CADERNOS DE SOCIOMUSEOLOGIA Nº 9 - 1996 35 OS PROCESSOS MUSEAIS E AS QUESTÕES METODOLÓGICAS: O MUSEU DA CIDADE DE PIRAJU COMO ESTUDO DE CASO Apresentação: “...os homens constroem os templos para seus deuses, as fortalezas dos soldados, os palácios para seus reis, destinam parques às suas vitórias, constroem casas para sua família, zoológico para seus animais, os museus para seu patrimônio cultural” Giraudy & Bouilhet (1977) Em diversos países os grandes museus vêm modificando sua política cultural, repensando-se conceitualmente, sofrendo reformas quanto ao espaço arquitetônico e apresentação das coleções; como também os pequenos museus vêm experimentando novas estratégias para a aproximação com a população, procurando sustentar-se em uma atuação comunitária. Esses esforços, de natureza diferente, procuram fazer com que os museus superem o aspecto de "depósitos de objetos" e passem a servir à população. Entre esses novos tipos de museus, surge o "Museu de Cidade", voltado para a preservação das estruturas, das referências e das formas de uma cidade. Esse modelo museológico procura ser o "local" privilegiado para a população encontrar as suas marcas patrimoniais e conhecer as suas tradições e rupturas culturais. É um museu para a população se ver, como também ser vista por pessoas CADERNOS DE SOCIOMUSEOLOGIA Nº 9 - 1996 36 de outras regiões. Em geral, reúnem vestígios do processo de urbanização, dos ciclos econômicos que sustentaram a consolidação da cidade, das famílias que formaram a população, entre outros referenciais. Preservam um patrimônio que possa garantir a identidade do espaço circunscrito de uma cidade e a vivência cultural partilhada por sua população. Tanto quanto os outros tipos, os museus de cidade também devem desempenhar três funções fundamentais (Bruno, 1990:8 e 9): "- Função Educativa: é a força importante das atividades museológicas e acarreta o desenvolvimento e aperfeiçoamento da capacidade intelectual, cultural, artística, ideológica, perceptiva e afetiva. Como afirma Léon (1978: 306) - "trata-se de dispor a mente e a sensibilidade do visitante para o encontro com as civilizações passadas ou atuais que possibilite uma via de reflexão profunda sobre si mesmo". Sob este aspecto, o museu deve oferecer uma educação objetiva e também subjetiva, renunciando às implicações doutrinárias e propiciando em cada espectador faculdades específicas, tais como: fantasias, curiosidades e ligações com a realidade. Por isso, é fundamental que as crianças aprendam desde muito cedo a conviverem com os objetos, exposições e museus. O Museu deve oferecer à criança situações que levem à reflexão, ao desenvolvimento do raciocínio, pois só assim estará contribuindo para a Educação Libertadora, que é aquela que, consciente e concretamente questiona a realidade do indivíduo, do outro e do mundo que os cerca, levando-os às transformações; - Função Científica: deve estar presente no interior e exterior do museu. No interior, enquanto as exposições representam o desfecho de um trabalho iniciado com a coleta sistemática do material, sua posterior catalogação e análise. Ao mesmo tempo, o museu deve atuar exteriormente, através das exposições e também de CADERNOS DE SOCIOMUSEOLOGIA Nº 9 - 1996 37 suas atividades paralelas (discussões, cursos, publicações, etc), como propulsor na procura do conhecimento, próprio a uma instituição científica; - Função Social: a mais importante de todas, uma vez que ela representa o encontro das duas anteriores e também o resultado de ambas, pois somente através do pensamento científico, o museu poderá contribuir para a educação e desempenhar papel significativo em uma sociedade". Para o desempenho dessas funções, esta proposta apresenta algumas diretrizes museológicas básicas para a atuação do Museu da Cidade de Piraju, a partir das considerações já enunciadas por Morais (1992:27 e 28), quando aponta que "Piraju será considerada um espaço produtor de relações sociais (o tecido urbano, as edificações, as praças e demais espaços de vivência)... Assim, optar-se-á pela musealização da cidade: Piraju e suas instituições serão consideradas espaços possíveis de intervenções culturais". Desta forma, o texto apresentado a seguir evidencia os aspectos conceituais e as propostas metodológicas deste modelo de musealização que vem sendo implementado desde 1993, na cidade de Piraju, Estado de São Paulo. 