Plano de Alta em uma Unidade de Terapia Intensiva Neonatal: Um desafio para
a equipe de enfermagem
Autores:
Bruna Corrêa Castilho (Castilho BC) - Enfermeira, especialista em terapia intensiva
neonatal pela PUC Campinas, pós graduanda em gestão em saúde pela UNIFESP. Email:
[email protected]. Responsável pela concepção, planejamento, obtenção, análise
e interpretação dos dados e redação do projeto.
Thiago Fernandes Franco (Franco TF) - Bacharel em Ciências Sociais (Unicamp) e
Relações Internacionais (Facamp), tutor do curso de Gestão em Saúde (UNIFESP/UAB),
doutorando
e
mestre
em
Desenvolvimento
Econômico
(História
Econômica) (Unicamp). Email: [email protected]. Responsável pela revisão
crítica.
Maykon Andersom Pires de Novais (Novais MAP) – Biólogo, bacharel em Ciências
biológicas e Licenciado em Ciências e Biologia, Especialista em Design Instrucional Virtual
pela Universidade Federal de Itajubá (Unifei), Mestre e Doutorando em Ciências pela
Universidade Federal de São Paulo (Unifesp), orientador do curso de Gestão em Saúde
(UNIFESP/UAB). Email: [email protected].
Resumo
A fim de dar conta da complexidade que é assistir o recém-nascido em unidade de
terapia intensiva neonatal (UTIN), torna-se importante o envolvimento da equipe
multiprofissional na assistência ao binômio mãe-filho. O preparo para a alta hospitalar
deve fazer parte de um processo de orientações, não devendo ocorrer apenas no
momento em que se dá, e sim sendo iniciativa constante da equipe durante o período de
internação. O planejamento precoce promove o envolvimento da família que contribui no
desenvolvimento do plano de alta, individualiza as ações e fornece aos pais maior
sensação de controle, como também, facilita as ações do profissional no momento da
alta. Neste artigo, tivemos objetivo de analisar a produção do conhecimento sobre plano
de alta hospitalar na área de enfermagem neonatal, dando ênfase na importância da
família na participação dos cuidados prestados ao RN internado na UTIN, e qual o seu
impacto na recuperação do bebê. Realizou-se uma revisão sistemática da literatura tendo
como enfoque o plano de alta hospitalar do recém-nascido internado em uma unidade de
terapia intensiva neonatal. Foram incluídos artigos com textos completos, publicação
após o século XXI, escritos nas línguas portuguesa, inglesa e espanhola, sem delimitação
de metodologia, teses e dissertações, além das referências citadas nos artigos
selecionados. Conclui-se que a literatura analisada tem enfatizado a importância do
preparo das famílias para a alta hospitalar durante toda a hospitalização do bebê,
reduzindo a ansiedade e aumentando a autoconfiança no cuidado domiciliar. Dessa
forma, a adaptação da família à criança, após a alta hospitalar, é facilitada. Destaca-se a
importância da equipe multiprofissional nas orientações oferecidas principalmente no
planejamento da alta hospitalar para que o cuidado do recém-nascido continue no
domicílio.
Descritores: recém-nascido, plano de alta, educação em saúde, família, unidade de
terapia intensiva neonatal.
Introdução
A partir do momento em que a mulher descobre que está grávida, e as mudanças
em seu corpo tornam-se perceptíveis, ela passa a se olhar de maneira diferente, a
imaginar como será o seu bebê, passando a desenvolver a partir deste momento, laços
afetivos entre mãe e filho, que se intensificam durante toda a gestação (REICHERT;
LINS; COLLET, 2007).
É nesse período que a mulher se prepara física e mentalmente para acolher seu
bebê, a futura mamãe sonha com um filho perfeito, saudável, com o momento em que
poderá tocá-lo e dar-lhe todo seu amor. Mas quando algo de inesperado acontece e este
bebê tão desejado nasce, fazendo-se necessária à hospitalização numa Unidade de
Terapia Intensiva Neonatal (UTIN), ocorre uma ruptura súbita entre o idealizado e a
realidade (SANTOS; FARIA; VICENTE, 2007).
A família vive em um momento anticlímax, no pêndulo que os transporta da
preocupação à esperança, do ânimo ao desalento, devido à separação do seu filho, ao
fato de estar hospitalizado, e a possibilidade de terminalidade. Esse desequilíbrio
emocional gera conflitos e agrava a sensação de culpa dos pais, dificultando sua
compreensão. O estabelecimento e a manutenção do vínculo durante o período de
hospitalização é fundamental para despertar o cuidado da família para com o bebê, como
também, para acelerar o processo de recuperação da sua saúde. O contato íntimo e o
apego dos pais com o bebê exercem profundos efeitos no futuro crescimento e
desenvolvimento do filho (SALES; ALVES; VRECCHI, 2006).
