PPGCOM ESPM // SÃO PAULO // COMUNICON 2014 (8 a 10 de outubro 2014)
A Utilização de Crianças em Publicidade Direcionada para Adultos:
Uma Análise do Filme Publicitário Viver é Prime do Banco
Bradesco1
Diana Gualberto de Macedo2
Centro Universitário Internacional Uninter
Andressa Cristina Rodrigues do Nascimento3
Centro Universitário Internacional Uninter
Resumo
O uso de crianças em publicidade direcionada para adultos está cada vez mais frequente. O
presente trabalho tem por finalidade analisar qual a percepção dos adultos sobre esta prática,
que, geralmente e prioritariamente, se utiliza de um apelo emocional. O objeto de estudo é o
filme publicitário Viver é Prime do banco Bradesco (2013), a partir do qual foi feita uma análise
netnográfica sobre os comentários dos internautas no Youtube e, posteriormente, foi realizada
uma pesquisa qualitativa para compreender qual a percepção das pessoas sobre o objeto e o
tema em questão.
Palavras-chave: banco Bradesco; consumo; criança; publicidade; Viver é prime.
Ao verificar de que forma se dá o consumo, percebe-se que com o passar dos
anos as empresas buscam cada vez mais investir em métodos que possam ser um
diferencial, agregando valor à marca, e que muitas vezes é comunicado através da
publicidade. Seguindo esta premissa, as empresas em sua comunicação não apenas
descrevem seus produtos, suas características, mas buscam agregar valor a eles,
algumas vezes, como no caso do filme publicitário analisado neste trabalho,
incentivando a busca pela qualidade de vida baseada em relacionamentos familiares.
Para isso, o Bradesco se utilizou da imagem de um bebê.
1
Trabalho apresentado no Grupo de Trabalho 3: Comunicação, Consumo e Infâncias, do 4º Encontro de
GTs - Comunicon, realizado nos dias 08, 09 e 10 de outubro de 2014.
2
Mestre em Comunicação e Práticas do Consumo pela ESPM e professora do Curso de Comunicação
Social do Centro Universitário Uninter, email: [email protected].
3
Aluna do 7°período do curso de Publicidade, Propaganda e Marketing do Centro Universitário Uninter,
email: [email protected].
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Muito se fala sobre publicidade infantil, proibição ou não da publicidade
infantil, produtos direcionados para crianças, o uso de personagens em embalagens e
em propagandas infantis, mas, o foco deste trabalho, todavia, é outro: busca-se analisar
o uso da imagem da criança/bebê em publicidade direcionada para adultos, analisando
de forma mais explícita o filme publicitário Viver é Prime do banco Bradesco.
Neste trabalho, busca-se então compreender a percepção das pessoas sobre o
filme publicitário em questão, tanto a partir de uma pesquisa netnográfica – em que se
buscou observar e analisar os comentários das pessoas sobre o vídeo veiculado no
Youtube – quanto de uma pesquisa de campo, feita com 20 adultos entre 20 e 40 anos,
residentes da cidade de Curitiba, entre os dias 19 e 30 de maio de 2014. A escolha de
tal faixa etária se deu pelo fato de que aparentemente é o público representado no filme:
um casal jovem com um bebê pequeno, e possivelmente o público alvo da campanha.
Antes de realizar as pesquisas foi feita uma breve análise do discurso do filme
publicitário
Acredita-se que as mulheres possam gostar mais e apresentar maior empatia
com o filme do que os homens por algumas razões: por identificarem-se com o
conteúdo do mesmo, por liberarem mais ocitocina 4 do que os homens e até mesmo por
poderem afirmar isso, já que é socialmente mais aceito as mulheres demonstrarem afeto
por crianças e até mesmo, esperado.
A publicidade, suas estratégias e o consumo
O modo com que se consome e se é influenciado a comprar, envolve muito mais
do que apenas a existência de um produto ou a necessidade e o desejo de consumi-lo.
A Revolução Industrial alterou drasticamente a relação entre consumidor e produto.
Segundo Turner:
A propaganda só conheceu uma verdadeira expansão, contudo, no final do
século XIX. A tecnologia e as técnicas de produção em massa já tinham
4
Ocitocina é um hormônio e está diretamente relacionado à sensação de prazer, de bem estar físico e
emocional.
