Escola Superior de Educação de Viseu
FORMAÇÃO CONTÍNUA DE PROFESSORES DO
1.º CICLO NA ÁREA DE MATEMÁTICA
Proposta
Preâmbulo
A formação contínua de professores, não tem em Portugal, na última
década, uma história de sucesso. A formação de professores em Matemática tem
também padecido de um conjunto de problemas que fazem com que os seus
resultados estejam bastante longe dos objectivos traçados por quem a pensou. O
caso dos professores que ensinam Matemática aos primeiros quatro anos de
escolaridade, no 1.º ciclo, é ainda mais preocupante.
Primeiro, porque estes professores têm logo à partida uma formação
inicial na área da Matemática que parece ser bastante heterogénea, consoante a
instituição de formação inicial. Esta diversidade manifesta-se tanto ao nível do
conhecimento matemático como do conhecimento didáctico da matemática.
Segundo, porque a formação contínua em Matemática que tem sido
colocada à disposição destes professores é, comparativamente com outros ciclos,
algo reduzida e também não tem tido a adesão que seria expectável. Esta
realidade manifesta-se, por exemplo, nos encontros de professores promovidos
pela Associação de Professores de Matemática, em que a presença de professores
do 1.º ciclo é bastante menor do que a de outros níveis de ensino.
Terceiro, porque uma parte substancial da formação que tem sido
oferecida aos professores assume o formato de cursos, normalmente de curta
duração, com uma forte componente teórica e fraca ligação com a prática
pedagógica. Este tipo de formação tem-se mostrado, em grande medida, ineficaz
tanto na melhoria do ensino como no incremento da aprendizagem dos alunos.
Para lá destas questões da formação, a própria organização e distribuição
geográfica das escolas do 1.º ciclo agravam ainda mais o panorama da
aprendizagem da Matemática nos primeiros anos de escolaridade, pois os
professores estão muitas vezes isolados nas suas salas de aula e não mantêm
relações profissionais com outros agentes educativos.
Face ao exposto, parece-nos que qualquer tentativa para tentar dinamizar a
formação contínua de professores deve passar pela observância de um conjunto
de princípios, que se apresentam a seguir.
Princípios
O sucesso de um dispositivo de formação depende de diversos factores,
sendo que alguns deles estão directamente relacionados com um conjunto de
princípios que reenviam para uma certa forma de conceber este processo no qual
os professores se envolvem durante a sua carreira.
Respeitar os conhecimentos e competências profissionais dos professores.
A formação deve partir daquilo que são as competências profissionais dos
professores para as desenvolver. Presumir a incompetência generalizada dos
profissionais, impondo-lhes um certo tipo de formação, definida de fora da
profissão, poderá ser o primeiro passo para condenar todo o processo formativo.
Estabelecer uma ligação estreita em teoria e prática. Os resultados da
formação de cariz teórico têm–se mostrado quase totalmente inoperantes na
inspiração de práticas pedagógicas renovadas. A formação deve, pois, promover
a relação entre a teoria e a prática dos professores, devendo esta ser
inclusivamente o seu ponto de partida. Assim, a formação assumirá a forma de
compreensão e resolução de problemas profissionais, em ciclos sucessivos
prática→teoria→prática.
Envolver os professores em dinâmicas colaborativas. A colaboração
profissional é um elemento fundamental do processo formativo, permitindo, por
um lado, evitar o isolamento que está muito presente no 1.ºciclo (pondo em
contacto professores do 1.º ciclo e de outros níveis), e, por outro, realizar
projectos que de outro modo não seriam exequíveis.
Incluir uma forte componente de reflexão e mesmo investigação.
Nenhuma aprendizagem se concretiza se não houver reflexão. No caso dos
professores, a reflexão sobre as experiências profissionais, sobre os episódios do
quotidiano da sala de aula, deve constituir o motor de qualquer processo de
mudança. O alcance desta reflexão será bastante maior se o trabalho formativo
puder incorporar a investigação. A realização de projectos de investigação, com
uma forte dimensão colaborativa, poderá ser um bom contexto para estimular a
formação dos professores do 1.º ciclo.
Modo de operacionalização
O plano de formação que propomos assenta em:
a) Constituição de equipas de professores, organizadas em projectos.
Estes professores poderão associar-se, de preferência, por proximidade
geográfica, para permitir o trabalho conjunto. Estes projectos não devem
ter mais do que 10 professores e devem integrar um professor de uma
instituição de formação;
b) Reunião periódica das equipas. As equipas devem reunir periodicamente
(de preferência quinzenalmente, nas próprias escolas dos professores e só
em último caso na instituição de ensino superior) para reflectirem sobre o
ensino e a aprendizagem da Matemática, a partir: (i) de problemas
colocados pelos professores; (ii) de textos da Didáctica da Matemática
escolhidos pelos elementos da equipa;
c) Identificação de problemas e dificuldades. A selecção de problemas
para discussão no grupo deve resultar primeiro de gravação de algumas
aulas e só depois da observação e supervisão. Esta observação deverá ser
realizada tanto pelo professor da instituição de formação como também
pelos outros professores da equipa. Esta interacção entre os elementos da
equipa poderá ser um bom meio de desenvolver profissionalmente todo o
grupo e melhorar a aprendizagem da Matemática;
d) Investigação da prática. A compreensão e resolução dos problemas
profissionais surgidos ganharia bastante se passasse pela realização de
investigação sobre a prática. Esta seria uma forma de dotar os professores
de capacidades de detectarem e resolverem os seus problemas,
investigando para ensinar.
e) Divulgação do trabalho desenvolvido ao longo do ano. O trabalho
desenvolvido nos projectos deverá ser comunicado e tornado público. Por
isso, sugere-se a realização de seminários de acompanhamento dos
formadores e, no final do ano, de um encontro/congresso em que as
diversas equipas nacionais partilham e discutem as suas experiências
formativas.
Considerações finais
O sucesso desta iniciativa depende muito da forma como se conseguir
desafiar e entusiasmar os professores nesta empreitada. Toda as formas de
obrigar alguém a realizar um trabalho para o qual não têm um contributo
significativo, tanto na sua concepção como na sua execução e avaliação, só
trazem um envolvimento vazio.
Melhorar as competências matemáticas dos alunos portugueses, com
professores mais empenhados e capacitados e escolas mais atractivas terá que ser
um desígnio nacional, que a ninguém pode deixar ficar indiferente.
Viseu, 20 de Maio de 2005
Área Científica de Matemática
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