Nos últimos anos ocorreu uma grande mudança na assistência, esta era centrada
na recuperação do corpo anátomo-fisiológico, transformando-se em uma assistência mais
integral e holística com ênfase no processo saúde-doença-cuidado tendo como finalidade
o crescimento e desenvolvimento do recém-nascido (RN) e sua qualidade de vida
(FONSECA, 2002).
A fim de dar conta da complexidade que é assistir o RN em uma UTIN, torna-se
importante o envolvimento da equipe multiprofissional na assistência ao binômio mãefilho ressaltando a necessidade de humanizar a assistência, facilitando a interação entre
equipe profissional-RN-mãe. Esse cuidado fornece estímulos sensoriais ao neonato,
estabelecimento do vínculo e a recuperação do RN de forma satisfatória, contribuindo
para minimizar os efeitos nocivos provocados pela hospitalização, tornando os pais
elementos ativos dentro deste contexto, além de contribuir para uma boa qualidade de
sobrevida do bebê (MOREIRA; 2001; SCOCHI, 2000).
No momento da alta hospitalar, não é de se surpreender que as mães sintam uma
dicotomia de emoções: lutam com o medo, a falta de confiança e competência, entre
meio a excitação e alegria de cuidar da criança em casa. A transição do hospital para a
casa pode ser um desafio para a família desses RNs; sentimentos de tristeza,
desamparo, culpa, ansiedade e depressão continuam a atormentar as mães, meses
depois da alta hospitalar, principalmente se estas não obtiveram preparo adequado
durante a internação do bebê (anterior à alta), gerando desta forma um impacto
negativo em relação mãe-bebê e aumentando o uso de recursos de saúde, como
consultas médicas repetidas e re-internações. O processo de adaptação à nova tarefa é
permeado,
inicialmente,
por
momentos
de
insegurança
que
evoluem
para
comportamentos que refletem solidez na relação dos pais com o seu bebê. Sendo assim é
importante ressaltar que o preparo para a alta hospitalar deve fazer parte de um
processo de orientações, não devendo ocorrer apenas no momento da alta, sendo uma
iniciativa constante da equipe multiprofissional durante o período de internação. A
capacitação dos pais é vital para o sucesso da transição do recém-nascido do ambiente
hospitalar para o domiciliar, sendo assim é função do enfermeiro da UTIN contribuir no
planejamento de alta, de modo a facilitar a transição do hospital para o contexto familiar
e fornecer às famílias orientações específicas e individualizadas de modo a suprir as
necessidades do RN e de seus cuidadores (FERECINI, 2008; COUTO; PRACA, 2009).
Para melhor desempenho das ações do familiar no cuidado recém-nascido
prematuro (RNPT), as orientações e a oportunidade de prestar cuidados devem ser
iniciadas no momento da admissão do bebê na UTIN. O planejamento precoce promove o
envolvimento da família que contribui no desenvolvimento do plano de alta, individualiza
as ações e fornece aos pais maior sensação de controle, facilitando também as ações do
profissional no momento da alta (BALBINO, 2004; MARTINEZ; FONSECA; SCOCHI,
2007).
Esse trabalho objetivou analisar a produção do conhecimento sobre plano de alta
hospitalar na área de enfermagem neonatal, que abordem as expectativas da família
quanto aos cuidados com o RN após a alta hospitalar da UTIN; estudar a importância da
família na participação dos cuidados prestados ao RN internado na UTIN e qual o seu
impacto na recuperação do bebê.
Métodos
Para atender aos objetivos deste estudo, realizou-se uma revisão sistemática da
literatura tendo como enfoque o plano de alta hospitalar do recém-nascido internado em
uma unidade de terapia intensiva neonatal. Com base em publicações encontradas nas
bases de dados eletrônicas: Medical Literature Analysis and Retrieval System Online
(MEDLINE), via PubMed, Literatura Latino-Americana em Ciências da Saúde (LILACS),
por meio do portal da Biblioteca Virtual em Saúde (BVS) e Scientific Electronic Library
Online (SciELO), identificadas pelos descritores: recém-nascido, plano de alta, educação
em saúde, família, vertidos para o inglês e para o espanhol, após o século XXI,
localizaram-se artigos que discorriam sobre intervenções de enfermagem utilizadas em
UTIN
no
preparo
do
familiar
para
a
alta
hospitalar
do
RN.
