1º Simpósio Internacional de Televisão Digital (SIMTVD) – 18 a 20 de novembro, Bauru/SP
IPTV Kaxinawá: autonomia audiovisual através da interface entre comunicação
e educação
REGO, Alita Sá Rego
RESUMO
Este trabalho aborda questões a respeito da produção de conteúdo audiovisual
destinada à veiculação nos canais alternativos de difusão, e relata etapas da
pesquisa Imagens sensoriais digitais e suas narrativas: a produção de material
didático audiovisual para os jovens da periferia do Rio de Janeiro no século
XXI, realizada na Universidade do Estado do Rio de Janeiro, no campus da
Faculdade de Educação da Baixada Fluminense (FEBF), em Duque de Caxias.
Uma das questões da pesquisa é: como produzir material audiovisual para ser
utilizado em sala de aula e veiculado pela IPTV da FEBF, em salas de aula,
TVs públicas e WebTVS que sejam, ao mesmo tempo, locais, nacionais,
globais e, além disso, capazes de atrair a atenção do público jovem que estuda
e mora na Baixada Fluminense? A investigação se dá em torno dos processos
de singularização autônomos que ocorrem na região e que ainda não foram
capturados nem pelo Estado, nem pelas empresas midiáticas. Ao mesmo
tempo, também tem como objetivo investigar metodologias que preparam o
professor de sala de aula para realizar, junto com seus alunos, seu próprio
material audiovisual, através do domínio da tecnologia digital. É uma pesquisa
ao mesmo tempo teórica e prática, que trabalha na interseção entre os campos
da Educação e da Comunicação e que trata da produção audiovisual no âmbito
do trabalho imaterial, tal como definido por Negri, Hardt e Lazzarato. Utilizamos
os conceitos de marcas territoriais, singularidades e subjetividades de Gilles
Deleuze, Felix Guattari e Suely Rolnick, de meios de comunicação de Marshall
Macluhan, além da bibliografia referente à produção televisiva e à tecnologia
digital. Além da pesquisa teórica, adotamos como metodologia o fazer e
aprender. Isso só foi possível através da convergência das mídias, da
interatividade possibilitada pela WEB 2.0 e pelo barateamento dos hardwares
informáticos (PCs, telefones celulares, câmeras fotográficas e de vídeo)
somados à facilidade de manuseio dos novos softwares de interfaces gráficas
intuitivas. A evolução tecnológica criou uma geração de crianças e jovens, de
homens e mulheres capazes de produzir e veicular seus próprios conteúdos
audiovisuais. Nossa pesquisa começou em setembro de 2007 com
financiamento da FAPERJ. Até agora, já contamos com 8 séries de programas
com previsão de finalização e transmissão em caráter experimental pela IPTV
Kaxinawá, em 25 de novembro de 2009. Acreditamos que a singularidade de
nosso trabalho está no fato de se tratar de uma pesquisa da área de
Comunicação realizada com alunos de Pedagogia, cujo desenrolar pode
apontar para a necessidade de acrescentar práticas de produção audiovisual e
multimídia nas Faculdades de Educação, tirando professores e alunos de seu
papel de consumidores passivos das mídias.
PALAVRAS-CHAVE: IPTV. Produção audiovisual. Educação. Periferia.
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1º Simpósio Internacional de Televisão Digital (SIMTVD) – 18 a 20 de novembro, Bauru/SP
Apresentação
Seis de outubro de 2009, estúdio da IPTV Kaxinawá na FEBF
(Faculdade de Educação da Baixada Fluminense), no campus da UERJ em
Duque de Caxias. Às 14 horas começa a transmissão experimental, ao vivo, da
programação experimental da IPTV Kaxinawa, dentro do evento UERJ sem
muros.1 A exibição intercala intervenções ao vivo com programas gravados. No
estúdio/auditório, uma mesa composta por três alunos entrevista o realizador
ou produtor de um dos programas exibidos: Caminhos do Oriente, Quem cala
consente, Improvisos, Vozes urbanas e Quinta dimensão. O entrevistado
explica como o programa foi realizado, o que aconteceu durante a gravação e o
que eles concluíram do trabalho. Todos os programas foram projetos
idealizados e roteirizados, gravados e editados pelos próprios alunos que
participam do grupo de pesquisa do Laborav, o Laboratório Audiovisual da
FEBF. Os criadores e produtores estudam tanto do mestrado quanto da
graduação. A transmissão pela internet, também realizada pelos próprios
alunos, foi através de uma plataforma de vídeo broadcast ao vivo, com
audiência global ilimitada, totalmente gratuita, que permite, a qualquer um que
possua uma câmera, ter seu próprio canal de TV. A transmissão e a recepção
na sede da UERJ no Maracanã, em um telão foi um sucesso. Principalmente
quando o público percebia que não se tratava de vídeos didáticos, mas sim de
alunos estavam fazendo televisão “ao vivo”. Alunos de uma faculdade de
Educação, e não de Comunicação.
