades de dois aços ferramenta. O primeiro aço,
VH13ISO, é similar ao AISI H13, mas produzido com processos especiais de
manufatura para proporcionar melhoria na tenacidade e isotropia de propriedades [2]. O
segundo aço, denominado VF800AT, foi desenvolvido para aplicações que necessitem
de tenacidade superior aos aços convencionais [3], tipicamente AISI D2 e D6.
1
Estima-se que cerca de 70% das falhas prematuras de ferramentas tem como causa as falhas de tratamento
térmico.
2. O TRATAMENTO TÉRMICO DE FERRAMENTAS, MOLDES E MATRIZES
O tratamento térmico dos aços ferramenta apresenta muitas peculiaridades. Por
uma série de fatores, e não apenas fatores metalúrgicos, pode ser considerado muito
diferente do tratamento térmico de aços ao carbono ou baixa liga, por exemplo,
aplicados em peças seriadas. Primeiramente, pela alta dependência das propriedades
finais do material com o tratamento térmico aplicado. As condições de temperatura,
tempo e taxas de aquecimento e resfriamento, os equipamentos utilizados, enfim todo o
procedimento pode estar e, na maioria dos casos, estará fortemente relacionado ao
desempenho final da ferramenta. Segundo, pelo alto valor agregado das peças a
serem tratadas; neste caso, moldes e matrizes em que custos de usinagem e do próprio
aço já estão embutidos. Terceiro, por ser, normalmente, uma das etapas finais do
processo. Assim, se ocorridos problemas sérios, dificilmente será possível repor a
ferramenta tratada no prazo requisitado. Quarto, pelos moldes e matrizes não se
tratarem de ferramentas padronizadas. Conseqüentemente, os tempos de aquecimento
e a geometria, e os concentradores de tensão relacionados a ela, variam
constantemente. Quinto, pela faixa estreita de temperatura, tanto de austenitização e
revenimento, bem como pela a variação desta faixa entre os diversos tipos de aços
ferramenta aplicados.
Todas essas especificidades do tratamento térmico dos aços ferramenta,
portanto, podem levar a problemas/falhas do processo que, por conseqüência, podem
levar a um baixo rendimento da ferramenta. Em termos de falhas, é interessante dividilas em dois subgrupos. O primeiro, das falhas identificadas no próprio processo, como
trincas pequenas ou catastróficas, distorções, problemas superficiais (como
descarbonetação e oxidação), e outras falhas visivelmente observadas. Apesar de
graves, essas falhas em geral não comprometem a vida útil da ferramenta. Ou, pelo
menos, não geram resultados inesperados durante sua utilização, porque são
identificadas antes que a mesma entre em operação.
A segunda possibilidade de desvios no tratamento térmico, que será objeto do
estudo do presente trabalho, refere-se às condições de temperatura, tempo e taxas de
resfriamento empregadas. O controle de qualidade do tratamento térmico, na grande
maioria dos casos, é realizado apenas por medidas de dureza na superfície da
ferramenta. Isto porque, normalmente, tratam de peças únicas e de alto valor, não
havendo possibilidade para sua destruição e análise microestrutural e das propriedades
obtidas. Assim, uma vez estando correta a dureza, dificilmente serão identificados
possíveis desvios de tratamento térmico antes da ferramenta ser utilizada. E estes
apenas serão observados se uma menor vida útil da ferramenta for percebida, e se a
causa da falha puder ser definida com precisão.
3. TRATAMENTO TÉRMICO DOS AÇOS FERRAMENTA PARA TRABALHO A FRIO
3.1 Composições químicas e curvas de revenimento
Como primeira análise do tratamento térmico dos aços ferramenta, as curvas de
revenimento devem ser consideradas. Como será discutido a seguir, tais curvas já
permitem o entendimento de muitas das propriedades finais dos materiais, bem como
possíveis falhas no tratamento térmico. A Figura 1 apresenta, portanto, a curva de
revenimento dos aços ferramenta para trabalho a frio mais utilizados. A composição
química e as normas internacionais desses materiais são dadas na Tabela 1.