1ª Parte: Conceito Museológico: a musealização da cidade. O desenvolvimento das atividades deste Museu partirá da idéia de que a cidade é um espaço de construção coletiva, ao longo de um tempo permeado por relações sociais cotidianas, ligadas ao trabalho, lazer, família e devoção. Este binômio espaço-tempo é sustentado pelas características ambientais do território, da mesma forma que é vulnerável às influências de agentes externos. CADERNOS DE SOCIOMUSEOLOGIA Nº 9 - 1996 38 1) O Patrimônio da Cidade: O conjunto dos bens identificados por uma coletividade será o objeto central da atuação deste modelo museológico. Conforme aponta Lucena (1991:10), "a expressão patrimônio cultural se aplica às coisas que cada grupo preserva, porque nelas estão a sua sobrevivência. A noção de patrimônio engloba objetos, técnicas, espaços, edificações, crenças, rituais, instrumentos, costumes, explicitados no cotidiano das pessoas". Esses bens são definidos a partir da importância que possam ter no cotidiano da população. Cabe ao museu colaborar na identificação, estudo, conservação e comunicação das referências patrimoniais, sempre levando em consideração a sua relevância para as comunidades envolvidas que, por sua vez, podem ser constituídas de diferentes segmentos da população. 2) As Pessoas da Cidade: A atuação deste museu deve estar voltada para a identificação das expectativas das diferentes comunidades de uma cidade, procurando compreender os mecanismos de aproximação das pessoas e os respectivos envolvimentos comunitários, que muitas vezes podem estar vinculados à faixa-etária, tipo de trabalho, poder aquisitivo, lazer, interesses políticos, prática religiosa, etc. Deve-se entender que a comunidade de uma cidade não é homogênea, pois é constituída de classes e setores, tais como trabalhadores (campo e cidade), como também existem atritos entre os diferentes segmentos (integrados e marginalizados). Entretanto, as pessoas de uma cidade são as reais construtoras de uma memória coletiva e devem ser consideradas como agentes neste processo museológico. CADERNOS DE SOCIOMUSEOLOGIA Nº 9 - 1996 39 Cabe ao museu, a partir de um trabalho sistemático, encontrar os elos de união entre as pessoas (que as tornam Pirajuenses) e, também, identificar as fissuras internas, valorizando a diversidade nos usos e costumes. Um museu de cidade deve servir de opção para quem quer conhecer outros aspectos da população, ao lado da sua própria imagem, como também outros caminhos do seu território, diferentes das suas próprias trilhas. 3) Os Espaços da Cidade: É fundamental que um Museu de Cidade estenda sua atuação para toda a área de intervenção de uma população, compreendendo as mudanças sócio-econômicas que vão dando diferentes contornos ao centro e à periferia. Este processo museológico tem como características básicas a descentralização espacial, o respeito aos espaços culturais já institucionalizados e a revalorização de locais marginalizados. Sempre atuando dentro deste tênue limite existente entre preservação e desenvolvimento. A partir das considerações conceituais apresentadas, o Museu da Cidade de Piraju atuará através da musealização de diferentes espaços, procurando atingir os diversos segmentos da população, na busca da valorização de três aspectos, a saber: a) o território de Piraju: o equilíbrio ambiental. b) o ser pirajuense: o perfil da população. c) os signos de Piraju: as referências patrimoniais. CADERNOS DE SOCIOMUSEOLOGIA Nº 9 - 1996 40 2ª Parte: Metodologia de Trabalho: a pedagogia museológica. A metodologia para esse tipo de museu deve seguir dois princípios básicos: por um lado, valorizar as intituições culturais já existentes e, por outro lado, estabelecer um processo que conte, fundamentalmente, com a participação da população. Para