A pesquisa
É no contexto da pesquisa sobre a IPTV Kaxinawá que se insere o
nosso projeto Imagens sensoriais digitais e suas narrativas: a produção de
material didático audiovisual para os adolescentes da periferia do Rio de
Janeiro no século XXI, desenvolvido pelo Programa de Pós-Graduação em
1
Evento em que os alunos da universidade apresentam à sociedade a produção acadêmica realizada nas diversas
áreas de conhecimento, envolvendo ensino, pesquisa, extensão e cultura. seus trabalhos e pesquisas realizadas ao
longo do ano. Em 2009, o evento aconteceu entre cinco e nove de outubro.
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Educação, Cultura e Comunicação nas Periferias, realizado no campus de
Duque de Caxias da Universidade do Estado do Rio de Janeiro, UERJ. Nosso
objetivo é produzir material didático audiovisual e multimídia e introduzir o
conhecimento das tecnologias de comunicação e informação no âmbito da
formação de professores. A pesquisa, ao mesmo tempo teórica e prática, é
financiada pela FAPERJ e começou em setembro de 2007. Nossa intenção é
fazer com que os futuros professores saiam do papel de consumidores
passivos de produtos audiovisuais, previamente produzidos, e se tornem
capazes realizar uma produção autônoma para uso em sala de aula, e que
possa, ao mesmo tempo, ser veiculada na pela IPTV Kaxinawá, nas TVs
Universitárias e Comunitárias, bem como nas TVs públicas como a TV Brasil.
Um projeto que vai de encontro às necessidades de formação de professores e
produção de conteúdo como aponta o Ministro da Educação do Governo Lula,
Fernando Haddad.
Nós temos que cuidar para que o processo dito de inclusão
digital não se restrinja à questão de conexão, mas avance em
questões sem as quais esse processo da educação não
estaria potencializado de maneira a trazer resultados
satisfatórios para o educando e o educador. Isso exige não
apenas a questão da formação de professores para este
mundo novo, mas um cuidado muito especial com a produção
de conteúdo digital educacional.(Haddad.2009.p.27)
Ao se apropriarem da tecnologia de produção, os futuros professores
também estarão capacitados a introduzir o uso do vídeo em sala de aula,
transmitindo a seus alunos o conhecimento técnico e prático adquirido, dando
origem, assim, a uma nova geração de produtores audiovisuais autônomos.
Para
determinarmos
esses
objetivos,
levamos
em
consideração
as
transformações tecnológicas que baratearam o acesso aos meios de produção
do audiovisual, a facilidade do manuseio dos equipamentos e a possibilidade
de veiculação aberta pelas redes digitais. Levamos em consideração também a
necessidade de professores e alunos se apropriarem da tecnologia para se
inserirem no contexto da existência do trabalho imaterial que é característico da
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sociedade contemporânea, calcado na produção, distribuição e controle da
informação.
Nosso projeto deu origem ao Laboratório Audiovisual – LABORAV, cujo
objetivo é pesquisar novas formas e formatos de programas para uma TV
localizada em uma faculdade na periferia da cidade do Rio de Janeiro. Nossa
proposta é criar uma programação que vá além da transmissão de mesas
redondas, defesas de monografias, vídeo-aulas, entrevistas com acadêmicos e
videoconferências.
Para isso, já foram realizadas três oficinas práticas de
criação e produção com os alunos das Faculdades de Pedagogia, Geografia e
Matemática. Os resultados foram diversos projetos de programas, dentro os
quais estão: Quem cala consente, Caminhos do Oriente, Cult cosplay, Em
matéria de arte e outros. Nesses projetos, procuramos incentivar os alunos a
reconhecer e a inserir marcas territoriais da periferia, produzindo um conteúdo
que reflita os processos de singularização característicos dos jovens da região.
Acreditamos que a originalidade do projeto está em aprofundar a interface
entre comunicação e educação e, ao mesmo tempo, criar uma programação
diferenciada para a IPTV Kaxinawá.
Geração digital
Se levarmos em que viver é comunicar, podemos compreender melhor
as palavras de McLUHAN (2005) quando, ainda na década de 60, afirmava que
o meio é a mensagem ou a massagem, já que atua diretamente sobre nosso
corpo. Equipamentos eletrônicos, como a televisão, provocariam uma
transformação no sistema nervoso capaz de criar uma assintonia entre
gerações: a geração da imprensa e a geração eletrônica.
A chamada assintonia entre gerações representa uma divisão
entre as pessoas que cresceram entre a era visual do Primeiro
Mundo, com seu complexo industrial – um mundo de
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empregos, de pontos de vista, políticas e atitudes, e os filhos
dessas pessoas, criados no mundo acústico simultâneoinstantâneo da televisão. (McLUHAN. 2005:p. 334)
A geração eletrônica começou no século XIX, com a invenção do
telégrafo em 1934, passou pelo rádio e pelo cinema e teve como seu marco a
televisão. Esta, unindo a todos na mesma sintonia, recria um mundo tribal ou
primitivo, uma aldeia global unida pelo tantan dos tambores que ressoam nos
meios de comunicação.
