CARLOS ALEXANDRE MACEDO BARCAROLLO O CONTROLE EXTERNO DOS REPASSES MUNICIPAIS DE RECURSOS PÚBLICOS PARA ENTIDADES PRIVADAS DO TERCEIRO SETOR: ANÁLISE DO QUADRO ATUAL E REFLEXÕES SOBRE O FUTURO Trabalho de Conclusão de Curso apresentado à Escola de Artes, Ciências e Humanidades da Universidade de São Paulo – EACH/USP, como requisito para avaliação final e aprovação no curso de Pós-Graduação lato sensu em Gestão de Políticas Públicas. Área de Concentração: Gestão de Políticas Públicas Orientadora: Professora Doutora Ursula Dias Peres SÃO PAULO – SP 2012 2 CARLOS ALEXANDRE MACEDO BARCAROLLO O CONTROLE EXTERNO DOS REPASSES MUNICIPAIS DE RECURSOS PÚBLICOS PARA ENTIDADES PRIVADAS DO TERCEIRO SETOR: ANÁLISE DO QUADRO ATUAL E REFLEXÕES SOBRE O FUTURO Trabalho de Conclusão de Curso apresentado à Escola de Artes, Ciências e Humanidades da Universidade de São Paulo – EACH/USP, como requisito para avaliação final e aprovação no curso de Pós-Graduação lato sensu em Gestão de Políticas Públicas. Aprovado em:___________________________. Banca examinadora: _____________________________________________ Professora Doutora Ursula Dias Peres (orientadora) Instituição: Escola de Artes, Ciências e Humanidades da Universidade de São Paulo – EACH/USP Julgamento:_________________________ _____________________________________________ Professor(a) Doutor(a): ________________________ Instituição: Escola de Artes, Ciências e Humanidades da Universidade de São Paulo – EACH/USP Julgamento:_________________________ _____________________________________________ Professor(a) Doutor(a): ________________________ Instituição: Escola de Artes, Ciências e Humanidades da Universidade de São Paulo – EACH/USP Julgamento:_________________________ 3 Dedico este trabalho às minhas queridas esposa e filha, pelo alicerce familiar e pela energia inesgotável do amor. 4 AGRADECIMENTOS À minha professora orientadora, Doutora Ursula Dias Peres por todo o aconselhamento dado ao longo do preparo deste trabalho, desde a direção inicial, imprescindível para a estrutura final do trabalho, até a revisão da última linha do texto, sempre objetiva e assertiva. À Escola de Artes, Ciências e Humanidades da Universidade de São Paulo – EACH/USP e a todos os professores que fizeram parte da grade curricular do curso, pelo conhecimento transmitido e pela disponibilidade em trazê-lo até nós, nas dependências do TCE/SP. Ao Tribunal de Contas do Estado de São Paulo e à Escola de Contas Públicas do TCE/SP, pelo apoio institucional, organizacional, financeiro e estrutural, sem os quais o curso não teria sido realizado. Aos colegas de turma do curso e aos amigos da 2ª Diretoria de Fiscalização do TCE/SP, principalmente, pelas discussões técnicas, troca de experiências e de conhecimento. Aos meus pais, irmãos, demais familiares e amigos pela compreensão da ausência e pela motivação. E aos amores da minha vida, minha querida esposa Elenir e minha amada filha Maria Paula, pela paciência ao abandoná-las nos momentos de dedicação ao estudo, pelo apoio quando o cansaço surgia, e pela motivação inconsciente de um simples sorriso, de um olhar, da felicidade e do amor. 5 RESUMO BARCAROLLO, Carlos Alexandre Macedo. O controle externo dos repasses municipais de recursos públicos para entidades privadas do Terceiro Setor: análise do quadro atual e reflexões sobre o futuro. 2012. 125 f. Trabalho de Conclusão de Curso (Pós Graduação latu sensu) – Escola de Artes, Ciências e Humanidades – EACH, Universidade de São Paulo, São Paulo, 2012. Este estudo constrói um panorama atual das transferências financeiras realizadas pelos Municípios do Estado de São Paulo para entidades privadas sem fins lucrativos através de ajustes celebrados para a execução de políticas públicas incluídas no campo de atuação do Terceiro Setor; do controle externo do Tribunal de Contas do Estado sobre tais ajustes e repasses; de ferramentas de avaliação e controle; bem como sobre reflexões a respeito de oportunidades de melhoria desse quadro. As pesquisas de doutrina, legislação, jurisprudência e de dados reais sobre o Terceiro Setor e o Tribunal de Contas apresentam o quadro atual, e a sua análise permite a discussão sobre pontos de aprimoramento do controle. A evolução da relação entre Estado e Sociedade Civil ao longo dos anos, desde a Monarquia até o Estado Democrático de Direito atual, refletida no ordenamento jurídico brasileiro, permitiu a delimitação do espaço de participação das entidades do Terceiro Setor em assuntos que antes eram de interesse exclusivo do Estado. O estreitamento dessa relação e a aproximação do cidadão da gestão das políticas públicas de interesse social fizeram com que, aos poucos e através de mudanças na legislação, fosse legitimada a participação direta da sociedade na execução dessas políticas. Organizada em entidades sem fins lucrativos, a sociedade civil passou, então, a participar das ações do Estado que objetivam a satisfação de uma necessidade coletiva e de interesse social, sendo beneficiada, quase sempre, com transferências financeiras da Administração Pública para a consecução de tal objetivo. O aumento no uso desse caminho para a execução de políticas públicas chama a atenção de todos os interessados no bom uso de recursos públicos, principalmente do controle externo, executado pelo Tribunal de Contas, e do controle social, desempenhado pela própria sociedade civil. O quadro atual do Terceiro Setor e do controle sobre ele exercido, tanto o controle externo quanto o social, apresenta uma situação satisfatória e em evolução. A reflexão colocada sobre o futuro do Terceiro Setor está concentrada nessa evolução, que está diretamente relacionada ao uso das ferramentas de avaliação e controle abordadas neste estudo, e resultam em sugestões de discussão sobre sua viabilidade de execução prática. Palavras-chave: Terceiro Setor. Sociedade Civil Organizada. Controle Externo. Tribunal de Contas. Efetividade. Contabilidade. Publicidade. Transparência. Controle social. Gestão de políticas públicas. Indicadores sociais. 6 ABSTRACT BARCAROLLO, Carlos Alexandre Macedo. External control of municipal transfers of public funds to private entities of the Third Sector: analysis of the current frame and reflections on the future. 2012. 125 f. End of Course Work (Latu sensu Graduate Study) – Escola de Artes, Ciências e Humanidades – EACH, Universidade de São Paulo, São Paulo, 2012. This academic work builds a current overview of the financial transfers made by the municipalities of São Paulo State to nonprofit private entities through adjustments signed for the execution of public policies within the field of action of the Third Sector; the external control of the State Court of Auditors on such adjustments and transfers; the evaluation and control tools, as well as reflections on opportunities to improve this scenery. The research on doctrine, legislation, case law and real data on the Third Sector and the Court of Auditors presents this current frame, and its analysis allows the discussion on control‟s points of improvement. The evolving relationship between State and civil society over the years, from the Monarchy to the current Democratic State of Law, reflected in the Brazilian legal system, allowed the delimitation of the Third Sector‟s participation area on issues that were of the State exclusive interest. The narrowing of this relationship and the citizen‟s approach on management of the public policies of social interest meant that, gradually and through changes in legislation, the direct participation of society in the implementation of these policies were legitimized. Organized in nonprofits entities, civil society began to participate in State actions that aim to satisfy a collective need and of social interest, being often served with financial transfers from the government to achieve this goal. The increased use of this path for the implementation of public policies draws attention of all concerned with the proper use of public funds, mainly from external control, run by the Court of Auditors, and from social control, played by civil society itself. The current picture of the Third Sector and the exercised control over it, both external and social, presents a satisfactory situation and in evolving. The discussion placed on the future of Third Sector is concentrated on this evolution, which is directly related to the use of evaluation and control tools addressed in this study, and results in suggestions for discussion of its feasibility for practical implementation. Keywords: Third Sector. Organized Civil Society. External Control. Court of Auditors. Effectiveness. Accounting. Advertising. Transparency. Social Control. Public Policy Management. Social Indicators. 7 LISTA DE ILUSTRAÇÕES Quadro 1 – Repasses do Estado em 2008 para o 1º e 3º Setores por tipo de acordo.....................78 Quadro 2 – Repasses dos Municípios em 2008 por tipo de acordo................................................80 Quadro 3 – Repasses dos Municípios em 2009 por tipo de acordo................................................81 Quadro 4 – Repasses dos Municípios em 2010 por tipo de acordo................................................81 Quadro 5 – Dados das Finanças Públicas dos Municípios em 2008 e 2009 (valores em milhares de R$).............................................................................................................................................82 Quadro 6 – Evolução da Despesa Realizada dos Municípios de 2007 a 2010...............................82 Quadro 7 – Repasses confrontados com a Receita Arrecadada de 2008 a 2010............................84 Quadro 8 – Repasses confrontados com a Receita Corrente Líquida de 2008 a 2010...................84 Quadro 9 – Volume de processos autuados dos exercícios de 2008 a 2010 por matéria...............87 Quadro 10 – Processos do Terceiro Setor em relação ao total de Processos..................................88 Quadro 11 – Volume de processos julgados singularmente nos exercícios de 2008 e 2009 por matéria............................................................................................................................................89 Quadro 12 – Processos julgados singularmente do Terceiro Setor em relação ao total.................89 Quadro 13 – O Resultado dos julgamentos singulares dos processos referentes ao Terceiro Setor em 2008 e 2009...............................................................................................................................90 8 LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS AJAM – Associação Joseense de Assistência à Mulher. ATJ – Assessoria Técnica Jurídica do Tribunal de Contas do Estado de São Paulo. AUDESP – Auditoria Eletrônica de Órgãos Públicos do Tribunal de Contas do Estado de São Paulo. AVAPE – Associação para Valorização de Pessoas com Deficiência. CECOI – Centros Comunitários de Convivência Infantil. CEDIN – Centro de Educação Infantil. CF – Constituição Federal. CFC – Conselho Federal de Contabilidade. CTN – Código Tributário Nacional. DOE – Diário Oficial do Estado de São Paulo. IPH – Índice de Pobreza Humana. LDO – Lei de Diretrizes Orçamentárias. LOA – Lei Orçamentária Anual. LRF – Lei de Responsabilidade Fiscal. NBC – Norma Brasileira de Contabilidade. NBC T – Norma Brasileira de Contabilidade Técnica. NBC TG – Norma Brasileira de Contabilidade Técnica Geral. OS – Organização Social. OSCIP – Organizações da Sociedade Civil de Interesse Público. PIB – Produto Interno Bruto. PSF – Programa Saúde da Família. PACS – Programa de Agentes Comunitários de Saúde. PPA – Plano Plurianual. RCL – Receita Corrente Líquida. SDG – Secretaria Diretoria Geral do Tribunal de Contas do Estado de São Paulo. SICONV – Sistema de Gestão de Convênios e Contratos de Repasse. TCE/SP – Tribunal de Contas do Estado de São Paulo. UFESP – Unidade Fiscal do Estado de São Paulo. 9 SUMÁRIO CAPÍTULO 1. INTRODUÇÃO....................................................................................................11 1.1. Apresentação...........................................................................................................................11 1.2. O Terceiro Setor: conceito......................................................................................................13 1.3. A relação entre Estado e sociedade e a participação social.....................................................15 1.4. O controle externo e sua importância......................................................................................17 2. PANORAMA INSTITUCIONAL, ESTRUTURAL E LEGAL...............................................18 2.1. As relações entre o Estado e o Terceiro Setor.........................................................................18 2.1.1. A Constituição Federal de 1988...........................................................................................19 2.1.2. A legislação infraconstitucional...........................................................................................23 2.1.2.1. Os tipos de entidade e suas áreas de atuação....................................................................23 2.1.2.2. Os tipos de relação instrumental: os ajustes......................................................................27 2.1.2.2.1. As subvenções sociais....................................................................................................28 2.1.2.2.2. As contribuições correntes e de capital..........................................................................29 2.1.2.2.3. Os auxílios......................................................................................................................29 2.1.2.2.4. Os convênios..................................................................................................................31 2.1.2.2.5. O contrato de gestão.......................................................................................................33 2.1.2.2.6. O termo de parceria........................................................................................................34 2.1.3. A legislação no Município....................................................................................................35 2.2. A contabilidade e o Terceiro Setor..........................................................................................38 2.2.1. A contabilidade e o controle.................................................................................................39 2.2.2. A contabilidade aplicada às entidades..................................................................................41 2.3. O controle externo pelo Tribunal de Contas do Estado..........................................................44 2.3.1. A legislação do controle externo..........................................................................................46 2.3.2. A fiscalização dos repasses...................................................................................................47 2.3.2.1. A remessa do ajuste para o Tribunal de Contas................................................................48 2.3.2.2. A prestação de contas das entidades.................................................................................50 2.3.2.3. O parecer conclusivo do órgão concessor.........................................................................52 2.3.2.4. Os momentos da fiscalização............................................................................................53 2.3.2.5. O processo administrativo no TCE/SP..............................................................................55 3. PANORAMA TEÓRICO – FERRAMENTAS DE AVALIAÇÃO E CONTROLE................57 3.1. Eficiência, eficácia e efetividade.............................................................................................57 3.2. A importância da avaliação do resultado.................................................................................59 3.2.1. A avaliação pelo poder público cedente...............................................................................61 10 3.2.2. O papel do Tribunal de Contas na avaliação........................................................................63 3.3. Ferramentas de avaliação – os indicadores sociais..................................................................64 3.3.1. Conceito de indicador social e suas fontes...........................................................................66 3.3.2. Os principais tipos de indicadores sociais............................................................................67 3.3.3. Os indicadores como norteadores das ações do Estado.......................................................70 3.4. Ferramentas de controle...........................................................................................................73 3.4.1. A contabilidade como instrumento de controle....................................................................73 3.4.2. A publicidade e a transparência............................................................................................75 4. PANORAMA FÁTICO.............................................................................................................77 4.1. Panorama dos repasses realizados nos exercícios de 2008 a 2010 no âmbito da jurisdição do TCE/SP...........................................................................................................................................78 4.1.1. Os repasses realizados pelo Estado de São Paulo.................................................................78 4.1.2. Os repasses realizados pelos Municípios do Estado.............................................................80 4.1.2.1. Os repasses por tipo de relação contratual.........................................................................80 4.1.2.2. Os repasses em relação à receita arrecadada e à receita corrente líquida..........................84 4.2. A atuação do Tribunal de Contas do Estado de São Paulo.....................................................85 4.2.1. Os números da fiscalização..................................................................................................85 4.2.1.1. O volume de processos autuados dos exercícios de 2008 a 2010.....................................86 4.2.1.2. O volume de processos julgados nos anos de 2008 e 2009 e o respectivo resultado.......88 5. ANÁLISE DE CASOS DE JULGAMENTO PELO TCE/SP...................................................91 5.1. Análise de casos julgados regulares........................................................................................91 5.1.1. Contrato de gestão julgado regular.......................................................................................91 5.1.2. Termo de parceria julgado regular........................................................................................94 5.1.3. Convênio julgado regular.....................................................................................................95 5.1.4. Comentários..........................................................................................................................96 5.2. Análise de casos julgados irregulares......................................................................................97 5.2.1. Contrato de gestão julgado irregular....................................................................................97 5.2.2. Termo de parceria julgado irregular...................................................................................100 5.2.3. Convênio julgado irregular.................................................................................................104 5.2.4. Comentários........................................................................................................................107 6. CONSIDERAÇÕES FINAIS E CONCLUSÃO.....................................................................108 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS........................................................................................120 REFERÊNCIAS NORMATIVAS...............................................................................................122 REFERÊNCIAS JURISPRUDENCIAIS.....................................................................................125 11 1. INTRODUÇÃO 1.1. APRESENTAÇÃO O presente estudo tem como objetivo apresentar e analisar o panorama atual dos repasses de recursos públicos realizados pelos Municípios do Estado de São Paulo para entidades privadas sem fins lucrativos, bem como o controle externo feito pelo Tribunal de Contas do Estado sobre os ajustes celebrados para formalizar tais transferências financeiras e sobre as prestações de contas das aplicações dos recursos, para, ao final, expor modestas reflexões sobre o futuro do tema. Neste primeiro capítulo abordaremos o conceito de Terceiro Setor, o histórico a respeito da relação entre o Estado e a Sociedade, que criou condições para o crescimento da participação social nas ações de interesse da coletividade, e também sobre a importância do controle externo do Tribunal de Contas. Nos dois capítulos seguintes, que iniciam o desenvolvimento deste trabalho (capítulos 2 e 3), apresentaremos um quadro teórico do tema, que fornecerá o alicerce conceitual à estrutura do estudo como um todo. No capítulo 2 desenvolveremos um panorama teórico com um viés jurídico e legal, onde discorreremos sobre a legislação que estrutura o Terceiro Setor e o controle externo, diga-se o Tribunal de Contas do Estado de São Paulo. Para tanto utilizamos a metodologia de pesquisa e levantamento de dados de fontes na doutrina acadêmica e na legislação brasileira vigente. Nesta etapa vamos construir o panorama estrutural e legal do Terceiro Setor, da contabilidade aplicável a ele e do controle externo ao qual está sujeito, passando pelos tipos de entidade e suas áreas de atuação, os tipos de ajuste celebrados, a relação entre contabilidade e controle, a contabilidade aplicada às entidades do Terceiro Setor e a fiscalização dos repasses pelo Tribunal de Contas. 12 Um panorama teórico, com um viés mais acadêmico, sobre as ferramentas de avaliação e controle de políticas públicas será o assunto do terceiro capítulo, onde a metodologia empregada também será a de busca de subsídios na doutrina acadêmica e na legislação. Nele falaremos sobre os conceitos de eficiência, eficácia e efetividade na gestão de políticas públicas, a importância da avaliação do resultado, os indicadores sociais como instrumentos de avaliação, e a contabilidade, a publicidade e a transparência como ferramentas de controle. Nos dois capítulos finais de desenvolvimento do presente estudo (capítulos 4 e 5) será apresentado um panorama sobre a realidade dos repasses efetuados para as entidades do Terceiro Setor e do controle realizado pelo Tribunal de Contas. Nos dois capítulos foi usada a metodologia de pesquisa e levantamento de dados de fontes situadas no sítio do Tribunal de Contas do Estado de São Paulo na internet. No quarto capítulo traremos um panorama fático dos repasses de recursos públicos realizados pelo Estado de São Paulo e seus Municípios nos anos de 2008 a 2010, com dados sobre os valores repassados e análises dos números, apresentando a dimensão financeira do assunto, bem como da atuação do Tribunal de Contas na fiscalização desses repasses, fornecendo uma dimensão quantitativa e qualitativa dos processos autuados nos exercícios de 2008 a 2010 e dos processos julgados nos anos de 2008 e 2009. Por fim, no quinto e último capítulo deste trabalho faremos a análise de alguns casos selecionados como exemplos de julgamento, com processos que trataram de diferentes tipos de ajuste, e que foram julgados tanto como regulares quanto como irregulares. A finalidade deste capítulo é a de exemplificar as falhas cometidas na celebração dos ajustes e na prestação de contas da aplicação dos recursos, bem como de que forma elas foram julgadas pelo TCE/SP. Nas considerações finais encerraremos o estudo abordando a eficiência e a eficácia apresentadas atualmente pelo controle externo do Tribunal de Contas sobre os repasses públicos 13 ao Terceiro Setor, apresentando reflexões sobre as possíveis oportunidades de aprimoramento de sua efetividade. O objetivo final do estudo é apresentar, para discussão, algumas hipóteses de melhoria da efetividade do controle externo sobre o Terceiro Setor, hipóteses essas que envolvam a aplicação das ferramentas de avaliação e controle que aqui serão tratadas. Vamos, dessa forma, iniciar o presente estudo com o conceito de Terceiro Setor que, como veremos a seguir, não possui definição simples. 