Tabela 1: Composição química típica de aços aplicados em trabalho a frio. Porcentagem em massa e
balaço em Fe. O sinal “~” nas similaridades indica que os materiais próximos, mas apresentam diferença
em alguns elementos. Os teores não indicados são de elementos residuais.
Aço
AISI
DIN
C
Si
Mn
Cr
Mo
W
V
Outros
VC131
D6
D2
O1
S1
~M2
M3:2
-
1.2436
1.2379
1.2510
1.2542
1.3343
~1.3344
-
2,10
1,50
0,85
0,95
0,45
0,89
1,28
1,28
0,3
0,3
1,0
0,3
1,0
0,4
0,4
0,4
0,3
0,3
0,3
1,3
0,3
0,3
0,3
0,3
11,5
12,0
8,5
0,5
1,4
4,2
4,2
4,2
1,0
2,1
0,2
5,0
5,0
5,0
0,7
0,5
2,0
6,1
6,3
6,3
0,2
0,9
0,5
0,1
0,2
1,9
3,0
3,0
Nb= 0,15
-
VD2
VF800AT
VND
VW3
VWM2
Sinter 23*
Sinter 30*
Co= 8,4
*Obtidos por metalurgia do pó
Primeiramente, as curvas da Figura 1 mostram porque os aços são normalmente
empregados em trabalho a frio. Os aços VC131, VD2 e VND promovem alta dureza em
baixa temperatura, porém esta dureza não é estável em altas temperaturas. Assim, se
tais materiais fossem empregados em processos com aquecimento acima de 500 ºC2, a
ferramenta perderia dureza rapidamente, causando falha prematura. Os aços rápidos,
por outro lado, possuem alta dureza se revenidos em altas temperaturas, propriedade
fundamental para sua aplicação em ferramentas de corte.
A curva do aço VWM2 é apenas representativa, pois as condições de tratamento
térmico são normalmente especificadas em função da temperatura de austenitização,
como mostram as curvas da Figura 2, e não de revenimento. Por exemplo, para
durezas de 60 a 62 HRC no aço VWM2 é mais adequado empregar austenitização a
1130ºC, fixando o revenimento a 560ºC, ao invés de austenitização a 1220 ºC e
revenimento a 620ºC. Isto porque a primeira condição conduz a uma matriz
microestrutural mais tenaz [4].
2
Para o aço VF800AT o revenimento em alta temperatura é possível e recomendado, principalmente para melhoria
da tenacidade, como será mostrado no item 3.2.
68
VWM2
66
64
Dureza (HRC)
62
60
VF800AT
58
56
VD2
54
VND
52
50
VW3
48
VC131
46
44
50
100
150
200
250
300
350
400
450
500
550
600
650
Temperatura de Revenimento (°C)
Dureza após revenimento a 560 ºC
(HRC)
Figura 1: Curvas de revenimento para os aços VW3, VND, VC131, VD2, VF800AT e VWM2. Os dados
referem-se a corpos de prova temperados em óleo e duplo revenimento. As temperaturas de
austenitização são as típicas para cada aço: 920 ºC para o VW3, 800 ºC para o VND, 940 ºC para o
VC131, 1010 ºC para o VD2, 1030 ºC para o VF800AT e 1200 ºC para o VWM2.
68
Sinter 30
66
64
Sinter 23
VWM2
62
60
58
1060
1080
1100
1120
1140
1160
1180
1200
1220
Temperatura de Austenitização
Figura 2: Dureza após revenimento a 560ºC em função da temperatura de austenitização para os aços
VWM2, Sinter 23 e Sinter 30. Revenimento duplo para o VWM2 e triplo para os aços Sinter 23 e Sinter
30.
As várias curvas da Figura 1 referem-se à austenitização nas temperaturas
usuais de cada material, as quais são muito variadas. Por exemplo, o aço VND, por ser
baixa liga, é austenitizado a 800ºC. Para este aço, temperaturas superiores causariam
demasiado crescimento de grão austenítico, sem ganhos em outras propriedades. O
aço VWM2, por outro lado, é temperado de 1200 ºC para dureza de 64 a 66 HRC, pois
altas temperaturas são necessárias para proporcionar adequada dissolução de
carbonetos. Os carbonetos também atuam como barreira ao crescimento de grão,
evitando perda excessiva de tenacidade e tornando possível o emprego de tais
temperaturas de austenitização.