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atingido um nível de desenvolvimento em que um maior número de empresas
produzia mercadorias de qualidade mais ou menos igual a preços mais ou
menos iguais. Com isso, veio a superprodução e a subdemanda, tornando-se
necessário estimular o mercado de modo que a técnica publicitária mudou da
proclamação para persuasão. (1965, apud VESTERGAARD; SCHRODER,
2004, p. 5)
No período que antecede a produção em massa, a oferta de produtos era escassa
e, portanto, geralmente era o consumidor que se adequava aos produtos. Hoje a oferta
é muito maior e, consequentemente a concorrência também é. Alves, Fontoura e
Antoniutti (2011, p. 80), com relação a publicidade afirmam que:
Não bastava somente informar os atributos do produto. A informação precisava
vir acompanhada de uma ‘ideia’, capaz de envolver as pessoas, levando-as a
mudar de atitude e de pensamento e de influenciar o seu modo de vida.
Neste contexto, a publicidade surge como fator decisivo na diferenciação dos
produtos, na identificação de público alvo e sua fidelização, além de se tornar fator
competitivo. Logo, a publicidade, mais do que anunciar, muitas vezes tem o papel de
reforço da marca e promover o lado simbólico do que é ofertado, pois as qualidades e
funções do produto/serviço muitas vezes já não bastam para torná-lo atrativo, já que a
oferta de produtos e serviços com praticamente as mesmas características e funções é,
geralmente, grande. Portanto, “comprovadamente o número de anúncios que apelam
para necessidades secundárias como qualidade, vantagem, economia, prestígio é muito
maior que os dos que simplesmente apelam às primárias” (GADE, 1998, p. 115).
Identificar a percepção de tais discursos publicitários pelo público é um desafio que o
anunciante enfrenta na busca pela adesão da mensagem, que, posteriormente, pode
desencadear a compra por determinado produto/serviço.
Observa-se que para causar a identificação com seu consumidor, algumas
empresas apelam para a necessidade do amor à família, principalmente a partir do uso
de crianças em suas propagandas. Cada vez mais, instituições financeiras têm feito o
uso da imagem de crianças em suas campanhas publicitárias para atingir os adultos. O
banco HSBC com sua propaganda “Lemonade”, o banco Itaú em sua campanha “Sem
papel”, o Banco do Brasil com a campanha “Por que bom pra todos?” e o banco
Bradesco que lançou em 2013 uma nova estratégia de comunicação que, conforme
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descreve a agência responsável pela campanha, WMcCann, traz como título “Viver é
Prime”, que será a analisada neste trabalho.
HSBC (2012)
Itaú (2012)
Banco do Brasil (2013)
Bradesco (2013
A campanha “Viver é Prime” é composta de filmes, anúncios e spots de rádio. Suas
mensagens trazem situações alegres relacionadas ao dia a dia das pessoas, como:
brincar com o cachorro da família, jogar futebol com os filhos e um bebê que, enquanto
se alimenta, também brinca com a ajuda dos pais. Na mídia impressa imagens de
situações parecidas trazem o texto: “Vai dizer que você pensou no seu banco quando
viu essa foto?”.
Para persuadir o target a publicidade se utiliza de diversas técnicas de
linguagem, desde o texto, as cores e as imagens. Tudo é pensado de forma a motivar o
consumidor em sua escolha. Dentre os fatores que influenciam na compra, está a
estratégia da argumentação feita na publicidade. Duas linhas de força denominadas por
Nietzsche, apolínea e dionisíaca, são citadas por Carrascoza (2007, p. 27) que destaca
a existência delas no texto publicitário. O modelo apolíneo trata de um texto mais
racional, que visa trazer a valorização prática “em que a indução é direta” enquanto o
dionisíaco valoriza uma linha mais lúdica, utópica “em que o caráter indutivo é mais
indireto”. No presente trabalho, percebe-se que, o texto apresenta um cunho racional,
mas as imagens apelam para a emoção do telespectador, visando se aproximar do seu
cotidiano, buscando assim, persuadir. Para Sant´Anna, Rocha Junior e Garcia,
“Palavras e imagens devem caminhar juntas, reforçando-se mutuamente.” (2009, p.
163). Ou seja, assim como linguagem verbal e não verbal se mesclam, as duas linhas
de raciocínio também o fazem.
