PRÁTICA ECOSÓFICA E CIDADANIA AMBIENTAL:
Desafios prementes para o século XXI.
Flávio Boaventura 1
Flávia Cristina Silva 2
Rúbia Rúbio 3
1. INTRODUÇÃO
O cenário do mundo contemporâneo encontra-se em pleno estado de fermentação das rápidas e sucessivas
mudanças na cultura, gerando tarefas inéditas para o pensamento. Fluidas, escorregadias e territorialmente
movediças, as tecnologias da informação diluíram as fórmulas engessadas da chamada cultura de massa,
propiciando o surgimento de um saber em constante transformação. Tudo hoje parece fazer parte de um
fluxo contínuo, sendo a mudança ininterrupta a única “coisa durável”. Nesse sentido, parece não convir
mais referir-se ao mundo (ou a qualquer objeto seu) como algo “já-dado”. Ao contrário, tudo está “sendo”,
“dando-se” em intercâmbios sucessivos e efêmeros: agenciamentos e dispositivos têm produzido novas
sínteses e potencializado novos procedimentos analíticos, ético-estéticos, político-econômicos. O “real”
tem se revelado aberto aos múltiplos cruzamentos de sentidos sociais, materiais, subjetivos. Ou seja,
vivemos num tempo de expansão das fronteiras do conhecimento – mas não apenas isso.
Caminhamos para uma identidade cada vez mais dinâmica e até certo ponto conflituosa, na medida em
que ela se insere num campo de forças conceituais, disciplinares e ideológicas a serem reinterpretadas4.
Por isso convém não perder de vista a redistribuição do campo do saber (para usar os termos de Foucault
em As palavras e as coisas), a presença progressiva do estatuto cultural em que se ergue um pensamento
vigorado pela ciência e pela técnica. Desse modo, cabe levar em consideração todo um aspecto produtivo
que envolve a razão crítica, pois é a partir dela que o pensamento vai descobrir a cultura como o modo
próprio e específico da existência dos seres humanos, tornando-se, assim, uma metaepistemologia do
universo discursivo das Ciências Humanas e daquelas que com elas se cruzam.
Isto posto, parece importante compreender que a ciência e a tecnologia atuais modificaram
fundamentalmente a maneira de pensar e de viver do homem contemporâneo, alterando, por conseguinte,
suas relações sociais e também sua relação com o meio ambiente. Entretanto, convém não esquecer a
nova concepção a respeito da técnica surgida a partir do final da Idade Média. Antes desvalorizada, ela
passou a ser o instrumento adequado para transformar o homem em “mestre” e “senhor” da natureza,
seja ao promover sua valorização, seja ao alterar determinada concepção de ciência, saber, conhecimento.
Em suma, se antes o saber era contemplativo, voltado para a compreensão “desinteressada” da realidade,
o novo homem buscará um saber ativo, capaz de atuar sobre o mundo, transformando-o. Essa nova
mentalidade permitirá o advento da ciência moderna, com Galileu, marcando definitivamente a relação
entre ciência e técnica.
Não custa lembrar, entretanto, que a técnica é um poder cujos desdobramentos nem sempre se manifestam
claramente no início do processo, por isso convém não desprezar a sabedoria daqueles que desejam
discutir sobre os fins a que ela se destina. Isso implica questionar se o saber técnico deve ser apenas
operacional, ou se ele também deve capacitar para refletir criticamente a respeito das questões que
envolvam a elaboração de projetos, bem como suas viabilidades. Um exemplo atual: hoje, a industrialização
não planejada tem transformado o mito do progresso no pesadelo da catástrofe ecológica (veja-se como
exemplo o aquecimento global, a extinção de várias espécies, a destruição do solo, as inundações etc.).
Nesse sentido, não custa lembrar que Rousseau, em pleno Iluminismo, já contrariava as expectativas
otimistas que a maioria depositava nas vantagens do mero desenvolvimento da técnica como fator gerador
de “progresso”, denunciando o avanço da desigualdade entre os homens. Essa questão culmina no século
XX, com a produção em linha de montagem: em nome de uma “nova organização” do trabalho, estabelecese uma disjunção entre concepção e execução, gerando conseqüentemente a figura do “técnico
especialista”, de “saber qualificado”, a quem sempre cabe a palavra final.
