Projeto Visões para o Gás Natural Como construir uma nova era do gás natural para o Brasil Ricardo Pinto O gás natural torna-se cada vez mais um recurso estratégico para os países que possuem reservas e investem para desenvolver o ambiente adequado para produzi-las de forma economicamente viável, assim como para os países importadores que enxergam os benefícios de sua utilização. Menos poluente que os outros combustíveis fósseis, como o carvão ou o óleo combustível, é considerado o combustível da transição para uma economia mais verde. Diversos países, como Estados Unidos, México e China, já se posicionaram com relação ao incremento do gás natural em suas matrizes energéticas por meio, por exemplo, da criação de políticas publicas que favorecem o setor e estimulam o desenvolvimento da cadeia de exploração e produção (E&P) do gás natural. Assim, pavimentam o caminho para reduzirem a dependência energética, rumo à autossuficiência e estimular a competitividade de setores industriais. A reflexão sobre as ações necessárias para fazer do gás natural uma prioridade e a definição de estratégias para permitir que isso aconteça são fundamentais para que o Brasil não fique para trás na corrida que se intensificou após a experiência bem sucedida americana com o fraturamento hidráulico horizontal do folhelho de xisto. No Brasil, o mercado de gás natural ainda é incipiente, com baixo consumo per capita em relação às maiores economias do mundo (G-20), além da baixa participação na matriz energética (~12%) e baixo desenvolvimento da malha de gasodutos, praticamente restrita ao litoral. Até meados da década de 90, a utilização de gás natural no país era limitada às regiões produtoras. O combustível só ganhou força no início dos anos 2000, com a construção do Gasoduto Brasil-Bolívia e, em seguida, com o plano de massificação liderado pela Petrobras entre 2003 e 2006, período no qual os preços competitivos do gás natural incentivaram o aumento de consumo a partir da substituição do óleo combustível em diversos setores industriais. No entanto, esse cenário de competitividade se reverteu a partir de 2007, devido à escassez de oferta e priorização do suprimento às termoelétricas. Teve-se então, uma mudança nas regras contratuais especialmente com relação à metodologia de precificação do gás doméstico comercializado com as distribuidoras, e que é mantida até os dias atuais. Essa nova metodologia passou a refletir o então cenário de escassez. Atualmente, mesmo que o país continue bastante dependente das importações, é preciso definir uma política de preços que viabilize a expansão da oferta nacional conforme são apresentadas todas as projeções oficiais disponíveis (ANP, MME, EPE e Petrobras). Cabe destacar que o consumo industrial vem sendo duramente penalizado pela perda da competitividade e ausência de oferta adicional disponível. O segmento está estagnado, o nível de consumo é basicamente o mesmo observado no ano de 2007. O que se observa é o aumento nos últimos anos do consumo de gás para geração elétrica, a partir dos aumentos das importações de gás liquefeito, além da expansão da produção doméstica. Em seus períodos de pico, como atualmente, esse consumo para geração de eletricidade supera o industrial. Olhando para frente, e se apenas considerarmos a premissa de aumento da produção de petróleo, que vem sendo apresentada já há alguns anos nos planos quinquenais da Petrobras, é possível acreditar que a produção de óleo no Brasil passará do atual nível de 2 milhões de barris de óleo equivalente ao dia para o nível de 4 milhões em 2020. Associado ao óleo virá, com certeza, muito gás natural. O desafio será transformar essa oferta futura em disponibilidade para o mercado, em bases competitivas para a indústria e economicamente comerciáveis para os produtores e demais investidores na cadeia. Os investimentos e expansões da indústria energointensiva são direcionados a partir das disponibilidades de suprimento de longo prazo de matéria-prima e de energia, em base firme e competitiva. Essas premissas são consideradas não somente no Brasil, mas nos mercados ao redor do mundo. A indústria brasileira compete com as indústrias de outros países. Os investimentos em tecnologia e expansão de escala devem ser constantes para que se mantenham competitivas. Infelizmente, cada vez mais o Brasil tem perdido mercado para seus concorrentes internacionais. A expansão do consumo cada vez mais é atendida por produtos importados. A percepção de que o gás natural como insumo energético para a indústria é um importante indutor de investimento e crescimento da nossa economia precisa ser assimilada de imediato pelo nosso governo. Dentre os diversos estudos realizados pelo projeto +Gás Brasil, a FIPE identificou, por exemplo, diversos impactos econômicos a partir de um preços de gás ao redor de US$ 7 MBtu na indústria. investimentos agregados (diretos e indiretos) para a economia aumentariam em 7,8% até 2015, passando para 19,5% do PIB. Até 2025, esse efeito seria significativamente maior: a taxa de investimento passaria para 22,3%. O volume investido passaria de R$ 585 bilhões para R$ 632,7 bilhões no curto prazo e para R$ 723,7 bilhões no longo prazo. aumento anual de 0,5 ponto percentual no PIB do País até 2025. Isso significa que a renda suplementar gerada por esse melhor desempenho da indústria alcançaria a esfera dos R$ 712 bilhões em 12 anos O ponto chave pelo qual devemos trabalhar, e justamente no qual as indústrias e associações apoiadoras do projeto +Gás vem se debruçando nos últimos anos, é discutir de que forma o Brasil deve transformar suas vantagens comparativas em vantagens competitivas. PROPOSTA PARA O DESENVOLVIMENTO DA INDÚSTRIA DE GÁS NATURAL NO BRASIL O certo é que não existe apenas uma solução para destravarmos o desenvolvimento dessa indústria. O crescimento passará por um conjunto de ações coordenadas entre o governo e agentes de mercado. A discussão e definição de uma política pública estabelecendo com clareza o que o país espera desenvolver e riqueza a gerar, a partir do gás natural, seria uma das principais medidas a ser tomada. O projeto +Gás Brasil apresentou uma proposta de agenda de mudança bastante ampla e com uma visão integrada da cadeia econômica do gás natural, conforme figura abaixo. Agenda de Mudança para a Indústria do Gás Natural A partir da definição de uma política pública, a agenda de mudança discorre sobre ações no segmento de exploração de produção, tratado como suprimento amplo, questões relacionadas ao desenvolvimento do transporte, distribuição e abertura do mercado em prol de um ambiente de comercialização competitiva. A premissa básica é de que o Brasil possui uma demanda industrial reprimida muito significa, e um potencial de oferta já no curto prazo bastante promissor. Além ainda, das bacias terrestres a serem desenvolvidas, e ainda sob a ótica da exploração de forma não convencional. Ou seja, o nosso desafio é mais gerencial e menos de recurso. Sabemos que o gás natural existe em nosso país. Negligenciá-lo poderá nos colocar em uma situação delicada no futuro, já que diversos países estão cientes da importância deste energético e estão trabalhando para fazer dele uma prioridade. Para que o Brasil possa se juntar a eles, é preciso que se vençam as barreiras que atrapalham o desenvolvimento do setor e que se construam as bases para uma nova era do gás natural no Brasil.