PARECER CONSULTA Nº 12/2012 – CRM/PA – PROCESSO CONSULTA Nº 541/2012
PROTOCOLO Nº 4130/2012
INTERESSADO: L.P.
PARECERISTA: CONSELHEIRA TEREZINHA DE JESUS DE OLIVEIRA CARVALHO
Ementa: Não há previsão legal para a interrupção
da gravidez de gêmeos xipófagos ou siameses, a
menos
que
se
enquadre
em
uma
das
hipóteses
legais, ou desde que seja devidamente autorizada
judicialmente quando provada a impossibilidade de
sobrevida extrauterina dos fetos.
I - PARTE EXPOSITIVA
Trata o presente processo consulta de questionamento realizado pela Sra.
L.P., a qual alega, nos seguintes termos:
“Eu sou assistente social em um hospital no Marajó, estou em
busca de informações junto ao setor jurídico deste conselho
para informações em relação a orientação de procedimentos no
caso
de
gravidez
gemelar,
diagnosticada
como
GEMELARES
SIAMESES, pois temos uma paciente que realizou sua primeira
consulta e primeira ultrassom, estando no 5º mês gestacional
onde a referida foi diagnosticada. A mesma procurou o Serviço
Social do hospital para orientações de como proceder para
realizar a interrupção da gravidez. Apenas realizamos algumas
orientações, solicitamos nova consulta, e estamos pedindo a
orientação
jurídica
para
podermos
realizar
melhores
esclarecimentos a paciente.”
II – DO PARECER
No Brasil, o aborto é tipificado pelo Código Penal como crime contra
a vida, onde é prevista a pena de detenção de um a quatro anos, em caso
de aborto com o consentimento da mulher, e de três a dez anos para quem o
fizer sem referido consentimento. Porém, não é qualificado como crime,
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quando praticado por médico capacitado, em três situações motivadoras da
legalidade
excepcional:
a
primeira,
de
cunho
clínico,
exclusivamente
atrelado ao perigo à vida da gestante; a segunda, atinente a uma visão
psicológica
da
mulher
a
quem
foi
imposta,
mediante
violação
de
sua
dignidade sexual, uma gestação indesejada e involuntária de uma criança;
e a terceira, se o feto for anencefálico, exceção esta legalizada a
partir
da
decisão
do
STF
na
ação de
Arguição
de Descumprimento
de
Preceito Fundamental nº 54, votada em 12 de abril de 2012, que descreve a
prática de aludida espécie de aborto como "parto antecipado" para fim
terapêutico.
A gestação gemelar, por seu turno, tem características particulares e
implica
seguimento
mais
cuidadoso
por
parte
do
médico
e
da
própria
gestante. No entanto, esta não é causa legal para a interrupção da
gravidez, a não ser que referida gestação seja enquadrada em um dos casos
previstos na legislação como autorizadores da prática interruptiva.
Em recente decisão, o Tribunal de Justiça de São Paulo, através de sua 6ª
Câmara de Direito Criminal, por votação unânime, autorizou a interrupção
da gravidez de uma mulher que estava no quinto mês de gestação de gêmeos
xifópagos, unidos pelo tórax e abdômen. Os fetos compartilhavam o mesmo
coração, fígado e cordão umbilical e, de acordo com todas as perícias
realizadas, não havia nenhuma chance de correção cirúrgica ou qualquer
possibilidade de vida fora do útero.
A
fundamentação
utilizada
pelo
relator
do
processo
alegava
que
“na
presente hipótese, a despeito da gestante, em tese, não correr risco
maior do que outra mulher com gravidez múltipla, devemos considerar a
peculiaridade do caso e as conseqüências que o prosseguimento dessa
gestação, levada a termo por parto, pode causar” e continuava afirmando
que “além disso, considerando a sobrevivência do parto, [os fetos] não
ficariam vivos mais do que poucos instantes, afastando a incidência da
norma
penal,
que
busca
proteger
a
vida
humana
e
não
sua
falsa
existência”. Mais adiante, afirma o relator que “se o aborto humanitário
[quando a mãe é vítima de estupro] tem como fundamento a preocupação com
os sentimentos da mãe, porque não admitir esse cuidado no caso de feto
com anomalia sem possibilidade de vida extrauterina, mantendo a gestante
subjugada a tamanho dissabor?”.
Tais situações são conhecidas pela doutrina e jurisprudência como aborto
eugênico (quando o feto é portador de anomalia grave e sem cura), figura
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jurídica
que
não
encontra
previsão
legal
e
que
não
é
pacífica
na
jurisprudência, havendo posições contrárias a sua autorização.
Vê-se, deste modo, que a interrupção de gravidez gemelar, fora as causas
previstas
legalmente,
judicialmente
e
somente
mediante
pode
provas
ocorrer
robustas
se
devidamente
que
não
existe
autorizada
qualquer
possibilidade de sobrevida extrauterina dos fetos; caso contrário, poderá
haver a incidência da figura do crime de aborto previsto, como já dito,
pelo Código Penal Brasileiro.
III – CONCLUSÃO
Observa-se, deste modo, que não há previsão legal para a interrupção da
gravidez de gêmeos xipófagos ou siameses, a menos que se enquadre em uma
das três situações já referidas, quais sejam: risco de vida para a
gestante, gestação resultante de estupro ou que o feto seja portador de
anencefalia. Há, ainda, possibilidade de interrupção de referida gravidez
através
de
autorização
judicial
em
casos
de
impossibilidade
sobrevivência dos fetos.
É o parecer, salvo melhor juízo.
Belém, 13 de julho de 2012.
DRA. TEREZINHA DE JESUS DE OLIVEIRA CARVALHO
CONSELHEIRA – CRM/PA
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