Existem graus de persuasão: alguns mais visíveis e outros menos visíveis, ou de
certa forma mascarados, segundo Citelli (2005, p.6). De acordo com o autor “o
elemento persuasivo está colocado ao discurso como a pele ao corpo”, portanto, ao
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analisar um texto leva-se em consideração que o mesmo não encontra-se “puro” mas
sim acompanhado de subjetividades que pretendem persuadir, e na publicidade isso se
dá geralmente de forma mais explícita; e menos mascarada.
Para que a publicidade tenha o efeito desejado, que é vender, a partir da atração
da atenção do consumidor, Sant´Anna, Junior e Garcia falam da necessidade de
compreender alguns elementos, entre eles os afetivos. Eles dizem que “o espírito
humano só se detém naquilo que lhe interessa pessoal e diretamente, desviando-se do
que não cativa a sua atenção.” (2009, p. 86) e ainda que “ao público interessa muito
mais a satisfação que pode obter com o produto do que o próprio produto”.
Fica claro então que as necessidades e desejos humanos servem como
instrumentos a serem utilizados pela publicidade. Valendo-se disso as peças
publicitárias são criadas muitas vezes “ancoradas nas ordenações sociais, culturais,
econômicas e psicológicas dos grupos humanos para os quais as peças estão voltadas.”
(Citelli, 2005, p. 56).
Viver é prime
O filme publicitário analisado foi veiculado a partir do dia 22 de julho de 2013,
pelo Banco Bradesco. O objetivo era divulgar uma nova estratégia de comunicação do
banco: Viver é prime. Segundo o site do banco, o Bradesco Prime é um segmento criado
para atender a pessoas físicas de forma diferenciada, personalizando o atendimento com
produtos que atendam necessidades de clientes de alta renda, fornecendo ao cliente a
exclusividade no atendimento. Prime é um termo em inglês que, ao ser traduzido para
o português significa “primordial”. Trata-se também de uma forma de atrair o
consumidor, pois segundo Santaella é a utilização de um “[...] signo do estrangeiro,
que, para a cultura brasileira de classe média, sempre exerce um forte poder de sedução”
(2008, p.61). Sendo assim, a utilização do termo em inglês e não no português reforça
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a mensagem de que o serviço pretende se distinguir por superioridade, atingindo um
público de renda mais alta.5
O objeto de estudo deste trabalho é o primeiro anúncio veiculado, que mostra
uma cena cotidiana de um bebê se alimentando e encerra com a presença dos pais,
demonstrando afetividade, felicidade, não aparentando se tratar de uma propaganda de
um banco.
O filme é protagonizado por um bebê que se alimenta de uma gelatina vermelha,
a cor nesse caso permite que o telespectador consiga associá-la à cor do banco
Bradesco, embora de forma sutil. A trilha instrumental foi criada exclusivamente para
ele, onde observa-se um up6 de tempo quando a câmera faz close no rosto do bebê,
transmitindo doçura e ingenuidade, o que chama a atenção para o cuidado que um bebê
necessita ao aparecer primeiramente sozinho. A câmera se mantém no mesmo
enquadramento até que o bebê esboça um sorriso, em seguida corta-se para o prato que
está à sua frente com a gelatina, que neste momento ele amassa com as mãos. A câmera
fecha novamente no rosto do bebê e há um silêncio quando ele olha para frente. Ao
final, a locução tem o seguinte discurso: “Você pensou no seu banco quando viu essa
cena? Não, né? E tem que ser assim. O Bradesco Prime cuida das coisas de banco por
você, enquanto você se liga nas outras coisas valiosas da sua vida”.
5
A renda mínima para se enquadrar no segmento é de R$ 9.000,00 ou investimentos a partir de R$
100.000,00.
6
Aceleração no ritmo da música.
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Pode-se entender que, ao usar o termo “coisas de banco”, usa-se uma linguagem
informal presente no cotidiano das pessoas que aproxima o telespectador, causando
identificação. A cena seguinte apresenta um homem e uma mulher, representando os
pais do bebê, que brincam com ele demonstrando carinho, com isso evocam a
representação de uma família feliz ao apresentar a alegria de partilhar momentos
familiares, que seriam as “coisas valiosas” a que a locução refere-se. O ambiente em
que os atores se encontram é uma casa, bastante ampla, com várias janelas até o chão,
o que ajuda também na representação de uma família do tipo prime, ou seja, de alta
renda.