tanto, o Museu da Cidade de Piraju está apoiado em duas grandes estruturas, a saber: a) Banco de Dados sobre a Cidade b) Núcleos Museológicos Temáticos 1) Banco de Dados sobre a Cidade. Este projeto está voltado para a organização e armazenamento de informações sobre a cidade. Começando pela informatização dos signos urbanos construídos (monumentos, edifícios, praças), passando para os elementos ambientais da região e terminando pelas coleções já existentes nas diferentes instituições. Deve ser armazenada, também, a memória ligada às festas populares e outras manifestações culturais.Em seguida, este projeto deve servir como suporte para a atuação dos núcleos museológicos. Seu desenvolvimento depende do cumprimento de algumas etapas preliminares, tais como: levantamento bibliográfico, realização de planilhas, elaboração de programa adequado para esse tipo de informatização, identificação dos primeiros itens a serem documentados. CADERNOS DE SOCIOMUSEOLOGIA Nº 9 - 1996 41 Cabe ressaltar que é fundamental a parceria com as instituições culturais, como também com empresas que possam sustentar financeiramente o projeto. A sede central do Projeto Banco de Dados pode ser instalada nas antigas dependências do Centro Regional de Pesquisas Arqueológicas Mario Neme, ficando próxima à Biblioteca e Arquivo da cidade. 2) Núcleos Museológicos Temáticos: Com o objetivo de desencadear o processo museológico, esta proposta apresenta quatro sugestões temáticas para dar início ao desenvolvimento do Museu da Cidade de Piraju, a saber: a) Arqueologia Regional: os vestígios do passado. b) Rio Paranapanema: a alma da cidade. c) Tradição e Progresso: o café e a evolução da cidade. d) Famílias: as pessoas de Piraju. Para cada um dos núcleos está previsto um processo de trabalho, um espaço de intervenção e um tipo de articulação junto aos diferentes segmentos da população. A união entre os diversos núcleos deve ocorrer através da aplicação de projetos pedagógicos voltados ao público infantojuvenil. 2.1) Núcleo Museológico A: "Arqueologia Regional: os vestígios do passado". Trata-se da reorganização do Centro Regional de Pesquisas Arqueológicas Mário Neme, que reúne o acervo proveniente das pesquisas do Projeto Paranapanema. CADERNOS DE SOCIOMUSEOLOGIA Nº 9 - 1996 42 Este núcleo deve atuar a partir de três bases: reserva técnica do acervo aberta ao público, exposições temporárias sobre as pesquisas em realização, vinculadas à mostra de longa duração e serviço educativo apoiado em arqueologia experimental. A sua sede central deve permitir o desenvolvimento das atividades mencionadas, da mesma forma, ser uma referência cultural para os interessados em Arqueologia. 2.1.1) Sede: O Galpão da Estação Ferroviária deve servir como sede para este núcleo, a partir de uma reforma e adaptação arquitetônica para o novo uso. Neste edifício devem funcionar as seguintes atividades: Sala 1: Exposição de Longa Duração: a) Processo de Hominização. b) Passagem do Homem para a América. c) O Homem no Vale do Rio Paranapanema. d) Métodos e Técnicas do Trabalho Arqueológico. Sala 2: Exposição biográfica sobre Mario Neme e Luciana Palestrini: a) Mário Neme: cronologia de uma vida. b) Luciana Palestrini: uma vida dedicada à arqueologia. Sala 3: Exposições Temporárias sobre os diversos programas de pesquisa arqueológica que fazem parte do Projeto Paranapanema. Sala 4: Espaço dedicado à guarda do acervo em armários de aço (com mezanino), sendo que uma das laterais é transformada CADERNOS DE SOCIOMUSEOLOGIA Nº 9 - 1996 43 em vitrina para o público ter acesso, também, às coleções. Estes armários devem ficar próximos à uma área destinada ao estudo e organização do acervo. Sala 5: Área destinada aos trabalhos públicos, como projeção de vídeo, atividades educativas, conferências, etc. Este núcleo, de alguma forma, já é uma realidade em Piraju, em função da importância da atuação do Centro Regional Mário Neme. Nesse sentido, sua implantação está vinculada a duas questões: por um lado, à adequada preparação do espaço (Galpão da Estação Ferroviária) e, por outro lado, às estratégias