3.2 Análise de várias condições de tratamento térmico no aço VF800AT
O item anterior mostrou que cada material tem uma condição distinta de
tratamento térmico, que inclui temperatura e tempo de austenitização, meio de
resfriamento na têmpera e condições de revenimento, como temperatura, tempo e
número de revenimentos aplicados. O uso de condições inadequadas normalmente
incorre em perda de propriedades mecânicas e, assim, em falha prematura da
ferramenta.
Um exemplo disto foi simulado para o aço VF800AT, com tratamento térmico em
laboratório. O material foi tratado em várias condições, uma correta e as demais
incorretas, e a resistência em flexão foi avaliada. Para todas, a dureza foi mantida a 60
HRC. A condição A refere-se ao material tratado corretamente, com têmpera de 1030ºC
e revenimento duplo a 530 ºC. As outras, a tratamentos incorretos, mas que seriam
corretos para outros materiais. A Figura 3 mostra tais resultados.
A condição B caracteriza uma condição de tratamento duplamente incorreta, em
que tanto a temperatura de austenitização quanto a temperatura de revenimento foram
inadequadas. Em relação ao tratamento correto, existe perda em 25% de tensão de
resistência à flexão e menor energia para ruptura, indicando menor tenacidade. A
condição B é próxima da aplicada no tratamento térmico do aço VC131, muito difundido
nas aplicações de trabalho a frio.
A condição C, por outro lado, possui a temperatura de austenitização correta,
porém o revenimento foi aplicado em baixa temperatura. Tal procedimento é típico para
o aço VD2, que possui temperatura de austenitização superior ao VC131, mas é
revenido em baixa temperatura, porque o pico secundário não é suficientemente
intenso para promover a dureza de 60 HRC. Neste caso, também se observa perda de
resistência e tenacidade.
A quarta condição, identificação D, é típica para tratamento térmico de aços
rápidos – austenitização em temperatura muito elevada e revenimento acima de 550 ºC.
Neste caso, a perda em tenacidade foi ainda mais expressiva.
O entendimento das propriedades mecânicas acima pode ser feito com base nas
microestruturas obtidas em cada condição (Figura 4). Na primeira condição, correta (A),
observam-se uma microestrutura com matriz martensítica e carbonetos primários não
dissolvidos. No aumento apresentado, a identificação dos contornos de grão
austeníticos não é clara, pois estes são finos, devido à temperatura de austenitização
ter sido adequada. Ainda, é observada uma matriz escurecida pelo ataque
metalográfico. Esta condição da matriz resulta do revenimento em alta temperatura,
com precipitação carbonetos secundários, retirando elementos de liga da matriz e
proporcionando maior susceptibilidade ao ataque. As propriedades mecânicas, neste
caso, são superiores porque as tensões da matriz, geradas na transformação
martensítica, são aliviadas; a dureza é promovida por precipitação secundária,
melhorando propriedades mecânicas.
Na condição B, verifica-se que a têmpera e revenimento em baixa temperatura
são capazes de promover adequada dureza. Contudo, a microestrutura praticamente
constitui-se de martensita bruta, ou seja, não revenida. Em tal condição, as tensões na
matriz microestrutural são muito elevadas, reduzindo a resistência do material e a
tenacidade.
A condição C é ligeiramente melhor, em termos de propriedades mecânicas, que
a condição B. Contudo, o fato de ainda empregar revenimento em baixa temperatura,
promove tenacidade melhor que no tratamento correto (condição A). A microestrutura
ainda apresenta-se pouco revenida, fato salientado pela alta resistência do material ao
ataque metalográfico, gerando assim baixa tenacidade.