1.2. O TERCEIRO SETOR: CONCEITO O surgimento do Terceiro Setor, como o próprio nome diz, pressupõe a existência de outros dois setores, o Primeiro Setor, que representa o Estado, e o Segundo Setor, que representa as empresas e sociedades comerciais. Podemos iniciar o conceito de Terceiro Setor afirmando ser esse o que abarca a participação da sociedade, através de entidades privadas financiadas com recursos públicos ou privados, no desenvolvimento de atividades em diversos setores ou áreas de interesse público, sem que possuam finalidade de lucro. O conceito é genérico, mas tem explicação, segundo alguns autores, nos inúmeros tipos e formas adotados pelas entidades, bem como nas diversas áreas nas quais desempenham suas atividades e na complexidade de seus objetos sociais, o que dificulta a formulação de um conceito mais objetivo e claro do tema. Para Rubem Fernandes a expressão Terceiro Setor tem sido a mais aceita para conceituar o conjunto de iniciativas da sociedade “voltadas à produção de bens públicos.”1 1 Fernandes, Rubem César. Privado porém público. 2ª Ed., Rio de Janeiro, Relume Dumará, 1994, p. 65. 14 Por conta da legislação aplicável à matéria, e da menção feita em seus dispositivos, afirmam em sua obra Paulo Olak e Diogo do Nascimento que “no Brasil, a expressão vigente (...) sempre foi entidades sem fins lucrativos.”2 Olak e Nascimento definem as entidades sem fins lucrativos como “instituições privadas com propósitos específicos de provocar mudanças sociais e cujo patrimônio é constituído, mantido e ampliado a partir de contribuições, doações e subvenções e que, de modo algum, se reverte para os seus membros ou mantenedores.”3 Peter Drucker faz uma afirmação interessante a respeito do propósito das entidades sem fins lucrativos, ao dizer que “todas as instituições sem fins lucrativos têm algo em comum: são agentes de mudança humana. Seu „produto‟ é um paciente curado, uma criança que aprende, um jovem que se transforma em um adulto com respeito próprio, isto é, toda uma vida transformada.”4 Vale ressaltar a afirmação contida no Manual Básico de Repasses Públicos ao Terceiro Setor do Tribunal de Contas do Estado de São Paulo, de que o Terceiro Setor é “representado por cidadãos integrados em organizações sem fins lucrativos, nãogovernamentais, voltados para a solução de problemas sociais e com objetivo final de gerar serviços de caráter público.”5 Outro conceito interessante é aquele produzido por Gustavo Justino de Oliveira, para o qual o Terceiro Setor é o conjunto de atividades voluntárias, desenvolvidas por organizações privadas não-governamentais e sem ânimo de lucro (associações ou fundações), realizadas em prol da sociedade, independentemente dos 2 Olak, Paulo Arnaldo; Nascimento, Diogo Toledo do. Contabilidade para Entidades sem Fins Lucrativos (Terceiro Setor). 3ª Ed., São Paulo, Atlas, 2010, p. 3. 3 Ibid, p. 6. 4 Drucker, Peter Ferdinand. Administração de organizações sem fins lucrativos: princípios e práticas. São Paulo, Pioneira, 1994, p. 14. 5 Manual Básico de Repasses Públicos ao Terceiro Setor do Tribunal de Contas do Estado de São Paulo. São Paulo, Imprensa Oficial, 2007, p. 12. 15 demais setores (Estado e mercado), embora com eles possa firmar parcerias e deles possa receber investimentos (públicos ou privados).”6 A seguir faremos uma breve análise da evolução da relação entre Estado e Sociedade, e como ela explica o crescimento do Terceiro Setor nos últimos anos e a sua importância na atualidade. 1.3. A RELAÇÃO ENTRE ESTADO E SOCIEDADE E A PARTICIPAÇÃO SOCIAL Observamos, dos conceitos colocados anteriormente, que o Terceiro Setor, em resumo, é a institucionalização da participação da sociedade em assuntos de interesse social, os quais eram, tempos atrás, administrados exclusivamente pelo Estado. Mais adiante, no próximo capítulo deste estudo, analisaremos em detalhes como o campo de atuação do Terceiro Setor está definido pela Constituição Federal de 1988, balizado, principalmente, na garantia dos direitos fundamentais e no exercício desses direitos, provocando os cidadãos a participar dos assuntos de interesse da coletividade. Sob os aspectos institucional, legal e social, o momento atual do Terceiro Setor no país está diretamente relacionado à evolução do Estado Democrático de Direito, através de mudanças culturais, sociais e políticas que transformaram a relação do Estado com a Sociedade, assim como a legislação que é o pilar dessa relação, diga-se, a Constituição Federal do Brasil. É esse o pensamento apresentado por Leandro Marins de Souza, ao dizer que do absolutismo ao Estado social, passando pelo Estado liberal e pelo estado providência, o campo de inserção do Terceiro Setor foi sendo trilhado por nossas Constituições, à medida que as funções do Estado se conformavam aos movimentos constitucionais brasileiros.7 6 Oliveira, Gustavo Justino de. Direito do Terceiro Setor. Revista de Direito do Terceiro Setor – RDTS, Belo Horizonte: Fórum: ano 1, n. 1, jan-jun. 2007, p. 16 e 17. 7 Souza, Leandro Marins de. Parcerias entre a Administração Pública e o Terceiro Setor: sistematização e regulação. 2010. Tese (Doutorado) – Faculdade de Direito, Universidade de São Paulo, São Paulo, 2010, p. 96. 16 Completa o autor, expondo que “com a Constituição de 1988 o que houve foi a confirmação plena da assunção, por parte do Estado brasileiro, da necessidade de participação da iniciativa privada em campos de atuação anteriormente sob a guarda privativa do Estado.”8 Diz, ainda, ao citar um novo ciclo de remodelação do papel do Estado a partir da década de 90, que se busca através deste movimento um ajustamento do Estado às novas aspirações sociais, tal qual ocorreu desde o surgimento do Estado; o Estado, criação social, é sensível aos pleitos da sociedade que rege. Não o fosse e estaria instalada a ingovernabilidade, o que justifica considerar o Estado como ente cambiante de acordo – mais ou menos – com os humores da sociedade em que está inserido.9 A abertura do Estado está, portanto, diretamente ligada às mudanças sociais ocorridas ao longo dos tempos, desde o absolutismo do Império até o Estado Democrático de Direito atual, mudanças essas refletidas em nossas Constituições Federais, e, portanto, na abertura da estrutura do próprio Estado para a participação da sociedade civil organizada. Para Maria Sylvia Zanella Di Pietro, essas mudanças estão relacionadas, mais recentemente, à democracia e à legalidade, como exigências da sociedade em busca de uma maior participação nas decisões do Estado em temas de interesse coletivo, e de uma maior justiça material fundamentada na lei, “daí hoje falar-se em Estado Democrático de Direito, que compreende o aspecto da participação do cidadão (Estado Democrático) e o da justiça material (Estado de Direito).”10 No capítulo seguinte, item 2.1.1., veremos em detalhes como a Constituição Federal de 1988 delineou os contornos atuais da participação da sociedade civil organizada, através das entidades do Terceiro Setor, nos assuntos de interesse social de competência do Estado. 8 Souza, Leandro Marins de. Parcerias entre a Administração Pública e o Terceiro Setor: sistematização e regulação. 2010. Tese (Doutorado) – Faculdade de Direito, Universidade de São Paulo, São Paulo, 2010, p. 96. 9 Ibid, p. 15. 10 Di Pietro, Maria Sylvia Zanella. Parcerias na Administração Pública: concessão, permissão, franquia, terceirização, parceria público-privada e outras formas. 5ª Ed.. São Paulo: Atlas, 2006, pp. 32-33. 17 Antes, porém, cabe uma breve passagem sobre a importância do controle externo para o Terceiro Setor e para o próprio Estado Democrático de Direito. 1.4. O CONTROLE EXTERNO E SUA IMPORTÂNCIA No papel de uma introdução ao assunto, já que no próximo capítulo, item 2.3, o abordaremos de forma mais profunda, ressaltamos que a competência para o exercício do controle externo é dada aos Tribunais de Contas, atualmente, pelos artigos 70 e seguintes da Constituição Federal de 1988. Combinados, os artigos 70 e 71 definiram a competência das Cortes de Contas para o exercício da fiscalização contábil, financeira, orçamentária, operacional e patrimonial dos entes políticos (União, Estados, Distrito Federal e Municípios), em relação à legalidade, legitimidade, economicidade, aplicação das subvenções e renúncia de receitas, bem como que “qualquer pessoa física ou jurídica, pública ou privada, que utilize, arrecade, guarde, gerencie ou administre dinheiros, bens e valores públicos” deverá prestar contas. No exercício dessa competência, O Tribunal de Contas do Estado de São Paulo editou as Instruções nºs 01/2008 (Estado) e 02/2008 (Municípios), que trazem, dentre outras, regras específicas para a fiscalização dos ajustes celebrados entre o poder público e as entidades do Terceiro Setor, bem como das prestações de contas feitas por essas entidades. A competência está definida na legislação e é exercida pelo órgão responsável, cujos detalhes serão trabalhados no decorres deste estudo, mas a importância da atuação do Tribunal de Contas vai além. Ao criar as regras de controle através da fiscalização e efetivamente desempenhá-lo, a Corte de Contas fornece ferramentas para controle do próprio órgão concessor dos repasses e também para o controle social dos cidadãos. 18 A constatação de eventuais irregularidades, após a execução dos procedimentos de fiscalização e transcorrido o devido processo legal, além de incorrer em penalidades aos responsáveis, possui um efeito pedagógico, tanto para o órgão público concessor como para a entidade privada beneficiária. Com a publicação dos resultados da fiscalização o Tribunal colabora com a transparência de informações importantes a respeito da aplicação de recursos públicos repassados ao Terceiro Setor, que podem ser utilizadas por qualquer cidadão. Além da publicação de determinados atos processuais no Diário Oficial do Estado, a Corte de Contas paulista permite o livre acesso ao andamento, despachos e decisões dos processos administrativos em seu sítio na internet, no endereço www.tce.sp.gov.br. O Tribunal de Contas do Estado de São Paulo também exerce o controle externo sobre o Terceiro Setor por iniciativa da sociedade, que pode denunciar qualquer irregularidade ou ilegalidade através de qualquer cidadão, partido político, associação ou sindicato11. Vê-se que é cristalina a relevância do Terceiro Setor para a sociedade nos tempos atuais, assim como a importância do controle externo exercido pelos Tribunais de Contas, e no capítulo que segue, onde vamos expor o alicerce normativo correspondente, isso ficará ainda mais evidente. 2. PANORAMA INSTITUCIONAL, ESTRUTURAL E LEGAL 2.1. AS RELAÇÕES ENTRE O ESTADO E O TERCEIRO SETOR O surgimento e o crescimento do Terceiro Setor no Brasil, como dissemos anteriormente, foi resultado de uma evolução da relação entre o Estado e a Sociedade, e de mudanças na estrutura e na ideologia do próprio Estado. 11 Os artigos 110 a 113 da Lei Complementar Estadual nº 709/93 (a Lei Orgânica do TCE/SP) definem as formalidades e o trâmite processual para os processos de denúncia. 19 Ou seja, falar da relação atualmente existente entre o Estado e o Terceiro Setor é falar do estreitamento da interação do Estado com a Sociedade Civil. Esse estreitamento se traduz na crescente transferência de atividades e ações próprias do Estado para a responsabilidade da sociedade civil, representada por entidades privadas sem fins lucrativos. Adiante desenvolveremos os detalhes mais relevantes a respeito dessa transferência de responsabilidade, tratando da legislação pertinente, as formas que podem tomar as organizações civis, os setores nos quais elas atuam e os tipos de formalização da relação. 2.1.1. A CONSTITUIÇÃO FEDERAL DE 1988 Respeitando a hierarquia das normas de nosso ordenamento jurídico, correto também darmos maior importância no início do presente estudo ao que nos ensina a Carta Magna brasileira. Em diversos trechos de seu texto, a atual Constituição Federal traz, direta ou indiretamente, por interpretação sistemática, princípios e conceitos norteadores do Terceiro Setor. Para Leandro Marins de Souza, a Constituição Federal de 1988 veio a consolidar as possibilidades de atuação da iniciativa privada em matéria social paralelamente à atuação estatal. Foi o fortalecimento da legitimidade da participação do Terceiro Setor na sociedade brasileira, motivo que também deve ser levado em consideração quando se observa seu crescimento na década de 90.12 Em seu primeiro artigo, nos incisos II e III, a Constituição dispõe que a República Federativa do Brasil constitui-se em Estado Democrático de Direito e possui como fundamentos, 12 Souza, Leandro Marins de. Parcerias entre a Administração Pública e o Terceiro Setor: sistematização e regulação. 2010. Tese (Doutorado) – Faculdade de Direito, Universidade de São Paulo, São Paulo, 2010, p. 64. 20 dentre outros, a cidadania e a dignidade da pessoa humana. Além disso, seu parágrafo único diz que o poder emana do povo, que o exerce através de representantes eleitos ou diretamente. Um pouco adiante, no artigo 3º, diz a Carta de 88 que são objetivos fundamentais da República: (i) construir uma sociedade livre, justa e solidária; (ii) garantir o desenvolvimento nacional; (iii) erradicar a pobreza e a marginalização, e reduzir as desigualdades sociais e regionais; e (iv) promover o bem de todos, sem preconceitos de origem, raça, sexo, cor, idade e quaisquer outras formas de discriminação. Têm origem nesses dispositivos constitucionais os primeiros conceitos fundamentais do Terceiro Setor, e são eles a cidadania, a dignidade da pessoa humana, uma sociedade livre e solidária, a redução das desigualdades e a promoção do bem comum, sem distinção entre as pessoas. Nas palavras de Gustavo Justino de Oliveira, o Terceiro Setor é o resultado da combinação do exercício da cidadania com a efetiva participação direta dos cidadãos – individual ou de modo associativo – nos assuntos de interesse da sociedade, sempre com fundamento na busca pela solidariedade entre os indivíduos. Sendo assim, os elementos fundantes do Terceiro Setor encontram-se previstos expressamente na Constituição de 1988. A cidadania é tida como um dos fundamentos da República Federativa do Brasil (art. 1º, inc. II); a participação direta dos cidadãos nos assuntos públicos possui suporte no art. 1º, parágrafo único; a solidariedade é elencada como um dos objetivos fundamentais da República Federativa do Brasil (art. 3º, inc. I). Ao lado disso, é inegável que a própria noção de Estado Democrático de Direito, previsto na Constituição Brasileira no art. 1º, caput, é absolutamente determinante para a conceituação de Terceiro Setor, principalmente diante da obrigatória democratização do Estado de Direito.13 Preceitua, ainda, nossa Constituição Federal, em seu artigo 5º, inciso XVII, o princípio da liberdade de associação, que determina ser plena a liberdade de associação para fins lícitos, proibida a de caráter paramilitar. Os incisos XVIII e XX o complementam dispondo que 13 Oliveira, Gustavo Justino de. Direito do Terceiro Setor. Revista de Direito do Terceiro Setor – RDTS, Belo Horizonte: Fórum: ano 1, n. 1, jan-jun. 2007, p. 26. 21 as associações são livres da interferência estatal em seu funcionamento, e que ninguém será obrigado a associar-se ou a permanecer associado. Leandro Marins de Souza afirma que “somando o princípio da solidariedade ou participação social ao princípio da liberdade de associação temos os fundamentos constitucionais para o Terceiro Setor no Brasil.”14 Diz, ainda, que para uma compreensão constitucional do Terceiro Setor, tão importante quanto os seus princípios constitucionais fundantes são os dispositivos garantidores dos direitos fundamentais dos cidadãos, os dispositivos de vertente social inseridos na Constituição, aqueles que especificam a participação da sociedade no provimento das necessidades sociais, outros que expressamente prevêem o princípio da justiça social como balizador das relações sociais, entre outros, que somados fixam o espaço de participação do Terceiro Setor.15 Esse espaço de participação é desenhado, inicialmente, pelo artigo 6º de nossa Carta Magna, segundo o qual “são direitos sociais a educação, a saúde, o trabalho, o lazer, a segurança, a previdência social, a proteção à maternidade e à infância, a assistência aos desamparados, na forma desta Constituição.” E continua, ao tratar da Ordem Econômica e Financeira, quando em seu artigo 170, caput, dispõe que “a ordem econômica, fundada na valorização do trabalho humano e na livre iniciativa, tem por fim assegurar a todos existência digna, conforme os ditames da justiça social (...)” No mesmo sentido, ao iniciar a abordagem do tema “Ordem Social”, o artigo 193 da Constituição determina que “a ordem social tem como base o primado do trabalho, e como objetivo o bem estar e a justiça sociais.” 14 Souza, Leandro Marins de. Parcerias entre a Administração Pública e o Terceiro Setor: sistematização e regulação. 2010. Tese (Doutorado) – Faculdade de Direito, Universidade de São Paulo, São Paulo, 2010, p. 67. 15 Ibid, p. 67 e 68. 22 Outros dispositivos constitucionais fortalecem ainda mais a legitimidade da participação da sociedade em atividades de interesse social, ao disporem expressamente sobre o tema. O artigo 194 da Constituição afirma que a seguridade social é um conjunto integrado de ações, de iniciativa do Estado e da Sociedade, que têm o objetivo de assegurar os direitos relativos à saúde, à previdência e à assistência social. No mesmo trilho segue o artigo 197, ao dispor que são de relevância pública as ações e serviços de saúde, que deverão ser executados diretamente pelo poder público ou através de terceiros. Também o faz o artigo 199, ao expressamente dispor que “a assistência à saúde é livre à iniciativa privada”. Seus parágrafos 1º e 2º informam que as instituições privadas poderão participar através de contrato de direito público ou convênio, tendo preferência as entidades filantrópicas e as sem fins lucrativos, ficando proibida a destinação de recursos públicos às entidades privadas com fins lucrativos. Mais preciso ainda, o artigo 204, inciso II, diz que as ações governamentais na área da assistência social serão realizadas com a participação da população, através de organizações representativas, na formulação das políticas e no controle das ações. Assim também preceitua o artigo 205, quando diz que “a educação, direito de todos e dever do Estado e da família, será promovida e incentivada com a colaboração da sociedade (...)”. Invocando os fundamentos e objetivos fundamentais da República, principalmente a cidadania e a construção de uma sociedade livre, justa e solidária, a Constituição Federal de 1988 construiu o caminho para a criação e o crescimento do Terceiro Setor, legitimando a participação da sociedade civil organizada nas atividades próprias do Estado, mas de interesse da coletividade. Além dos dispositivos comentados anteriormente, regulamentação semelhante ocorreu com a destinação de recursos públicos para escolas (artigo 213), os direitos à cultura, ao esporte, 23 ao lazer e ao meio ambiente ecologicamente equilibrado (artigos 215, 216, parágrafos 1º e 3º, 217, parágrafo 3º e 225), o amparo às pessoas idosas (artigo 230) e a garantia de direitos à criança e ao adolescente (artigo 227). Nas palavras de Leandro Marins de Souza em estudo focado no aspecto jurídico, o Terceiro Setor encontra âmbito de atuação constitucionalmente delimitado, das noções principiológicas que fundamentam a atuação do Terceiro Setor, como o princípio da solidariedade social antes apresentado, passando pelos objetivos da República Federativa do Brasil, pelo princípio da liberdade de associação, chegando mais especificamente aos dispositivos que expressamente prevêem uma regulamentação constitucional da atuação de entidades sem fins lucrativos em determinadas áreas, verifica-se que juridicamente é sustentável a fixação de um espaço de participação do Terceiro Setor.16 2.1.2. A LEGISLAÇÃO INFRACONSTITUCIONAL Como já dito neste estudo, há um entendimento comum de que a dificuldade de se conceituar o Terceiro Setor reside na diversidade de entidades que o compõe e também dos variados setores de atividade dos quais fazem parte. Concordamos, em parte, com a colocação acima, pois com o que discorremos no item anterior ficou claro o projeto desenhado pela Constituição Federal de 1988 para o Terceiro Setor. Essas características próprias do Terceiro Setor, de diversidade de entidades e campos de atuação, também colaboraram para a formação de um sistema legal vasto e esparso, desde a Constituição, leis, decretos e diversos outros atos normativos. Adiante vamos falar das mais relevantes, que vão tratar, principalmente, dos tipos de entidade e dos setores em que atuam. 2.1.2.1. OS TIPOS DE ENTIDADE E SUAS ÁREAS DE ATUAÇÃO 16 Souza, Leandro Marins de. Parcerias entre a Administração Pública e o Terceiro Setor: sistematização e regulação. 2010. Tese (Doutorado) – Faculdade de Direito, Universidade de São Paulo, São Paulo, 2010, p. 71. 24 Veremos algumas das formas que podem ser adotadas pelas entidades do Terceiro Setor, mas não podemos nos esquecer da principal característica, comum a todas elas, a de ausência de finalidade lucrativa, que quer dizer, ausência de distribuição de eventual resultado positivo de suas atividades para seus instituidores. Joaquim Falcão esclarece que juridicamente, entidades privadas sem fins lucrativos podem assumir duas formas distintas: a de sociedade civil sem fins lucrativos, também denominada associação civil, ou a de fundação. A existência dessas duas formas não é casual. Correspondem a duas manifestações típicas do chamado „espírito comunitário‟, razão de ser do Terceiro Setor: o associar e o dar.17 Para Leandro Marins de Souza, “as formas clássicas de entidades privadas sem fins lucrativos existentes em nosso ordenamento jurídico são a associação civil e a fundação privada, mas não são as únicas.”18 O estudioso e jurista entende que também são entidades do Terceiro Setor os sindicatos, as organizações religiosas e os partidos políticos, porque além de serem entidades sem fins lucrativos, suas atividades se enquadram no espaço de participação do Terceiro Setor. O artigo 44 do Código Civil Brasileiro (Lei nº 10.406/02) dispõe que são pessoas jurídicas de direito privado: (i) as associações; (ii) as sociedades, (iii) as fundações; (iv) as organizações religiosas; (v) os partidos políticos; e (vi) as empresas individuais de responsabilidade limitada. Por óbvio não nos importam nesse momento, por não serem consideradas entidades do Terceiro Setor, as sociedades e as empresas individuais de responsabilidade limitada, já que possuem finalidade lucrativa. 