Acho que o termo primitivas talvez seja enganoso, mas ele
sugere que as pessoas estão menos habituadas a extrair
aspectos singulares, níveis singulares etc., e que estão
acostumadas a um compromisso mais inclusivo, totalmente
sensorial, com as situações.(Idem. 2005:p.64)
McLuhan não assistiu à explosão da geração digital, mas certamente iria
concordar com o Ministro Fernando Haddad (2009). Ao falar sobre a geração
digital que explode no início do século XXI, ele afirma que o digital abalou
profundamente a relação hierárquica professor-aluno e exemplifica com um
fato que aconteceu quando chegaram, numa escola pública, os computadores
do projeto UCA (Um Computador por Aluno):
O menino pega um dos protótipos, que é uma interface muito
pensada para a criança, um computadorzinho verde, e a
professora tem até dificuldade para abrir a maletinha e o
menino abre. A professora vira e fala: Mas como eu vou fazer
para usar isto? E o menino fala assim: não se preocupe,
professora, que eu te ensino (Haddad.2009.p.30)
É esse mesmo jovem que, um pouco mais velho, vai dizer que não está
fazendo nada, enquanto está ao computador baixando músicas em MP3,
assistindo filmes no Youtube, fazendo upload de suas fotos no MySpace,
mandando um Twiter para a namorada e por último, mas nem por isso menos
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importante, pesquisando no Wikipédia para o trabalho do colégio. É esse
jovem, ou criança, o aluno que o professor encontra em sala de aula.
Nos anos 60, McLuhan (2005) já apontava que a causa do abandono da
sala de aula pela geração eletrônica se devia ao nosso hábito de encarar o
novo através das lentes do velho. Até hoje, muitos ainda acreditam que a TV
está ligada à visão, quando, na verdade, ela está ligada ao processo da
imersão sensível. Nesse caso, o aluno sai da era da especialização
proporcionada pelas escolas, para o envolvimento audiovisual dos meios de
comunicação de massa. Um envolvimento tão profundo que faz com que,
quando o espectador (adulto, jovem ou criança) se senta no sofá e se deixa
levar pela imagem, tenha uma atitude de passividade mental,apesar da intensa
atividade corporal2.
Como em nossa sociedade, boa parte da experiência é transmitida
através dos meios de comunicação, principalmente a televisão, o professor
deve dominar a tecnologia de sua época e ser capaz de transmiti-la a seus
alunos de forma crítica, para que eles sejam capazes de detectar a produção
de subjetividades seriadas dos meios massivos. Daí a necessidade de o
professor das novas gerações ser capaz não só de consumir produtos
audiovisuais, mas também de produzir, junto com seus alunos, seus próprios
trabalhos.
Assim como uma criança aprende a fazer uma redação sobre a ida ao
Jardim Zoológico, ela deve ser capaz de realizar um documentário sobre seu
passeio, com imagens gravadas em seu telefone celular e editadas nos
softwares caseiros de edição e veiculadas no Youtube. A possibilidade de
veicular sua própria produção cria um movimento de externalização do próprio
2
Derrick Kerckhove vai afirmar que estamos em constante atividade sensorial quando vemos a TV, porque nosso
organismo está sempre se adaptando às transformações provocadas no meio ambiente. A cada corte ou mudança de
imagem, cores e sons mudam, demandando uma Reação Orientadora (RO), que é uma resposta involuntária do
organismo a qualquer tipo de estímulo interno ou externo. Quando confrontado com apresentações em mudança
rápida e ação acelerada, o espectador é literalmente levado de imagem para imagem. Isto exige uma adaptação
inesperada mas constante aos estímulos perceptivos. Como resultado, o espectador deixa de conseguir manter o
ritmo e desiste de fazer classificações mentais (Kerckhove. 2005.p.41)
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pensamento, elaborado a partir das principais combinações sensoriais, que
passam a fazer parte de uma mente coletiva (Kerckhove.1997), do intelecto
geral ou infosfera (HARDT E NEGRI, 2002) que recobre o planeta.
Foi a possibilidade de alcançar uma visibilidade midiática e fazer parte
da infosfera que levou diversos alunos da FEBF a participarem das Oficinas de
Criação Audiovisual.