Ainda sobre este discurso, pode-se citar como exemplo as campanhas
publicitárias do Mastercard, veiculadas desde 2008, que usavam um discurso muito
semelhante cujo slogan era “Tem coisas que o dinheiro não paga. Para todas as outras
existe Mastercard”. Segundo a diretora de Marketing da MasterCard no Brasil, Cristina
Paslar, o consumidor “hoje, não quer ser simplesmente impactado por uma propaganda
e, sim, fazer parte dela. Então, para conquistá-lo, temos de interagir com ele e levá-lo a
enxergar nossa comunicação como entretenimento”.
Netnografia: uma análise sobre os comentários do filme Viver é Prime
A pesquisa etnográfica trata-se de uma observação a partir da inserção do
pesquisador no ambiente a ser pesquisado, é uma forma de investigar participando do
meio, recolhendo informações do universo em que se incluiu (AMARAL, 2008). A
partir do surgimento das comunidades virtuais, foi feita uma transição, adaptando tal
metodologia para o ambiente cibernético, o que foi chamado de netnografia.
A netnografia, como transposição virtual das formas de pesquisa face a face e
similares, apresenta vantagens explícitas tais como consumir menos tempo, ser
menos dispendiosa e menos subjetiva, além de menos invasiva já que pode se
comportar como uma janela ao olhar do pesquisador sobre comportamentos
naturais de uma comunidade durante seu funcionamento, fora de um espaço
fabricado para pesquisa, sem que este interfira diretamente no processo como
participante fisicamente presente. (AMARAL, 2008)
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Neste caso especificamente, foi feita observação e a análise sobre o discurso de
determinados usuários que, voluntariamente e, de certa forma, espontaneamente,
comentaram sobre o vídeo “Viver é Prime” publicado no Youtube pelo banco Bradesco
a fim de divulgar sua nova campanha publicitária. O vídeo foi publicado em 22 de julho
de 2013, e teve 87 comentários, até o mês de julho de 2014, sendo que desses, 66 foram
o número total de participantes, pois os 21 comentários restantes foram de pessoas que
participaram mais de uma vez. Uma pessoa apenas participou manifestando-se contra
o vídeo, em 11 comentários, nos quais, além de responder a outros, criticou o
estereótipo físico das pessoas que aparecem no filme, como é possível ver a seguir: “Oh
Bradesco! Quanto veremos um propaganda com um casal de negros e seu filho
pretinho!!?? Seus vermes sangue sugas! E varios retardados aqui pagando pau ainda!
Brasiu pais da puta que o pariu!”
Os comentários sobre o vídeo tiveram a participação de 28 mulheres e 29
homens, 5 participações não puderam ser identificadas pelo fato de as pessoas
utilizarem nomes de usuários que dificultam a identificação. Houve ainda 3
participações de instituições como: Rede Estrela, Cidadão brasileiro e Netsfera e 1
participação do próprio banco Bradesco, que optou por não se manifestar sobre os
comentários, mas por compartilhar o vídeo no Google +, deixando também o registro
no Youtube com um comentário, que teve 18 pessoas que curtiram: “Own! Tem muita
coisa valiosa nesta vida e o bom é aproveitar cada uma delas.” A linguagem utilizada
pelo Bradesco em sua interação com os internautas é bastante informal, buscando
justamente a aproximação com eles.
Das 66 participações, 25 pessoas entraram para comentar que gostaram da
propaganda, sendo que dessas 12 foram homens. Das mulheres que comentaram, 11
falaram diretamente sobre o bebê, elogiando suas características físicas. Sobre o uso de
criança na propaganda em geral, houve apenas um comentário criticando: “os cara tao
apelando nas crianças nos comerciais !”
Percebe-se que entre homens e mulheres o número de participações quase se
igualou. A maioria (37) gostou da propaganda no geral, sendo que 19 mencionam o
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bebê, elogiando-o. Daqueles que criticaram a propaganda (5) ou o banco (11) a
participação foi somente masculina. Ainda há 9 participações onde os usuários não se
manifestaram nem a favor nem contra, apenas respondem a outros participantes ou se
interessaram em saber sobre a trilha sonora, por exemplo.