17 Falcão, Joaquim; Cuenca, Carlos. Diretrizes para nova legislação do Terceiro Setor. In: (coord.). Mudança Social e reforma legal: estudos para uma nova legislação do terceiro setor. Brasília, DF. Conselho da Comunidade Solidária: UNESCO, 1999, p. 47. 18 Souza, Leandro Marins de. Parcerias entre a Administração Pública e o Terceiro Setor: sistematização e regulação. 2010. Tese (Doutorado) – Faculdade de Direito, Universidade de São Paulo, São Paulo, 2010, p. 92. 25 Nos interessa, portanto, tratar com maior minúcia das associações e das fundações, que são as formas mais comuns dentre as entidades que atuam no Terceiro Setor. De acordo com o artigo 53 do Código Civil, as associações são constituídas a partir da união de pessoas que se organizem para fins não econômicos. Paulo Olak e Diogo Nascimento afirmam que “são elementos caracterizadores das associações: reunião de pessoas, consecução de fins comuns e finalidade não lucrativa. Pode-se admitir, portanto, que associação é a reunião de pessoas para a consecução de fins comuns sem finalidade lucrativa.”19 As fundações, por sua vez, e nos termos do artigo 62 do Código Civil, são criadas por um instituidor que “fará, por escritura pública ou testamento, dotação especial de bens livres, especificando o fim a que se destina, e declarando, se quiser, a maneira de administrá-la.” Por determinação do parágrafo único do artigo 62, a fundação poderá ser constituída somente para fins religiosos, morais, culturais ou de assistência. Para Pedro Nunes, a fundação é uma instituição autônoma, criada por liberalidade privada ou pelo Estado, por meio de escritura pública ou testamento, com personalidade jurídica, patrimônio próprio especificado e fim altruístico, beneficente ou de necessidade, interesse ou utilidade pública ou social, administrada segundo determinações de seus fundadores.20 O campo de atuação das fundações foi bem definido pelo parágrafo único do artigo 62 do Código Civil, conforme o acima comentado. Por outro lado, para as associações ficou a vasta abrangência dada pela Constituição Federal ao Terceiro Setor. 19 Olak, Paulo Arnaldo; Nascimento, Diogo Toledo do. Contabilidade para Entidades sem Fins Lucrativos (Terceiro Setor). 3ª Ed., São Paulo, Atlas, 2010, p. 15. 20 Nunes, Pedro. Dicionário de tecnologia jurídica. 12ª Ed. Rio de Janeiro: Freitas Bastos, 1990. 26 De forma mais ampla a Constituição desenhou como áreas de atuação para as associações a educação, a saúde e a assistência, dentre outras, nos termos do seu artigo 6º, segundo o qual “são direitos sociais a educação, a saúde, o trabalho, o lazer, a segurança, a previdência social, a proteção à maternidade e à infância, a assistência aos desamparados, na forma desta Constituição.” No Item 2.1.1. deste estudo comentamos a respeito disso, bem como de espaços mais específicos de atuação do Terceiro Setor, definidos pela Carta Magna, dentre eles a garantia dos direitos à cultura, ao esporte, ao lazer e ao meio ambiente ecologicamente equilibrado (artigos 215, 216, parágrafos 1º e 3º, 217, parágrafo 3º e 225), o amparo às pessoas idosas (artigo 230) e a garantia de direitos à criança e ao adolescente (artigo 227). De volta ao nível infraconstitucional, além do Código Civil Brasileiro, outra norma que merece destaque é a Lei Federal nº 9.637, de 15 de maio de 1998, que trata das Organizações Sociais. Nos termos do artigo 1º da citada Lei, poderão ser qualificadas pelo Poder Executivo como Organizações Sociais as pessoas jurídicas de direito privado, sem fins lucrativos, cujas atividades sejam dirigidas ao ensino, à pesquisa científica, ao desenvolvimento tecnológico, à proteção e preservação do meio ambiente, à cultura e à saúde, atendidos aos requisitos previstos nesta Lei. Outra Lei Federal de igual importância para o Terceiro Setor é a Lei nº 9.790, de 23 de março de 1999, que dispõe sobre as Organizações da Sociedade Civil de Interesse Público, as OSCIP‟s. Seu artigo 1º define que poderão ser qualificadas como OSCIP‟s “as pessoas jurídicas de direito privado, sem fins lucrativos, desde que os respectivos objetivos sociais e normas estatutárias atendam aos requisitos instituídos por esta Lei.” Importante citar que, de acordo com o artigo 3º da mencionada Lei, o objetivo social da entidade postulante a tal qualificação deve possuir pelo menos uma das seguintes atividades: 27 (i) promoção da assistência social; (ii) promoção da cultura, defesa e conservação do patrimônio histórico e artístico; (iii) promoção gratuita da educação, observando-se a forma complementar de participação das organizações de que trata esta Lei; (iv) promoção gratuita da saúde, observando-se a forma complementar de participação das organizações de que trata esta Lei; (v) promoção da segurança alimentar e nutricional; (vi) defesa, preservação e conservação do meio ambiente e promoção do desenvolvimento sustentável; (vii) promoção do voluntariado; (viii) promoção do desenvolvimento econômico e social e combate à pobreza; (ix) experimentação, não lucrativa, de novos modelos sócio-produtivos e de sistemas alternativos de produção, comércio, emprego e crédito; (x) promoção de direitos estabelecidos, construção de novos direitos e assessoria jurídica gratuita de interesse suplementar; (xi) promoção da ética, da paz, da cidadania, dos direitos humanos, da democracia e de outros valores universais; e (xii) estudos e pesquisas, desenvolvimento de tecnologias alternativas, produção e divulgação de informações e conhecimentos técnicos e científicos que digam respeito às atividades mencionadas neste artigo. Do que dizem as Leis Federais nºs 9.637/98 e 9.790/99 se extrai que tanto as Organizações Sociais quanto as Organizações da Sociedade Civil de Interesse Público – OSCIP‟s devem ser pessoas jurídicas de direito privado sem fins lucrativos, podendo, assim, assumir a forma jurídica ou de associações ou de fundações, porém com campos de atuação delimitados pelas citadas Leis, nos termos do que comentamos acima. Veremos agora como essas entidades instrumentalizam as relações que estabelecem com o Estado para a consecução de seus objetivos sociais. 2.1.2.2. OS TIPOS DE RELAÇÃO INSTRUMENTAL: OS AJUSTES Diante do que foi exposto até então neste estudo, fica clara a busca por conceitos ou definições no texto de nossa Constituição Federal, porém nela não encontramos nenhum dispositivo específico relativo aos tipos de instrumentos que podem ser utilizados para reger a relação entre o poder público e as entidades do Terceiro Setor. Apenas em seu artigo 199, parágrafos 1º e 2º, que tratam especificamente da assistência à saúde, encontramos mera menção quando diz que 28 as instituições privadas poderão participar de forma complementar do sistema único de saúde, segundo diretrizes deste, mediante contrato de direito público ou convênio, tendo preferência as entidades filantrópicas e as sem fins lucrativos”, e que “é vedada a destinação de recursos públicos para auxílios ou subvenções às instituições privadas com fins lucrativos. A seguir veremos com maior profundidade o que traz a legislação infraconstitucional em relação aos tipos de instrumento mais comuns para formalizar os acordos entre o Estado e as entidades sem fins lucrativos. 2.1.2.2.1. AS SUBVENÇÕES SOCIAIS A Lei Federal que estatuiu em 1964 as normas gerais de Direito Financeiro para a União, Estados, Distrito Federal e Municípios, a Lei nº 4.320/64, é a primeira fonte para conceituarmos as subvenções sociais. De acordo com o seu artigo 12, parágrafos 2º e 3º, inciso I, são subvenções sociais as transferências correntes destinadas a cobrir despesas de custeio das instituições públicas ou privadas de caráter assistencial ou cultural, sem finalidade lucrativa. O artigo 16 da citada Lei de Direito Financeiro informa, ainda, que “a concessão de subvenções sociais visará a prestação de serviços essenciais de assistência social, médica e educacional, sempre que a suplementação de recursos de origem privada aplicados a esses objetivos, revelar-se mais econômica.” Seu artigo 17 acrescenta que somente serão concedidas subvenções às entidades que tiverem condições de funcionamento julgadas satisfatórias pelos órgãos oficiais de fiscalização. Complementando o conceito acima, de natureza financeira e orçamentária, o artigo 30 da Lei Orçamentária Anual Federal de 2012, a Lei nº 12.465/11, dispõe que as transferências à título de subvenções sociais atenderão às entidades privadas sem fins lucrativos que exerçam atividades de natureza continuada nas áreas de assistência social, saúde ou educação, 29 prestem atendimento direto ao público e tenham certificação de entidade beneficente de assistência social”, nos termos de Lei própria. 2.1.2.2.2. AS CONTRIBUIÇÕES CORRENTES E DE CAPITAL Nos termos do artigo 12, parágrafo 2º, da Lei nº 4.320/64, são contribuições correntes as dotações destinadas a atender à manifestação de outras entidades de direito público ou privado. Conforme previsão do artigo 31 da Lei Orçamentária Anual Federal de 2012, as contribuições correntes são transferências destinadas a entidades sem fins lucrativos que não atuem nas áreas de assistência social, saúde ou educação, e que cumpram com uma das seguintes condições: (i) estejam autorizadas em lei que identifique expressamente a entidade beneficiária; (ii) estejam nominalmente identificadas na Lei Orçamentária de 2012; ou (iii) sejam selecionadas para execução, em parceria com a Administração Pública Federal, de programas e ações que contribuam diretamente para o alcance de diretrizes, objetivos e metas previstas no Plano Plurianual. Por outro lado, de acordo com o artigo 12, parágrafo 6º, da Lei nº 4.320/64, são contribuições de capital as dotações para investimentos ou inversões financeiras que outras pessoas de direito público ou privado devam realizar, independentemente de contraprestação direta em bens ou serviços, (...), segundo derivem diretamente da Lei de Orçamento ou de lei especialmente anterior. Reitera o artigo 32 da Lei Orçamentária Anual de 2012 – Lei Federal nº 12.465/11 – que as contribuições de capital para entidades privadas sem fins lucrativos estão condicionadas a uma autorização em lei especial anterior. 2.1.2.2.3. OS AUXÍLIOS Nos termos do artigo 12, parágrafo 6º, da Lei nº 4.320/64, os auxílios também são transferências de capital, assim como as contribuições de capital, destinadas para investimentos ou inversões financeiras que outras pessoas de direito público ou privado devam realizar, independentemente de contraprestação 30 direta em bens ou serviços, (...), segundo derivem diretamente da Lei de Orçamento ou de lei especialmente anterior. Tanto para os auxílios como para as contribuições de capital, os parágrafos 4º e 5º do mesmo artigo da Lei de Direito Financeiro classificou como investimentos as dotações para o planejamento e a execução de obras, inclusive as destinadas à aquisição de imóveis considerados necessários à realização destas últimas, bem como para os programas especiais de trabalho, aquisição de instalações, equipamentos e material permanente e constituição ou aumento do capital de empresas que não sejam de caráter comercial ou financeiro, e como inversões financeiras as dotações destinadas a aquisição de imóveis, ou de bens de capital já em utilização, aquisição de títulos representativos do capital de empresas ou entidades de qualquer espécie, já constituídas, quando a operação não importe aumento do capital, e constituição ou aumento do capital de entidades ou empresas que visem a objetivos comerciais ou financeiros, inclusive operações bancárias ou de seguros. O artigo 33 da Lei Orçamentária Federal de 2012 define que os auxílios somente serão concedidos para entidades privadas sem fins lucrativos e desde que sejam, dentre outros requisitos: (i) de atendimento direto e gratuito ao público, atendam ao disposto no artigo 30 desta Lei (que trata de subvenções) e alternativamente sejam voltadas para a educação especial ou educação básica; (ii) qualificadas para desenvolver atividades de conservação e preservação ambiental; (iii) de atendimento direto e gratuito ao público na área de saúde e alternativamente atendam ao disposto no artigo 30 desta Lei ou sejam signatárias de contrato de gestão celebrado com a Administração Pública Federal; (iv) qualificadas ou registradas e credenciadas como instituições de apoio ao desenvolvimento da pesquisa científica e tecnológica e tenham contrato de gestão firmado com órgãos públicos; (v) qualificadas para o desenvolvimento de atividades esportivas que contribuam para a capacitação de atletas de alto rendimento nas modalidades olímpicas e paraolímpicas; (vi) de atendimento direto e gratuito ao público na área de assistência social e atendam ao disposto no artigo 30 desta Lei, e cujas ações se destinem a idosos, crianças e adolescentes em situação de vulnerabilidade social, risco pessoal e social ou a habilitação, reabilitação e integração da pessoa portadora de deficiência; (vii) voltadas diretamente às atividades de coleta e processamento de material reciclável; (viii) voltadas ao atendimento de pessoas em situação de vulnerabilidade social, risco pessoal e social, violação de direitos ou diretamente alcançadas por programas e ações de combate à pobreza e geração de trabalho e renda; 31 (ix) colaboradoras na execução dos programas de proteção a pessoas ameaçadas promovidos pela Secretaria de Direitos Humanos da Presidência da República; e (x) voltadas diretamente às atividades de extrativismo, manejo de florestas de baixo impacto, pesca e agricultura de pequeno porte realizadas por povos e comunidades tradicionais e agricultores familiares. 2.1.2.2.4. OS CONVÊNIOS Nas palavras da Professora Maria Sylvia Zanella Di Pietro, a saúde, por exemplo, “pode ser prestada pelo Estado como serviço público próprio, ou pelo particular, como serviço público impróprio. Quando prestada pelo particular, o Estado pode fomentar, pela outorga de auxílios ou subvenções, que se formaliza mediante convênio.”21 Apesar de ser um instrumento dos mais utilizados atualmente para formalizar as relações entre o Estado e as entidades do Terceiro Setor, o convênio não era utilizado para esse propósito quando de sua origem. Leandro Marins de Souza consigna que em sua origem no ordenamento jurídico, os convênios tinham por função instrumentalizar o relacionamento entre entidades públicas, com vistas a facilitar a execução de seus serviços por meio da descentralização; pretendia o intercâmbio de funcionários e estrutura entre poderes públicos nos mais diversos níveis.22 A legislação começou a admitir a celebração de convênios entre o poder público e organizações particulares em 1986, com o Decreto Federal nº 93.872, artigo 48, ao prever que “os serviços de interesse recíproco dos órgãos e entidades da administração federal e de outras entidades públicas ou organizações particulares, poderão ser executados sob o regime de mútua cooperação, mediante convênio, acordo ou ajuste.” 21 Di Pietro, Maria Sylvia Zanella. Parcerias na Administração Pública: concessão, permissão, franquia, terceirização, parceria público-privada e outras formas. 5ª Ed.. São Paulo: Atlas, 2006, p. 250. 22 Souza, Leandro Marins de. Parcerias entre a Administração Pública e o Terceiro Setor: sistematização e regulação. 2010. Tese (Doutorado) – Faculdade de Direito, Universidade de São Paulo, São Paulo, 2010, p. 164. 32 O parágrafo primeiro do citado dispositivo reitera a importância do interesse recíproco na relação, informando que em sua ausência, ou seja, quando houverem interesses diversos e opostos dos participantes, o acordo constitui contrato. Anos depois, com a promulgação da Constituição Federal de 1988, o convênio foi sutilmente citado, como já comentamos neste estudo, pelo artigo 199, que permitiu às instituições privadas, as filantrópicas e as sem fins lucrativos, participar do sistema único de saúde de forma complementar, mediante contrato de direito público ou convênio. Apesar de estar no rol das normas infra-legais, a Instrução Normativa nº 01/1997 da Secretaria do Tesouro Nacional é norma de referência, pois disciplina a celebração e a execução de convênios de natureza financeira, para fins de execução descentralizada de Programa de Trabalho no âmbito da Administração Pública Federal. No artigo 1º, parágrafo 1º, inciso III, da norma acima mencionada, ao trazer o conceito de „convenente‟, há uma menção à possibilidade de celebração de convênios entre órgãos ou entidades da Administração Pública Federal, direta ou indireta, e organizações particulares. Num passado mais recente, foi editado o Decreto nº 6.170, de 25 de julho de 2007, que, dentre outras providências, regulamenta os convênios celebrados por órgãos e entidades da administração pública federal com órgãos ou entidades públicas ou privadas sem fins lucrativos. De acordo com seu artigo 1º, parágrafo 1º, inciso I, considera-se convênio o acordo, ajuste ou qualquer outro instrumento que discipline a transferência de recursos financeiros de dotações consignadas nos Orçamentos Fiscal e da Seguridade Social da União e tenha como partícipe, de um lado, órgão ou entidade da administração pública federal, direta ou indireta, e, de outro lado, órgão ou entidade da administração pública estadual, distrital ou municipal, direta ou indireta, ou ainda, entidades privadas sem fins lucrativos, visando a execução de programa de governo, envolvendo a realização de projeto, atividade, serviço, aquisição de bens ou evento de interesse recíproco, em regime de mútua cooperação. 33 Lembra Leandro Marins de Souza que “assim como no Decreto 93.872/86, o conceito trazido por este dispositivo traz a nota principal de distinção entre os convênios e os contratos: o interesse recíproco e a mútua cooperação.”23 Conclui sua linha de pensamento a professora Maria Sylvia Zanella Di Pietro afirmando que no caso do convênio, se o conveniado recebe determinado valor, este fica vinculado ao objeto do convênio durante toda a sua execução, razão pela qual o executor deverá demonstrar que referido valor está sendo utilizado em consonância com os objetivos estipulados. Como não há comutatividade de valores, não basta demonstrar o resultado final obtido; é necessário demonstrar que todo o valor repassado foi utilizado na consecução daquele resultado. Vale dizer que o dinheiro assim repassado não muda sua natureza por força do convênio; ele é transferido e utilizado pelo executor do convênio, mantida sua natureza de dinheiro público (no sentido de que está destinado a fim público).24 2.1.2.2.5. O CONTRATO DE GESTÃO O contrato de gestão é um instrumento jurídico criado pela Lei Federal nº 9.637/98, lei que instituiu a figura das Organizações Sociais, que, segundo o artigo 5º, é o instrumento a ser firmado “entre o Poder Público e a entidade qualificada como organização social, com vistas à formação de parceria entre as partes para fomento e execução de atividades relativas às áreas” do ensino, pesquisa científica, desenvolvimento tecnológico, proteção e preservação do meio ambiente, cultura e saúde. Importante a determinação do artigo 7º da mesma Lei, de que os princípios da legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade, e economicidade devem ser observados na elaboração do contrato de gestão, bem como os seguintes preceitos: (i) especificação do programa de trabalho proposto pela organização social, a estipulação das metas a serem atingidas e os respectivos prazos de execução, bem como previsão expressa dos critérios objetivos de avaliação de desempenho a serem utilizados, mediante indicadores de 23 Souza, Leandro Marins de. Parcerias entre a Administração Pública e o Terceiro Setor: sistematização e regulação. 2010. Tese (Doutorado) – Faculdade de Direito, Universidade de São Paulo, São Paulo, 2010, p. 168. 24 Di Pietro, Maria Sylvia Zanella. Parcerias na Administração Pública: concessão, permissão, franquia, terceirização, parceria público-privada e outras formas. 5ª Ed.. São Paulo: Atlas, 2006, p. 251. 34 qualidade e produtividade; e (ii) a estipulação dos limites e critérios para despesa com remuneração e vantagens de qualquer natureza a serem percebidas pelos dirigentes e empregados das organizações sociais, no exercício de suas funções. No artigo 8º da citada Lei resta evidente a preocupação com a execução do contrato e sua fiscalização, nomeando os responsáveis por esta, bem como pela elaboração de relatórios periódicos a respeito da execução (entidade qualificada), pela análise dos resultados atingidos na execução e relatório conclusivo sobre a avaliação (comissão de avaliação). 2.1.2.2.6. O TERMO DE PARCERIA Criado pela Lei nº 9.790/99 para formalizar as relações do Poder Público com as Organizações da Sociedade Civil de Interesse Público, as OSCIP‟s, o Termo de Parceria, de acordo com o artigo 9º da Lei, é “destinado à formação de vínculo de cooperação entre as partes, para o fomento e a execução das atividades de interesse público previstas no art. 3º desta Lei.” Em item anterior do presente estudo elencamos as atividades de interesse público que devem fazer parte do objetivo social das OSCIP‟s25. Merecem destaque algumas das cláusulas essenciais do Termo de Parceria, trazidas pelo parágrafo 2º do artigo 10 da Lei, dentre elas: (...) (ii) a de estipulação das metas e dos resultados a serem atingidos e os respectivos prazos de execução ou cronograma; (iii) a de previsão expressa dos critérios objetivos de avaliação de desempenho a serem 25 “(i) promoção da assistência social; (ii) promoção da cultura, defesa e conservação do patrimônio histórico e artístico; (iii) promoção gratuita da educação, observando-se a forma complementar de participação das organizações de que trata esta Lei; (iv) promoção gratuita da saúde, observando-se a forma complementar de participação das organizações de que trata esta Lei; (v) promoção da segurança alimentar e nutricional; (vi) defesa, preservação e conservação do meio ambiente e promoção do desenvolvimento sustentável; (vii) promoção do voluntariado; (viii) promoção do desenvolvimento econômico e social e combate à pobreza; (ix) experimentação, não lucrativa, de novos modelos sócio-produtivos e de sistemas alternativos de produção, comércio, emprego e crédito; (x) promoção de direitos estabelecidos, construção de novos direitos e assessoria jurídica gratuita de interesse suplementar; (xi) promoção da ética, da paz, da cidadania, dos direitos humanos, da democracia e de outros valores universais; e (xii) estudos e pesquisas, desenvolvimento de tecnologias alternativas, produção e divulgação de informações e conhecimentos técnicos e científicos que digam respeito às atividades mencionadas neste artigo.” 