pedagógicas que devem vinculá-lo aos sítios arqueológicos, ao cotidiano da cidade e às atividades dos outros núcleos. Para tanto, este núcleo deve contar com as seguintes linhas de atuação: a) visitas monitoradas às exposições, seguidas de atividades educativas vinculadas à Arqueologia Experimental (em especial para o público infantojunvenil); b) visitas aos sítios arqueológicos da região, em especial durante etapas de escavações (programas turísticos); c) organização de seminários, sessões de vídeos e debates sobre arqueologia; d) realização periódica de cursos, para o público infanto-juvenil, sobre arqueologia, e e) preparação de professores para o acompanhamento das atividades deste núcleo. CADERNOS DE SOCIOMUSEOLOGIA Nº 9 - 1996 44 2.1.2) Processo de Trabalho: a) - reforma do Galpão da Estação Ferroviária. - detalhamento museográfico do projeto do mobiliário para a reserva técnica, uma vez que parcela substancial das instalações depende de móveis, divisórias e portas especialmente planejadas. - preparação do arqueológicos. circuito entre os sítios b) - elaboração de proposta para organização, guarda das coleções e realização dos respectivos estudos, como também, apresentação expositiva. Encaminhamento desta proposta às agências financiadoras, visando a contratação dos profissionais para o estudo, catalogação e possível publicação de um catálogo do Projeto Paranapanema. - montagem das exposições. - início das atividades pedagógicas c) - abertura integral do núcleo - inserção das visitas aos sítios arqueológicos em programas turísticos. A provável realização de escavações arqueológicas no espaço urbano, próximo a este núcleo, sob a coordenação de Margarida Andreatta, dará realce especial à dinâmica das atividades pedagógicas e turísticas, podendo vincular-se à estratégia museológica para consolidação do Museu da Cidade. CADERNOS DE SOCIOMUSEOLOGIA Nº 9 - 1996 45 2.2) Núcleo Museológico B: "Rio Paranapanema: a alma da cidade”. Este núcleo terá sua atuação voltada para as questões ambientais, utilizando o Rio Paranapanema como eixo temático, em função de sua importância para a cidade. Partindo da idéia de que este rio ocupa espaço significativo na construção da memória de Piraju, considera-se fundamental fomentar processos participatórios em que a população possa expor a "imagem" que tem do Rio Paranapanema. Para tanto, o Museu da Cidade deve desencadear duas linhas de atuação para consolidação desse núcleo, a saber: a) estudo e organização da documentação existente, com apoio de entidades ambientalistas e acadêmicas. b) desencadear campanha pública, com apoio da imprensa (jornal, rádio), com o tema "Mostre o Rio que voce vê", com o objetivo de levantar as diferentes imagens que a população foi guardando sobre o rio. Neste processo, documentos em diferentes suportes (fotos, desenhos, textos, etc) podem surgir e, após a devida catalogação devem ser expostos em local próximo ao rio e, em seguida, percorrer as escolas da cidade (a partir do empréstimo dos documentos). A implantação desse núcleo deve amparar as contradições normalmente existentes entre a preservação, uso e transformação das referências ambientais. Por um lado, este núcleo pode contribuir para uma pedagogia da apropriação, ou seja: chamar a atenção para o equilíbrio ecológico e a necessidade de conter a devastação da natureza. Sem uma sede específica, sua atuação deve consolidar-se junto aos espaços abertos (praças, nichos ecológicos, rio, etc), como CADERNOS DE SOCIOMUSEOLOGIA Nº 9 - 1996 46 também nas escolas através de oficinas de reciclagem de papel, maletas pedagógicas sobre questões ambientais, adoção de áreas verdes através de campanhas, entre outras atividades. A estratégia adotada, focalizando o Rio Paranapanema, pode ser repetida sistematicamente através da valorização de outros elementos, como o inventário de áreas verdes e a reorganização do viveiro de plantas. O desenvolvimento desse núcleo deve visar a formação da população infanto-juvenil, contribuir para a implantação de programas turísticos não predatórios e colaborar para a elaboração do Código Ambiental do Município de Piraju. 