Resultados e discussão
Moreira (2001) defende que a sistematização da assistência de enfermagem
representa um avanço para a profissão, por respaldar o cuidado de enfermagem
direcionado ao ser humano, norteado por princípios científicos, visando proporcionar uma
assistência individualizada, atendendo às reais necessidades do paciente.
Frota et al. (2007) sugerem que o primeiro contato dos pais com a Unidade de
Terapia Intesiva causa espanto e surpresa por dois motivos, primeiro por ter uma gama
de equipamentos ligados ao seu filho e segundo pelo fato de estar todo este aparato
voltado para salvaguardá-lo.
Andraus; Minanisava; Munari (2004) compartilham da opinião segundo o qual o
estabelecimento de vínculo e o compartilhamento do cuidado à criança figuram como
elementos-chave da interação efetiva entre os enfermeiros e os pais.
Balbino (2004) sugere que os pais manifestam medo, insegurança, ansiedade,
alegria, incerteza e dúvida, a partir do momento que serão responsáveis por um bebê
com características tão peculiares, como o nascido prematuro.
Bengozi et al., (2010) sustentam que a importância do atendimento integral ao
prematuro e sua família, na medida em que é possível contribuir para a redução da
morbimortalidade e melhora da qualidade de vida dessas crianças e famílias.
Collet; Rocha (2004) apontam que a falta de um projeto terapêutico coletivo sob
a perspectiva do cuidado centrado na família é um dos óbices ao envolvimento da destes
na assistência, contexto que demonstra que as relações entre família e equipe de
enfermagem mostram-se complexas e permeadas pelo exercício do poder, sendo
necessária a busca da construção do cuidado compartilhado.
Couto; Praca (2009) sustentam que o cuidado domiciliar pode ser entendido como
uma modalidade de assistência em saúde, que busca o envolvimento da família na
assistência sem deixar de responsabilizar o Sistema de Saúde.
Tais autores sustentam ainda que o preparo para a alta hospitalar deve fazer
parte de um processo de orientações, não devendo ocorrer apenas no momento da alta,
sendo uma iniciativa constante da equipe multiprofissional durante o período de
internação e como tal, para melhor desempenho das ações do familiar no cuidado do
recém-nascido, as orientações e a oportunidade de prestar cuidados devem ser iniciadas
no momento da admissão do bebê na unidade neonatal, em um contexto no qual o
planejamento
precoce
promove
o
envolvimento
da
família
que
contribui
no
desenvolvimento do plano de alta, individualiza as ações e fornece aos pais maior
sensação de controle, como também facilita as ações do profissional no momento da
alta.
Para Kenner (2001) preparar a família para a alta do bebê exige avaliação das
preocupações, detectar e analisar dificuldade dos mesmos em prestar cuidados ao RN. O
enfermeiro deve verificar a habilidade que eles demonstram e ficar atento aos possíveis
temores que possam persistir.
Nesse sentido Gaíva et al. (2006) sugerem que o sucesso do plano de alta não
depende apenas do quadro de saúde do recém-nascido, mas sim dos profissionais
envolvidos e do planejamento de alta ter início desde o primeiro dia de internação da
criança, sendo que para tanto, a equipe deve ser sensível ao lidar com cada família, para
perceber qual é a melhor forma de ajudá-la, de acordo com as necessidades que se
apresentam ao longo do tempo.
Gomes; Gaíva; Oliveira (2002) indicam que a apesar dos enfermeiros explicitarem
as concepções atuais da família brasileira, a prática ainda é permeada de dificuldades e
não tem a família como centro da assistência, quadro que revela que o cuidar da família
é visto como um aprendizado e para tal necessita do preparo da equipe multidisciplinar.
Martinez et al. (2007) salientam que os resultados indicam que a participação da
família ainda é incipiente na unidade neonatal, mas há interesse da equipe de saúde em
implementá-la, reconhecendo a sua importância ao favorecer a estabilidade clínica do
prematuro e seu processo de crescimento e desenvolvimento, possibilitar a interação
mãe-filho e o estabelecimento do vínculo afetivo, bem como o treinamento familiar para
a alta.
Molina et al. (2007) sugere que o primeiro passo para a mudança e melhor
aceitação dos familiares dentro da UTI é sensibilizar os profissionais quanto à
importância da presença da família para a criança em momentos de crise, como na
hospitalização.