O prosumidor e o operário social
Computadores dão continuidade à mídia eletrônica, principalmente
depois do advento da TV de alta definição (HDTV), que é a passagem da
televisão para o reino dos computadores (KERCKHOVE, 1997). HDTVs são
computadores que transmitem imagens e sons digitais através de conexões à
Internet via satélite e/ou tecnologia ADSL e que permitem a interatividade entre
emissores e receptores. Conectada às redes de comunicação, a televisão se
transforma em um telecomputador, capaz de ligar indivíduos com suas
necessidades pessoais a mentes coletivas (KIERKCHOVE, 1997. p.89), sem
respeitar fronteiras, espaciais ou temporais. Isso implica em novas formas de
tomada de consciência e demanda novos processos educacionais capazes de
responder a esse novo contexto. Neste caso, o ponto de vista de McLuhan nos
anos 60 ainda continua atual, quando ele afirma que a educação ainda está
ligada ao processo de modelagem dos indivíduos através de um conhecimento
já pronto, que não respeita diversidades, tempos e espaços. (McLUHAN apud
LORENZONI, 2005). Essa é uma educação que ainda está voltada para as
sociedades disciplinares, onde o importante era criar corpos dóceis, prontos
para obedecer ao ritmo da linha de montagem (FOUCAULT, 2004) das
sociedades industriais. Uma educação para as massas, que não seria a mais
adequada para os jovens contemporâneos, que já nascem conectados à
Internet através de seus computadores, que vivem na sociedade da informação
e que têm uma forte necessidade de afirmação e autonomia.
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Essa nova geração, desde pequena, aprendeu a lidar com aparelhos
celulares, joysticks, interfaces gráficas intuitivas, câmeras fotográficas e vídeos
digitais, softwares de edição e animação, vídeogames. Ela freqüenta sites de
relacionamento e está acostumada a uma vida digital. Uma juventude que não
é apenas consumidora de sons e imagens pré-fabricadas pelos grandes canais
de comunicação. A facilidade de manipulação dos novos equipamentos permite
que ela produza material próprio, que é disponibilizado e consumido
instantaneamente na rede através do Youtube, do Facebook, MySpace, dos
blogs etc. Crianças e jovens dessa geração que são capazes de produzir o que
consomem e que vivem uma vida midiática, formam um exército de
prosumidores. (Kerckhove.1997).
Entretanto, se pensarmos que os prosumidores vivem numa economia
voltada apenas para a produção e consumo de produtos abordados sob o
aspecto de valores simbólicos difundidos pela mídia massiva e produtora de
subjetividades prêt-à-porter3, estaremos usando categorias baseadas nos
conceitos de indústria cultural e nas teorias hegemônicas que estiveram em
voga até meados do século XX. Uma abordagem que, de acordo com Simmel,
acredita que apenas uma classe intelectual produz e que a moda vai se difundir
através da imitação (KERCKHOVE, 1997). Nesse caso, pensamos a
comunicação como mera transmissão de produtos simbólicos, voltados para
um consumidor totalmente passivo. Uma abordagem que não leva em
consideração a transformação provocada pela tecnologia nos processos de
produção, onde a produção de conhecimento é um dado estratégico, já que a
informação é a única substância que cresce com o uso, em vez de decrescer,
como acontece com os recursos naturais (KERCKHOVE, 1997, p.95).
Podemos verificar a ressonância entre o conceito de prosumidores com
o de operário social, de Lazzarato e Negri (2001). O operário social surge em
meados do século XX, quando o conceito de trabalhador se amplia, incluindo
não apenas os operários das fábricas, mas todos aqueles que produzem
3
Tais identidades definem-se não só por certas competências, mas também por uma certa aparência, um estilo de
corpo, roupa e comportamento ditadas pelas tendências do mercado do momento (Rolnik.1998. p.14).
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conhecimento, informações, serviços e afetos. São intelectuais, trabalhadores
do setor de serviços, artistas, estudantes, donas de casa e todos aqueles que,
no dia-a-dia, se relacionam, criam, produzem e consomem algum tipo de
informação, serviços, laços sociais e geram sentimentos de conforto e bemestar. Em suma, toda sociedade realiza um trabalho imaterial de produção
constante, que é fruto das relações sociais que se estabelecem no cotidiano.
Por isso vivemos numa sociedade da abundância de produção imaterial. Uma
produção coletiva que está disponível para todos e cujo valor está fora de
qualquer medida (HARDT e NEGRI, 2002).
Periferia antropofágica
A experiência social corrente vivenciada pelos jovens da geração do
início do século XXI está estreitamente ligada ao advento das redes, à cultura
digital e às possibilidades interativas da WEB 2.0. Uma experiência que,
segundo André Lemos (2009), começa com o surgimento do PC individual,
sem conexão. Depois ela passa a se relacionar com os CCs, ou computadores
coletivos ou conectados através das redes e cabos. Depois, essa experiência
passa a se dar através da CCM, ou computação coletiva móvel, onde é
possível se conectar através dos celulares, laptops e notebooks. Dentre essas
fases poderemos identificar também três etapas da relação do usuário na
cultura digital. Na primeira, desconectado, ele alimenta seu PC com
informações que cria, coleta ou processa em outras mídias, e que são
transportadas através de outros suportes (disquetes, papel impresso). Na
segunda, conectado, ele faz o download das informações de provedores que
passam a circular pela rede e já age de forma interativa, respondendo a
enquetes, participando de salas de bate papo e de comunidades virtuais. Na
terceira, ele tanto cria e consomem faz o download e o upload de informações,
da mesma forma em que, através do peer to peer, compartilha diretamente sua
produção com outros usuários, com uma atitude pró-ativa.
