NO ANO DA EUCARISTIA “Isto é o meu corpo, que é dado por vós” (Lc 22, 19) Carta do Ministro geral da Ordem dos Frades menores no dia de Santa Beatriz da Silva às muito amadas Irmãs da Ordem da Imaculada Conceição Paz e Bem! Já estamos vivendo os últimos momentos do ano da Eucaristia, um ano em que a Igreja quis dedicar-se especialmente a viver o mistério eucarístico, uma caminhada de piedade e de caridade que será coroada no próximo mês de outubro, com a celebração da Assembléia Ordinária do Sínodo dos Bispos. A solenidade, já próxima da bem-aventurada Madre, Santa Beatriz da Silva, oferece-me a ocasião de, em tão grata celebração, fazer-vos chegar a afetuosa saudação dos Frades menores e de partilhar convosco, em comunhão carismática, o amor intenso que professamos a nosso Senhor Jesus Cristo, que por todos morreu e ressuscitou e para todos está presente no Santíssimo Sacramento do altar. Em comunhão carismática, contemplamos a Cristo, dom de Deus O Pai do céu, que é o Bem de quem procede todo o bem, amou-nos com tão desmedido amor que nos deu seu Filho único para que, pela fé, tenhamos vida e não pereça nenhum daqueles que crêem nele (cf. Jo 3,16). Em Jesus Cristo, dom de Deus, fonte que o poder de Deus abriu para mitigar a sede de seu povo, os sedentos bebem a água viva que jorra para a vida eterna. Cristo é o verdadeiro pão do céu que o Pai nos dá para a nossa caminhada pelo deserto. Ele é a luz que o Pai nos oferece para que, vendo, possamos realizar as obras de Deus. Ele é a ressurreição e a vida que desceu do céu para livrar-nos do poder da morte. Totalmente no-lo deu, quem totalmente se nos deu em seu Filho muito amado! Com este dom, chegou aos pobres a boa nova da libertação e, pela fé, inundou-se de alegria o coração dos que viviam na tristeza, surgiu um dia eterno nos olhos dos cegos, a pele dos leprosos recuperou uma pureza inocente, ao sussurro pacificador da Palavra de Deus abriram-se os ouvidos do surdo, os paralíticos andaram decididos pelo caminho que leva à terra prometida e abriram-se os sepulcros para entregar seus mortos a uma felicidade sem fim. Totalmente no-lo deu, quem totalmente se nos deu em seu Filho muito amado! Neste Filho, neste pobre, neste homem, a pobreza encheu-se de Deus porque o Filho de Deus abraçou a pobreza. A fragilidade humana se fez bendita porque nela o Filho de Deus quis manifestar seu poder e a humanidade viu-se rica de Deus, porque a Palavra eterna do Pai quis ser um pobre, um homem. Totalmente no-lo deu, quem totalmente se nos deu em seu Filho muito amado! Na pessoa de Deus, o Pai nos abençoou com toda a espécie de bens espirituais e celestiais. Em Cristo nos escolheu por amor e nos destinou a sermos seus filhos. Por Cristo recebemos a redenção, o perdão dos pecados. O tesouro de sua graça, de sua sabedoria e prudência derramou-se em abundância sobre nós (cf. Ef 1,3-10). Pelo grande amor com que nos amou, estando nós mortos pelo pecado, Deus nos fez viver com Cristo, ressuscitou-nos com ele e, com ele, sentou-nos no céu (cf. Ef 2,4-7). Totalmente no-lo deu, quem totalmente se nos deu em seu Filho muito amado! Deu-nos tudo, inclusive o que ainda esperamos, isto é, a riqueza da glória que Deus dá em herança aos santos, a eficácia de sua força poderosa, que desenvolveu em Cristo, ressuscitando-o dentre os mortos e sentando-o à sua direita no céu (cf. Ef 1,17-23), a felicidade da eterna bem-aventurança que se manifestará quando chegar a perfeição e desaparecer o que é parcial, quando deixarmos de ver obscuramente e começarmos a ver face a face (cf. 1Cor 13,8-13). Totalmente no-lo deu, quem totalmente se nos deu em seu Filho muito amado! Deus Pai já nos deu tudo, embora nem possamos imaginar a infinita riqueza que se esconde na brevidade desse “tudo”, já que não somos capazes de imaginar o céu, nem a eternidade, nem o amor que é amor puro, nem a felicidade que é somente felicidade. O sol, mesmo sendo sol, é somente fria obscuridade diante do fogo de amor que é a Trindade santíssima. E o amor, que atinge o homem Jesus Cristo, atinge-nos a todos em Cristo, pois dele recebemos o Espírito e com ele formamos um só corpo. Podemos dizer que somos amados de Deus, que somos amados como filhos no Filho, como filhos muito amados no Filho predileto; mas, de modo algum podemos expressar como é esse amor, porque é o amor com