Campeãofeitono
quintal de casa
Felipe Wu, prata nos Jogos Olímpicos da Juventude, improvisou
um centro de treinamento para praticar com mais frequência
ERNESTO RODRIGUES/AE - 19/1/2011
PAULOFAVERO
FELIPE WU
[email protected]
Nascido em 11 de junho de
1992, o atirador ganhou destaque ao conquistar a medalha de prata nos Jogos Olímpicos da Juventude em Cingapura ano passado, 90
anos depois da única medalha do esporte numa Olimpíada (veja na página ao lado).
Aos 8 anos, Felipe já dava
os primeiros tiros, e aos 11
iniciou na modalidade. Seus
pais, Paulo e Elza, são instrutores de tiro. Hoje, aos 18, é
uma das revelações brasileiras e tem como principal concorrente no País o experiente Júlio Almeida, de 41 anos.
Do lado direito uma escada está encostada
naparedeamarela,comapinturajáumpoucogasta.Algunsvaraisestãoerguidosnocorredor comprido que leva aos fundos da casa.
O anfitrião pede para não reparar na bagunça,mas éali queele tem seucentrode treinamento particular. Um dos principais nomes
do tiro esportivo do Brasil, Felipe Wu luta
contra a falta de apoio para o esporte no País
e investiu recursos para adaptar um pequenoespaçoemsuacasaparaapráticadaPistola de Ar 10 metros, sua especialidade.
No simples sobrado de dois quartos onde
mora com os pais no Itaim Bibi, ele utilizou
um estreito corredor para colocar o alvo. “A
distância correta seria dez metros, mas em
casa só tenho oito metros. Então, treino assim mesmo. Não é o ideal, mas ajuda”, conta.O pai,Paulo,professor de físicano Ensino
Euqueria
treinaro50
metros,mas
nãotenho
umlocal
apropriado
paraissoem
SãoPaulo”
...
Médio, fica um pouco constrangido com a
situação. Diariamente faz as contas para saber se a família não ficará no vermelho.
“Acordo pensando o que posso fazer para
que ele continue treinando.”
Despesas
A bolsa atleta de R$ 1.500 que Felipe recebe
por mês ajuda nas despesas, mas o equipamento importado é muito caro. A arma de
pressão custa cerca de R$ 6 mil, o óculos de
tiro sai por R$ 1,2 mil e o sapato por aproximadamente R$ 500. Sem contar a munição,
que custa R$ 35 o pacote com 500 unidades –
ele gasta por volta de 120 cápsulas por dia. O
pouco dinheiro que sobra na casa é investido nele.
AConfederação Brasileira de Tiro Esportivo também não tem muitos recursos. Conta
apenas com o repasse do Ministério dos Esportes. Sem patrocínio, Felipe luta contra a
visão de que o esporte está ligado à violên-
cia. Um dos seus argumentos principais é
que nunca houve um acidente em provas de
tiro esportivo. De qualquer forma, a entidade já vem fazendo um trabalho específico
para transformar Felipe Wu em um dos melhores atletas do mundo.
O Centro Nacional de Tiro Esportivo em
Deodoro, no Rio, é o maior da América Latina. E sempre que pode o rapaz viaja para
treinar lá.
A expectativa é de ele chegue no auge em
2016,quando terá 24anos.Masnão descarta
a possibilidade de integrar a delegação na
Olimpíada de Londres.
“Tenho chance para 2012, mas não conto
com isso. Haverá uma seletiva para o PanAmericano e os dois primeiros garantem vaga. Se eu for para o Pan, aí tenho chance de ir
para os Jogos de Londres. Para 2016, o Brasil
terá pelo menos uma vaga. E é o meu grande
sonho. Mas sei que tudo será consequência
do meu trabalho.”
tiro esportivo
A modalidade Pistola de Ar
10 metros requer muita
precisão e concentração
Óculos de tiro
Diafragma
Tapa-olho
Tem um tapa-olho
(assim o atleta não
precisa fechar um
dos olhos) e um
diafragma (que aceita
lente corretiva) para
controlar a entrada
de luz, ajudando o
competidor a se
adaptar a qualquer
tipo de ambiente
1 2 345 6 789
1
2
3
4
5
6
7
8
9
9
8
7
6
5
4
3
2
1
Comele,argentino
nãotemvez
9 876 5 43 2 1
Medidas do alvo
Possui diâmetro de 17 cm e quanto
mais central for o tiro, mais pontos
ganha o atleta
A posição do atirador
é livre, podendo ser de lado
ou de frente para o alvo
O ALVO FICA A 10 METROS DE DISTÂNCIA
INFOGRÁFICO/AE
45
medalhas
sãodisputadaspelo
tironumaOlimpíada,
em15categorias
ERNESTO RODRIGUES/AE - 19/1/11
582
PONTOS
Este é o recorde pessoal do garoto.