2.3) Núcleo Museológico C: "Tradição e Progresso: o café e a evolução da cidade" O café é uma referência básica para a organização e desenvolvimento de Piraju como cidade, como também de sua projeção no cenário estadual e nacional. Representa, no que diz respeito ao universo patrimonial, a linha divisória entre a tradição (preservação das referências ligadas ao período áureo) e progresso (opção por novos caminhos econômicos). O café será utilizado como símbolo para que este núcleo possa musealizar a força do trabalho que tem consolidado as estruturas sócio-culturais de Piraju. A partir da memória construída em função do café, o desenvolvimento deste núcleo abordará outras questões, tais como: pecuária, comércio, indústria, etc. Este núcleo deve atuar por meio de cinco bases: sede central com mostras de longa duração e reserva técnica do acervo; inventário dos signos urbanos (casas, monumentos, ruas) ligados ao CADERNOS DE SOCIOMUSEOLOGIA Nº 9 - 1996 47 desenvolvimento da cidade; organização de circuitos para visita; exposições itinerantes com temas ligados à história sócio-econômica de Piraju, para serem montadas em escolas, empresas, indústrias, clubes e projetos pedagógicos apoiados na Educação Patrimonial. 2.3.1) Sede: A Estação Ferroviária deve servir como sede básica depois que passar pelas devidas reformas, que compreendem a restauração do edifício e a adequação da arquitetura interna para poder receber a instalação de uma instituição que abrigará acervo (de tipologia diferenciada) e estará aberta à visitação. Este edifício dividido em dois pavimentos deve reservar o andar superior para as atividades burocráticas e técnicas, como também para palestras e projeção de vídeos. No andar térreo, a divisão deve ser a seguinte: Sala 1: Exposição de Longa Duração a) O Povoamento da Região b) São Sebastião do Tijuco Preto: as terras dão o contorno à cidade c) Piraju: o desenvolvimento da cidade d) O Café: cultivo e tecnologia e) Piraju: perfil econômico Sala 2: Exposição Temporária "As Ruas e Praças da Cidade" Espaço destinado à apresentação de mostras biográficas sobre personalidades que deram nomes às ruas e praças, a CADERNOS DE SOCIOMUSEOLOGIA Nº 9 - 1996 48 partir do desenvolvimento dos estudos vinculados ao Banco de Dados e do empréstimo dos objetos junto às famílias. Sala 3: Exposição Temporária Espaço destinado a mostras temporárias que, em seguida, devem se transformar em itinerantes, enfocando a pecuária, a indústria e o comércio. Sala 4: Reserva Técnica: deve ser preparado um espaço para abrigar coleções, mesmo que temporariamente, e proceder o devido tratamento museológico. A implantação do núcleo Tradição e Progresso deve ser acompanhada de uma estratégia pedagógica apoiada nos princípios da Educação Patrimonial, ou seja: priorizar a referência do patrimônio como evidência material de um processo cultural que deve ser vivenciado pelo público, em especial o infanto-juvenil em sua formação educacional. Significa que a história da cidade deve ser conhecida pela população a partir da convivência com os signos urbanos, da familiaridade com os objetos musealizados e da participação em reconstituições de fatos relevantes da história local. 2.3.2) Processo de Trabalho: a) - restauração e adaptação da sede, a partir da elaboração de projeto específico para esse fim, que deve ser encaminhado para empresas locais, com o objetivo de obter o financiamento das obras. Este projeto deve dar início a um longo processo de parceria entre o Museu da Cidade e os representantes dos principais setores econômicos de Piraju, uma vez que a atuação CADERNOS DE SOCIOMUSEOLOGIA Nº 9 - 1996 49 deste núcleo está voltada para a musealização desta realidade. b) - detalhamento do projeto museográfico para a montagem das mostras acima mencionadas; - preparação dos circuitos de visita aos principais pontos históricos da cidade e a respectiva inserção em programas turísticos. c) após a instalação da estrutura básica na sede central, este núcleo deve desencadear um processo de sensibilização da