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Como constata o Coordenador Brasileiro de Cultura Digital, Cláudio
Prado (2009), é na periferia que a apropriação dessa possibilidade de fazer
dowload e upload mostrou sua face mais ativa.
A periferia brasileira está avançadíssima em relação à
compreensão do digital. O digital age de forma instantânea, há
um fenômeno similar de compreensão do que é possível ser
feito na era pós-industrial, pós-trabalho. Esse pessoal aprende
a fazer upload antes de fazer download. A compreensão do up
e down era uma proposta de interatividade, de articulação, e
não de baixar uma coisa simplesmente para consumo. Era
uma compreensão política que esse pessoal tinha pela
primeira vez (Prado.2009.p.50).
Acreditamos que a apropriação das tecnologias digitais pelos jovens da
periferia é conseqüência de nossa singularidade antropofágica. No Brasil,
somos capazes de assimilar e deglutir tudo o que há de novo, o diferente,
integrando-o ao cotidiano. Uma herança do antropofagismo de nossos
antepassados tupis. Os índios desta etnia devoravam os bravos guerreiros
inimigos para adquirir a potência vital deles, absorvendo-os de corpo e alma.
A inspiração da noção de antropofagia vem da prática dos
índios tupis, que consistia em devorar os seus inimigos, mas
não qualquer um, apenas os bravos guerreiros. Ritualizava-se
assim uma certa relação com a alteridade: selecionar seus
outros em função da potência vital que sua proximidade
intensificaria;deixar-se afetar por esses outros desejados a
ponto de absorvê-los no corpo, para que partículas de sua
virtude se integrassem à química da alma e promovessem o
seu refinamento (Rolnik.1998.p.2)
Por isso, em nossa pesquisa, chegamos à conclusão de que uma
metodologia adequada aos alunos da FEBF, que fazem parte da geração
digital da periferia do Rio de Janeiro, deveria adotar métodos de ensino
imersivos, interativos, cooperativos e colaborativos, capazes de gerar
processos de singularização que proporcionassem modos de pensar, agir e
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sentir que tivessem relação com a realidade conectada em que eles viviam.
Além disso, implicaria em uma forma de se apropriar antropofagicamente deste
universo tecnológico e televisual, para que seja possível encontrar linhas de
fuga em um meio que aparentemente não tem saída.
Marcas territoriais
Nesse contexto, consideramos fundamental resguardar as marcas
territoriais que iriam preservar as singularidades dos jovens alunos da FEBF
envolvidos no processo de produção audiovisual, para que eles não repetissem
a mesma visão de juventude que está presente na mídia comercial. Na
verdade, os chamados “programas para juventude” são direcionados para um
jovem universal, idealizado pelos criadores e produtores, que não levam em
consideração as singularidades pessoais e as marcas territoriais.
Tomamos como ponto de partida o conceito de território como o espaço
que alguém cria em torno de si para se proteger do caos externo, de Deleuze e
Guattari (2002). Um território se constitui a partir do agenciamento de
determinadas marcas visuais, sonoras, olfativas, táteis e/ou comportamentais.
O conjunto de marcas conforma um meio. Gatos demarcam seu território com o
cheiro de sua urina. Pássaros fazem o mesmo com seu canto. Seres humanos
usam componentes materiais como tijolos para construir as paredes de sua
casa. Tijolos materiais que se somam a pequenos tijolos imateriais que vão
expressar um território simbólico, sonoro, visual etc. Quando eles deixam de
ser apenas símbolos e se tornam marcas expressivas e consistentes, eles
passam a constituir um território.
O território da FEBF está localizado no município de Duque de Caxias
(RJ), na Baixada Fluminense. Uma região onde as cidades funcionam como
dormitórios para a mão-de-obra que trabalha no Rio de Janeiro, cuja marca
mais expressiva não é a produção de bens imateriais e de capital afetivo. É a
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violência. A região é conhecida como nascedouro e moradia de grupos de
extermínio4. Mesmo ostentando o sexto maior Produto Interno Bruto (PIB) do
país, tem graves carências sociais, que se refletem na falta de creches, escolas
e oportunidades de trabalho. A população é de baixo poder aquisitivo e uma
grande parcela é ligada a diversas seitas evangélicas. Esta marca está
presente entre os/as alunos/as da FEBF.
O complexo cultural da região é deficitário, principalmente em termos
audiovisuais. De acordo com os alunos, não existem cinemas e as locadoras
de vídeos e DVDs só oferecem filmes de ação, romance, lutas marciais ou os
filmes considerados como trash pelos mais informados. Além disso, o acesso à
Internet via banda larga ainda é pequeno. Nesse contexto, a televisão ainda
pode ser considerada a principal fonte de cultura e de lazer. É através das
imagens televisuais que se conforma o olhar, o pensar e o sentir dos jovens da
região.