Tensão
4000
Energia
3000
25
20
15
2000
10
1000
A
B
C
D
0
Energia para Ruptura (J)
Tensão de Ruptura em Flexão (MPa)
30
5
0
Correta: TP 1030ºC Incorreta: TP 970ºC Incorreta: TP1030ºC Incorreta: TP 1150ºC
2 RV 540ºC
2 RV 100ºC
2 RV 180ºC
2 RV 570ºC
Figura 3: Resistência em flexão e energia para ruptura, para o aço VF800AT tratado para diversas
condições, todas com 60 HRC. A condição A é a correta, com têmpera de 1030 ºC e revenimento duplo a
540 ºC. A condição B é incorreta pela aplicação de austenitização em baixa temperatura (970 ºC) e
revenimento em baixa temperatura (100 ºC). A condição C é também incorreta, com austenitização em
temperatura adequada (1030 ºC), porém revenimento em baixa temperatura (180 ºC). Na condição D a
temperatura de austenitização foi excessivamente alta, 1150 ºC, com revenimento a 570 ºC, ajustando a
dureza para 60 HRC. Resultados obtidos no ensaio de flexão a 4 pontos, com corpos de prova de 5 x 7
mm2 de secção.
Na condição D, por outro lado, a matriz microestrutural é mais atacada pelo
reagente metalográfica. Contudo, a tenacidade obtida é muito baixa, porque neste caso
o fator negativo refere-se à temperatura de austenitização muito elevada (típica de aços
rápidos). Nestas condições, existe demasiado crescimento de grão pois, ao contrário
dos aços rápidos, o VF800AT não possui projeto de liga para suportar temperaturas de
austenitização tão elevadas. A martensita formada no resfriamento é,
conseqüentemente, grosseira e as propriedades são reduzidas.
a) condição A
c) condição C
b) condição B
d) condição D
Figura 4: Microestruturas do aço VF800AT, resultantes dos tratamentos térmicos nas condições A a D,
descritas na Figura 3. Aumento 350x, ataque Villela, por 10s.
4. TRATAMENTO TÉRMICO DOS AÇOS FERRAMENTA PARA TRABALHO A
QUENTE
4.1 Composições químicas e curvas de revenimento
O tratamento térmico de ferramentas para trabalho a quente, na maioria das
vezes, é mais crítico que das ferramentas de trabalho a frio. As ferramentas de trabalho
a quente possuem, usualmente, maiores dimensões e maiores custos de usinagem
embutidos. Ainda, são normalmente empregadas em aplicações mais críticas, como,
por exemplo, as ferramentas de fundição sob pressão. Apesar de também existirem
aplicações críticas em trabalho a frio, como facas industriais e
matrizes de
estampagem, tais ferramentas dificilmente atingem mais de 500 kg.
Como discutido no anterior, é interessante primeiramente discutir as curvas de
revenimento dos aços mais usuais para trabalho a quente (Figura 5). As composições
químicas são apresentadas na Tabela 2.
Dureza (HRC)
60
58
56
54
52
50
48
46
44
42
40
38
36
34
32
30
VH13 ISO
VW9
TENAX 300
VHSUPER
VMO
400
450
500
550
600
650
Temperatura de Revenimento (°C)
Figura 5: Curvas de revenimento para os aços VMO, VH13ISO, TENAX 300, VHSUPER e VW9. Os
dados referem-se a corpos de prova temperados em óleo e duplo revenimento. As temperaturas de
austenitização são as típicas para cada aço: 900 ºC para o VMO, 1020 ºC para os aços VH13 ISO,
TENAX 300 e VHSUPER e 1100 ºC para o VW9.
Para aplicações em trabalho a quente são empregadas durezas inferiores às de
trabalho a frio. Normalmente, as durezas variam entre 40 e 50 HRC. Assim, observa-se
na Figura 5 que, para tais durezas, todos os materiais devem ser revenidos em alta
temperatura. Obviamente, isto é uma condição necessária para aplicações em trabalho
a quente, pois o material deve possuir estabilidade de propriedades nas temperaturas
de trabalho. E, assim, o revenimento realizado necessariamente deve ocorrer acima de
500 ºC.
Nas curvas, podem ser observadas algumas diferenças entre os materiais. Os
aços com maior teor de elementos de liga possuem queda em dureza menos intensa
em função do aumento da temperatura. Esta propriedade é denominada resistência ao
revenido e, aliada à tenacidade, constitui a principal propriedade desta classe de
materiais.