população em relação à sua área de atuação. Para tanto, deve estabelecer uma "gincana cultural" sobre a memória do café, com o objetivo de inventariar os bens patrimoniais. Com o apoio da imprensa (jornal e rádio) esta gincana deve contar com a participação de professores que possam colaborar na catalogação dos objetos recuperados pelos participantes, como também gravar informações sobre os respectivos donos. O material coletado deve fazer parte de mostra temporária, como estímulo à preservação patrimonial. d) todo esse processo deve estar permeado por projetos educativos, vocacionados para a observação, fruição e, questionamento das evidências patrimoniais ligadas à história local. A mesma estratégia ligada à musealização da "Memória do Café - vinculada à força do trabalho" pode ser utilizada para o tratamento de outros elementos sobre a cidade de Piraju, sempre relacionados à abordagem dos limites e reciprocidades entre tradição e progresso. CADERNOS DE SOCIOMUSEOLOGIA Nº 9 - 1996 50 2.4) Núcleo Museológico D: "Famílias: as pessoas de Piraju" Procurando conhecer o cotidiano das diferentes famílias, a partir da consideração de que a família é uma célula fundamental na dinâmica de uma cidade, este núcleo pretende levantar junto à população, a história das famílias, os usos e costumes, as opções quanto ao lazer e devoção, entre outros aspectos. A implantação deste núcleo, em um primeiro momento, deve contar com o apoio dos professores para a aplicação de questionários junto aos alunos. Utilizado como instrumento de investigação, devidamente preparado (perguntas estimulantes acompanhadas por imagens) e analisado, o questionário passa a desempenhar um papel chave para o levantamento do perfil da população. Em um segundo momento, este perfil deve apontar aspectos a serem musealizados, a partir do tratamento de temas de relevância para a população. Através de exposições, esses temas podem ser abordados periodicamente e devidamente desdobrados em atividades pedagógicas. Considerações Finais O êxito de um Museu de Cidade está ligado às possibilidades de participação coletiva que seus projetos permitem, ao mesmo tempo em que deve estar consolidado no exercício sistemático da cidadania. Um museu deste tipo deve consolidar-se em uma dinâmica museológica que não desenvolva suas atividades isoladamente. Ao contrário, deve envolver-se com as questões da cidade e tratá-las como Fatos Museais. CADERNOS DE SOCIOMUSEOLOGIA Nº 9 - 1996 51 É fundamental considerar que este projeto necessita de um tempo razoável para sua implantação e amadurecimento, como também depende de uma gestão partilhada com os diferentes segmentos da sociedade. Como tem ocorrido em outros locais, os Museus de Cidade partem da identificação de temas relevantes e das lideranças capazes de desencadearem o Processo Museológico. CADERNOS DE SOCIOMUSEOLOGIA Nº 9 - 1996 52 Esquema Metodológico Patrimônio Pessoas da Cidade da Cidade Espaços da Cidade BANCO DE DADOS Núcleo Museológico A Arqueologia Regional: os vestígios da cidade Núcleo Museológico B Rio Paranapanema: a alma da cidade PROJETOS Núcleo Museológico C Tradição e Progresso: o café e a evolução da cidade Núcleo Museológico D Famílias : as pessoas de Piraju PEDAGÓGICOS CADERNOS DE SOCIOMUSEOLOGIA Nº 9 - 1996 53 BIBLIOGRAFIA CITADA BRUNO, M.C. - Museu do Estado de Mato Grosso do Sul - proposta Museológica - encaminhada à Universidade Federal de Mato Grosso do Sul (199l) GIRAUDY, D. & Bouilhet, H. - Le Musée et la vie. La Documentation Francaise, Paris (1977) BRUNO, M.C. - Proposta Museológica - Museu do Estado de mato Grosso do Sul, São Paulo (1990 LÉON, A - El Museo: teoria, praxis e utopia. Ediciones Cátedra, S.ª, Madrid (1978) Lucena, C. - Linguagens da Memória in Apoio, nº 6, FDE, São Paulo (1991 MORAIS, J.L. - Secretaria Municipal de Cultura e Meio Ambiente - Plano de Reforma e Gestão - Piraju/SP (1992)Obs.: este projeto museológico foi apresentado como um dos “modelos de musealização”, aplicados à realidade brasileira, com o objetivo de vincular os vestígios pré-coloniais no âmbito de um Museu de Cidade.