Mas, se levarmos em consideração que territórios são espaços
permeáveis que permitem trocas entre fluxos de marcas materiais e imateriais,
interiores e exteriores, podemos verificar que em todo o tempo acontecem
processos
de
territorialização
e
de
desterritorialização,
Um
ato
de
territorialização se completa no momento em que os componentes do meio
interno e externo são apropriados e se tornam uma nova forma de expressão a
partir de novos agenciamentos. Por isso, criar um território audiovisual
autônomo seria um dos efeitos de nosso trabalho.
4
Como comenta José Cláudio Souza Alves, autor do livro Dos barões ao extermínio: «A Baixada Fluminense, com
suas cidades-dormitórios, o excesso de mão-de-obra barata e as indústrias de fundo-de-quintal, são o suporte para a
grande metrópole, Rio de Janeiro... A partir dos anos 80, na Baixada e no Rio de Janeiro, os grupos de extermínio
sofrem a chamada “autonomização”, isto é: os grupos passam a ser compostos não só por policiais militares, mas
também por cidadãos, pessoas comuns que passam a ser arregimentadas para realizar “operações de limpeza” nos
diferentes bairros suburbanos ou favelas. Disponível em
http://www.midiaindependente.org/pt/blue/2005/04/312662.shtml.
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Uma produção antropofágica
Verificando este contexto, chegamos aos princípios que nortearam a
produção do material que foi assimilado antropofagicamente por nossos alunos
em sua produção. Dentre eles, estão a produção audiovisual periférica e
autônoma das produtoras independentes, e cursos livres de cinema
promovidos por ONGs na região, a TV comercial e o reconhecimento das
marcas territoriais da Baixada. A estes se somaram a consciência da
importância do professor como operário sócial/prosumidor, o domínio técnico e
estético dos meios de produção e a possibilidade de uma existência midiática.
Estas marcas podem ser reconhecidas nos programas que já foram
produzidos: a busca por conteúdos mais consistentes, formas estéticas mais
elaboradas, com profunda influência da MTV, dos videogames, dos quadrinhos
e dos animes, além de uma forte tendência ao non sense. Um material
assimilado antropofagicamente por nossos alunos e que resultaram nos
seguintes projetos que estão em fase de produção:
Quem cala, consente – série de entrevistas com estátuas de artistas que
estão nas ruas do Rio de Janeiro: Pixinguinha, Carlos Drummond de Andrade,
Dorival Caymmi etc. Cada personagem será abordado em um vídeo com cerca
de 8 minutos de duração. O programa é ideal para uso em sala de aula, na
medida em que conta, através de perguntas sem respostas (quem cala
consente...), a vida de intelectuais brasileiros que viraram estátua.
Caminhos do Oriente – programa quinzenal com 30 minutos,
apresentado ao vivo pela IPTV. O programa contará a cada semana com a
participação de convidados ligados ao mundo das Artes Marciais, que irão
mostrar seus trabalhos em forma de entrevistas e demonstração de estilos de
kung fu. Também serão apresentadas aulas de Katis5 e filmes clássicos de
5
O Kati surgiu na Ásia junto com o Wushu (Kung fu), é difícil dizer a quanto tempo existe essa técnica porém é
estimado que tenha mais de 2000 anos. Surgiu primeiramente dos estudos de monges budistas que imitavam os
movimentos dos animais da natureza e posteriormente passou a ser uma técnica militar quando foram criados outros
tipos de Katis, como por exemplo o Kati de respiração o Chi Kung, No Kati, o atleta faz uma luta imaginária
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Shao Lin. O programa será apresentado pelo Mestre Dimas, com a
participação de alunos das diversas academias de artes marciais de Duque de
Caxias. .O objetivo do programa é fazer uma maior divulgação das Artes
Marciais em um novo meio de comunicação para um público diferente e
divulgar a cultura tradicional japonesa.
Botando na banca – programa gravado no dia em que vai ao ar. A
equipe fica ao lado de uma banca de jornal, e pede para alguém que está
comprando o jornal comentar a notícia que acha mais importante naquele dia.
O programa será curto e rápido, no estilo “bateu valeu”, de improviso. A equipe
deve ser super-enxuta (diretor, câmera e produtor), e a edição praticamente
inexistente.
Cult Cosplay6 – o programa pretende ilustrar a cultura pop japonesa no
Brasil, a partir dos Cosplayers, grupos de adolescentes que se fantasiam de
personagens de anime para fazer apresentações. Em cada programa serão
entrevistados Cosplayers de personagens diversos, mostrando o processo de
produção da indumentária, a maquiagem e a apresentação do cosplay.