Tabela 2: Composição química típica de aços aplicados em trabalho a quente. Porcentagem em massa e
balaço em Fe. O sinal “~” nas similaridades indica que os materiais próximos, mas apresentam diferença
em alguns elementos. Os teores não indicados são de elementos residuais.
Aço
AISI
DIN
C
Si
Cr
Mo
W
V
Outros
VMO
~ 6F3
H13
H11
mod.
1.2714
~1.2344
0,57
0,40
1,0
1,1
5,2
0,50
1,5
-
0,1
0,9
Ni = 1,65
-
-
0,36
0,3
5,0
1,4
-
0,4
-
0,36
0,3
3,8
2,5
-
0,5
-
0,30
-
2,7
-
8,5
0,4
-
VH13 ISO
TENAX 300
VHSUPER
-
VW9
H21
1.2367
mod.
1.2581
Em geral, quanto mais ligado o material, maior a temperatura de austenitização.
Primeiramente, porque temperaturas superiores são necessárias para colocar todos os
elementos de liga em solução sólida, que na condição recozida (de fornecimento) estão
formando carbonetos secundários. A solubilização dos carbonetos é necessária para
que os elementos de liga, durante o revenimento ou durante o trabalho, promovam a
precipitação secundária, e a resistência a quente do material como conseqüência.
Segundo, porque quanto mais ligado o aço maior a quantidade de carbonetos finos, que
atuam como barreiras ao crescimento de grão e, assim, permitem a utilização de
maiores temperaturas de austenitização. Portanto, na Figura 5, as curvas apresentadas
referem-se às temperaturas de austenitização normais de cada material.
4.2 Análise de várias condições de tratamento térmico no aço VH13 ISO
Assim como no estudo anterior do aço VF800AT, várias condições de tratamento
térmico foram simuladas para o aço VH13 ISO, muito utilizado em ferramentas de
trabalho a quente. Foram simuladas as condições descritas abaixo e, para todas, a
dureza foi mantida entre 44 e 46 HRC. A propriedade mecânica avaliada foi a energia
de impacto sem entalhe, segundo recomendações da NADCA (North American Die
Casting Association) [5], porque este teste relaciona-se bem com o rendimento de
matrizes de trabalho a quente [2,7]. Os resultados são apresentados na Figura 6.
Condição E: tratamento térmico correto para o aço H13, com austenitização a
1020 ºC, resfriamento rápido durante a têmpera, e revenimento em alta temperatura –
610 ºC. Esta condição gera os maiores valores de tenacidade em impacto.
Condição F: temperatura de austenitização e revenimento baixas. Este
procedimento pode ser, erroneamente, aplicado quando utilizam-se fornos de baixa
temperatura.
Condição G: temperatura de austenitização demasiadamente elevada, e
revenimento ligeiramente mais alto que o usual, para ajustar a dureza para a faixa
necessária.
Condição H: temperatura de austenitização e revenimento normais, mas material
resfriado muito lentamente até a temperatura ambiente (cerca de 6 ºC/min). Tal
procedimento pode ser causado, por exemplo, devido à têmpera em meios de
resfriamento pouco agressivos, como têmpera ao ar.
Na Figura 7 são apresentadas as microestruturas características de cada
condição de tratamento térmico. Na Figura 7a, pode-se observar a microestrutura
normal do material, constituída de martensita revenida e carbonetos secundários
(condição E); isto gera o alto valor de tenacidade identificado – 350 J.
Na Figura 7b, condição F, a temperatura de austenitização demasiadamente
baixa não promoveu a total transformação da ferrita. A tenacidade é mais baixa que o
esperado (210 J). Além disso, a fim de obter a dureza requerida, este aço foi revenido
em baixa temperatura (200 ºC). Após exposição a 550 por 10h, tem-se o decaimento de
3 HRC de dureza, quando seria esperado apenas 0,5 HRC. Assim, a microestrutura,
além de mais frágil, causaria menor desempenho a quente, dada sua maior perda em
dureza.
