SUCESSÃO ENTRE CÔNJUGES
Sylvia Maria Mendonça do Amaral
Uma importante alteração que foi introduzida pelo novo Código Civil em vigor desde janeiro de
2003 diz respeito à sucessão entre os cônjuges e deve ser detidamente analisada, até mesmo com a finalidade de
se fazer um planejamento sucessório.
A legislação anterior ao novo Código Civil não considerava herdeiro necessário o cônjuge. Os
herdeiros necessários (descendentes e ascendentes) seguiam uma ordem denominada linha sucessória, através da
qual os herdeiros do falecido eram seus descendentes (filhos), na falta destes, os ascendentes (pais) e, apenas na
falta destes, o cônjuge, seguindo-se dos colaterais (irmãos).
Saliente-se que ao cônjuge sobrevivente só seria reconhecido o direito sucessório se ao tempo
do falecimento o casamento não estivesse dissolvido judicialmente (separação judicial) e se o casal não estivesse
separado de fato há mais de dois anos.
Se antes o cônjuge sobrevivente só herdava na ausência de descendentes e ascendentes (ele era
denominado herdeiro legítimo) a legislação agora em vigor alçou o cônjuge sobrevivente à condição de herdeiro
necessário privilegiado, pois passou a concorrer com os descendentes e com os ascendentes do falecido, na
mesma condição de igualdade.
Também é preciso esclarecer que o cônjuge sobrevivente só irá concorrer com os descendentes
e com os ascendentes conforme o regime de bens do casamento, não podendo haver a concorrência se o
casamento foi celebrado sob o regime da i) comunhão universal de bens; ii) da separação obrigatória de bens e ii)
da comunhão parcial de bens, se o falecido não houver deixado bens particulares, aqueles adquiridos com seus
próprios e exclusivos recursos.
Para melhor compreensão do texto é preciso entender um conceito que é o da meação. No
regime da comunhão universal de bens e no da comunhão parcial de bens, o cônjuge sobrevivente tem direito à
metade dos bens do casal em virtude da meação. Aqui não estamos falando em direitos sucessórios, herança e
sim em parte dos bens que já pertenceriam ao cônjuge em decorrência do regime de casamento e não serão objeto
de inventário e partilha entre os herdeiros.
Explicamos, agora, os regimes de bens nos quais não ocorre a concorrência entre cônjuge
sobrevivente e os herdeiros necessários:
O regime da comunhão universal de bens é aquele no qual todos os bens de ambos os cônjuges,
mesmo os adquiridos por eles individualmente antes do casamento, passam a pertencer aos dois. No caso de
falecimento de um dos cônjuges, o sobrevivente já tem assegurado 50% deles, ou seja, a sua meação. Os outros
50% restantes serão divididos entre os filhos, sem a participação do cônjuge, pois a concorrência entre cônjuge e
descendentes não se opera nesse regime de bens.
Já o regime da separação obrigatória de bens é aquele onde todos os bens, tanto os adquiridos
durante o casamento, como os adquiridos antes, pertencem exclusivamente àquele que os adquiriu. Esse regime é
obrigatório para os que se casam após os 60 anos de idade, àqueles que necessitam de autorização judicial para
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casar ou àqueles que se casarem sem observar algumas causas suspensivas. Aqui, nesse regime, não há meação
do cônjuge sobrevivente (pois não existem bens comuns do casal) e os descendentes ou ascendentes herdam a
totalidade dos bens. O cônjuge sobrevivente, assim, não concorre com os herdeiros.
Com relação ao regime da comunhão parcial de bens – onde só pertencem ao casal os bens
adquiridos durante o casamento, e os demais, adquiridos antes do casamento pertencem exclusivamente ao
cônjuge que os adquiriu – é preciso dizer que a concorrência só será possível se o falecido houver deixado bens
particulares (aqueles adquiridos antes do casamento). Aqui não há a concorrência do cônjuge sobrevivente com
os herdeiros, pois o sobrevivente já tem direito à meação em decorrência do regime de bens. Ele só concorrerá
com os herdeiros com relação aos bens particulares do falecido. Se não houver bens particulares não haverá
concorrência, cabendo ao sobrevivente apenas sua meação.
Passamos, agora, a analisar como se dá a divisão da herança entre o cônjuge e descendentes.
1) Hipótese onde o cônjuge sobrevivente é pai/mãe dos filhos do falecido:
A divisão dos bens dar-se-á de forma igual entre o cônjuge e os filhos do casal, sendo que a parte que caberá ao
cônjuge não pode ser inferior à quarta parte da herança. Exemplo de um casal que tem dois filhos: a herança,
ressalvadas as restrições referentes ao regime de bens acima mencionadas, será dividida em três partes iguais
(cônjuge e dois filhos).
A mesma proporção de divisão ocorre na hipótese de o casal ter três filhos. Porém, se o casal
tiver quatro filhos, como ao cônjuge sobrevivente caberá não menos que uma quarta parte da herança, aos quatro
filhos caberão os três quartos restantes.
2) Hipótese onde o cônjuge sobrevivente não é pai/mãe dos filhos do falecido:
A divisão dar-se-á sempre em partes iguais entre o cônjuge sobrevivente e os filhos do falecido, não sendo
reservada ao sobrevivente qualquer cota mínima, não importando o número de filhos que o falecido tinha.
3) Hipótese onde o falecido não tinha filhos:
O cônjuge sobrevivente concorrerá com os ascendentes do falecido, da seguinte forma:
- se o cônjuge concorrer com os pais do falecido, caberá a ele uma terça parte da herança e aos pais os dois terços
restantes, ou seja, a partilha é feita em partes iguais.
- caso o falecido só tenha um dos pais vivo, ao cônjuge caberá metade da herança a ao único ascendente do
falecido a outra metade.
- ao cônjuge sobrevivente também caberá metade da herança se estiver concorrendo com ascendentes do falecido
de grau mais distante que os pais.
Aqui é preciso esclarecer que não vigoram as restrições referentes ao regime de bens, como no caso de
concorrência com os descendentes.
4) Hipótese onde o falecido não tinha descendentes nem ascendentes:
A herança será deferida integralmente ao cônjuge sobrevivente.
Além de ter sido alçado a condição de herdeiro necessário, o cônjuge sobrevivente tem direito real de habitação.
Isso significa que, qualquer que seja o regime de bens do casamento, o cônjuge sobrevivente tem direito de
habitar o imóvel destinado à residência da família, desde que ele seja o único dessa natureza a inventariar, isso
sem que seja prejudicada a sua participação na herança.
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A sucessão entre companheiros, aqueles que vivem em união estável, opera-se de forma diversa e, diante da
complexidade do tema, será abordada em outro texto.
Sylvia Maria Mendonça do Amaral - Advogada formada pela Faculdade de Direito de São Bernardo do Campo
com especialização em Direito de Família pela Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais – PUC-MG.
Atua nas áreas contenciosa e consultiva desde 1986. Membro do IBDFAM – Instituto Brasileiro de Direito de
Família. Palestrante de temas relacionados ao Direito de família e Direito Civil. Autora do livro “Direitos dos
Homossexuais e Transexuais” e editora do site www.amorlegal.com.br – e-mail: [email protected]
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