(Footnotes)
1
Orientador e Professor (CODACIS). IFMG – campus OP. E-mail: [email protected]
2
Bolsista (CNPq) e discente do curso de Geografia. IFMG – campus OP, E-mail: [email protected]
3
Bolsista (PIBIT) e discente do curso de Geografia. IFMG – campus OP. E-mail: [email protected]
4
Ao tratar do que chamou de “estratégias para o próximo milênio”, Peter Pál Pelbart comenta que a identidade contemporânea
deve ser pensada como subjetividade dinâmica (a ser construída pouco a pouco). Cf. Vida capital: ensaios de biopolítica, p. 217.
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Ou seja, vivemos hoje uma crise desses valores. O ideal do “progresso inexorável” é desmistificado
quando constatamos que o desenvolvimento da ciência e da técnica nem sempre vem acompanhado pelo
avanço do que haveria de potencial humano, pois a razão que serve para o desenvolvimento da técnica
possui caráter instrumental, sendo bem diferente da razão vital, por meio da qual o homem torna-se
capaz de compreender criticamente o mundo em que vive.
Enfim, o homem contemporâneo sabe o que fazer e como fazer, mas perdeu de vista o porquê fazer. Além
do mais, o fato de se achar saturado de informações inúmeras e complexas nem sempre tem capacitado
esse homem para reorganizá-las de forma crítica. Daí a importância efetiva do pensamento ecosófico,
que consiste na recuperação da razão vital como instrumento para resgatar o sentido humano do mundo.
Até porque, como mencionei acima, vivemos um tempo em que os saberes se reexaminam e se requalificam, fixando novas fronteiras, elaborando novos comportamentos. Estamos à procura de um novo
equilíbrio, ainda por ser construído.
2. METODOLOGIA
Diante dos grandes impasses ético-políticos colocados para um século XXI sustentável, deve-se levar em
consideração que as questões ambientais precisam ser pensadas em suas diversas matrizes (social,
política, científica etc.). Vale dizer, é cada vez mais necessário refletir criticamente, e de maneira
multidisciplinar, sobre a importância de se fomentar uma consciência ética que tenha o eco-desenvolvimento
como baliza para o exercício de uma cidadania plena. Nesse sentido, parece oportuno realizar uma
arqueologia crítica da postura científico-industrial moderna, sobretudo de seu modelo de racionalidade
instrumental adotado. Dessa maneira, esta pesquisa se norteará a partir das seguintes etapas:
a) Num primeiro momento, a investigação está se dando de natureza bibliográfica. Importante ressaltar
que, nesta etapa, será necessário fazer um amplo levantamento de textos teórico-críticos que
examinem as relações entre ética e meio ambiente, assim proporcionando uma melhor demarcação
da pesquisa proposta;
b) a partir dos resultados da primeira parte da pesquisa, conceitos de ecosofia serão trabalhados
junto a diferentes grupos de indivíduos, buscando levantar a percepção de cada um sobre questões
relacionadas à ética, ao meio ambiente e à sustentabilidade. Neste momento cada grupo poderá ser
trabalhado individualmente, de forma a checar quais são seus paradigmas em relação aos conceitos
estabelecidos. Em seguida, para demarcação das relações existentes entre as diferentes percepções,
o trabalho deverá confrontar as opiniões e aprofundá-las, de forma a permitir uma reflexão sólida em
torno dos conceitos elaborados;
c) nesta etapa, a pesquisa fomentará uma discussão nos grupos de análise e privilegiará dinâmicas
interativas entre os alunos e docentes envolvidos, participando coletivamente os conceitos de ciência,
homem, mundo num contexto relacional, criativo e dinâmico. Esse procedimento será de fundamental
importância para estimular uma visão plural sobre o tema em todos os participantes;
d) posteriormente, e uma vez identificadas a percepção individual (sobre os conceitos abordados) e
a percepção coletiva (a partir dos grupos de análise), serão levantadas práticas ético-ambientais,
propostas através de trabalhos individuais e em grupos. A partir dessas análises, as relações entre a
percepção (subjetiva) e a prática (objetiva) poderão ser estabelecidas, tanto do ponto de vista individual,
quanto do ponto de vista do comportamento coletivo;
e) para finalizar, e entrecruzando as ações acima mencionadas, será de fundamental importância
apresentar para a comunidade (acadêmica e entorno) os resultados da pesquisa, que podem ser
disponibilizados de diferentes maneiras: publicação de artigos e/ou livro, realização de seminário,
colóquio, congresso, produção e exibição de documentário, ou ainda ações sociais como oficinas de
reciclagem e conscientização ambiental, stands, feira cultural, feira de ciência e tecnologia, entre
outras possibilidades.