35 utilizados, mediante indicadores de resultado; (iv) a de previsão de receitas e despesas a serem realizadas em seu cumprimento, estipulando item por item as categorias contábeis usadas pela organização e o detalhamento das remunerações e benefícios de pessoal a serem pagos, com recursos oriundos ou vinculados ao Termo de Parceria, a seus diretores, empregados e consultores; (v) a que estabelece as obrigações da Sociedade Civil de Interesse Público, entre as quais a de apresentar ao Poder Público, ao término de cada exercício, relatório sobre a execução do objeto do Termo de Parceria, contendo comparativo específico das metas propostas com os resultados alcançados, acompanhado de prestação de contas dos gastos e receitas efetivamente realizados, independente das previsões mencionadas no inciso IV; (vi) a de publicação, na imprensa oficial do Município, do Estado ou da União, conforme o alcance das atividades celebradas entre o órgão parceiro e a Organização da Sociedade Civil de Interesse Público, de extrato do Termo de Parceria e de demonstrativo da sua execução física e financeira, conforme modelo simplificado estabelecido no regulamento desta Lei, contendo os dados principais da documentação obrigatória do inciso V, sob pena de não liberação dos recursos previstos no Termo de Parceria. Além das cláusulas essenciais exigidas, o artigo 11 da Lei nº 9.790/99 também prevê regras de accountability para a execução e fiscalização do Termo de Parceria, nomeando os responsáveis por esta, bem como pela análise dos resultados atingidos na execução e relatório conclusivo sobre a avaliação (comissão de avaliação). A Lei ainda prevê, em seu artigo 14, que as OSCIP‟s devem publicar regulamento próprio com as regras que serão por ela adotadas na contratação de obras e serviços, e nas compras com o uso de recursos do Poder Público, observados os princípios da legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade, economicidade e da eficiência. A seguir veremos como as relações estabelecidas com entidades do Terceiro Setor são tratadas, legal e formalmente, no âmbito municipal. 2.1.3. A LEGISLAÇÃO NO MUNICÍPIO Em complemento ao que dissemos até o momento a respeito das relações do Estado com entidades privadas sem fins lucrativos, vamos ver um exemplo de como certo município trata, sob os aspectos legal e formal, suas relações com tais entidades. 36 O Município paulista de São José dos Campos, por exemplo, possui uma história antiga de celebração de convênios com entidades privadas sem fins lucrativos para a execução de atividades de interesse social. Em uma pesquisa realizada no sítio da Câmara Municipal local na internet verificamos a existência de Leis que tratam do assunto e que são datadas da década de 70. Um exemplo é a Lei Municipal nº 2.233, de 1º de outubro de 1979, que autorizava a Prefeitura (artigo 1º) a celebrar convênio com a AJAM - Associação Joseense de Assistência à Mulher, visando o diagnóstico Precoce do Câncer ginecológico em mulheres residentes no Município, bem como proceder à orientação quanto ao caso, às pacientes, no sentido do tratamento indicado ou recomendado. A Lei ainda aprovava as cláusulas básicas do convênio, conforme minuta a ela anexada. A Lei de Diretrizes Orçamentárias – LDO do Município para o Ano de 2011 – Lei Municipal nº 8.154/10 – determina, no artigo 10, inciso VII, que “constarão na proposta do orçamento fiscal (...) as despesas relativas às subvenções sociais e auxílios para despesas de capital destinadas às entidades privadas sem fins lucrativos e que se encontrem habilitadas nos termos da legislação vigente.” O artigo 13 da LDO 2011 ainda informa que “a Lei Orçamentária Anual não conterá dispositivo estranho à previsão da receita e à fixação da despesa”, com algumas exceções, sendo uma delas a “autorização para celebração de convênios com Órgãos ou Entidades Públicas e Privadas, para aplicação dos recursos oriundos desses órgãos e entidades, sem retorno, no limite dos valores a serem efetivamente transferidos.” Seguindo essa determinação, o artigo 10 da Lei Municipal nº 8.265/10, a Lei Orçamentária Anual de 2011 do Município de São José dos Campos, possui previsão idêntica. 37 Verificamos, dessa forma, que a legislação municipal de São José segue a mesma diretriz que a legislação orçamentária federal, ao guardar consonância com a Lei de Direito Financeiro nº 4.320/64 em relação às subvenções sociais e auxílios, conforme comentamos nos itens 2.1.2.2.1. e 2.1.2.2.3.. Ademais, para atividades específicas que podem se repetir em mais de um convênio com mais de uma entidade a Municipalidade optou por editar leis que trouxessem regras e uma minuta de convênio padrão para as situações nela enquadradas. É o caso da Lei Municipal nº 5.801/00, que autoriza a Prefeitura a celebrar convênios com entidades sem fins lucrativos para a implantação de Centros Comunitários de Convivência Infantil – CECOI, que atendam crianças com até 7 anos de idade, de famílias com baixa renda familiar. O artigo 2º da Lei informa que poderão propor a parceria nela prevista entidades privadas sem fins lucrativos que comprovem: (i) não remunerar diretores e conselheiros a qualquer título; (ii) revogado; (iii) atender a legislação pertinente as Escolas de Educação Infantil da rede privada; (iv) comprovar que seus estatutos determinam que os diretores e conselheiros serão eleitos periodicamente com mandato máximo de quatro anos; e (v) seu regular funcionamento através de atestado fornecido por órgão governamental de âmbito estadual. Outro exemplo é a Lei Municipal nº 7.102/06, que autoriza a Prefeitura a firmar convênios com Instituições de Ensino Superior localizadas no Município, para concessão de bolsas de estudos integrais, cujos custos serão divididos entre os convenentes. De outra sorte, o que verificamos em maior quantidade são as Leis editadas especialmente para cada convênio celebrado, individualmente, ou seja, para cada convênio uma lei própria de autorização. É o caso da Lei Municipal nº 8.208/10, que autoriza a Secretaria da Educação a firmar convênio com a Associação para Valorização de Pessoas com Deficiência – AVAPE, para o 38 desenvolvimento de um Centro de Educação Infantil – CEDIN em determinada localidade do Município, com o objetivo de atender, em período integral, crianças de 0 a 5 anos de idade, que sejam filhos de mães com atividades remuneradas, mas de baixa renda. Tanto a Lei quanto a minuta do convênio prevêem as responsabilidades e as obrigações de cada parte para o exato cumprimento do objeto do acordo, demonstrando existir o interesse recíproco e a mútua cooperação, citados pelo Decreto nº 6.170/07, que regulamenta os convênios no âmbito Federal, ao conceituar tal instrumento. Importante analisarmos agora as regras aplicáveis às entidades privadas sem fins lucrativos para o registro e controle de suas receitas e despesas, instrumentos necessários à fiscalização e accountability. 2.2. A CONTABILIDADE E O TERCEIRO SETOR O Conselho Federal de Contabilidade – CFC, órgão que regulamenta e fiscaliza a profissão contábil no Brasil é responsável, entre outras atribuições, pela elaboração das Normas Brasileiras de Contabilidade, as NBC‟s, conjunto de regras que devem ser observadas no exercício da profissão contábil. Dentre as NBC‟s elaboradas pelo Conselho Federal de Contabilidade, três delas dizem respeito a entidades sem fins lucrativos e são a NBC T 10.4, aplicável às Fundações, a NBC T 10.18, para Entidades Sindicais e Associações de Classe, e a NBC T 10.19, para Entidades sem finalidade de lucros. Além das normas contábeis específicas aplicáveis ao Terceiro Setor, das quais falaremos com maior profundidade mais adiante, outras leis trataram da importância da contabilidade para essas entidades. O Código Tributário Nacional – CTN, instituído pela Lei nº 5. 172/66, e recepcionado pela Constituição Federal de 1988 com status de Lei Complementar, traz em seu artigo 9º, inciso 39 IV, letra “c”, dentre outras, uma vedação à União, aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios segundo a qual não podem instituir impostos sobre o patrimônio, a renda ou serviços das instituições de educação e de assistência social, sem fins lucrativos. Para ter direito a tal imunidade, de acordo com o artigo 14 do CTN, a entidade deve respeitar certos requisitos, sendo um deles o de manter “escrituração de suas receitas e despesas em livros revestidos de formalidades capazes de assegurar sua exatidão”. Outra norma, a Lei Orçamentária Anual Federal de 2012, Lei nº 12.465/11, em seu artigo 34, inciso X, dispõe que a transferência de recursos para entidade privada sem fins lucrativos à título de subvenções sociais, contribuições correntes ou auxílios, dependerão de manutenção de escrituração contábil regular. Por sua vez, a Lei Federal nº 12.101/09, que trata da certificação das entidades beneficentes de assistência social, em seu artigo 29, inciso IV, determina que somente fará jus à isenção de contribuições para a seguridade social a entidade que “mantenha escrituração contábil regular que registre as receitas e despesas, bem como a aplicação em gratuidade de forma segregada, em consonância com as normas emanadas do Conselho Federal de Contabilidade.” Também fazem menção à contabilidade as Leis nº 9.637/98 (artigo 4º, inciso X) e 9.790/99 (artigo 4º, inciso VII, letra “a” e artigo 5º, inciso III), que tratam da qualificação de entidades sem fins lucrativos como Organizações Sociais e Organizações da Sociedade Civil de Interesse Público, respectivamente, na medida em que exigem dessas entidades a adoção de normas e princípios contábeis. A seguir falaremos um pouco sobre a relação entre contabilidade e controle, e de como este depende daquela. 2.2.1. A CONTABILIDADE E O CONTROLE 40 Em sua obra intitulada “Contabilidade para Entidades sem fins lucrativos” Paulo Olak e Diogo Nascimento afirmam que inicialmente, não é possível admitir que uma organização, independentemente do seu porte, tenha apenas a escrituração “das receitas e despesas”. Hoje, é condição sine qua non que todas as entidades, com ou sem fins lucrativos, públicas ou privadas, pequenas ou grandes, tenham Contabilidade. São dois os motivos básicos: transparência, relativa à prestação de contas, ao Estado e outros usuários externos, e suporte técnico para gerenciamento da organização (usuários internos).26 A contabilidade nada mais é do que uma fotografia da situação de uma empresa, entidade ou órgão em um determinado momento do tempo, ou seja, quando a foto é tirada (emissão dos demonstrativos contábeis), é revelada, através dos números, a situação real em que se encontra a entidade. O papel da contabilidade é registrar, organizar e revelar os números da entidade da forma mais didática possível para o bom entendimento dos diversos usuários da informação. Como bem disseram Paulo Olak e Diogo Nascimento, a contabilidade para as entidades sem fins lucrativos traz transparência à prestação de contas de suas atividades e ao gerenciamento dos recursos públicos que lhe foram repassados, fator determinante para o controle dos usuários externos: o Estado e a sociedade. O Controle Social sobre as ações do Estado e gastos de recursos públicos tem aumentado nos últimos tempos em razão de dois fatores principais: a inclusão social e política de parcela da população, e a ampliação dos meios de publicidade e divulgação das informações, sendo o principal deles a internet. Cada vez mais pessoas buscam acesso a informações sobre o que o Estado faz com os recursos públicos, e se esses são repassados a entidades privadas para a execução de atividades de 26 Olak, Paulo Arnaldo; Nascimento, Diogo Toledo do. Contabilidade para Entidades sem Fins Lucrativos (Terceiro Setor). 3ª Ed., São Paulo, Atlas, 2010, p. 40. 41 interesse social, normal que haja um interesse da sociedade sobre a qualidade do gasto desses recursos, e a transparência dada pela contabilidade é imprescindível para isso. 2.2.2. A CONTABILIDADE APLICADA ÀS ENTIDADES Como dissemos acima, algumas Normas Brasileiras de Contabilidade – NBC‟s do Conselho Federal de Contabilidade são aplicáveis a entidades do Terceiro Setor. A principal delas é a NBC T 10.19, que trata diretamente das entidades sem finalidade de lucros. A NBC T 10.19, trazida pela Resolução CFC nº 926/01, estabelece critérios e procedimentos específicos de avaliação, de registros dos componentes e variações patrimoniais e de estruturação das demonstrações contábeis, e as informações mínimas a serem divulgadas em nota explicativa das entidades sem finalidade de lucros”, bem como orienta “o atendimento às exigências legais sobre procedimentos contábeis a serem cumpridos pelas pessoas jurídicas de direito privado sem finalidade de lucros, nos termos dos itens 10.19.1.1. e 10.19.1.2.. Item de enorme relevância da norma, o item 10.19.1.6. determina que as entidades sem fins lucrativos estão sujeitas aos Princípios Fundamentais de Contabilidade, às Normas Brasileiras de Contabilidade e às suas Interpretações Técnicas e Comunicados Técnicos, ou seja, se sujeitam às normas contábeis, assim como as empresas que visam lucros. Os Princípios Fundamentais de Contabilidade, agora chamados apenas de Princípios de Contabilidade, após recente alteração feita pela Resolução CFC n 1.282/10, são aqueles definidos pela Resolução CFC nº 750/93, como o da Entidade, o da Continuidade, o da Oportunidade, o do Registro Pelo Valor Original, o da Competência e o da Prudência. De acordo com o parágrafo 1º do artigo 1º da Resolução nº 750/93, “a observância dos Princípios de Contabilidade é obrigatória no exercício da profissão e constitui condição de legitimidade das Normas Brasileiras de Contabilidade (NBC).” Adiante comentaremos a respeito daqueles que entendemos ser os mais relevantes ao presente estudo. 42 O primeiro deles, o Princípio da Entidade (artigo 4º da Resolução), é aquele que reconhece o Patrimônio como objeto da Contabilidade e afirma a autonomia patrimonial, a necessidade da diferenciação de um Patrimônio particular no universo dos patrimônios existentes, independentemente de pertencer a uma pessoa, um conjunto de pessoas, uma sociedade ou instituição de qualquer natureza ou finalidade, com ou sem fins lucrativos. Por conseqüência, nesta acepção, o Patrimônio não se confunde com aqueles dos seus sócios ou proprietários, no caso de sociedade ou instituição. Aqui se estabelece uma determinação clara: autonomia patrimonial para a entidade, ou seja, seu patrimônio não deve jamais ser confundido com o de seus diretores, associados e outros membros. No artigo 6º da Resolução CFC nº 750/93 é definido o Princípio da Oportunidade, que “refere-se ao processo de mensuração e apresentação dos componentes patrimoniais para produzir informações íntegras e tempestivas.” O parágrafo único do artigo 6º explica bem esse Princípio quando diz que “a falta de integridade e tempestividade na produção e na divulgação da informação contábil pode ocasionar a perda de sua relevância, por isso é necessário ponderar a relação entre a oportunidade e a confiabilidade da informação.” E por fim, o Princípio da Competência informado pelo artigo 9º da Resolução, caput e parágrafo único, “determina que os efeitos das transações e outros eventos sejam reconhecidos nos períodos a que se referem, independentemente do recebimento ou pagamento” e “pressupõe a simultaneidade da confrontação de receitas e de despesas correlatas.” Importante ressaltar que em relação à aplicação dos Princípios de Contabilidade, o parágrafo 2º do artigo 1º da Resolução dispõe que “a essência das transações deve prevalecer sobre seus aspectos formais.” 43 Ou seja, a essência ou conteúdo do fato a ser registrado contabilmente deve prevalecer sobre a forma adotada, e importa dizer que o fato que efetivamente ocorreu na prática é o que deve ser contabilizado, e não o que consta em sua formalização. Retornando ao conteúdo da NBC T 10.19, que trata especificamente das entidades sem fins lucrativos, verificamos que o assunto também é abordado, quando o item 10.19.2.1. dispõe que no registro contábil as receitas e despesas serão reconhecidas mensalmente com observância aos Princípios Fundamentais de Contabilidade, em especial os Princípios da Oportunidade e da Competência. Outras regras que merecem destaque são a segregação do registro contábil de receitas e despesas, superávit ou déficit, quando identificáveis por tipos diferentes de atividade (item 10.19.2.5. da NBC T 10.19), e a segregação em contas próprias, mediante constituição ou não de fundos, das receitas de doações, subvenções e contribuições, recebidas para aplicação específica (item 10.19.2.6. da mesma norma). Com relação às demonstrações contábeis, a NBC T 10.19 determina, em seu item 10.19.3.1., que devem ser elaboradas pelas entidades sem finalidade de lucros aquelas demonstrações determinadas pela NBC T 327, porém essa norma foi revogada, e atualmente a norma vigente que a substituiu é a NBC TG Estrutura Conceitual, trazida pela Resolução CFC nº 1.374/11. Em seu capítulo 4, itens 4.2 e 4.3, ao tratar dos elementos das demonstrações contábeis, a NBC TG Estrutura Conceitual menciona as seguintes peças: balanço patrimonial, demonstração do resultado e a demonstração das mutações na posição financeira (mutação do patrimônio). Abordando cada uma dessas demonstrações contábeis, o item 4.2 da NBC TG Estrutura Conceitual informa que 27 As demonstrações contábeis elencadas pela NBC T 3 eram: balanço patrimonial, demonstração do resultado, demonstração de lucros ou prejuízos acumulados, demonstração das mutações do patrimônio líquido e demonstração das origens e aplicações de recursos. 44 elementos diretamente relacionados à mensuração da posição patrimonial e financeira no balanço patrimonial são os ativos, os passivos e o patrimônio líquido. Os elementos diretamente relacionados com a mensuração do desempenho na demonstração do resultado são as receitas e as despesas. A demonstração das mutações na posição financeira usualmente reflete os elementos da demonstração do resultado e as alterações nos elementos do balanço patrimonial. Além disso, o item 10.19.3.3. da NBC T 10.19 determina que as demonstrações contábeis das entidades sem finalidade de lucros devem ser complementadas por notas explicativas que contenham uma lista mínima de informações, dentre as quais citamos algumas de maior relevância para esse estudo, e são elas: o resumo das principais práticas contábeis; os critérios de apuração das receitas e das despesas, especialmente com gratuidades, doações, subvenções, contribuições e aplicações de recursos; as subvenções recebidas pela entidade, a aplicação dos recursos e as responsabilidades decorrentes dessas subvenções; os fundos de aplicação restrita e as responsabilidades decorrentes desses fundos; evidenciação dos recursos sujeitos a restrições ou vinculações por parte do doador; as entidades educacionais, além das notas explicativas, devem evidenciar a adequação das receitas com as despesas de pessoal, segundo parâmetros estabelecidos pela Lei das Diretrizes e Bases da Educação e sua regulamentação; e as entidades beneficiadas com a isenção de tributos e contribuições devem evidenciar, em Notas Explicativas, suas receitas com e sem gratuidade, de forma segregada, e os benefícios fiscais gozados. Daquilo que foi exposto a respeito da legislação e das normas acima, percebemos que os instrumentos contábeis necessários para viabilizar a transparência das atividades e da gestão de recursos públicos existem, e estão disponíveis para o uso das entidades sem fins lucrativos. Basta que haja o cumprimento a essa legislação. Veremos agora como estão previstas no ordenamento jurídico as regras referentes ao controle externo dos ajustes e das prestações de contas das entidades do Terceiro Setor. 2.3. O CONTROLE EXTERNO PELO TRIBUNAL DE CONTAS DO ESTADO A Constituição Federal de 1988 prevê no artigo 70 que 45 a fiscalização contábil, financeira, orçamentária, operacional e patrimonial da União e das entidades da administração direta e indireta, quanto à legalidade, legitimidade, economicidade, aplicação das subvenções e renúncia de receitas, será exercida pelo Congresso Nacional, mediante controle externo, e pelo sistema de controle interno de cada Poder. O controle externo citado será exercido pelo Poder Legislativo com o auxílio do Tribunal de Contas da União, nos termos do artigo 71 da Carta Magna, que ainda determina, no parágrafo único do artigo 70 que “qualquer pessoa física ou jurídica, pública ou privada, que utilize, arrecade, guarde, gerencie ou administre dinheiros, bens e valores públicos” deverá prestar contas. O artigo 75 da Constituição Federal ainda informa que em relação à organização, composição e fiscalização dos Tribunais de Contas dos Estados aplicam-se, no que couber, as normas por ela estabelecidas para o controle externo no âmbito Federal. O parágrafo único do citado artigo diz, também, que “as Constituições estaduais disporão sobre os Tribunais de Contas respectivos, que serão integrados por sete Conselheiros.” Seguindo a determinação da Carta Federal, a Constituição do Estado de São Paulo repete, em seus artigos 32 e 33 as mesmas regras da Constituição Federal acima comentadas, adaptadas para o Estado. O parágrafo único do artigo 32 da Constituição Estadual repete a norma segundo a qual “prestará contas qualquer pessoa física ou jurídica, de direito público ou de direito privado, que utilize, arrecade, guarde, gerencie ou administre dinheiro, bens e valores públicos.” Mais específico em relação à competência do Tribunal de Contas do Estado de São Paulo, o artigo 33, inciso VII, dispõe que a este compete “fiscalizar a aplicação de quaisquer recursos repassados ao Estado e pelo Estado, mediante convênio, acordo, ajuste ou outros instrumentos congêneres.” 46 O inciso XIII do mesmo artigo ainda informa que o Tribunal é competente para emitir parecer sobre a prestação de contas anual da administração financeira dos Municípios, com exceção daqueles que possuem Tribunal próprio. Ou seja, o Tribunal de Contas do Estado de São Paulo possui competência constitucional para o exercício do controle externo, veremos a seguir a legislação própria da Corte de Contas paulista. 