Os comentários negativos totalizaram 16, sendo que 5 pessoas criticaram
diretamente a propaganda e 11 criticam o banco, como por exemplo: “Caixas
eletrônicos estragados, filas, incopentência e inercia? não muito obrigado Bradesco é
um péssimo banco.” De qualquer forma, 5 pessoas criticaram o banco elogiaram a
propaganda.
A partir dos comentários foi possível perceber que o uso do bebê no comercial
foi mais elogiado (19) do que criticado (2), e entendeu-se que a vontade de comentar
sobre as características do bebê foi maior no público feminino do que no público
masculino, provavelmente pelo fato de as mulheres geralmente serem mais emotivas e
também por que é socioculturalmente mais aceitável e até mesmo esperado que
mulheres falem mais sobre as características do bebê do que homens na sociedade
contemporânea. Um dos comentários foi: “Acho que já assisti esse vídeo umas 1000
vezes só hoje. “Que Criança Perfeita! Linda." Sem palavras...”
A grande maioria das pessoas identificou-se e gostou do uso da imagem do bebê.
A maioria daqueles que comentaram negativamente foram homens, mas que na
realidade criticaram o banco e não o filme publicitário em si. É possível notar também
na linguagem dos internautas a informalidade com que se manifestam, inclusive com
erros de ortografia e concordância textual. Outra importante observação é que são, em
sua maioria, jovens.
Pesquisa qualitativa: uma conversa sobre o filme analisado
Buscando conhecer de forma mais aprofundada o que pensam os adultos entre
20 e 40 anos sobre a utilização da imagem do bebê pelo banco Bradesco no filme
publicitário “Viver é Prime”, foi realizada também uma pesquisa qualitativa, a fim de
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que se consiga compreender como se dá a aceitação de tal linguagem, que é de certa
forma racional, mas apela principalmente para a emoção.
Como uma conversa, embora tivesse um roteiro, as pessoas puderam dar suas
opiniões sobre o assunto. Foram entrevistadas 20 pessoas com idade entre 20 e 40 anos,
sendo 10 homens e 10 mulheres. Assim sendo, o questionário foi construído de forma
que os participantes pudessem dar suas opiniões sobre pontos como: o uso de crianças
em propagandas, alguma lembrança de propagandas que usaram crianças, etc., antes
mesmo de entenderem tratar-se de uma propaganda de banco para que não houvesse
indução nem positiva nem negativa na resposta.
Levando-se em consideração o discurso que o banco propõe no filme, a primeira
pergunta realizada era a seguinte: Se você precisasse definir o que são "coisas valiosas",
como você definira? Tal resposta foi praticamente unânime entre os entrevistados ao
definirem como sendo a família ou algo relacionado a ela, como pode-se ver em alguns
exemplos na a seguir: “Aquilo que a perda seria irreparável! A minha família”
(Masculino, 33 anos, casado), “Família, filhos, coisa simples do dia a dia, não ser
apegado a bens materiais.” (Masculino, 36 anos, solteiro), “A minha família”
(Feminino, 38 anos, casada), “Valiosas são todas as coisas que dizem respeito a mim e
minha família ao mesmo tempo. São as coisas que sentirei falta quando tiver que deixar
esse mundo, não aqueles que mês que vem já não farão diferença.” (Masculino, 40 anos,
casado).
Também houve observações como sendo, a integridade física, a vida em si,
pessoas importantes, etc. Em todas as respostas é possível encontrar relações de “coisas
valiosas”, como o banco propõe, com pessoas e não com produtos/serviços.
Das 20 pessoas que responderam ao questionário, apenas 4 não têm filhos e daqueles
que têm filhos (16) 5 são menores de 3 anos, ou seja bebês, os quais supostamente
melhor podem se identificar com o vídeo publicitário, pois podem reconhecer no bebê
mais facilmente a sua própria família. Comparando com os pais que não tinham filhos
ou que os filhos são maiores de 3 anos, percebeu-se nas respostas desses com filhos
bebês, uma maior afinidade em suas declarações, mesmo tratando-se de um bebê
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desconhecido, como por exemplo: “É muito bom ver uma criança feliz e sorridente”
(Feminino, 38 anos, casada).