Tenacidade em Impacto Sem Entalhe (J)
400
300
200
100
E
F
H
G
0
Correta: TP 1020ºC
2 RV 610ºC
Incorreta: TP 890ºC
2 RV 250ºC
Incorreta: TP 1150ºC
2 RV 630ºC
Incorreta:
Resfriamento lento
na têmpera
Figura 6: Energia de impacto sem entalhe, para ensaio conforme NADCA [5], para a aço VH13 ISO
tratado para diversas condições, todas com 45 HRC. Microestruturas representativas do aço H13, tratado
para dureza entre 44 e 46 HRC nas seguintes condições: a) condição correta, com austenitização a 1020
ºC, têmpera em óleo e revenimento duplo a 610 ºC, e perda em dureza de 0,5HRC , após exposição a
550 ºC por 10 h. b) condição incorreta, com austenitização a 890 ºC, têmpera em óleo e revenimento
duplo a 250 ºC, e perda em dureza de 3 HRC, após exposição a 550 ºC por 10 h. c) condição incorreta,
com austenitização a 1150 ºC, têmpera em óleo e revenimento duplo a 630 ºC. d) condição incorreta,
com austenitização a 1020 ºC, têmpera com resfriamento lento e revenimento duplo a 610 ºC.
A Figura 7c mostra a microestrutura típica de um aço austenitizado em
temperatura demasiadamente alta (condição G), evidenciando o elevado tamanho de
grão austenítico. O resultado tenacidade cai drasticamente, para 42 J, mostrando a
fragilização ocorrida. Assim como na condição D do aço VF800AT, a temperatura de
austenitização muito elevada promove a formação de martensita grosseira, e forte
redução na tenacidade.
Para a condição H (Fig. 7d), a microestrutura possui traços de perlita (escura nos
pontos triplos), mostrando uma condição errônea no resfriamento para a têmpera.
Novamente, verifica-se menor tenacidade. Além da formação de perlita, o resfriamento
demasiadamente lento proporciona fragilização dos contornos de grão, como será
mostrado no item a seguir.
a) condição E
b) condição F
c) condição G
d) condição H
Figura 7: Microestruturas do aço VH13 ISO, resultantes dos tratamentos térmicos nas condições E a H,
descritas na Figura 3. Aumento 1000x, ataque nital 4%.
4.3 Estudo de Caso – matriz de forjamento com falha prematura
Um caso prático de falha próximo à condição H, descrita anteriormente, foi
identificado em uma matriz de forjamento feita com aço VHSUPER. Neste caso, a
matriz apresentou vida muito inferior ao esperado. A falha ocorreu por trincas
catastróficas, mostradas na Figura 8.
A análise da dureza e composição química mostraram realmente se tratar do aço
em questão, tratado para a dureza correta. A microestrutura, contudo, mostrou forte
marcação dos contornos austeníticos (Ver Fig. 9a e 9b). Isto resulta de precipitação de
carbonetos secundários durante o resfriamento, devido a um resfriamento
demasiadamente lento durante a têmpera.
Para análise da tenacidade, foram retirados corpos de prova de impacto da
matriz fraturada. O resultado encontrado muito inferior ao esperado para o aço
VHSUPER. Obteve-se 50J de energia de impacto em corpos de prova sem entalhe,
usinados segundo as recomendações da NADCA, sendo esperado para o aço energia
superior a 250 J. A superfície de fratura, mostrada na Figura 9c, apresentou-se
predominantemente intergranular, evidenciando o efeito fragilizante dos carbonetos.
Figura 8: Matriz de forjamento trincada prematuramente. a) toda matriz e b) detalhe das regiões
trincadas.
a)
b)
c)
Figura 9: Microestrutura observada na matriz trincada. Em detalhe os grãos austeníticos marcados, a)
em baixo aumento, 100x, e b) em maior aumento, 350 x. c) fratura dos corpos de prova de impacto
retirados da matriz, obtida por microscopia eletrônica de varredura, elétrons secundários, 200x de
aumento.
Após este resultado, em uma amostra de material foi aplicado um recozimento e
nova têmpera e revenimento, para a mesma dureza, mas com resfriamento em óleo
durante a têmpera. A energia de impacto aumentou de 40 para 360 J.