que Deus ama seu Filho, e só Deus pode falar de Deus. Em comunhão carismática, contemplamos a Deus, entregue por nós Volvamos agora o olhar para Cristo, o Senhor, a Palavra encarnada pelo qual nos chegou a graça e a verdade, a reconciliação e a alegria, a luz e a vida, a liberdade e a paz. Volvamos o olhar para o altíssimo Filho de Deus, em quem se revela o amor do Pai. Volvamos o olhar para ele com serena confiança, pois não nos ofuscará a majestade do divino, mas nos atrairá a pequenez do humano. São Paulo apresenta-nos este mistério de amor dessa forma: Subsistindo na condição de Deus, Cristo Jesus não se apegou à sua igualdade com Deus. Mas esvaziou-se a si mesmo, assumindo a condição de escravo, tornando-se solidário com os seres humanos. E, apresentando-se como simples homem, humilhou-se, feito obediente até a morte, até a morte numa cruz (Fl 2,6-8). E a santa Igreja, na sua profissão de fé, assim o confessa: “Creio num só Senhor, Jesus Cristo, Filho unigênito de Deus, nascido do Pai antes de todos os séculos [...], que por nós homens e por nossa salvação desceu do céu e, por obra do Espírito Santo, se encarnou no seio da Virgem Maria e se fez homem; e por nós foi crucificado [...], padeceu e foi sepultado”. Assim o contempla o Seráfico Pai São Francisco: “Esta Palavra do Pai, tão digna, tão santa e gloriosa, o altíssimo Pai a enviou do céu por meio de seu santo anjo Gabriel ao seio da santa e gloriosa Virgem Maria, e nele recebeu a verdadeira carne de nossa humanidade e fragilidade. Sendo acima de todas as coisas, com a beatíssima Virgem, sua Mãe, neste mundo Ele quis escolher a pobreza. E, estando próxima a paixão, celebrou a Páscoa com seus discípulos e, tomando o pão, deu graças, abençoou-o e partiu-o, dizendo: Tomai e comei, isto é o meu corpo. E tomando o cálice, disse: Isto é o meu sangue da nova aliança que será derramado por vós e por muitos em remissão dos pecados” (2Fi 4-7). Por nosso amor, o altíssimo Filho de Deus fez sua a nossa humanidade, a nossa fragilidade, a nossa pobreza: Por nós se humilhou, por nós se consagrou, por nós se entregou. “Como é santo e dileto, muito aprazível, humilde, pacífico, doce, amável e, acima de tudo, desejável ter tal irmão e tal filho: Nosso Senhor Jesus Cristo, que expôs sua vida por suas ovelhas” (1Fi, 13). Memória necessária de tão grande amor são as palavras da Sagrada Escritura, que guardamos como um tesouro em nosso coração. Memória daquele amor divino é o testemunho de vida do Seráfico Pai São Francisco e da Bem-aventurada Madre Santa Beatriz. Memória daquele infinito amor é, sobretudo, o santíssimo Sacramento da Eucaristia, no qual Cristo se oferece realmente por nós, bondosamente fica conosco e, docemente, convida-nos a seguir seus passos pelo caminho da entrega amorosa. Na divina Eucaristia, o Senhor entrega-se totalmente a nós. Em vossa profissão religiosa, com o propósito de oblação perfeita, cada uma de vós se oferece ao divino Redentor e à sua gloriosa Mãe, entregando-se a Ele em alma e corpo como hóstia viva (cf. Regra da OIC, 2). Na divina Eucaristia, Cristo, Deus e Filho de Deus, humilha-se a ponto de, por nossa salvação, esconder-se numa pequena forma de pão (cf. São Francisco, Carta a toda a Ordem, 27). Em vossa vocação contemplativa, sois convidadas a imitar a humildade e a mansidão do Redentor e de sua dulcíssima Mãe (cf. Regra da OIC, 44). Na divina Eucaristia, Cristo faz-se nosso servidor, fazendo-se nosso alimento da alma e do corpo. Em vossa consagração ao Senhor, cada uma de vós entrega o humilde e precioso dom da própria vida, por amor e para o serviço de nosso Senhor e da Imaculada Conceição de sua Mãe. carisma, vós sois como a lâmpada acesa junto ao altar, que, com sua chama viva, dá testemunho da presença do Senhor e, nessa presença, vive, adora, intercede, agradece, ama e se consome. Na Eucaristia, queridas Irmãs, tendes o sacramento do amor que Deus tem para todos nós e, nela, encontrais ao mesmo tempo o exemplo de amor que todos devemos ter a Deus. Trazei sempre Cristo no coração e, em vossa oração, não esqueçais os vossos Frades menores. De todo o coração as abençôo. Na divina Eucaristia, Cristo é fogo de amor que nos oferece luz e calor. Por vosso Roma, Cúria geral O.F.M. 17 de agosto de 2005 Festa de Santa Beatriz de Silva Fr. José Rodríguez Carballo, O.F.M. Ministro geral