O pesquisador americano Paul Zak 7 em uma de suas palestras fala sobre a
ocitocina8, um hormônio produzido a partir de estímulos, capaz de causar empatia nos
indivíduos. Uma imagem pode, portanto, servir de estímulo, como Paul cita em sua
palestra, que algumas pessoas passaram a produzir o hormônio através da visualização
de um vídeo. No caso deste filme, ao observar o bebê, a família aparentemente feliz e
a narrativa da locução, este estímulo pode ocorrer o que faz com que emocione o
receptor e ele produza mais ocitocina. O fato de a pessoa poder se colocar no lugar da
outra, passa-lhe a sensação de sentir o que o casal na cena está sentindo, no caso,
felicidade, e aceitar e gostar do discurso torna-se mais compreensível, pois a ocitocina
também é geralmente liberada quando vemos crianças, filhotes de animais, etc.
A partir de uma adaptação da metodologia de Bruzzone, foram apresentadas as
imagens do comercial, onde aparecem apenas as cenas sem que se identifique o produto
ou a empresa em questão, e então as pessoas foram questionadas se lembravam de ter
visto tal comercial e se sabiam de que produto se tratava. Do total, 7 disseram ter
lembrança de ter visto o comercial na TV, mas apenas 2 lembraram ser do banco
Bradesco, os outros 5 relacionaram a marcas como Sadia e Omo, ou apenas ao produto
margarina. Dos que não lembraram ter visto o filme publicitário, sugeriram que poderia
ser de produtos para bebê, como gelatina e sopinha, ou ainda seguro de vida e cuidado
com a família. É importante ressaltar que das 20 pessoas apenas 6 relacionaram a
propaganda com produtos direcionados a bebê ou criança, 4 não souberam ou quiseram
sugerir e 10 pessoas acreditaram ser uma propaganda ligada a produtos de uso, na
maioria das vezes, adulto, como alguns exemplos que seguem: “Não lembro mas, acho
que se trata de cuidado, zelo e segurança que os pais transmitem a criança.” (Masculino,
35 anos, casado), “Plano de saúde ou seguro de vida.” (Masculino, 40 anos, casado),
7
Economista e diretor do Centro de Neuroeconomia da Universidade Claremont.
Na gravidez a mãe libera este hormônio no parto e também é ele o responsável pelo auxílio na
amamentação.
8
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“Sabão em pó Omo” (Feminino, 26 anos, solteira), “Talvez seguro de vida.” (Feminino,
31 anos, casada).
Ao relacionarem que as imagens poderiam ser de produtos não diretamente
ligados ao consumo infantil, pode-se entender que as pessoas estejam possivelmente
acostumadas a perceber crianças em propagandas direcionadas aos adultos, já que a
maioria lembrou nesses segmentos a presença de crianças.
Quando questionados sobre o que acharam do bebê no comercial, houve
também unanimidade ao declarar que acharam “lindo”. Ao serem indagados se
lembravam de alguma outra propaganda que houvesse o uso de crianças, entre as
respostas foram citadas marcas de produtos infantis como Johnson & Johnson e Fisher
Price, e também houve a lembrança das propagandas do banco Itaú.
Ainda sem identificar que a propaganda apresentada era de um banco, os
entrevistados responderam se gostavam de ver criança em propagandas, apenas um
apresentou-se como indiferente ao uso e dois disseram depender da situação, alegando
que algumas propagandas querem “apelar para o instinto maternal/paternal”, porém, a
maioria (17) afirmou gostar: “Amo. Porque criança é alegria e o futuro.” (Feminino, 26
anos, solteira), “Sim. Porque as crianças são fofas e lindas e bem expressivas.”
(Feminino, 33 anos, casado), “Sim. Crianças são puras não tem maldade.” (Masculino,
36 anos, solteiro), “Sim. Gosto muito de criança e acho que chama atenção de todo o
público.” (Masculino, 38 anos, divorciado).
Foi solicitado aos entrevistados que citassem se, porventura, houve alguma
propaganda onde foi utilizada criança e que não tenham gostado, 15 disseram não se
lembrar e daqueles que citaram propagandas que não gostaram (5), comentaram sobre
as embalagens de cigarro, onde, em algumas é feito o uso da imagem de crianças muitas
vezes com deficiência, propositalmente para que cause estranhamento e impacte
aqueles que o usam. Também foi citada a propaganda do OMO “se sujar faz bem”,
nesta, a reclamação é de que incentiva as crianças a se sujarem e nem sempre os pais
usam esse sabão ou ele funciona como diz a propaganda.