Também há a idéia de colocar pequenos quadros como o Playlist: Música de
fundo – j-pop sugerido pelos entrevistados, temas de abertura de animes,
músicas que em geral fazem parte do universo dos otakus (fã de
anime).Fanzine da semana
- divulgação de fanzines produzidos por
desenhistas que estão iniciando na carreira. AMV: Clipe de vídeo produzido por
fãs que usa como fundo animes conhecidos e músicas que tenham a ver com o
contexto da história.Tokusatsu: uma pequena série no estilo tokusatsu (tipo
Jaspion, Jiraya, changeman) que dure de 3 a 5 minutos.
individualmente e o objetivo é atingir a perfeição. Muitas vezes o Kati é usado apenas para apresentações, pois é uma
técnica esteticamente bonita. O atleta que pratica o Kati busca aperfeiçoar a força, o equilíbrio, a harmonia, a
respiracao, a flexibilidade e a velocidade. (http://pt.wikipedia.org/wiki/Kati)
6
Cosplay é abreviação de costume play ou ainda costume roleplay (ambos do inglês) que podem traduzir-se por "jogo
de disfarces" ou "jogo de fantasias", ou ainda "jogo de trajes", e tem sido utilizado no original, como neologismo,
conquanto ainda não convalidado no léxico português. Refere-se a atividade lúdica praticada principalmente (porém
não exclusivamente) por jovens e que consiste em disfarçar-se ou fantasiar-se de algum personagem real ou ficcional,
concreto ou abstrato, como, por exemplo, animes, mangás, comics, videojogos ou ainda de grupos musicais —
acompanhado da tentativa de interpretá-los na medida do possível. Os participantes (ou jogadores) dessa atividade
chamam-se, por isso, cosplayers. http://pt.wikipedia.org/wiki/Cosplay
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Cidade exposta – série de 12 episódios que mostra o modo de vida da
Baixada. Episódio 1: Do mangue à mesa. Programa de 20 minutos que mostra
o percurso de um caranguejo desde sua pesca no manguezal até ser servido
em um restaurante de Duque de Caxias,especializado em frutos do mar. Nesse
percurso, serão apresentados os projetos de recuperação do manguezal da
região, o destino das cooperativas de pescadores, as feiras livres e a vida dos
trabalhadores e freqüentadores de um restaurante que é ponto de reunião das
famílias locais.
Voz urbana – programa com cerca de 8 minutos, que disponibiliza a
câmera para que os populares falem ou façam o que desejarem. Pode ser o
anúncio de um evento, um recado pessoal, uma opinião, uma apresentação
artística. As locações serão: praças, shopping centers, saídas de universidade.
Ao final de cada série de 10 programas, será realizada uma avaliação dos
temas mais abordados para ver o que está mobilizando a população da região.
Em matéria de arte – programa em formato de documentário, com cerca
de 30 minutos que apresenta a arte e a técnica dos artistas plásticos da
perferia.
Improviso – o músico, apresentador e aluno do mestrado Pedro
Albuquerque, recebe músicos convidados para sessões de improviso.
Programa transmitido ao vivo.
Práticas metodológicas
A primeira transmissão da IPTV Kaxinawá foi resultado das
atividades realizadas entre setembro de 2007 e outubro de 2009, voltadas para
a incorporação das TIC no âmbito da formação dos alunos da FEBF. Ela
complementou as atividades da Rede Interativa Kaxinawá na Internet, onde já
é veiculada a programação da Rádio Kaxinawá e estão disponíveis os vídeos
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1º Simpósio Internacional de Televisão Digital (SIMTVD) – 18 a 20 de novembro, Bauru/SP
das entrevistas realizadas durante o programa Quinta dimensão, origem do
projeto da IPTV Kaxinawá, no qual o nossa pesquisa se insere.
A criação de um cineclube e de um laboratório de linguagens
audiovisuais, o LABORAV, foram as primeiras atividades práticas de nossa
pesquisa. O cineclube não despertou nem o interesse e nem a freqüência
desejada, com sua programação pré determinada e definida de cima para
baixo, de acordo com os interesses da pesquisa e não dos alunos. No Laborav,
contávamos com a participação de cinco alunos, todos integrantes do grupo de
pesquisa do projeto Quinta dimensão, programa de entrevistas realizadas pelo
professor Henrique Sobreira com pesquisadores de diferentes áreas. Esses
alunos já tinham alguma intimidade com o equipamento de gravação de uso
doméstico, de fácil manuseio. Foram eles que realizaram os vídeos de
demonstração dos programas que eles próprios imaginaram que seriam
veiculados na TV Kaxinawá, e que foram apresentados no campus da
faculdade e dezembro de 2007.
Foi durante as atividades de produção, ao longo do primeiro
semestre de nossa pesquisa, que percebemos que os alunos em geral não
tinham, de imediato, interesse em estudos teóricos sobre o audiovisual. Para
estimular a adesão ao nosso projeto, criamos as Oficinas de Audiovisual, sob o
nome genérico Da idéia ao produto final. A primeira oficina, intensiva, foi
realizada entre os meses de fevereiro e março de 2008. A segunda se
prolongou de maio a dezembro do segundo semestre de 2008, contando com
um grupo de 12 alunos, dos quais seis já se incorporaram à equipe de
produção do LABORAV.