3. RESULTADOS PARCIAIS
Nesse sentido, essa pesquisa iniciou-se com uma revisão bibliográfica acerca do assunto, que continuará
sendo uma constância ao longo de toda a pesquisa. Documentários, filmes, e outros tipos de textos,
senão livros, também foram concebidos como arcabouço teórico-criativo para essa pesquisa. Maneiras
de analisar essa postura ecosófica foram pensadas, repensadas e continuarão, claro, e sempre, a fazer
parte das reflexões oriundas na e da pesquisa. Encontros entre o orientador e as bolsistas foram providos
semanalmente, na tentativa de nortear as leituras, as reflexões e, em breve, também nossas ações.
Encontros esses que também geraram inúmeros questionamentos e o desfecho de olharmos para nós
mesmos à procura de explicações; revisitando, por isso, nossa própria interioridade.
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4. DISCUSSÃO
Em um cenário de mudanças as mais diversas, este projeto de pesquisa visa sublinhar a importância de
uma reestruturação dos modos de ser do homem contemporâneo, destacando a proposta de Félix Guattari
(estabelecida em sua obra As três ecologias) para pensar o grande desafio ecológico atual, que exige
profundas mudanças de mentalidade e práticas consideradas sob o prisma de uma sustentabilidade stricto
sensu. Manifestando indignação perante a rápida devastação do planeta provocada pelos atuais padrões
insustentáveis de consumo, o filósofo francês Félix Guattari (1990) propõe condutas ecosóficas que levam
em conta três tipos simultâneos de ecologia: a do meio-ambiente, a das relações sociais e a da subjetividade
humana. Sua maneira de pensar parece vir muito a calhar nos dias atuais, sobretudo porque a crescente
transdisciplinaridade que envolve as questões ambientais emergentes implica uma nova heurística que
funcione não como um modelo perfeito e definitivo, mas como uma conexão permanente entre ensinopesquisa-extensão que esteja disposta a considerar a alteridade, o conflito e uma co-participação cidadã
na solução de problemas.
Guattari, nesse aspecto, chama a atenção para o fato de que o atual avanço técnico-científico não tem
sido necessariamente acompanhado por um progresso ético, social, político e até mesmo afetivo que
favoreça práticas autônomas e também coletivas (de acordo com ele, o individualismo contemporâneo só
tem gerado uma espécie de vazio da subjetividade). Por isso justifica-se o desafio atual de produzirmos
“novos modelos” de subjetividade, para atender a outra lógica, nascida da conexão entre várias disciplinas,
produzindo agenciamentos de valorização de um saber integral, multidisciplinar, ético-político, marcado
por um vitalismo e uma re-significação do que vem a ser crucial ao ser humano enquanto parte integrante
do meio ambiente. A esse respeito, Guattari sugere uma espécie de ampla consciência ambiental, qual
seja uma postura apta a extrair do campo do saber o potencial de tornar o homem múltiplo.
Trata-se de um fazer integral, no qual a heterogeneidade encontra o seu lugar, o eixo mais amplo para
compreender o que ele chamou de transversalidade: corte com a lógica binária, abertura para
agenciamentos incessantes e diversificados, que, através de seus vários componentes, possam extrair
sua consistência e ultrapassar fronteiras ontogenéticas, ensejando uma autopoiese criativa. Quer dizer, é
o espírito lúdico (interdisciplinar/ transdisciplinar, interativo/coletivo), contido no plano ético, que poderá
produzir linguagens inovadoras para desenvolver um aperfeiçoamento permanente do fazer pedagógico
(aprender fazendo). Enfim, tudo indica que hoje, possivelmente mais do que antes, é preciso desafiar os
modelos convencionais para experimentar o mundo em favor de uma visão criativa sobre o meio ambiente.
5. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS BÁSICAS
FOUCAULT, Michel. As palavras e as coisas: uma arqueologia das ciências humanas. 5ª ed. Trad. Salma
Tannus Muchail. SP: Martins Fontes, 1990.
GUATTARI, Félix. As três ecologias. Trad. Maria Cristina F. Bittencourt. Campinas: Papirus, 1990.
NIETZSCHE, Friedrich. A gaia ciência. Tradução, notas e posfácio de Paulo César de Souza. SP: Companhia
das Letras, 2001.
PELBART, Peter Pál. Vida capital: ensaios de biopolítica. SP: Iluminuras, 2003.
SANTOS, Milton. Por uma outra globalização: do pensamento único à consciência universal. São Paulo:
Record, 2000.
WALDMAN, Maurício. Lixo: cenários e desafios: abordagens básicas para entender os resíduos sólidos.
São Paulo: Cortez, 2010.
DOCUMENTÁRIOS
1. A CARNE É FRACA (Brasil, s/d, 54 min, Produção: Instituto Nina Rosa)
2. ESTAMIRA (Brasil, 2005, 115 min, Dir. Marcos Prado)
3. ILHA DAS FLORES (Brasil, 1989, 13 min, Dir. Jorge Furtado)
4. TERRÁQUEOS (Earthlings, EUA, 2005, 95 min, Dir. Shaun Monson)
5. UMA VERDADE INCONVENIENTE (An Inconvenient Truth, EUA, 2006, 100 min, Dir. Davis Guggenheim).
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Aprimoramento de um Sistema Microcontrolado para a Geração de
Números Verdadeiramente Aleatórios
TOMÁS, Luísa Rosária Assis
TRINDADE, Ronaldo Silva
1
2
INTRODUÇÃO
Para se fazer a simulação de sistemas que envolvam grandezas aleatórias, faz-se necessário a obtenção
de números verdadeiramente aleatórios para que a simulação possa refletir uma situação real.
Uma forma de geração de números verdadeiramente aleatórios utilizada em grandes laboratórios, é o
decaimento radiotaivo. Entretanto, essa forma de geração mostra-se inviável em função dos recursos
que temos disponíveis, bem como em função dos elevados riscos inerentes à manipulação de materiais
radioativos.
Assim sendo, utilizaremos o ruído térmico produzido por um resistor ou por junções PN à temperatura
ambiente, como forma de obter uma semente realmente aleatória para implementar um gerador de números
verdadeiramente aleatórios.
MATERIAIS E METÓDOS
Para o desenvolvimento deste projeto, utilizaremos um circuito microcontrolado para a geração de números
aleatórios utilizando-se o ruído térmico como semente do gerador. Esse circuito foi apresentado na Semana
de Ciência e Técnica de 2009. Efetuaremos a aquisição de dados através de um microcomputador
alimentando um banco de dados e, posteriormente, efetuaremos a análise estatística dos dados obtidos.
RESULTADOS E DISCUSSÃO
Espera-se avaliar, pelo método científico, a eficácia do gerador de números aleatórios apresentado na
Semana de Ciência e Técnica do IFMG campus Ouro Preto em outubro de 2009, bem como propor
melhorias no circuito. Espera-se também experimentar outras grandezas naturais (ruído sonoro ambiente)
como fonte de geração de números aleatórios.
CONCLUSÃO
Como o projeto encontra-se em fase inicial, ainda não temos resultados disponíveis que nos possibilitem
tirar conclusões.
BIBLIOGRAFIA
SOUZA, David José de - Desbravando o PIC - 6a ed. - São Paulo: Editora Érica, 2003.
PEREIRA, Fábio - Microcontrolador PIC Técnicas Avançadas. - São Paulo: Editora Érica, 2002.
SOUZA, David José de - Conectando o PIC 16F877A- 1a ed. - São Paulo: Editora Érica, 2003.
PEREIRA, Fábio - Microcontrolador PIC Programação em C. - São Paulo: Editora Érica, 2002.
(Footnotes)
1
Instituto Federal de Minas Gerais – campus Ouro Preto, CODAAUT, e-mail: [email protected]
2
Instituto Federal de Minas Gerais – campus Ouro Preto, CODAAUT.
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