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Após essas perguntas foi então revelado que a empresa que veiculou essa
propaganda se tratava de um banco para os 18 que não sabiam. Depois de serem
informadas 8 pessoas disseram ser do Bradesco, essa correlação pode ter sido feita pelo
uso da cor da gelatina que remete ao banco, como descrito anteriormente. Vale ressaltar
que algumas pessoas disseram acreditar que seria do banco Itaú, possivelmente pelo
constante uso de crianças em suas propagandas.
Tão logo foi esclarecido se tratar do banco Bradesco e apresentada a locução,
perguntou-se se as pessoas achavam que tanto a locução como as imagens faziam
sentido e que tipo de sentimento lhes era transmitido através do conjunto. A maioria
gostou, achou interessante e até mesmo emocionante e objetivo, concordando com a
mensagem do banco de que é preciso ter mais tempo para a família e se preocupar
menos com as “coisas de banco”. Quanto ao que sentiam ao ver as cenas as respostas
foram: carinho, amor, felicidade, tranquilidade. Algumas frases utilizadas, por
exemplo, foram: “Que a família é sempre mais importante.” (Feminino, 26 anos,
casada), “Me fez pensar sobre o que importa.” (Masculino, 38 anos, casado), “Amor
pelo que não tem preço.” (Feminino, 31 anos, casada), “Me transmite segurança.”
(Masculino, 35 anos, casado).
Percebeu-se que após as pessoas ficarem sabendo que se tratava de um banco,
suas opiniões ficaram mais críticas, como essa de um homem, casado, com 35 anos:
“Infelizmente todos os bancos estão usando o fator família como retorno de
investimento. A propaganda é boa, minha opinião é que a vida não se define apenas
neste período, a propaganda precisa explorar os demais 70 anos de vida de uma
família.” Ainda assim quando questionados diretamente sobre o que acham do uso de
crianças em propagandas de banco, há de certo modo um apoio, esclarecendo que
tornam-se “fofas” ou “divertidas”. Por outro lado, há reflexão: “De um ponto de vista
seria estranho, pois elas não utilizam esse tipo de serviço, por outro lado mexe com os
sentimentos dos pais que muitas vezes perdem muito tempo com o trabalho e outras
coisas, achando que um banco com bons serviços prestados lhe dará mais tempo com a
família.” (Mulher, 33 anos, casada e com filhos).
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Observou-se que no geral tanto homens como mulheres, gostaram ou gostam de
propagandas que contenham crianças, indiferente ao fato de ser ou não de um produto
direcionado ao público infantil. Percebe-se que tais propagandas não passam sem ser
percebidas, pois o fato de muitos se lembrarem de outras com conteúdos parecidos
reforça tal ideia. E mesmo aqueles que têm filhos, não se “importam” ou acham
conveniente o uso de crianças nesse segmento, chegando a pensar inclusive na eficácia
da propaganda.
Considerações finais
A partir destas análises, percebeu-se, portanto que ao se envolver
emocionalmente com a propaganda, o receptor, tanto homem como mulher, tende a
aceitar, o uso de crianças na publicidade direcionada para adultos de maneira
praticamente natural e muitas vezes inclusive apoiando o uso. Daí o motivo pelo qual
empresas investem cada vez mais nesta estratégia, pois seus receptores segundo as
pesquisas e análises feitas, em sua maioria, gostam e se identificam.
Percebe-se que o consumidor, algumas vezes, passa a observar tais estratégias
com o ponto de vista da empresa e não com o seu de consumidor, ao declarar que é uma
boa estratégia. Além disso, alguns consumidores disseram se envolver não apenas
emocionalmente, mas também racionalmente, quando afirmaram que a propaganda
passa segurança.
Portanto, para as empresas, pode-se dizer que a utilização de crianças, mesmo
em comerciais direcionados para adultos, é uma linguagem eficaz. Porém, vale ressaltar
que muitos são contra a utilização da imagem de crianças em publicidade, ou ao menos
procuram restringir bastante, como por exemplo, o Instituto Alana. Esta ainda é uma
questão para se refletir, portanto, dentro do campo da publicidade.
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Referências
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2008.
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São Paulo, 2007.
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