2.3.1. A LEGISLAÇÃO DO CONTROLE EXTERNO Fundamentada no alicerce constitucional acima citado, a Lei Orgânica do Tribunal de Contas do Estado foi publicada através da Lei Complementar Estadual nº 709/93, e, de início, também definiu a competência do órgão, com um grau maior de detalhe. O artigo 1º define o Tribunal de Contas do Estado de São Paulo como órgão destinado à fiscalização contábil, financeira, orçamentária, operacional e patrimonial do Estado e de seus Municípios. Ao detalhar a competência do Tribunal, o artigo 2º da Lei Orgânica informa que à Corte de Contas cabe, dentre outras atribuições, “fiscalizar a aplicação de quaisquer recursos repassados pelo Estado, mediante convênio, acordo, ajuste ou instrumento congênere” (inciso X) e “julgar convênios, aplicação de auxílios, subvenções ou contribuições concedidos pelo Estado e pelos Municípios a entidades particulares de caráter assistencial ou que exerçam atividades de relevante interesse público” (inciso XVII). O conteúdo do dispositivo acima é reforçado pelo artigo 15, incisos II e V, da Lei Orgânica, ao determinar que as pessoas físicas ou jurídicas, de direito público ou privado, que arrecadarem ou receberem depósito, auxílio, subvenção, ou contribuição do Estado ou do Município, ou que tenham sob sua guarda e administração bens ou valores públicos, bem como “os responsáveis por entidades jurídicas de direito privado que recebam contribuições 47 parafiscais e prestem serviço de interesse público ou social”, estão sujeitos à jurisdição do Tribunal de Contas. Antes de tratar da norma específica relacionada aos procedimentos de fiscalização dos repasses de recursos públicos às entidades sem fins lucrativos, lembramos que a jurisprudência e as Súmulas do Tribunal de Contas também são fontes de orientação aos órgãos jurisdicionados. As Súmulas publicadas pelo Tribunal que envolvem matéria própria do Terceiro Setor são as seguintes: Súmula nº 1 – Não é lícita a concessão de subvenção para bolsa de estudo e assistência hospitalar com caráter personalíssimo; Súmula nº 2 – É inconstitucional a aplicação de Auxílios ou Subvenções, direta ou indiretamente na manutenção de culto religioso; Súmula nº 3 – Não é lícita a concessão de Auxílios e Subvenções a entidades com fins lucrativos ou com a finalidade específica de valorização patrimonial; e Súmula nº 4 – As despesas somente poderão correr a conta da destinação constante do ato concessório. Dentro de sua competência para fiscalizar e julgar as prestações de contas dos recursos públicos colocados à disposição das entidades sem fins lucrativos, conforme definiu a Lei Complementar Estadual nº 709/93, O Tribunal de Contas elaborou as Instruções nº 1 e 2 de 2008, referentes às áreas Estadual e Municipal, respectivamente, com procedimentos de fiscalização dos objetos inseridos no campo de sua jurisdição. A seguir trataremos delas com maior minúcia. 2.3.2. A FISCALIZAÇÃO DOS REPASSES Para fins desse estudo, no âmbito Municipal abordaremos os repasses e transferências de recursos realizados pelas Prefeituras e regulados pelas Instruções nº 2/2008, que possui o mesmo tratamento legal existente no âmbito Estadual para os repasses realizados por Unidades Gestoras dos órgãos do Poder Executivo, regulados pelas Instruções nº 1/2008. As duas Instruções tratam da mesma forma os repasses realizados tanto pelo Estado como pelas Prefeituras em quatro situações: nos Contratos de Gestão celebrados com 48 Organizações Sociais, nos Termos de Parceria firmados com OSCIP‟s, nos Convênios firmados com entidades não governamentais sem fins lucrativos e nas transferências de recursos a entidades não governamentais sem fins lucrativos por meio de auxílios, subvenções e contribuições. Para os contratos de gestão, termos de parceria e convênios existem regras específicas de envio dos instrumentos celebrados e dos respectivos documentos ao Tribunal de Contas, a depender do valor firmado no acordo. As transferências de recursos por meio de auxílios, subvenções e contribuições possuem regras mais simples de envio de informações ao Tribunal. Veremos essas regras em detalhes a seguir. 2.3.2.1. A REMESSA DO AJUSTE PARA O TRIBUNAL DE CONTAS Até o dia 15 de cada mês deverão ser encaminhadas ao Tribunal de Contas as cópias dos contratos de gestão, termos de parceria e convênios celebrados no mês anterior que tenham atingido valor igual ou superior ao limite de remessa, que atualmente é de R$ 1.746.000,00, nos termos dos artigos 36, 44 e 52 das Instruções nº 1/2008 e 17, 25 e 33 das Instruções nº 2/2008, com o valor atualizado em janeiro de 2012 pelo Comunicado SDG nº 01/2012. As cópias dos instrumentos mencionados deverão vir acompanhadas de um rol extenso de documentos relativos à constituição e qualificação da entidade beneficiária, às razões de escolha da entidade, às evidências de que há vantagem econômica para a Administração em detrimento da aplicação direta, ao próprio contrato e à sua execução, dentre outros (artigos 38, 46 e 54 das Instruções nº 1/2008 e 19, 27 e 35 das Instruções nº 2/2008). Os documentos com os respectivos instrumentos serão utilizados no Tribunal de Contas para a fiscalização dos requisitos exigidos para a celebração do ajuste, e serão autuados em um processo administrativo no qual será julgada a regularidade de tal ajuste. O mesmo 49 processo subsidiará a fiscalização da aplicação dos recursos repassados e respectiva prestação de contas. Por outro lado, os contratos de gestão, termos de parceria e convênios que não tenham atingido o valor limite de remessa terão o mesmo tratamento dado às transferências de recursos realizadas por meio de auxílios, subvenções e contribuições. Em relação a esses casos, o órgão concessor municipal ou estadual deverá obedecer, respectivamente, ao disposto nos artigos 71 a 73 das Instruções 1/2008 e artigos 47 a 50 das Instruções n º 2/2008 do TCE/SP, e exigir determinados procedimentos e documentos referentes ao ajuste ente as partes, comprovação da aplicação dos recursos, prestação de contas e execução do objeto do ajuste, que deverão ser autuados em processo administrativo próprio no órgão, ficando à disposição da fiscalização do Tribunal de Contas. Feito isso, a Prefeitura ou órgão do Estado deverá, ainda, elaborar parecer conclusivo, nos termos do artigo 627 das Instruções 1/2008 e o artigo 370 das Instruções n º 2/2008 do TCE/SP. Esses processos autuados pela origem referentes às prestações de contas de repasses que não foram encaminhados ao Tribunal, por serem de valor inferior ao de remessa, deverão ser analisados quando da fiscalização das contas anuais do órgão concessor. Dessa forma, quando o órgão concessor realizar a prestação das contas anuais, deverão ser enviadas ao Tribunal de Contas as relações de todos os repasses financeiros efetuados no ano para entidades do Terceiro Setor decorrentes de contratos de gestão, termos de parceria e convênios, bem como os repasses à título de auxílios, subvenções e contribuições, independentemente do valor ajustado (artigo 17, incisos VIII e IX das Instruções nº 1/2008 e artigo 1º, inciso XIX das Instruções nº 2/2008). Essas relações serão a base para a seleção da amostragem da fiscalização quando for realizada a visita ao órgão concessor do repasse para a análise das contas anuais. 50 Portanto existem duas formas de envio dos ajustes ao Tribunal de Contas: uma mais completa, no dia 15 de cada mês, referente aos instrumentos celebrados no mês anterior e de valor igual ou superior a R$ 1.746.000,00, outra mais simplificada, uma vez ao ano, quando do envio da prestação de contas anual do órgão público concessor, no dia 31 de janeiro, para as Unidades Gestoras dos órgãos do Poder Executivo Estadual, ou no dia 31 de março, para as Prefeituras (as datas da forma de envio mais simplificada foram definidas pelo artigo 17 das Instruções nº 1/2008 e artigo 1º das Instruções nº 2/2008). Ultrapassada a etapa de fiscalização dos ajustes celebrados entre o poder público e as entidades sem fins lucrativos, será alcançada pelo controle externo do Tribunal de Contas a prestação de contas da aplicação dos recursos repassados, assunto que veremos adiante. 2.3.2.2. A PRESTAÇÃO DE CONTAS DAS ENTIDADES A prestação de contas referente à aplicação dos recursos repassados deverá ser feita pela entidade beneficiária ao órgão concessor, que deve gerenciar a cobrança, o recebimento e a análise dos documentos e informações contidas nessa prestação de contas, além, é claro, de fiscalizar as atividades desempenhadas pela entidade e a execução do acordo. Para todos os tipos de repasses, as Instruções nº 1/2008 (artigos 39, 47, 55 e 72) e 2/2008 (artigos 20, 28, 36 e 49) determinam que o órgão público concessor deverá definir uma data limite para a prestação de contas anual da entidade, que não pode ultrapassar 31 de janeiro do exercício seguinte ao da transferência dos recursos. De acordo com os citados dispositivos, no caso de irregularidades na prestação de contas ou na ausência dela, a Administração Pública deverá exigir o saneamento no prazo máximo de 30 dias, devendo reiterar o procedimento até esgotar todas as possibilidades de correção das falhas. 51 Decorrido o prazo de 30 dias sem a regularização, novos repasses à entidade inadimplente poderão ser suspensos, e, se for o caso, será exigida a devolução dos repasses com os acréscimos legais devidos. Esgotadas as providências acima, o fato deverá ser comunicado pelo órgão ao Tribunal de Contas no prazo máximo de 15 dias. De outra sorte, tendo sido feita a prestação de contas corretamente, sem qualquer irregularidade, o órgão concessor deverá analisá-la e elaborar, no prazo máximo de 30 dias a contar do seu recebimento, o parecer conclusivo nos moldes definidos pelas Instruções do Tribunal (artigo 627 das Instruções 1/2008 e artigo 370 das Instruções n º 2/2008), assunto que será objeto do próximo item deste estudo. Feito isso, no caso de instrumentos celebrados por valor igual ou superior a R$ 1.746.000,00, um conjunto de documentos referente à prestação de contas, incluindo o parecer conclusivo, deverá ser encaminhado ao Tribunal de Contas pelo órgão concessor em até 90 dias após o encerramento do exercício anterior, nos termos dos artigos 40, 48 e 56 das Instruções 1/2008 e artigos 21, 29 e 37 das Instruções n º 2/2008 do TCE/SP. Os documentos serão utilizados pelo setor de fiscalização para a verificação da correta aplicação dos recursos públicos recebidos pela entidade, em obediência à legislação aplicável e ao acordo celebrado. Em relação aos ajustes de valor inferior ao limite de remessa, informado acima, toda a documentação referente à prestação de contas será autuada em um processo administrativo pelo órgão concessor e deverá ficar à disposição do Tribunal de Contas, quando da fiscalização das contas anuais daquele órgão, conforme dispõe os artigos 40, §4º, 48, §4º, 56, §4º, e 73, das Instruções 1/2008 e artigos 21, §4º, 29, §4º, 37, §4º, e 50, das Instruções n º 2/2008 do TCE/SP. 52 No próximo item deste estudo apresentaremos os termos em que a legislação define os requisitos para a emissão do parecer conclusivo pelo órgão concessor a respeito do resultado obtido pela parceria. 2.3.2.3. O PARECER CONCLUSIVO DO ÓRGÃO CONCESSOR De início, o artigo 627 das Instruções 1/2008 e o artigo 370 das Instruções n º 2/2008 determinam que a emissão do parecer conclusivo deverá atender à transparência da gestão definida pelo artigo 48 da Lei Complementar Federal nº 101/00, a Lei de Responsabilidade Fiscal – LRF. Em relação à transparência, sobre a qual comentamos anteriormente no presente estudo e sobre a qual trataremos no próximo capítulo, o parágrafo único do artigo 48 da LRF diz que também será assegurada, dentre outras medidas, através da disponibilização detalhada de informações sobre a execução orçamentária e financeira para a sociedade em meios eletrônicos de acesso público (inciso II). As Instruções do Tribunal exigem, ainda, que na emissão do parecer conclusivo o órgão concessor ateste, no mínimo: (i) o recebimento da prestação de contas dos entes beneficiários, bem como a aplicação de sanções por eventuais ausências de comprovação ou desvio de finalidade; (ii) datas da prestação de contas e dos repasses concedidos; (iii) os valores transferidos e os comprovados, por fontes de recursos; (iv) a localização e o regular funcionamento da entidade que recebeu os recursos; (v) a finalidade estatutária da entidade beneficiária; (vi) a descrição do objeto dos recursos repassados, dos resultados alcançados e a economicidade obtida em relação ao previsto em programa governamental; (vii) o cumprimento das cláusulas pactuadas em conformidade com a regulamentação que rege a matéria; (viii) a regularidade dos gastos efetuados e sua perfeita contabilização, atestados pelos controles internos do beneficiário e do concessor; (...) (x) a regularidade dos recolhimentos de encargos trabalhistas, quando a aplicação dos recursos envolver gastos com pessoal; (xi) que as cópias dos documentos das despesas correspondem aos originais apresentados pelo beneficiário onde constam o tipo de repasse obtido e o órgão repassador a que se referem; e (xii) o atendimento aos princípios da 53 legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade, eficiência e economicidade. O parecer conclusivo, juntamente com outros documentos referentes à prestação de contas, deverá ser encaminhado ao Tribunal em até 90 dias após o encerramento do exercício, para fins de fiscalização e acompanhamento das atividades desempenhadas pelas entidades (artigos 40, 48 e 56 das Instruções 1/2008, artigos 21, 29 e 37 das Instruções n º 2/2008, para os casos de ajustes de valor igual ou superior a R$ 1.746 mil, e itens 9.4.1 e 9.4.2 da Ordem de Serviço SDG nº 2/2009, para os de valor inferior). A seguir veremos os momentos em que a fiscalização atua. 2.3.2.4. OS MOMENTOS DA FISCALIZAÇÃO Via de regra, dos repasses de recursos públicos a entidades sem fins lucrativos, aqueles dos quais o Tribunal de Contas toma conhecimento antes são os contratos de gestão, termos de parceria e convênios de valores que alcancem ou ultrapassem o limite para remessa. Esses devem ser encaminhados ao Tribunal até o dia 15 do mês seguinte à celebração. Depois de registrado e cadastrado na Seção de Protocolo, o processo referente ao acordo celebrado será enviado à fiscalização para fins de instrução. Nessa etapa a fiscalização analisa o cumprimento de requisitos formais e de conteúdo do instrumento e dos documentos que a ele servem de suporte. Após a instrução pela fiscalização o processo segue o trâmite pelas demais áreas do Tribunal para apreciação da regularidade ou não do contrato, termo ou convênio. O setor da fiscalização responsável pela instrução do ajuste deverá solicitar, no exercício seguinte, à Diretoria de Expediente do Tribunal, a autuação de processo específico destinado à análise da prestação de contas daquele mesmo ajuste. 54 Também no exercício seguinte à celebração do ajuste, em até 90 dias após o encerramento do ano anterior, o órgão concessor do repasse deverá encaminhar os documentos necessários para comprovar a aplicação devida dos recursos, bem como o parecer conclusivo correspondente. O setor responsável da fiscalização deverá acompanhar junto ao órgão o envio dos documentos, exigindo-os caso necessário. De posse desses documentos, a fiscalização selecionará o que deverá ser examinado junto ao órgão concessor em visita no local, bem como decidirá pelas visitas às entidades beneficiárias. Nas visitas ao órgão concessor, a fiscalização realizará a análise documental das transferências e das prestações de contas, conforme documentos enviados pelas entidades, e nas visitas às entidades, será feita, principalmente, a verificação de sua existência física, a execução do ajuste, e se suas instalações e atividades guardam relação com o objeto do acordo celebrado. Por outro lado, em relação aos contratos de gestão, termos de parceria, convênios e transferências por meio de auxílio, subvenção ou contribuição celebrados por valor inferior ao de remessa, a atividade da fiscalização do Tribunal de Contas se inicia no dia 31 de janeiro, para órgãos Estaduais, e no dia 31 de março, para as Prefeituras. Até as datas acima citadas, os setores de protocolo da Corte de Contas devem receber as prestações de contas anuais dos órgãos públicos que concederam os repasses, e nela deverá ser incluída uma relação de todos os repasses financeiros do ano decorrentes de contratos de gestão, termos de parceria e convênios, bem como dos repasses sem formalização de ajuste à título de auxílios, subvenções de contribuições, independentemente do valor ajustado (artigo 17, incisos VIII e IX das Instruções nº 1/2008 e artigo 1º, inciso XIX das Instruções nº 2/2008). Além disso, em até 90 dias após o encerramento do exercício os setores de fiscalização do Tribunal deverão receber o parecer conclusivo referente ao resultado da execução do ajuste celebrado. 55 A partir desse momento, os procedimentos de fiscalização são semelhantes aos ajustes de valor igual ou superior ao de remessa, ou seja, serão programadas as visitas tanto ao órgão concessor como à entidade beneficiária, essa por amostragem, para a análise da prestação de contas da aplicação dos recursos, e para a verificação da execução do acordo e de adequação das instalações e atividades ao objeto do ajuste. Encerrados os procedimentos de fiscalização e verificada a real adequação ou não aos requisitos legais e ao ajuste celebrado, será elaborado um relatório final com os apanhados da fiscalização, que farão parte de um processo administrativo sobre repasses ao Terceiro Setor, assunto que trataremos a seguir. 2.3.2.5. O PROCESSO ADMINISTRATIVO NO TCE/SP Comentamos no presente estudo sobre o tratamento diferenciado aplicado a cada tipo de repasse, dependendo do instrumento utilizado, se contrato de gestão, termo de parceria, convênio ou transferências a título de auxílio, subvenção ou contribuições, e dependendo do valor do ajuste. Dessas características, aquela que vai determinar a forma em que os processos serão registrados e cadastrados no Tribunal será o valor do ajuste, assim como o resultado da fiscalização, que pode considerar a prestação de contas da aplicação dos repasses regular, regular com recomendação ou irregular. Os processos referentes às prestações de contas de repasses de valor igual ou superior ao de remessa serão autuados individualmente no setor de protocolo do Tribunal de Contas, ou seja, para cada ajuste um processo. Para as prestações de contas de valor inferior, o resultado da fiscalização é que definirá a forma de autuação do processo. 56 Se o setor da fiscalização responsável opinar pela regularidade da prestação de contas, quando realizados mais de um repasse pelo mesmo órgão, os respectivos ajustes serão autuados em conjunto num mesmo processo, porém se a opinião for pela irregularidade, aqueles ajustes serão autuados individualmente, ou seja, para cada ajuste considerado irregular haverá um processo. Caso a instrução do processo pela fiscalização tenha sido pela irregularidade, será assegurado ao responsável ou interessado o direito à ampla defesa através dos recursos cabíveis nos termos da legislação que trata da matéria (artigos 51 e seguintes da Lei Orgânica do Tribunal – Lei Complementar Estadual nº 709/93). De acordo com o artigo 33, inciso III, da Lei Orgânica do Tribunal, as contas são julgadas irregulares “quando comprovada qualquer das seguintes ocorrências: a) omissão no dever de prestar contas; b) infração à norma legal ou regulamentar; c) dano ao erário, decorrente de ato de gestão ilegítimo ou antieconômico; d) desfalque, desvio de bens ou valores públicos.” Caso sejam julgados irregulares os ajustes com existência de débito, o Tribunal condenará o responsável pelo recolhimento do valor atualizado pelos acréscimos legais, podendo, ainda, ser aplicada multa, nos termos do artigo 36 da mesma Lei. Inexistindo débito, mas comprovada qualquer das hipóteses acima listadas do artigo 33, III, da Lei Complementar nº 709/93, será aplicada multa ao responsável de até 2000 UFESP‟s, ou R$ 36.880,0028 (parágrafo único do artigo 36). A imputação de débito ou multa através de decisão do Tribunal de Contas terá eficácia de título executivo. Assim, na falta do pagamento os documentos pertinentes serão enviados ao Procurador Geral do Estado, por intermédio da Procuradoria da Fazenda do Estado, para cobrança judicial da dívida (artigos 85 e 88 da Lei Orgânica). 28 Valor calculado com base no valor da UFESP para o exercício de 2012, ou seja, de R$ 18,44. 57 Traçamos neste capítulo um panorama sobre a estrutura e legislação do Terceiro Setor, da contabilidade aplicada ao tema e do controle externo exercido pelo Tribunal de Contas, jamais com a pretensão de esgotar o assunto, que é vasto e dinâmico. No capítulo seguinte vamos tratar, do ponto de vista teórico, das ferramentas de avaliação de políticas públicas, como os indicadores sociais, e das ferramentas de controle, como a contabilidade, a publicidade e a transparência, e ao mesmo tempo falaremos de sua importância para o Terceiro Setor e para o controle externo da Corte de Contas, nesta parte sob um prisma teórico e prático. 3. PANORAMA TEÓRICO – FERRAMENTAS DE AVALIAÇÃO E CONTROLE 3.1. EFICIÊNCIA, EFICÁCIA E EFETIVIDADE Antes de falarmos das ferramentas de avaliação e controle dos ajustes celebrados pela administração pública com entidades sem fins lucrativos do Terceiro Setor, vamos tecer alguns comentários sobre conceitos importantes relacionados à avaliação das ações do poder público. No âmbito acadêmico, o tema de gestão das políticas públicas contempla discussões a respeito da gerência do aparelho do Estado, e inevitavelmente aborda assuntos ligados à avaliação de desempenho do próprio Estado. No Brasil após os anos 90, o desafio da melhoria do desempenho da administração pública fez surgir, dentro do modelo de reforma do Estado, o conceito da Nova Gestão de Políticas Públicas, baseado em reformas de primeira, segunda e terceira gerações, fundamentadas, respectivamente, na lógica econômica, lógica administrativa e lógica sócio-política (informação verbal)29. 29 Texto elaborado com base em notas de aula ministrada pelo Professor Doutor Fernando de Souza Coelho, da Escola de Artes, Ciências e Humanidades da Universidade de São Paulo – EACH/USP, aos 18 e 25/08/2010. 58 A primeira reforma, baseada na lógica econômica, tinha foco na eficiência e na economicidade, em processos cuja execução seguiria determinada norma ou regra, em busca de produtividade, ou seja, em fazer mais com menos. Na prática buscou-se um ajuste estrutural da máquina pública, com a privatização de empresas públicas, o equilíbrio fiscal proporcionado pela Lei de Responsabilidade Fiscal, o uso da contabilidade gerencial e da controladoria (auditoria) e a aplicação de conceitos de reengenharia e downsizing (informação verbal)30. A reforma de segunda geração, baseada na lógica administrativa, tinha foco na eficácia e na qualidade, com a entrega de um produto com satisfação quantitativa e qualitativa, buscando fazer o melhor. O objetivo prático era a qualidade dos serviços públicos, com o treinamento e desenvolvimento do funcionalismo, e a desburocratização e a transparência administrativa, com ferramentas como o Governo Eletrônico (informação verbal)31. Por fim, a reforma de terceira geração, fundada na lógica sócio-política, tinha foco na efetividade, em trazer um resultado prático positivo para a sociedade, e fazer diferença para o beneficiário. A idéia era trazer inovações práticas ligadas à democracia participativa, ao empoderamento social, ao cooperativismo, solidariedade e ação coletiva, com o desenvolvimento humano integrado, a sustentabilidade e a territorialidade das políticas públicas (informação verbal)32. Com foco na eficiência e economicidade, a reforma de primeira geração buscou criar valor para o contribuinte; com foco na eficácia e na qualidade, a reforma de segunda geração 30 Texto elaborado com base em notas de aula ministrada pelo Professor Doutor Fernando de Souza Coelho, da Escola de Artes, Ciências e Humanidades da Universidade de São Paulo – EACH/USP, aos 18 e 25/08/2010. 31 Ibid. 32 Ibid. 59 pretendeu criar valor para o usuário-cliente; e com foco na efetividade e resultado, a reforma de terceira geração buscou criar valor para o cidadão (informação verbal)33. As discussões acadêmicas ligadas ao tema da nova gestão de políticas públicas trouxeram novas dimensões aos conceitos de eficiência, eficácia e efetividade relacionados à administração pública. Um processo normatizado que busca a produtividade (fazer mais com menos), para a entrega de um produto (serviço) com quantidade e qualidade que satisfaçam o usuário (fazer melhor), objetivando um resultado que traga impacto a esse usuário (fazer diferença para o beneficiário) são critérios importantes para a avaliação de resultado das políticas públicas.34 Os conceitos de eficiência, eficácia e efetividade são, pois, a base para qualquer índice de avaliação de uma política pública. 