Durante as atividades de gravação, concluímos que, para a criação da
IPTV Kaxinawá, seria preciso um up grade nos equipamentos de produção e
transmissão
audiovisual.
Depois
de
consultarmos
diversos
técnicos,
redimensionamos nossas necessidades e, com verbas de fomento à pesquisa
da FAPERJ e da própria UERJ, já compramos alguns equipamentos
profissionais básicos. Desde o início de maio de 2008 contamos com uma
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câmera Sony HVR-Z1, montamos um computador com configuração adequada
para edição de vídeo e compramos os equipamentos complementares para a
produção de vídeo e transmissão via Internet.
O resultado desse trabalho, ao longo de 2008, foi a realização do
primeiro programa da série Quem cala, consente. O “entrevistado” foi o poeta
Carlos Drummond de Andrade. Já estão agendadas as entrevistas com as
estátuas do compositor e instrumentista Pixinguinha, do compositor e cantor
Dorival Caymmi, do compositor Noel Rosa e do jornalista Otto Lara Resende.
Incorporamos a prática da produção audiovisual em nossas aulas na
graduação, na disciplina obrigatória de Cultura local e global 4 e na eletiva
Multimídia e Educação. Nas duas turmas regulares, os alunos tiveram como
exercício prático a transformação de alguns conteúdos da matéria em um
roteiro para documentário. Dois dos cinco roteiros realizados pelos grupos da
turma de Multimídia e Educação 1 serão produzidos. Os vídeos abordarão o
surgimento do computador e a importância das interfaces gráficas para a
incorporação da informática no dia-a-dia. Na turma de Cultura Local e Global 4,
os cinco roteiros baseados no livro de Darci Ribeiro, O povo brasileiro, estão
em fase de conclusão.
Apesar do entusiasmo dos alunos das duas turmas com a possibilidade
de produzir seu próprio material audiovisual, percebemos que ainda
encontramos resistências ao uso da tecnologia entre alguns dos futuros
professores. Durante os debates em sala de aula, principalmente na turma de
Multimídia e Educação 1, ficou demonstrado que eles ainda não se
conscientizaram da importância das transformações técnico-socioeconômicas
que ocorreram a partir do início da sociedade da informação.
Mesmo assim, nossas atividades já estão se refletindo no
ambiente do campus. Sem interferência dos professores, um grupo de alunos
decidiu estimular a prática da exibição de filmes e discussões sobre cinema,
criando uma mostra permanente. Algumas exibições já aconteceram, sempre
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às quartas-feiras, entre meio-dia e 14h. Também foi criado um grupo para
discutir a proposta da mostra, hospedado no site de relacionamento da
Faculdade para aglutinar pessoas interessadas em construir, na estrutura da
FEBF, a prática permanente de exibições e de discussões em torno da sétima
arte7.
A partir do maior contato com os alunos que desejam se envolver na
produção e exibição audiovisual, descobrimos que vários deles já têm o hábito
de realizar seus vídeos, postando-os no Youtube. Por isso, uma de nossas
próximas atividades será pesquisar este material, reuni-lo e criar condições
para que eles sejam exibidos em mostras internas e transmitidos pela IPTV
Kaxinawá.
Considerações finais
Territórios são espaços permeáveis, que permitem trocas entre fluxos de
marcas materiais e imateriais, interiores e exteriores. É bom lembrar que os
territórios não pré-existem às suas marcas. São as marcas que o constituem.
Um ato de territorialização se completa no momento em que os componentes
do meio interno e externo são apropriados e se tornam uma nova forma de
expressão a partir de novos agenciamentos. Por isso, criar um território seria
um dos efeitos da arte. É esse território estético que pretendemos criar no
LABORAV.
O trabalho imaterial realizado através da apropriação das tecnologias de
informação pelos alunos de pedagogia da periferia do Rio de Janeiro abre o
espaço para territorialização das imagens e sons que circulam na TV e pelo
ciberespaço, criando um conteúdo ao mesmo tempo local e global.
7
Maiores informações sobre o assunto podem ser encontradas no site de relacionamento da FEBF em
http://febfuerj.ning.com/group/mostrapermanentedefilmes.
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Transformados e revestidos por outras linguagens e formas através do
conhecimento da tecnologia e do experimentalismo, a produção audiovisual
dos futuros professores da rede escolar visa inseri-los no contexto produtivo do
trabalho imaterial, ao mesmo tempo em que os prepara para lidar com a nova
geração de alunos. Serão os futuros professores e alunos capazes de
experimentar processos de subjetivação autônomos, criando uma linha de fuga
expressiva na sociedade de controle que sucedeu à sociedade disciplinar?
Será que a posse de um meio não comercial de produção e difusão de
imagens e sons criados por uma juventude conectada pode abrir caminhos
para a formação de um indivíduo mais democrático, integrante de uma multidão
esperta?
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IPTV Kaxinawá: autonomia audiovisual através da interface