Nascimento et al. (2007) apontam que o discurso da humanização não pode,
sozinho, sustentar uma proposta de UTI aberta, sabendo-se que a carga de trabalho nas
UTI(s) é grande e que a presença de acompanhantes pode exigir muito dos funcionários,
em um contexto no qual se a administração da UTI não calcular o impacto dos familiares
no cuidado, é possível que os funcionários fiquem sobrecarregados, não manifestando
sua concordância em relação à presença da família ou suas exigências para que ela
permaneça.
Oliveira et at. (2005) salientam que no espaço da UTI neonatal fica comprometida
a relação interpessoal da mãe acompanhante com os profissionais da equipe, que estão
voltados para os procedimentos necessários dos recém-nascidos, em um movimento
constante e intenso, uma vez que a realização desses procedimentos, muitas vezes
considerados dolorosos, torna a mãe cada vez mais fragilizada ante as condutas dos
profissionais, sendo que, em associação a essas situações, a mãe, distante do seio
familiar, muitas vezes sente-se preocupada com os demais membros da família, com os
afazeres domésticos e provavelmente antevendo dificuldades financeiras que poderão
advir.
Reichert; Lins; Collet (2007) defendem que a internação em uma UTIN promove
desequilíbrio emocional do bebê e de seus pais, constituindo-se em uma situação de
estresse, sendo que no momento da internação, os pais podem se desestruturar e criar
fantasias ameaçadoras em torno das diferentes situações que envolvem o termo UTI,
processo que geralmente leva a uma desorganização emocional dos mesmos, tornandoos ansiosos e impacientes.
Sales et al. (2006) apontam que através de sua análise é possível identificar
quatro categorias: a dor de ver seu filho nascer prematuro e ser tirado de seus braços;
padecimento ante a possibilidade de perder parte de si; sentimentos avivados a partir da
compreensão da situação do filho e, a importância da equipe de saúde no processo de
recuperação do filho.
Santos; Faria; Vicente (2007) sugerem que as representações expressas pelas
mães e profissionais configuraram as categorias: a tristeza e o medo; comunicação e
prática educativa fazem diferença na visão das mães; a relação de ajuda e atenção na
assistência à mãe; o trabalho requer cuidado e atenção; receptividade, culpa e rejeição
desafiam o relacionamento entre profissionais e mães; a convivência entre tecnologia e
humanização.
Scochi (2003) aponta que a inter-relação entre a equipe multidisciplinar e a
família favorece o estabelecimento do vínculo e apego mãe-filho e família, observando-se
maior interação da família com o bebê, em especial da mãe, e maior interesse no
aprendizado de seus cuidados, além da satisfação manifestada pela assistência recebida.
Silva; Oliveira (2007) defendem que as orientações são de extrema importância
para os familiares dos prematuros, e esta deve ser acompanhada durante todo o período
de internação, possibilitando que os familiares prestem cuidados e entenda o porquê
destes cuidados.
Conclusão
A idealização do plano de alta em uma unidade de terapia intensiva neonatal
revela-se um desafio para a equipe multidisciplinar na medida em que esta se depara
com uma série de inquietações por parte da família, em especial, às mães, quanto aos
cuidados a serem
tomados para além
do ambiente hospitalar, reforçando um
compromisso que abrange além do suporte ao neonato.
Desta forma, torna-se essencial o fortalecimento por parte da equipe o vínculo
com a família do neonato, preparando-a para lidar com as especificidades comuns a tal
fase.
É preciso então, que a toda a equipe considere o núcleo familiar do neonato como
extensão dos cuidados já dispensados ao neonato, compartilhando informações que
venham esclarecer dúvidas e aclarar incertezas, reduzindo a ansiedade e aumentando a
autoconfiança materna no cuidado domiciliar.
Neste sentido, o processo de preparação deve consistir na capacitação da família
para a continuidade do cuidado do recém-nascido após a alta hospitalar em domicílio;
orientações que devem abranger não somente os cuidados básicos demandados pelo
bebê, como também a informação e os procedimentos diante da condição de risco da
criança.
Incumbe ao enfermeiro avaliar as necessidades do plano de alta no momento da
admissão e durante toda a internação de maneira individualizada, de acordo com a
realidade e às necessidades de cada caso.
Conclui-se, neste sentido, que a inter-relação entre a equipe multiprofissional e a
família do neonato a partir de uma perspectiva de educação em saúde pode contribuir
decisivamente para a redução dos sentimentos negativos, assim como o estresse e o
medo gerados após a alta hospitalar em Unidades de Terapia Intensiva Neonatal.
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