3.2. A IMPORTÂNCIA DA AVALIAÇÃO DO RESULTADO A avaliação do resultado, considerando o que comentamos anteriormente, está diretamente relacionada à efetividade, ou seja, está ligada ao efeito produzido pela ação do Estado, através do Terceiro setor, na vida das pessoas, daquelas que direta e indiretamente usufruíram daquela ação. O senso comum a respeito da avaliação do resultado da execução de ajustes entre o Estado e o Terceiro Setor é aquele que observa apenas o controle do cumprimento das metas estabelecidas inicialmente para o projeto. A meta, por exemplo, pode ser a de criar 100 vagas em uma creche para crianças até 5 anos, com as condições padrão para uma boa higiene, alimentação e pedagogia. Criadas as 100 33 Texto elaborado com base em notas de aula ministrada pelo Professor Doutor Fernando de Souza Coelho, da Escola de Artes, Ciências e Humanidades da Universidade de São Paulo – EACH/USP, aos 18 e 25/08/2010. 34 Ibid. 60 vagas nessas condições a avaliação do resultado será boa, pois vai apontar que a meta foi cumprida 100%, mas as pessoas, crianças e familiares alcançados pela ação foram questionados a respeito do benefício sentido por elas? Ou ainda, em outro exemplo, o objetivo do ajuste foi a aquisição de um equipamento oftalmológico para atendimento gratuito da população carente em determinado município, cuja meta era realizar 50 atendimentos por mês. Executado nesses termos o objeto, a meta seria alcançada e o resultado da execução seria bem avaliado, mas os beneficiários aprovaram o atendimento? Há demanda continua para o grau do investimento realizado, e a sociedade está satisfeita com isso? As metas devem sim ser sempre consideradas para a avaliação do resultado final de uma ação, mas antes as metas devem ser muito bem definidas, tarefa tão importante quanto a de estabelecer qual é a finalidade da ação e seu próprio objeto. O ciclo completo é justamente este, descobrir e entender o problema, desenvolver as ações e as metas necessárias para solucionar esse problema, executar as ações e avaliar o seu resultado, ou seja, sua efetividade, que em outras palavras significa o impacto para as pessoas beneficiadas pela ação. E é sob esse aspecto que reside a importância da avaliação do resultado de uma ação governamental para a sociedade. Não é limitada apenas à verificação do cumprimento objetivo das metas estabelecidas no projeto, mas também ao impacto causado pela ação para aqueles que dela usufruíram. Para o Estado a avaliação do resultado bem feita se transforma em instrumento poderoso de gestão das políticas públicas, na medida em que informa se as ações executadas cumpriram seu papel, se há necessidade de continuidade ou não, ou se os recursos podem ser direcionados à solução de outros problemas. 61 Para a sociedade, é ferramenta de controle das ações do Estado e de cobrança por qualidade e atendimento às necessidades dos cidadãos. 3.2.1. A AVALIAÇÃO PELO PODER PÚBLICO CEDENTE Como dissemos anteriormente no presente estudo, o órgão público cedente dos recursos tem o dever, definido na legislação ordinária e nas normas do Tribunal de Contas do Estado de São Paulo, de avaliar a execução dos ajustes celebrados com entidades sem fins lucrativos. Em relação aos contratos de gestão, termos de parceria, convênios e transferências a título de auxílio, subvenções e contribuições, as Instruções do Tribunal de Contas determinam que ao órgão público cedente compete “fiscalizar a aplicação dos recursos e o desenvolvimento das atividades correspondentes”, bem como “receber e examinar as comprovações apresentadas e emitir parecer conclusivo”35 sobre a aplicação dos recursos. Além disso, especificamente nos casos dos contratos de gestão, termos de parceria e convênios de valor igual ou superior a R$ 1.746.000,00, o órgão estadual ou municipal que transferiu os recursos deve encaminhar à Corte de Contas para fins de fiscalização, até 90 dias após o fim do exercício, dentre outros documentos, cópia dos relatórios elaborados sobre a execução do objeto do ajuste.36 A Lei Federal nº 9.637/98, por sua vez, ao tratar da qualificação de entidades como Organizações Sociais e dos contratos de gestão, dispõe, no artigo 8º, que a execução do contrato “será fiscalizada pelo órgão ou entidade supervisora da área de atuação correspondente à atividade fomentada.” 35 Artigos 39, incisos IV e VI, 47, incisos IV e VI, 55, incisos IV e VI e 72 IV e VI das Instruções nº 1/2008 e artigos 20, incisos IV e VI, 28, incisos IV e VI, 36, incisos IV e VI e 49, incisos IV e VI das Instruções nº 2/2008. 36 Artigos 40, incisos VIII e XX, 48, incisos IV e XVI e 56, inciso IV das Instruções nº 1/2008 e artigos 21, incisos VIII e XVIII, 29, incisos IV e XVI e 37, inciso IV das Instruções nº 2/2008. 62 Ao final de cada exercício, ou conforme o interesse público, a entidade deverá encaminhar ao órgão relatório sobre a execução do contrato que contenha “comparativo específico das metas propostas com os resultados alcançados, acompanhado da prestação de contas correspondente ao exercício financeiro.” Além disso, uma comissão de avaliação indicada deverá, periodicamente, analisar os resultados alcançados com a execução do contrato, bem como enviar relatório conclusivo sobre a avaliação realizada à autoridade supervisora37. O artigo 7º, inciso I, da citada norma determina, ainda, que na elaboração do contrato de gestão deverá ser incluído dispositivo que especifique o programa de trabalho proposto pela organização social, a estipulação das metas a serem atingidas e os respectivos prazos de execução, bem como previsão expressa dos critérios objetivos de avaliação de desempenho a serem utilizados, mediante indicadores de qualidade e produtividade. Observemos que a Lei carrega em seu texto conceitos e requisitos importantes para a avaliação de resultados, como o comparativo das metas propostas com os resultados obtidos, prazos de execução das metas e critérios objetivos de avaliação de desempenho através de indicadores de qualidade e produtividade. O artigo 11, caput e parágrafos 1º e 2º (fiscalização da execução do ajuste) e o artigo 10, parágrafo 2º, incisos II e III (elaboração do Termo de Parceria), ambos da Lei Federal nº 9.790/99, que trata da qualificação de entidades como Organizações da Sociedade Civil de Interesse Público – OSCIP‟s, trazem o mesmo conteúdo dos artigos acima comentados da Lei das OS‟s. Já o artigo 6º, caput e parágrafo único, do Decreto Federal nº 6.170/07, que regulamenta a celebração de convênios pelos órgãos da administração pública federal, apenas determina ser cláusula essencial “em qualquer convênio dispositivo que indique a forma pela qual a execução do objeto será acompanhada pelo concedente”, bem como que “a forma de acompanhamento prevista deverá ser suficiente para garantir a plena execução física do objeto.” 37 Parágrafos 1º ao 3º do artigo 8º da Lei nº 9.637/98. 63 Voltando às Instruções do Tribunal de Contas paulista, lembramos, nos termos do que já comentamos nesse estudo, que os órgãos concedentes de repasses devem elaborar e encaminhar ao Tribunal o parecer conclusivo sobre a prestação de contas da aplicação dos recursos pela entidade sem fins lucrativos. O parecer conclusivo, que deverá ser elaborado nos moldes definidos pelas Instruções do Tribunal (artigo 627 das Instruções nº 1/2008 e artigo 370 das Instruções n º 2/2008), conforme comentamos detalhadamente no Item 2.3.2.3. retro, pode ser considerado a formalização da avaliação de resultado pelo poder público concedente. 3.2.2. O PAPEL DO TRIBUNAL DE CONTAS NA AVALIAÇÃO O Tribunal de Contas do Estado de São Paulo, além de orientar os órgãos jurisdicionados estaduais e municipais a receber a prestação de contas das entidades e a elaborar o parecer conclusivo, bem como exigir o correto envio dos ajustes, documentos e informações relacionados aos repasses de recursos públicos, também tem participação direta na avaliação do resultado desses ajustes. Com a cópia dos ajustes e dos respectivos documentos o setor de fiscalização verifica o cumprimento dos requisitos legais relacionados à qualificação das entidades e à formalização do próprio ajuste, bem como às exigências formais referentes à execução do objeto do ajuste, nos termos das Instruções nºs 1/2008 e 2/2008, já comentados no presente estudo. Quanto à fiscalização da execução do ajuste, em visita ao órgão público cedente e à entidade sem fins lucrativos beneficiária, o Tribunal verifica, por exemplo, a adequação da execução orçamentária dos recursos em relação à legislação pertinente e a adequação da execução física das atividades da entidade em relação ao objeto do ajuste. Como resultado dos procedimentos de fiscalização é elaborado um relatório com as constatações feitas, que fará parte de um processo administrativo cujo trâmite dará oportunidade 64 ao exercício do direito à ampla defesa aos interessados, conforme já comentamos no item 2.3.2.5. desse estudo. Podemos dizer que no relatório da fiscalização o Tribunal de Contas faz sua primeira avaliação de resultado sobre um determinado ajuste, que é concluída após o trâmite processual, com o trânsito em julgado da decisão sobre sua regularidade ou irregularidade. A decisão proferida pelos órgãos julgadores da Corte de Contas pode ser considerada a avaliação final feita pelo órgão do controle externo. Nessas etapas, inicial e final, bem como em etapas intermediárias em que os órgãos consultivos do Tribunal opinam sobre a regularidade ou não do ajuste ou de sua prestação de contas, o controle externo faz seu juízo de valor a respeito do resultado da execução de certa política pública por uma entidade privada sem fins lucrativos, que, por sua vez, utilizou recursos públicos para tal fim. É por essa razão que o Tribunal de Contas, ao desempenhar o papel que lhe foi dado pela Constituição Federal, realizando suas atividades de fiscalização sobre a execução orçamentária e financeira de políticas públicas, é órgão importante na avaliação do resultado de tais políticas. A seguir construiremos alguns comentários sobre as ferramentas de avaliação de resultado que podem ser utilizadas pelo poder público para verificação da efetividade de uma política executada. 3.3. FERRAMENTAS DE AVALIAÇÃO – OS INDICADORES SOCIAIS Veremos, neste item do presente estudo, como os indicadores sociais se tornaram a ferramenta mais importante de avaliação de resultado utilizada pelo Estado na verificação da eficiência, eficácia e efetividade das políticas públicas por ele realizadas. 65 Passaremos por um breve histórico, seu conceito, suas fontes de formação, os tipos mais comuns existentes, e sua função como norteador das ações do Estado. Ao falar sobre os indicadores sociais no Brasil, o Professor Paulo de Martino Jannuzzi cita que apesar de algumas contribuições sobre o tema nos anos 20 e 30, o desenvolvimento da área é recente, tendo adquirido corpo científico em meados dos anos 60 no bojo das tentativas de organização de sistemas mais abrangentes de acompanhamento das transformações sociais e aferição do impacto das políticas sociais nas sociedades desenvolvidas e subdesenvolvidas.38 Nessa época havia uma distância considerável entre crescimento econômico e desenvolvimento econômico nos países subdesenvolvidos, hoje chamados de países em desenvolvimento, ou seja, a economia crescia e gerava riquezas, mas essa riqueza não era bem distribuída para a população. Com a economia próspera e geração de riquezas, mas com índices e dados de miséria, analfabetismo, mortalidade, dentre outros, em altos níveis, o poder público estava impotente em relação a uma solução, pois não tinha a exata medida do problema. Por essa razão, o Estado buscou o desenvolvimento de instrumentos que o permitissem conhecer melhor e mais profundamente os fatos, constatações e realidades que originavam os problemas sociais então existentes. Jannuzzi cita que nesse momento “empreendeu-se um imenso esforço conceitual e metodológico para desenvolvimento de instrumentos de mensuração do bem estar e da mudança social, sob os auspícios das instituições multilaterais como OCDE, UNESCO, FAO, OIT, OMS, UNICEF e Divisão de Estatísticas das Nações Unidas.”39 38 39 Jannuzzi, Paulo de Martino. Indicadores Sociais No Brasil. 4ª Ed. Campinas: Alínea, 2009, p. 13. Ibid, p. 14. 66 Adiciona Jannuzzi que “os sistemas nacionais de produção e disseminação de estatísticas públicas passaram a incorporar novas dimensões investigativas e produzir relatórios sociais de forma sistemática”, e que anos depois, já na década de 80, as Universidades, sindicatos, centros de pesquisa e as agências vinculadas ao Sistema de Planejamento Público (...) passaram a desenvolver esforços para aprimoramento conceitual e metodológico de instrumentos mais específicos de quantificação e qualificação das condições de vida, da pobreza estrutural e outras dimensões da realidade social, criando-se “um rico e diversificado acervo de indicadores sociais que muito têm contribuído para desvelar as iniqüidades históricas.”40 Vamos, então, tratar do conceito de indicador social e suas peculiaridades. 3.3.1. CONCEITO DE INDICADOR SOCIAL E SUAS FONTES Os indicadores sociais são dados e informações concretas, agrupadas e organizadas de forma que sirvam de fonte para uma percepção objetiva sobre uma realidade abstrata, são instrumentos de leitura da realidade social, capazes de dar uma dimensão mais precisa de uma situação real para aquele que dela não conhece ou não a vivenciou. Para Jannuzzi, o indicador social “é uma medida em geral quantitativa dotada de significado social substantivo, usado para substituir, quantificar ou operacionalizar um conceito social abstrato, de interesse teórico (para pesquisa acadêmica) ou programático (para formulação de políticas), (...) que informa algo sobre um aspecto da realidade social ou sobre mudanças na mesma.”41 Para a pesquisa acadêmica, complementa, é a “ligação entre os modelos explicativos da Teoria Social e a evidência empírica dos fenômenos sociais observados”. Para o interesse programático, “é um instrumento operacional para monitoramento da realidade social, para fins de formulação e reformulação de políticas públicas.”42 40 Jannuzzi, Paulo de Martino. Indicadores Sociais No Brasil. 4ª Ed. Campinas: Alínea, 2009, p. 14 e 15. Ibid, p. 15. 42 Ibid, p. 15. 41 67 A complexidade conceitual do indicador social é diretamente proporcional à complexidade de sua constituição. Não se trata de uma simples compilação de dados e informações sobre fatos sociais apresentadas ao conhecimento dos interessados. E é justamente esse aspecto que diferencia os indicadores sociais de suas fontes, os bancos de dados e as estatísticas públicas, qual seja, a complexidade daquele e a simplicidade desse. Jannuzzi explora bem esse aspecto ao precisar que levantadas nos Censos Demográficos, pesquisas amostrais ou coletadas nos registros administrativos de Ministérios, Secretarias de Estado e Prefeituras as estatísticas públicas correspondem ao dado social na sua forma bruta, não inteiramente contextualizado em uma Teoria Social ou uma Finalidade Programática.43 E diz mais, que “estão ainda em um estágio preliminar (bruto ou intermediário) para utilização efetiva, mas são úteis para construção de indicadores que permitam uma apreciação mais contextualizada e comparativa (no tempo e espaço) da realidade social.”44 Conclui com exatidão o Professor Jannuzzi ao afirmar que as estatísticas públicas “constituem-se, pois, na matéria-prima para a construção de indicadores sociais”, e o que diferencia um do outro “é o conteúdo informacional presente, isto é, o “valor contextual” da informação disponível nesse último.”45 Vamos, então, falar dos tipos de indicadores sociais. 3.3.2. OS PRINCIPAIS TIPOS DE INDICADORES SOCIAIS 43 Jannuzzi, Paulo de Martino. Indicadores Sociais No Brasil. 4ª Ed. Campinas: Alínea, 2009, p. 16. Ibid, p. 16. 45 Ibid, p. 16. 44 68 Os indicadores sociais são divididos ou classificados de diversas maneiras, mas a mais comum e que servirá como ilustração de alguns exemplos com a finalidade de contribuir para o objeto do presente estudo é a classificação de acordo com a área temática da realidade social à qual se referem. Jannuzzi utiliza a classificação temática para dividir os indicadores sociais nos seguintes assuntos: demografia, saúde, educação, mercado de trabalho, renda e pobreza, habitação, infraestrutura urbana, qualidade de vida, meio ambiente, segurança e justiça. 46 Em sua obra intitulada “Indicadores Sociais no Brasil”, ele ainda trata dos indicadores político-sociais, de opinião pública e de desenvolvimento e pobreza humanos. Como exemplos de indicadores demográficos e de saúde, dentre outros, Jannuzzi cita a taxa de natalidade, a taxa de crescimento demográfico, a taxa de urbanização, a taxa de mortalidade infantil, a esperança de vida ao nascer, de morbidade e atendimento à saúde e de desnutrição.47 Para ilustrar os indicadores educacionais e culturais, Paulo de Martino Jannuzzi menciona a taxa de analfabetismo, a escolaridade média, a taxa de atendimento escolar, de acesso à informação e cultura e indicadores de ciência e tecnologia, e para os indicadores de mercado de trabalho, a taxa de participação, a taxa de desemprego aberto e oculto e rendimento médio do trabalho.48 Dentre os indicadores de renda e pobreza, Jannuzzi elenca a renda ou PIB per capita, a renda familiar média, o indicador de pobreza como insuficiência de renda e os índices de custo de vida, e dentre os indicadores habitacionais e de infraestrutura urbana, ele cita a proporção de domicílios adequados, a taxa de cobertura dos serviços urbanos e os indicadores de infraestrutura de transporte.49 46 Jannuzzi, Paulo de Martino. Indicadores Sociais No Brasil. 4ª Ed. Campinas: Alínea, 2009, p. 20 (quadro). Ibid, p. 66 a 80. 48 Ibid, p. 81 a 94. 49 Ibid, p. 94 a 111. 47 69 Apresentando mais exemplos de indicadores sociais, Jannuzzi ainda lista como indicadores de qualidade de vida e meio ambiente os indicadores subjetivos de qualidade de vida, os de criminalidade e homicídios e os indicadores ambientais, como hectare de área verde por habitante e taxa de desmatamento anual de áreas de proteção ambiental. Como indicadores político-sociais cita os indicadores de acesso a direitos e a taxa de sindicalização e associativismo, e como indicadores de desenvolvimento e pobreza humanos, o IDH – Índice de Desenvolvimento Humano e o IPH – Índice de Pobreza Humana.50 Destacamos, também, outra classificação importante para o presente estudo, abordada por Jannuzzi, que tipifica os indicadores “quanto à natureza do ente indicado, se recurso (indicador-insumo), realidade empírica (indicador-produto) ou processo (indicador- processo).”51 Os indicadores-insumo estão relacionados às medidas da “disponibilidade de recursos humanos, financeiros ou equipamentos alocados para um processo ou programa”, os indicadores-produto são aqueles “vinculados às dimensões empíricas da realidade social (...), são medidas representativas das condições de vida, saúde, nível de renda da população, indicativas da presença, ausência, avanços ou retrocessos das políticas sociais.”52 Comparando os dois tipos de indicadores, Jannuzzi afirma que “enquanto os indicadores-insumo quantificam os recursos disponibilizados nas diversas políticas sociais, os indicadores-produto retratam os resultados efetivos dessas políticas.”53 Por sua vez, os indicadores-processo ou fluxo “são indicadores intermediários, que traduzem em medidas quantitativas o esforço operacional de alocação de recursos humanos, 50 Jannuzzi, Paulo de Martino. Indicadores Sociais No Brasil. 4ª Ed. Campinas: Alínea, 2009, p. 112 a 126. Ibid, p. 23. 52 Ibid, p. 23. 53 Ibid, p. 23. 51 70 físicos ou financeiros (indicadores-insumo) para obtenção de melhorias efetivas de bem-estar (indicadores-produto).”54 Por fim, outra classificação usual que nos interessa para o desenvolvimento deste estudo, também citada por Jannuzzi em sua obra, é aquela que diferencia os indicadores segundo os três aspectos relevantes da avaliação dos programas sociais: indicadores para avaliação da eficiência dos meios e recursos empregados, indicadores para avaliação da eficácia no cumprimento das metas e indicadores para avaliação da efetividade social do programa, isto é, indicadores para avaliação dos efeitos do programa (...) em termos mais abrangentes de bem estar para a sociedade.55 A classificação comentada vai ao encontro do que dissemos no item 3.1. do presente estudo, quando afirmamos que os conceitos de eficiência, eficácia e efetividade na gestão de políticas públicas são a base para qualquer índice de avaliação de uma política pública. A elaboração de indicadores para a avaliação da eficiência, eficácia e efetividade de uma determinada política pública resulta na criação de uma ferramenta completa para a avaliação de todas as etapas dessa política, desde o seu desenvolvimento e execução otimizados (eficiência), sua entrega ou conclusão com qualidade (eficácia), até a satisfação e impacto positivo para o cliente cidadão (efetividade). Percebe-se como os indicadores sociais são importantes para a gestão de políticas públicas. A seguir trataremos dessa importância com maior detalhamento. 3.3.3. OS INDICADORES COMO NORTEADORES DAS AÇÕES DO ESTADO Através dos exemplos de indicadores sociais acima mencionados, é possível perceber a dimensão e a complexidade das informações que retratam a realidade social em um determinado tempo e espaço. 54 55 Jannuzzi, Paulo de Martino. Indicadores Sociais No Brasil. 4ª Ed. Campinas: Alínea, 2009, p. 23. Ibid, p. 24. 71 Esse retrato da realidade social é o objetivo final de um indicador social, que, isoladamente ou em conjunto com outros, ampliam ou aprofundam o nível de conteúdo informacional relacionado a uma determinada temática social. Nesse momento voltamos para a origem dos indicadores sociais, para lembrar qual foi a necessidade existente à época e que motivou o desenvolvimento dessas ferramentas, qual seja, conhecer o problema, para enfrentá-lo e resolvê-lo. Quando as nações em desenvolvimento não conseguiam sanar o problema da existência simultânea de crescimento econômico e pobreza a partir da década de 60, por não terem a medida exata das causas correspondentes, surgiu a necessidade da criação de instrumentos capazes de fornecer as informações suficientes para se conhecer essas causas. O desenvolvimento dos bancos de dados e da produção e armazenamento das estatísticas públicas fez surgir os indicadores sociais, que carregam informações de forma contextualizada a respeito da realidade e dos problemas sociais. O que acima chamamos de conteúdo informacional foi, é, e continuará sendo importante fonte para o poder público ter o conhecimento mais detalhado possível sobre a realidade dos problemas sociais. Lembramos do que falou Jannuzzi a respeito do interesse programático sobre o conteúdo informacional dos indicadores sociais, afirmando ser esse “um instrumento operacional para monitoramento da realidade social, para fins de formulação e reformulação de políticas públicas.”56 Ou seja, os indicadores sociais são ferramentas importantes de gestão para a administração pública, pois fornecem informações fundamentais para o conhecimento das necessidades sociais e para a tomada de decisões, direcionando o foco das políticas públicas. 