Até hoje ninguém no mundo fez a
marca de 600, pontuação máxima
na pistola de ar 10m masculino
ONDE ENCONTRAR
Para obter mais informações sobre o
atirador Felipe Wu, acesse o site da
Confederação Brasileira de Tiro Esportivo:
www.cbte.org.br
Todo ano era a mesma história
no Campeonato Sul-Americano
deTiroEsportivo.AArgentinalevava o ouro na categoria júnior e
o Brasil comia poeira. Mas em
2007, Felipe Wu se transformou
no carrasco dos hermanos. LevouamedalhaprincipalnaPistola de Ar 10 metros e nunca mais
deixou um argentino vencer esta modalidade no torneio. “Depois ganhei mais duas vezes em
2008,2009enoanopassado”,comemora o pentacampeão.
Foi após a primeira conquista
que ele decidiu se dedicar mais
ao esporte. “Era mais tranquilo
antes,masentãopasseiaaumentaro ritmo de treinamento.” Hoje ele pratica de duas a três horas
na parte da manhã e faz o mesmo à tarde.
Apesar de não parecer, o cansaço físico é muito grande. Além
da força mental necessária para
acertar o alvo, ele tem de segurar
com apenas uma mão a arma
que pesa 1,3 quilo. Em competições, tem uma hora e 50 minutos para dar os 60 tiros.
Para manter a forma, Felipe
frequenta uma academia. E por
causa do ritmo forte de treinos
ele teve de largar os estudos.
“Anopassadoeudeixeiavidaestudantil para me dedicar ao esporte. Já procurei algumas universidades, mas o apoio é raro.
Quero fazer engenharia aeronáutica.”Elesabequenãodáparaconciliarumavidadeesportistadeeliteàsexigênciasacadêmicas. Por causa de viagens, teria
de perder aulas e provas.
Aposta no sucesso
Ricardo Brenck, diretor técnico
daConfederaçãoBrasileiradeTiroEsportivo, conta que aentidadejávinhaacompanhandoosresultadosdeFelipe.“Elepossuitodasascaracterísticasdeumatletadotiro:disciplina,autocontrole e concentração. Aposto nele
por isso.”
O Comitê Olímpico Brasileiro
também percebeu o seu talento
quando ele ficou com a prata
nos Jogos da Juventude do ano
passado,0,3pontoatrásdoucraniano Denys Kushnirov. “Quando ele fez este bom resultado, o
COB pediu que fizéssemos um
trabalho extra com ele. E disse
que o Felipe poderia usar a sua
estrutura de psicólogo, preparador físico e nutricionista.”
Emabriltem
umaetapada
Copado
MundodeTiro
Esportivoem
Sydneyeserá
umbomteste
paraele”
RICARDOBRENCK
DIRETORTÉCNICODACBTE
OUROOLÍMPICO
Guilherme
Paraense ficou
para a história
A primeira medalha de ouro do
Brasil na história dos Jogos Olímpicos foi de Guilherme Paraense,
em 1920, na
Antuérpia
(Bélgica).
Ele ganhou
a prova de
Tiro Rápido
25 metros,
superando
todas as dificuldades que teve para chegar ao torneio.
O tenente do Exército levou 27
dias para chegar ao local dos Jogos, entre a viagem de navio até
a Europa e de trem até a Bélgica.
Mas parte de sua bagagem, incluindo equipamentos de tiro, foi
furtada. Ele pegou munição emprestada com os norte-americanos e surpreendeu a todos com o
ouro. Também levou o bronze na
Pistola Livre por equipes. E Afrânio Costa ficou com a prata na
Pistola Livre.
O feito de Guilherme Paraense
ficou marcado e ele acabou sendo homenageado tempos depois
com o seu nome no espaço de
tiro da Academia Militar das Agulhas Negras. Já nos Jogos Olímpicos da Juventude em Cingapura,
90 anos depois do feito brasileiro na Antuérpia, Felipe Wu voltou a trazer uma medalha para o
País no tiro.
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