5. CONSIDERAÇÕES FINAIS
Pelos exemplos anteriores, itens 3 e 4, fica claro que a dureza não representa
condição suficiente para um tratamento térmico adequado. Para se considerar um
tratamento adequado, a microestrutura e as propriedades mecânicas devem, também,
serem avaliadas.
Porém, em termos práticos, é extremamente complicado avaliar a microestrutura
e propriedades de um molde ou matriz, pois normalmente seria necessário destruir a
peça (para se observar a microestrutura do núcleo, por exemplo). Assim, tratamento
térmico adequado pode apenas ser garantido se todos os procedimentos (equipamento,
temperatura e tempo) forem rigorosamente respeitados.
6. CONCLUSÕES
-
As condições de tratamento térmico influem significativamente na microestrutura e
propriedades dos aços ferramenta. Desta maneira, também têm forte influência na
vida útil do molde, matriz ou da ferramenta empregada.
-
Tanto nos aços ferramenta para trabalho a frio quanto nos aços para trabalho a
quente, as condições de tratamento térmico variam de maneira intensa de aço para
aço.
-
Assim, as condições individuais de cada material, em termos de temperatura, tempo
e taxas de aquecimento e resfriamento, devem ser respeitadas para um adequado
desempenho da ferramenta.
-
Os estudos realizados em laboratório comprovaram a influência de condições
incorretas nas propriedades finais dos aços ferramenta. Confirmam, portanto, a
necessidade de se utilizar um procedimento correto, como forma de garantia de um
tratamento térmico adequado.
7. REFERÊNCIAS
[1] Tool Steels, Steel Products Manual, Iron and Steel Society, April 1988.
[2] MESQUITA, R. A. e BARBOSA, C. A. “Aços Ferramenta de Alto Desempenho para Matrizes de
Fundição sob Pressão”, Caderno tecnológico da revista Metalurgia & Materiais, vol. 59, n. 539, p.
17-22, Novembro de 2003.
[3] R. A. Mesquita, P. S. Andrijauskas e C. A. Barbosa. Desenvolvimento de Um Novo Aço para Trabalho
a Frio de Alta Tenacidade. Anais do 56º Congresso da ABM, p. 71, Belo Horizonte-MG, Brasil, 2001.
[4] L. W. Crane and A. P. Bigg. Fractures Toughness of High Speed Steels. Materials Science and
Technology, Vol. 6., p. 993-998, October 1990.
[5] NADCA no 207/90 – Premium Quality H13 Steel Acceptance Criteria for Pressure Die Casting, Ed.
North American Die Casting Association, November 1990.
[6] Wilmes, S. and Burns, K. P. Vergleich der Zähigkeit von Warmarbeitsstahl unterschiedlicher
Herstellverfahren im Hinblick auf die Verwendung für Druckgießformen, Giesserei, vol. 76, no. 24, p.
835-842, 1989.
EFFECT OF HEAT TREATING CONDITIONS ON THE
MICROSTRUCTURE AND MECHANICAL PROPERTIES OF TOOL
STEELS
Rafael Agnelli Mesquita (1)
Daniel Rodrigo Leiva (2)
Celso Antonio Barbosa (3)
Tool steels are mainly employed in molds, dies or other tools for metal forming, either in
low or high temperature, and for polymers processing and ceramic shaping as well. In all
these applications the heat treating is of fundamental importance for tools to attain for
the desired performance. Therefore, the present work analyze several heat treating
conditions on two tool steels: the VH13ISO® steel, for hot work tools, and the VF800AT®
steel, for cold work. The heat treating conditions are simulated in laboratory and
mechanical properties, specially the toughness, are determined and correlated with the
end microstructure. The results show the strong influence of the heat treating on such
properties, and that hardness is not a sufficient condition for an adequate tool
performance.
Key words: tool steels, heat treating, toughness, performance.
1)
Materials Engineer and Master Science in Materials Engineering, Researcher in Villares Metals S. A.,
Sumaré, SP, Brazil, e-mail: [email protected].
2)
3)
Post Graduate student in Materials Engineering course, Universidade Federal de São Carlos.
Metallurgical Engineer, Technology manager in Villares Metals S. A., Sumaré - SP, Brazil, e-mail:
[email protected].
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aos ferramenta com qualidade diferenciada para matrizes de