56 Jannuzzi, Paulo de Martino. Indicadores Sociais No Brasil. 4ª Ed. Campinas: Alínea, 2009, p. 15. 72 Nesse sentido, Jannuzzi diz que “os indicadores sociais se prestam a subsidiar as atividades de planejamento público e formulação de políticas sociais nas diferentes esferas do governo”, e completa esclarecendo que permitem “o monitoramento das condições de vida e bem estar da população por parte do poder público e sociedade civil e permitem aprofundamento da investigação acadêmica sobre a mudança social e sobre os determinantes dos diferentes fenômenos sociais.”57 É isso que fazem os indicadores sociais, auxiliando o Estado na formulação, execução, avaliação, manutenção, reestruturação ou extinção de políticas públicas voltadas ao que já mencionamos nesse estudo, ao bem estar da sociedade. Para ilustrar os tipos de indicadores que podem ser utilizados no processo de formulação de políticas públicas o Professor Jannuzzi elaborou um “quadro teórico-conceitual de referência”58, com 4 etapas de formulação e os indicadores a eles correspondentes, que são: (i) Diagnóstico da realidade: indicadores-produto sobre diferentes aspectos sociais; (ii) Formulação de soluções: indicadores-insumo referentes a recursos a empregar; (iii) Implementação de programa: indicadores-processo referentes ao uso dos recursos alocados; e (iv) Avaliação de programa: indicadores de eficiência, eficácia e efetividade social. Podemos ver que os indicadores sociais são instrumentos valiosos de avaliação para a gestão de políticas públicas, que podem ser usados na avaliação de todas as etapas da celebração de um acordo de transferência de recursos públicos a entidades do Terceiro Setor, desde a escolha da entidade, a execução do acordo, o cumprimento do objeto, até a avaliação do resultado alcançado. Feita a avaliação, o poder público terá as informações necessárias para tomar a decisão mais correta possível, podendo ampliar o alcance da política, destinando mais recursos, ou reduzi-lo, e até descontinuar a política, cessando os repasses e os ajustes. 57 58 Jannuzzi, Paulo de Martino. Indicadores Sociais No Brasil. 4ª Ed. Campinas: Alínea, 2009, p. 15. Ibid, p. 34. 73 Feita a abordagem das ferramentas de avaliação, a seguir vamos analisar algumas ferramentas disponíveis para o controle dos acordos celebrados entre o poder público e as entidades privadas sem fins lucrativos. 3.4. FERRAMENTAS DE CONTROLE 3.4.1. A CONTABILIDADE COMO INSTRUMENTO DE CONTROLE Dissemos anteriormente, quando tratamos da contabilidade aplicada às entidades do Terceiro Setor no item 2.2.2. do presente estudo, que estas estão sujeitas aos Princípios e às normas contábeis, assim como as empresas que visam lucro, nos termos do item 10.19.1.6 da Norma Brasileira de Contabilidade – NBC T 10.19. Interessante lembrar, também, do que discorremos no item 2.2.1, quando falamos que o papel da contabilidade é registrar, organizar e revelar os números da entidade da forma mais didática possível, para o bom entendimento dos diversos usuários da informação. Considerando ser esse o objetivo imediato da contabilidade, o respeito e a boa aplicação dos Princípios e normas da contabilidade resultam em demonstrações contábeis que espelham com exatidão a realidade financeira, patrimonial e orçamentária da entidade, ou seja, resultam em transparência das contas e das atividades por ela executadas. Vamos relembrar, ainda, a afirmação de Paulo Olak e Diogo Nascimento de que hoje, é condição sine qua non que todas as entidades, com ou sem fins lucrativos, públicas ou privadas, pequenas ou grandes, tenham Contabilidade. São dois os motivos básicos: transparência, relativa à prestação de contas, ao Estado e outros usuários externos, e suporte técnico para gerenciamento da organização (usuários internos).59 59 Olak, Paulo Arnaldo; Nascimento, Diogo Toledo do. Contabilidade para Entidades sem Fins Lucrativos (Terceiro Setor). 3ª Ed., São Paulo, Atlas, 2010, p. 40. 74 Na medida em que o Estado e os outros usuários externos, diga-se a sociedade em último grau, precisam e devem ter conhecimento de como são gastos os recursos públicos repassados às entidades privadas sem fins lucrativos, a transparência na prestação de contas dada pela contabilidade cria condições ideais para a efetivação do controle do Estado e do controle social. Nesse sentido é correto afirmar que a contabilidade traz transparência às contas da entidade, que por sua vez permite um controle mais efetivo do poder público cedente do recurso e da sociedade civil. Prova disso é o requisito trazido pelo artigo 14 do Código Tributário Nacional para o gozo da imunidade tributária referente aos impostos contida no artigo 150, inciso VI, letra “c”, da Constituição Federal e no artigo 9º, inciso IV, letra “c”, do próprio CTN, segundo o qual a entidade deve manter “escrituração de suas receitas e despesas em livros revestidos de formalidades capazes de assegurar sua exatidão.” A Lei Orçamentária Anual Federal de 2012 também determina, em seu artigo 34, inciso X, que as transferências para entidades sem fins lucrativos dependerão de manutenção de escrituração contábil regular. Por sua vez, a Lei nº 9.790/99, artigo 4º, inciso VII, letra “a”, dispõe que a entidade que pretenda a qualificação como Organização da Sociedade Civil de Interesse Público – OSCIP deverá incluir em seu estatuto normas de prestação de contas que determinem a “observância dos princípios fundamentais de contabilidade e das Normas Brasileiras de Contabilidade.” Vê-se que não é recente a preocupação do legislador com a manutenção de registros contábeis visando dar transparência às contas e atividades das entidades privadas sem finalidade de lucros que recebem recursos públicos. O objetivo é melhorar as condições de controle das contas dessas entidades. 75 A seguir veremos porque a publicidade também é instrumento de controle, que assim como a contabilidade, traz transparência às atividades das entidades do Terceiro Setor. 3.4.2. A PUBLICIDADE E A TRANSPARÊNCIA Assim como a legalidade, a impessoalidade, a moralidade e a eficiência, a publicidade é princípio constitucional que rege a administração pública direta e indireta de qualquer um dos Poderes da União, Estados, Distrito Federal e Municípios, nos termos do artigo 37, caput, da Constituição Federal de 1988. A publicidade é um princípio que legitima os atos da administração pública, na medida em que os torna de conhecimento público, de toda a sociedade, para fins de validação, e, também, de contestação daqueles interessados em fazê-lo. O principal dispositivo legal sobre a publicidade das contas dos entes públicos no Brasil é a Lei Complementar Federal nº 101/00, a Lei de Responsabilidade Fiscal, que traz um capítulo exclusivo sobre transparência, controle e fiscalização. O artigo 48 da Lei trata dos instrumentos de transparência da gestão fiscal do ente, e diz que são eles o Plano Plurianual, a Lei de Diretrizes Orçamentárias, a Lei Orçamentária Anual, as prestações de contas e o respectivo parecer prévio do Tribunal de Contas, o Relatório Resumido da Execução Orçamentária e o Relatório de Gestão Fiscal, determinando que a eles “será dada ampla divulgação, inclusive em meios eletrônicos de acesso público.” A transparência será garantida, também, nos termos do parágrafo único, incisos I e II, do mesmo artigo 48, com o incentivo à participação da sociedade e a realização de audiências públicas para discussão do PPA, da LDO e LOA, bem como a divulgação, em meios eletrônicos de acesso público e em tempo real, de informações detalhadas sobre a execução orçamentária e financeira (execução das receitas e despesas do ente). 76 Além disso, o artigo 49 da Lei de Responsabilidade Fiscal determina que as contas do “Chefe do Poder Executivo ficarão disponíveis, durante todo o exercício, no respectivo Poder Legislativo e no órgão técnico responsável pela sua elaboração, para consulta e apreciação pelos cidadãos e instituições da sociedade.” A publicação de demonstrativos e peças contábeis dos entes públicos também é tratada nos artigos 52, 55, §2º, e 63, inciso II, da mesma Lei, que determinam a publicação do relatório resumido da execução orçamentária e do relatório de gestão fiscal. A publicidade, bem como a legalidade, a impessoalidade, a moralidade e a eficiência, também deverão ser observadas na elaboração do contrato de gestão e deverão estar contidas expressamente nos estatutos das OSCIP‟s, conforme determinam, respectivamente, o artigo 7º da Lei nº 9.637/98 e o artigo 4º, inciso I, da Lei nº 9.790/99. Especificamente em relação à publicidade das atividades e das contas das entidades sem fins lucrativos, importante citarmos a previsão do artigo 2º, letras “d” e “f”, da Lei nº 9.637/98, de que membros da comunidade devem participar do órgão colegiado de deliberação superior da Organização Social, e de que os relatórios financeiros e o relatório de execução do contrato de gestão devem ser publicados anualmente no Diário Oficial da União. Por sua vez, a Lei nº 9.790/99, que trata da qualificação de entidades como Organizações da Sociedade Civil de Interesse Público, dispõe no artigo 4º, inciso VII, letra “b”, que o estatuto da entidade deve conter normas de prestação de contas que determinem, entre outras regras, a publicidade do relatório de atividades e das demonstrações financeiras, ao final de cada exercício fiscal. Ainda tratando de regras de publicidade para as OSCIP‟s, o artigo 10, parágrafo 2º, inciso VI, da citada Lei determina que devem ser publicados na imprensa oficial o extrato do Termo de Parceria e o demonstrativo da sua execução física e financeira. 77 Ressaltamos, ainda, o Decreto Federal nº 6.170/07, que trata das normas relativas às transferências de recursos da União mediante convênios, que em seu artigo 13 dispõe sobre o registro dos acordos no SICONV – Sistema de Gestão de Convênios e Contratos de Repasse: a celebração, a liberação de recursos, o acompanhamento da execução e a prestação de contas de convênios, contratos de repasse e termos de parceria serão registrados no SICONV, que será aberto ao público, via rede mundial de computadores – Internet, por meio de página específica denominada Portal dos Convênios. A presença da publicidade das contas e atividades dos entes públicos e das entidades privadas sem fins lucrativos na Constituição federal, como princípio, e na legislação ordinária, reflete a relevância do tema para a sociedade. Como dissemos anteriormente, a recente melhora da condição de vida de uma significante parcela da sociedade brasileira é causa de uma crescente inclusão social e política da população, que, com a acessibilidade às informações proporcionada pela internet, aumentou significativamente o número de pessoas interessadas na qualidade do gasto dos recursos públicos. A publicidade de informações relativas ao setor público é, pois, uma necessidade da sociedade, necessidade por transparência e controle, e não simplesmente uma imposição legal. 4. PANORAMA FÁTICO Neste capítulo vamos apresentar dados quantitativos a respeito dos repasses de recursos realizados pelo Governo do Estado e pelos Municípios a entidades sem fins lucrativos no âmbito do Estado de São Paulo, bem como em relação à apreciação dos respectivos processos de regularidade dos ajustes e de prestação de contas pelo Tribunal de Contas do Estado de São Paulo. O objetivo é demonstrar a dimensão do tema no Estado mais desenvolvido e no que mais arrecada na Federação, refletindo a crescente relevância que o Terceiro Setor vem 78 adquirindo, bem como a importância de se manter o assunto na pauta das discussões acadêmicas e da agenda pública e social. 4.1. PANORAMA DOS REPASSES REALIZADOS NOS EXERCÍCIOS DE 2008 A 2010 NO ÂMBITO DA JURISDIÇÃO DO TCE/SP 4.1.1. OS REPASSES REALIZADOS PELO ESTADO DE SÃO PAULO No sítio do Tribunal de Contas do Estado de São Paulo na internet, no endereço www.tce.sp.gov.br, podem ser encontrados dados interessantes sobre o volume de repasses efetuados pelo Governo do Estado de São Paulo a entidades privadas sem fins lucrativos. No site, seguindo o caminho “Cidadão” e depois “Primeiro e Terceiro Setores”, estão disponibilizadas informações de repasses realizados ao Primeiro e Terceiro Setores dos exercícios de 2007 a 2010, através de planilhas com dados como o órgão ou entidade beneficiária, o Município ao qual se referem e o valor recebido, porém apenas para o exercício de 2008 são apresentados dados totalizados por tipo de repasse e um total geral, e, ainda assim, sem segregação entre Primeiro e Terceiro Setor. Por essa razão, e considerando que este item 4. é apenas exemplificativo em relação à pretensão final do presente estudo, vamos apresentar somente os dados referentes aos repasses efetuados pelo Governo Estadual no exercício de 2008. De acordo com a fonte acima citada, em 2008 o Governo do Estado de São Paulo transferiu para órgãos públicos e entidades privadas sem fins lucrativos à título de subvenções sociais, auxílios e contribuições os seguintes valores: Quadro 1 – Repasses do Estado em 2008 para o 1º e 3º Setores por tipo de acordo. Tipo de Repasse Subvenções Sociais Auxílios Valor (em milhares de R$) 1.182.025 136.743 79 Contribuições TOTAL 6.247 1.325.015 Fonte dos dados: sítio do TCE/SP na internet. No mesmo exercício o Governo Estadual registrou a receita arrecadada total de R$ 109.626.162 mil60, sendo que, dessa forma, o total de repasses à título de subvenções sociais, auxílios e contribuições a entidades do Primeiro e Terceiro Setores no mesmo ano representou 1,2% da receita arrecadada total. Se compararmos esse dado com a Receita Corrente Líquida – RCL apurada pelo Poder Executivo Paulista no mesmo exercício, no total de R$ 81.680.712 mil61, a representatividade das transferências (de R$ 1.325.015 mil) sobe para 1,6%. Convém esclarecer que a Receita Corrente Líquida, de acordo com o artigo 2º, inciso IV, da Lei de Responsabilidade Fiscal (Lei Complementar Federal nº 101/00), é a soma “das receitas tributárias, de contribuições, patrimoniais, industriais, agropecuárias, de serviços, transferências correntes e outras receitas também correntes”, descontados, nos Estados, os valores transferidos aos Municípios por determinação constitucional, e nos Estados e nos Municípios, a contribuição dos servidores para o custeio do regime próprio de previdência e assistência social e as receitas provenientes da compensação financeira do INSS. Apesar da baixa representatividade numérica em face das receitas (1,2% e 1,6%), sob o aspecto material, o valor total de transferências realizadas pelo Estado em 2008, de R$ 1.325.015 mil, ganha relevância quando comparado a outros dados da execução orçamentária e financeira. O número é próximo, por exemplo, ao valor da despesa com a amortização da dívida do Governo do Estado de São Paulo no mesmo exercício de 2008, no montante total de R$ 1.358 60 Informação extraída da “Divulgação dos Resultados das Finanças Públicas do Estado de São Paulo e seus Municípios”, publicada pelo Tribunal de Contas do Estado de São Paulo no Diário Oficial do Estado do dia 30/11/2011, no caderno “Poder Legislativo”, p. 1 a 6. 61 Ibid. 80 mil. No mesmo exercício de 2008 todos os Municípios do Estado, exceto a Capital, obtiveram a receita total de R$ 1.308 mil referente ao recebimento de valores da dívida ativa62. Apresentaremos no tópico seguinte os dados referentes aos repasses feitos pelos Municípios paulistas. 4.1.2. OS REPASSES REALIZADOS PELOS MUNICÍPIOS DO ESTADO Também no site do Tribunal de Contas do Estado de São Paulo encontramos, no mesmo caminho “Cidadão” e depois “Primeiro e Terceiro Setores”, as informações referentes aos repasses para entidades sem fins lucrativos realizados pelos órgãos municipais nos anos de 2007 a 2010. Neste tópico apresentaremos aqueles relativos aos anos de 2008 a 2010. 4.1.2.1. OS REPASSES POR TIPO DE RELAÇÃO CONTRATUAL Para o exercício de 2008 foram disponibilizadas pelo TCE/SP em seu site duas planilhas com dados sobre as transferências de recursos públicos, uma à título de auxílios, subvenções e contribuições, e a outra à título de contratos de gestão, convênios e termos de parceria. Além dos demais dados, em relação aos valores a primeira planilha informa apenas o total geral repassado no exercício, e somente a segunda apresenta o total por tipo de acordo. São esses os números: Quadro 2 – Repasses dos Municípios em 2008 por tipo de acordo. Tipo de Repasse Auxílios, subvenções e contribuições Convênios Termos de parceria Contratos de gestão TOTAL Valor (em milhares de R$) 827.695 918.981 171.112 243.224 2.161.014 Fonte dos dados: sítio do TCE/SP na internet. 62 Informação extraída da “Divulgação dos Resultados das Finanças Públicas do Estado de São Paulo e seus Municípios”, publicada pelo Tribunal de Contas do Estado de São Paulo no Diário Oficial do Estado do dia 30/11/2011, no caderno “Poder Legislativo”, p. 1 a 6. 81 Em relação aos anos de 2009 e 2010, no sítio do TCE/SP na internet é possível consultar as planilhas em duas versões, uma para leitura no Microsoft Excel e outra para visualização no Adobe Acrobat, sendo duas planilhas para cada um dos exercícios que, assim como as de 2008, trazem informações dos auxílios, subvenções e contribuições, e a outra dos contratos de gestão, convênios e termos de parceria, mas no caso de 2009 e 2010 há uma soma total dos repasses para cada um desses tipos de acordo. Vejam os números nos dois quadros a seguir: Quadro 3 – Repasses dos Municípios em 2009 por tipo de acordo. Tipo de Repasse Auxílios Subvenções Contribuições Convênios Termos de parceria Contratos de gestão TOTAL Valor (em milhares de R$) 8.622 726.364 41.313 886.041 109.172 389.773 2.161.284 Fonte dos dados: sítio do TCE/SP na internet. Quadro 4 – Repasses dos Municípios em 2010 por tipo de acordo. Tipo de Repasse Auxílios Subvenções Contribuições Convênios Termos de parceria Contratos de gestão TOTAL Valor (em milhares de R$) 12.200 787.152 36.262 1.226.093 168.488 643.673 2.873.867 Fonte dos dados: sítio do TCE/SP na internet. Em uma análise de comparação dos quadros e de seus valores percebe-se, em relação ao total geral de cada exercício, que não houve mudança no volume de repasses de 2008 para 2009, porém de 2009 para 2010 foi registrado um aumento de 33% aproximadamente, tendo havido um aumento individual de todas as modalidades de ajuste. 82 A estagnação verificada nas transferências de recursos para entidades privadas sem fins lucrativos no ano de 2009 pode ser explicada pela ocorrência da crise financeira mundial na segunda metade do ano de 2008, que provocou recessão econômica em vários países e freou a economia, os investimentos e o crescimento do mercado interno nos países em desenvolvimento, dentre eles o Brasil. Vejamos alguns dados extraídos da “Divulgação dos Resultados das Finanças Públicas do Estado de São Paulo e seus Municípios”, publicada pelo TCE/SP no Diário Oficial do Estado de 30/11/2011, que mostram a consequência da crise financeira para os Municípios no ano de 2009: Quadro 5 – Dados das Finanças Públicas dos Municípios em 2008 e 2009 (valores em milhares de R$). Descrição Receita Arrecadada Resultado da Execução Orçamentária Dívida Total (Flutuante + Fundada) 2008 50.023.297 2.588.165 18.138.994 2009 Variação 47.433.022 -5,18% -4.383.413 -269,36% 45.195.829 149,16% Fonte dos dados: “Divulgação dos Resultados das Finanças Públicas do Estado de São Paulo e seus Municípios”, publicada pelo TCE/SP no Diário Oficial do Estado de 30/11/2011. Além da evolução negativa dos resultados financeiros dos Municípios de 2008 para 2009, demonstrada no quadro acima, a mesma fonte informa a variação da Despesa Realizada em relação ao ano anterior, conforme quadro a seguir: Quadro 6 – Evolução da Despesa Realizada dos Municípios de 2007 a 2010. Exercício 2006 2007 2008 2009 2010 Valores (em milhares de R$) 33.390.084 39.598.212 47.435.132 51.816.435 61.971.802 Variação 18,59% 19,79% 9,24% 19,60% Fonte dos dados: “Divulgação dos Resultados das Finanças Públicas do Estado de São Paulo e seus Municípios”, publicada pelo TCE/SP no Diário Oficial do Estado de 30/11/2011. 83 Os dados dos Quadros 5 e 6 demonstram o impacto da crise financeira de 2008 para as finanças dos Municípios em 2009, com a diminuição na Receita Arrecadada, na Despesa Realizada, no Resultado da Execução Orçamentária e aumento da Dívida Total, e podem explicar a ausência de crescimento de repasses públicos ao Terceiro Setor no ano de 2009. Analisando individualmente cada um dos tipos de ajuste, o reflexo é o mesmo no período de 2008 para 2009, com exceção dos Contratos de Gestão dos quais falaremos mais à frente. Os Auxílios, Subvenções e Contribuições mantiveram um volume de recursos equivalente no decorrer dos 3 anos, com destaque apenas para os Auxílios, nos quais houve um aumento de 41% de 2009 para 2010. Em relação aos Convênios ocorreu mudança sem relevância de 2008 para 2009, mas de 2009 para 2010 houve um aumento significativo de 38%, diferentemente dos Termos de Parceria, para os quais houve um certo equilíbrio ao longo dos 3 anos, apesar da queda em 2009, já que em 2010 o aumento fez o volume voltar ao patamar de 2008. Em termos de formalização, operacionalização e fiscalização, quando comparados aos Termos de Parceria e aos Contratos de Gestão, os Convênios possuem um regramento mais simplificado, razão pela qual são a forma de ajuste mais utilizada, justificando, assim, o aumento verificado em 2010. Por fim, quanto aos Contratos de Gestão, destacamos o crescimento gradativo durante os 3 períodos, com aumentos substanciais de 60% de 2008 para 2009 e de 65% de 2009 para 2010. O aumento do uso do instrumento do Contrato de Gestão para formalização de ajustes com entidades qualificadas como Organizações Sociais pode ser explicado pelo movimento chamado por alguns estudiosos de terceirização dos serviços públicos de saúde, que vem 84 ocorrendo com maior frequência nos últimos anos através da transferência da administração de hospitais públicos para essas entidades. A avaliação que podemos fazer dos dados acima apresentados e da análise sobre eles realizada é aquela da qual já falamos, que é a relevância cada vez maior do tema do Terceiro Setor para a sociedade e para o Estado, e que as discussões sobre ele devem ser permanentes, principalmente as relacionadas ao controle, seja ele o externo, através do TCE/SP, ou o social, bem como as relacionadas à avaliação da efetividade, ou seja, do impacto da ação realizada pela entidade para o cidadão e para a sociedade. 4.1.2.2. OS REPASSES EM RELAÇÃO À RECEITA ARRECADADA E À RECEITA CORRENTE LÍQUIDA Faremos agora um confronto dos dados referentes aos repasses de recursos públicos efetuados pelos Municípios às entidades do Terceiro Setor nos anos de 2008 a 2010 com aqueles referentes à receita arrecadada e à receita corrente líquida de cada um desses exercícios. Vejamos: Quadro 7 – Repasses confrontados com a Receita Arrecadada de 2008 a 2010. Exercício 2008 2009 2010 Repasses (em milhares de R$) 2.161.014 2.161.284 2.873.867 Receita Arrecadada 50.023.297 47.433.022 66.784.854 Proporção 4,32% 4,56% 4,30% Fonte dos dados: sítio do TCE/SP na internet e “Divulgação dos Resultados das Finanças Públicas do Estado de São Paulo e seus Municípios”, publicada pelo TCE/SP no Diário Oficial do Estado de 30/11/2011. Quadro 8 – Repasses confrontados com a Receita Corrente Líquida de 2008 a 2010. Exercício 2008 2009 2010 Repasses (em milhares de R$) 2.161.014 2.161.284 2.873.867 R.C.L. 48.132.629 50.229.369 58.092.639 Proporção 4,49% 4,30% 4,95% Fonte dos dados: sítio do TCE/SP na internet e “Divulgação dos Resultados das Finanças Públicas do Estado de São Paulo e seus Municípios”, publicada pelo TCE/SP no Diário Oficial do Estado de 30/11/2011. 85 Percebe-se a relevância dos números do Terceiro Setor no caso dos repasses realizados pelos Municípios dada a proporção dos recursos transferidos às entidades privadas sem fins lucrativos em relação às receitas municipais. Comparando os números relativos a essas proporções com os dados equivalentes referentes ao Governo do Estado de São Paulo (1,2% e 1,6%, da receita arrecadada e RCL, respectivamente), verificamos que tal relevância é significativamente maior para os Municípios, pois equivale a quase o triplo numericamente (1,6% contra 4,49% da RCL em 2008). A importância do tema para os Municípios e seus cidadãos em relação ao Governo do Estado é ainda maior não só pela proporção das transferências de recursos, como também pela capacidade, em geral, mais limitada de estrutura e de recursos que, de certa forma, podem oferecer dificuldades para os controles externo e social, e para a avaliação de resultados. A seguir apresentaremos alguns dados a respeito da fiscalização dos repasses públicos ao Terceiro Setor pelo Tribunal de Contas do Estado de São Paulo, para termos uma dimensão da atuação do controle externo. 4.2. A ATUAÇÃO DO TRIBUNAL DE CONTAS DO ESTADO DE SÃO PAULO 4.2.1. OS NÚMEROS DA FISCALIZAÇÃO Tratamos no item 4.1. acima dos números referentes ao volume de repasses de recursos públicos concedidos pelo Estado de São Paulo e seus Municípios a entidades privadas sem fins lucrativos, para estabelecermos um grau de relevância do assunto na atualidade. Neste item do presente estudo faremos uma apresentação dos números relativos à fiscalização dos repasses de recursos públicos, cujo objetivo é demonstrar a dimensão que o tema possui em termos de controle externo e fiscalização pelo TCE/SP. 86 Veremos adiante alguns dados sobre a quantidade de processos autuados dentro do Tribunal de Contas do Estado de São Paulo, bem como sobre o volume de julgamentos por ele realizados. 4.2.1.1. O VOLUME DE PROCESSOS AUTUADOS DOS EXERCÍCIOS DE 2008 A 2010 Dissemos anteriormente, no item 2.3.2.5. do presente estudo, que as formas em que os processos referentes ao Terceiro Setor serão registrados e cadastrados no Tribunal de Contas serão determinadas conforme as seguintes características: o valor do repasse e a regularidade ou não da prestação de contas. Quando o valor do repasse é igual ou superior a R$ 1.746.000,00 (valor atualizado para o exercício de 2012), o instrumento celebrado, juntamente com uma lista de documentos, deverá ser encaminhado ao Tribunal até o dia 15 do mês seguinte à celebração. Neste caso será autuado um processo individual para cada ajuste, que terá a finalidade de constatar a regularidade ou não do instrumento celebrado. Após 90 dias do encerramento do exercício em que o ajuste foi celebrado, deverá ser encaminhado anualmente ao Tribunal de Contas um conjunto de documentos referentes à prestação de contas dos repasses de valor igual ou superior a R$ 1.746.000,00, até que se esgote sua vigência. Para esses documentos será autuado um novo processo também individual, por ajuste, mas sua finalidade será a de verificar a regularidade ou não da prestação de contas. Quanto aos repasses de valor inferior ao limite de remessa ao Tribunal (R$ 1.746.000,00), não haverá necessidade de envio da documentação referente ao instrumento celebrado, mas deverão ser encaminhados aqueles relacionados à prestação de contas dos respectivos repasses efetuados. Também para esses casos, 90 dias após o encerramento do exercício em que os repasses foram efetuados o órgão público cedente deverá remeter ao TCE/SP um conjunto de 87 documentos referentes à prestação de contas dos repasses, porém a autuação dos processos será diferente. Para os repasses de valor inferior ao limite de remessa a autuação dos processos dependerá da regularidade ou irregularidade da respectiva prestação de contas, de acordo com a constatação feita pelo setor de fiscalização do Tribunal. No caso de regularidade, as prestações de contas de repasses feitos pelo mesmo órgão poderão ser autuadas conjuntamente em um único processo, mas no caso de irregularidade, a prestação de contas deverá ser autuada individualmente em um processo. Nos dois casos, de autuação individual ou em conjunto, o processo terá a finalidade de julgamento da regularidade ou não da prestação de contas. Feitas esses considerações a respeito das hipóteses de autuação dos processos, vamos apresentar os respectivos números, que foram extraídos do sítio do Tribunal de Contas do Estado de São Paulo na internet (www.tce.sp.gov.br), no caminho “Pesquisa de Processos”, onde foram preenchidos os campos “Exercício” (de 2008, 2009 e 2010) e “Matéria”, e obtidos os dados quantitativos, conforme quadro abaixo: Quadro 9 – Volume de processos autuados dos exercícios de 2008 a 2010 por matéria. Matéria Contrato de Gestão Termo de Parceria Convênio – repasses públicos ao 3º Setor Repasses P. ao 3º Setor – C.Gestão/T.Parceria/Convênios Repasses P. ao 3º Setor – Auxílios/Subvenções/Contribuições Prestação de Contas – Contrato de Gestão Prestação de Contas – Termo de Parceria Prestação de Contas – Convênio 3º Setor Total Fonte dos dados: sítio do TCE/SP na internet. 2008 2009 2010 39 36 42 15 33 13 106 117 93 1701 1689 947 10 18 748 78 99 136 33 39 30 235 232 201 2217 2263 2210 88 Ressaltamos que na pesquisa realizada no sítio do TCE/SP na internet, cujo resultado apresentamos no quadro acima, o exercício informado se refere à ocorrência da matéria, e não à autuação do processo. Por exemplo, um contrato de gestão celebrado em 2008, mas autuado em 2009 será considerado na pesquisa como de 2008. Considerando essa informação, ao realizarmos a pesquisa de processos preenchendo apenas o campo “Exercício”, foram obtidos os totais de processos cuja matéria se refere a cada um dos exercícios preenchidos, que no quadro a seguir são comparados com os totais do quadro anterior: Quadro 10 – Processos do Terceiro Setor em relação ao total de Processos. Exercício 2008 2009 2010 Processos do 3º Setor 2217 2263 2210 Total de Processos 20296 16616 15824 Proporção 10,92% 13,62% 13,97% Fonte dos dados: sítio do TCE/SP na internet. Pelo resultado da análise feita no quadro anterior verificamos como o Terceiro Setor também é assunto relevante para o Tribunal de Contas, que dedica parcela considerável de seus esforços no controle externo dos repasses de recursos públicos a entidades sem fins lucrativos. A seguir analisaremos qual foi o resultado desse esforço. 4.2.1.2. O VOLUME DE PROCESSOS JULGADOS NOS ANOS DE 2008 E 2009 E O RESPECTIVO RESULTADO Novamente a fonte de pesquisa para o levantamento das informações que serão apresentadas e analisadas no presente tópico foi o sítio do Tribunal de Contas do Estado de São Paulo na internet, no endereço www.tce.sp.gov.br. 89 No citado site, no caminho “Instituição” e depois “Resultado Anual de Julgados” encontramos duas planilhas em versão Adobe Acrobat que contêm dados e informações a respeito dos julgamentos realizados pelo TCE/SP nos exercícios de 2008 e 2009 somente. Nas duas planilhas são apresentados dados quantitativos dos processos julgados pelas Câmaras e Tribunal Pleno, órgãos colegiados da Corte de Contas paulista, bem como os julgados singularmente, com os respectivos resultados e as penalidades eventualmente aplicadas. Considerando a ausência de informações para o exercício de 2010, e que para os processos julgados pelos órgãos colegiados não há segregação por matéria, serão apresentados no quadro abaixo apenas os processos julgados singularmente nos exercícios de 2008 e 2009. Quadro 11 – Volume de processos julgados singularmente nos exercícios de 2008 e 2009 por matéria. Matéria 2008 652 3 894 1 1550 Auxílios/Subvenções Convênios com o 3º Setor Prestação de Contas – Termo de Parceria Repasses Públicos ao 3º Setor Termo de Parceria Total 2009 483 2 1082 1 1568 Fonte dos dados: sítio do TCE/SP na internet. Interessante também para o presente tópico compararmos os dados totais do quadro acima com o total de processos julgados singularmente nos anos de 2008 e 2009. Vejamos: Quadro 12 – Processos julgados singularmente do Terceiro Setor em relação ao total. Exercício 2008 2009 Processos do 3º Setor 1550 1568 Fonte dos dados: sítio do TCE/SP na internet. Total de Processos 8346 8540 Proporção 18,57% 18,36% 90 Percebe-se que a relevância do Terceiro Setor para o controle externo, realizado pelo Tribunal de Contas, se repete através do resultado trazido pelo quadro acima. E qual foi o resultado desse controle externo? Como se deram os julgamentos desses processos de prestação de contas de repasses a entidades sem fins lucrativos? Apresentamos no quadro seguinte alguns dados que respondem a tais indagações: Quadro 13 – O Resultado dos julgamentos singulares dos processos referentes ao Terceiro Setor em 2008 e 2009. Resultados dos Julgamentos Aplicação de multa Envio ao Ministério Público Devolução dos recursos repassados Recomendação Ressalva Regulares sem recomendação Total de Processos 2008 2009 Total 12 16 28 1 10 11 29 82 111 193 589 782 28 32 60 1287 839 2126 1550 1568 3118 Fonte dos dados: sítio do TCE/SP na internet. As falhas materiais e formais na celebração dos ajustes e nas prestações de contas dos repasses são as causas dos resultados de julgamento acima mencionados. Dentre as falhas graves mais comuns podemos citar a ausência de prestação de contas, que pode resultar na condenação da entidade à devolução dos valores repassados atualizados e à proibição do recebimento de novos repasses até sua regularização. Como falhas menos graves podemos mencionar, dentre as mais comuns, o descumprimento do prazo legal para a apresentação da prestação de contas e as irregularidades formais, que podem resultar apenas em recomendação para o cumprimento da legislação. Outro exemplo de falha menos grave é a ausência de manifestação do órgão concessor, ou seja, ausência do parecer conclusivo, que pode resultar em recomendação e aplicação de multa ao responsável pela concessão do repasse. 91 No capítulo que segue analisaremos alguns casos práticos de ajustes apreciados pelo controle externo do Tribunal de Contas. Nessa análise veremos exemplos das falhas eventualmente apontadas, as justificativas apresentadas na defesa e a decisão final da Corte. 5. ANÁLISE DE CASOS DE JULGAMENTO PELO TCE/SP Veremos no presente capítulo alguns exemplos de casos reais de julgamento, pelo TCE/SP, das prestações de contas e dos ajustes celebrados entre o poder público e entidades privadas sem fins lucrativos para o repasse de recursos visando a execução de atividades de interesse da sociedade. Analisaremos com maior detalhe a atuação da Corte de Contas paulista no exercício, que lhe compete, do controle externo sobre as transferências públicas a entidades do Terceiro Setor, desde a apuração dos fatos pelo setor de fiscalização, a manifestação do órgão concessor do repasse e da entidade beneficiária, a opinião das áreas de consultoria técnica do Tribunal, até o julgamento pelos órgãos singulares e colegiados da Casa. O objetivo desta etapa do estudo é demonstrar como em cada tipo de ajuste as falhas praticadas, tanto na execução do acordo quanto na prestação de contas, implicam em consequências reais para os responsáveis pela entidade e pelo órgão concessor, ressaltando o respeito aos direitos constitucionais do contraditório e da ampla defesa, assegurados aos interessados dentro do devido processo legal. 5.1. ANÁLISE DE CASOS JULGADOS REGULARES 5.1.1. CONTRATO DE GESTÃO JULGADO REGULAR O primeiro caso diz respeito aos repasses realizados por uma Prefeitura paulista a uma Organização Social no exercício de 2007, no valor total de R$ 1.330 mil aproximadamente, 92 através de contratos de gestão, para a implantação do Programa Saúde da Família – PSF e do Programa de Agentes Comunitários de Saúde – PACS, cujo processo administrativo foi autuado no TCE/SP sob o nº TC-1299/002/08. Após analisar a prestação de contas de aplicação dos recursos, o setor de fiscalização preparou relatório com os seguintes apontamentos: (i) ausência de declaração quanto à compatibilização e adequação das despesas aos artigos 15 e 16 da Lei de Responsabilidade Fiscal – LRF; (ii) não apresentação de estimativa trienal do impacto orçamentário-financeiro; (iii) ausência de publicação do contrato de gestão na imprensa oficial; (iv) fracionamento em 5 contratos de gestão para não atingir o limite de remessa ao Tribunal; (v) metas não foram satisfatoriamente cumpridas; e (vi) terceirização do PSF e da contratação de agentes comunitários de saúde, em desacordo com a Emenda Constitucional nº 51/06 e Lei 11.350/06. Por outro lado, a fiscalização do Tribunal atestou a regularidade das despesas realizadas e da prestação de contas da Organização social, não verificando qualquer desvio de finalidade na aplicação dos recursos. Dessa forma concluiu pela irregularidade da concessão dos repasses e pela regularidade da prestação de contas, sugerindo a quitação dos responsáveis. Os responsáveis pela entidade e pelo órgão concessor foram devidamente notificados para apresentar defesa, e em resposta o Sr. Prefeito trouxe documentos e as seguintes alegações: (i) atendimento aos artigos 15 e 16 da LRF, pois desde 2002 o município possuia contrato de gestão para a execução do PSF; (ii) existência de estimativa trienal do impacto orçamentáriofinanceiro, pois as despesas já estavam previstas no PPA, LDO e LOA; (iii) demonstração da publicação resumida dos contratos de gestão; (iv) quanto ao fracionamento dos contratos, informou que a implantação ocorreu individualmente em bairros distintos para atender as demandas específicas de cada comunidade e cada local, além de terem ocorrido em momentos distintos; e (v) em relação ao não atendimento de metas, justificou que houve, em suma, demanda menor que a prevista, porém foram celebrados aditivos visando a redução dos repasses. Quanto à terceirização das admissões de agentes comunitários de saúde e de membros do PSF, em resumo, informou que os contratos de gestão na área da saúde naquele município 93 tiveram início em 2001, muito antes da Emenda Constitucional nº 51/06 e Lei 11.350/06, que vedaram a contratação terceirizada desses profissionais, porém em 2008 firmou Termo de Ajuste de Conduta com o Ministério Público do Trabalho, comprometendo-se a atender aos dispositivos da citada legislação, passando tais profissionais a serem contratados diretamente pela Municipalidade. O processo retornou à fiscalização acrescido dos novos documentos e justificativas da Prefeitura para instrução complementar, que resultou no afastamento dos apontamentos (i) a (iii) do primeiro relatório, mas foram mantidos aqueles relativos ao fracionamento dos contratos, não atendimento das metas e terceirização da admissão dos profissionais da saúde, concluindo novamente pela irregularidade da concessão dos repasses, mas pela regularidade da prestação de contas. A Assessoria Técnico-Jurídica do Tribunal de Contas opinou, também, pela irregularidade da concessão dos repasses e pela regularidade da prestação de contas, e a Secretaria-Diretoria Geral do TCE/SP posicionou-se pela regularidade da comprovação da aplicação dos repasses, sem prejuízo de recomendação para observar a Emenda Constitucional nº 51/06, a Lei 11.350/06 e as Instruções do Tribunal. Em seu voto o julgador relator ressalta que os órgãos instrutivos da Casa opinaram pela boa ordem da demonstração documental dos repasses e dos gastos efetuados, e que não foi lavantada qualquer ciscunstância indicativa de desvio de finalidade ou má utilização dos recursos. Quanto ao fracionamento dos contratos para cada unidade de atendimento ou equipe dos programas que atendam um ou mais bairros, afirma não haver impedimento legal, e que a origem informou ter adotado o critério territorial para o planejamento das ações e definição de metas, e que tal aspecto não prejudicou a apreciação do caso pela Corte de Contas. O Julgador administrativo entendeu, também, que foram suficientes as justificativas da origem para o cumprimento não suficiente das metas inicialmente estimadas, pois tal fato não implicou em deficiências na prestação dos serviços públicos objeto do repasse. 94 Por fim, em relação à terceirização das admissões de pessoal da saúde, concluiu o Relator que o assunto já foi objeto de Termo de Compromisso e Ajustamento de Conduta com o Ministério Público do Trabalho, fato que não prejudica a prestação de contas analisada. Dessa forma, considerando as manifestações favoráveis dos órgãos de instrução do Tribunal, da ATJ e SDG, votou pela regularidade da prestação de contas, quitando os responsáveis em relação aos repasses apreciados no processo. Em acórdão publicado no Diário Oficial do Estado de São Paulo – DOE aos 17/11/2011, a Primeira Câmara do TCE/SP decidiu julgar da mesma forma. 5.1.2. TERMO DE PARCERIA JULGADO REGULAR Neste outro caso, determinada Prefeitura repassou no exercício de 2008 o montante de R$ 197 mil, aproximadamente, a uma entidade qualificada como Organização da Sociedade Civil de Interesse Público, através de Termo de Parceria, para o estabelecimento de vínculo e cooperação entre as partes para a promoção gratuita de saúde, para atender ao Programa Saúde da Família – PSF naquele município. A prestação de contas foi autuada em processo administrativo sob o nº TC-1200/005/09. A Unidade Regional do Tribunal de Contas responsável pela fiscalização elaborou relatório no qual apontou ausência dos documentos exigidos para a prestação de contas por determinação das Instruções nº 02/2008 do próprio TCE/SP. Os responsáveis foram notificados a apresentar suas razões, tendo sido feito através de documentos e justificativas, que, acrescidos ao processo, foram analisados pela SDG, órgão da Corte de Contas, que opinou pela regularidade da comprovação da aplicação dos recursos, mas sugeriu recomendação para que fossem incluídos na prestação de contas todos os documentos exigidos pelas Instruções do Tribunal, sob pena de multa no caso de reincidência. 95 A SDG ressaltou que a fiscalização não desabonou a aplicação dos recursos e a natureza das despesas incorridas, aspectos esses de maior importância nessa matéria. Assim, decidiu o Exmo. Conselheiro julgar regular com ressalvas a prestação de contas, quitando os responsáveis pelos repasses analisados e recomendando ao órgão concessor que tome as medidas cabíveis para adequar as futuras prestações de contas às determinações contidas nas Instruções nº 02/2008. A sentença foi publicada no DOE aos 19/07/2011. 5.1.3. CONVÊNIO JULGADO REGULAR Trata este caso de convênio celebrado entre uma Prefeitura paulista e certa entidade para o desenvolvimento de atividades sociais para crianças e adolescentes em conjunto com assistente social para reintegração à sociedade de acordo com planos de trabalho estabelecidos, através do qual foram repassados recursos públicos no valor de R$ 194 mil, aproximadamente, no ano de 2008, tendo a respectiva prestação de contas sido autuada no processo administrativo nº TC-270/003/10. O setor de fiscalização do Tribunal de Contas apontou em seu relatório, em relação ao órgão concessor, que: (i) não indicou o endereço da entidade no parecer conclusivo; (ii) não apresentou declaração de adequação da despesa ao PPA e LDO, nos termos dos artigos 15 e 16 da LRF; e (iii) não apresentou autorização ou proibição para redistribuição do recurso à entidade. Quanto à entidade beneficiária verificou a ausência de: (i) declaração de utilidade pública ou certificado de assistência social; (ii) inscrição no CNPJ; (iii) estatuto; (iv) informação sobre as fontes de recursos utilizados (se próprios, municipais, estaduais ou federais); (v) declaração de existência de fato e de funcionamento; (vi) cópia do balanço ou demonstrativo de receitas e despesas; e (vii) programa de trabalho proposto. Concluiu a fiscalização, após o relatado, pela irregularidade da prestação de contas, com proposta para notificação dos interessados para apresentação de defesa. 96 Regularmente notificados, apenas a entidade beneficiária apresentou documentos e justificativas aos apontamentos feitos, que pela análise da área de fiscalização foram consideradas suficientes para propor a regularidade da prestação de contas e quitação dos responsáveis, mesmo com a ausência de justificativas do órgão concessor, mas com sugestão de recomendação para este observar as determinações do Tribunal. A ATJ e SDG acompanharam a proposta da fiscalização, e, dessa forma, o Exmo. Conselheiro decidiu aprovar a comprovação da aplicação dos recursos com a quitação dos responsáveis, recomendando ao Município obediência à legislação aplicável à matéria e às Instruções do Tribunal. 5.1.4. COMENTÁRIOS Dos julgamentos dos casos acima apresentados podemos extrair um aspecto comum relacionado à forma em que é apreciada determinada falha em razão de sua gravidade. A maior parcela das falhas apontadas nesses casos é de natureza formal, de cumprimento de requisitos de formalidade, e de pequena gravidade, que quando sanadas, não comprometem a regularidade da comprovação da aplicação dos recursos. Percebe-se que durante o devido processo legal, na oportunidade do exercício do direito à ampla defesa e ao contraditório, as partes interessadas podem apresentar os documentos e justificativas para as falhas levantadas na primeira fase da fiscalização do Tribunal de Contas, e saná-las a tempo do julgamento. Havendo regularidade das despesas realizadas pela entidade e não existindo qualquer ciscunstância que indique desvio de finalidade ou má utilização dos recursos, e desde que o responsável demonstre interesse em cumprir as exigências da legislação aplicável, se esforçando para corrigir eventuais falhas, o julgamento de mérito lhe será favorável. 97 Veremos a seguir que em alguns casos não se vê muito esforço na demonstração do interesse em cumprir a legislação. 5.2. ANÁLISE DE CASOS JULGADOS IRREGULARES 5.2.1. CONTRATO DE GESTÃO JULGADO IRREGULAR O próximo caso a ser apresentado, o primeiro dos exemplos julgados irregulares, se refere a um contrato de gestão celebrado em janeiro de 2007 entre uma Prefeitura do interior do Estado de São Paulo e uma Organização social – OS, cujo exame foi tratado no processo administrativo nº TC-1039/009/08. O objeto do ajuste, com prazo de vigência de doze meses, era o de discriminar as atribuições, responsabilidades e obrigações das partes na operacionalização da administração e execução, pela contratada, das atividades de serviços médico-hospitalares a serem prestados a qualquer indivíduo que deles necessitasse, no Hospital Municipal. O valor total do repasse de recursos públicos vinculados a esse objeto foi de R$ 5.400 mil. O contrato de gestão em questão foi celebrado por dispensa de licitação, com fundamento no artigo 24, inciso XXIV, da Lei nº 8.666/93, segundo o qual não é necessário o devido processo de licitação na contratação de serviços prestados por Organizações Sociais qualificadas no âmbito das respectivas esferas de governo, para atividades contempladas no contrato de gestão. O setor de fiscalização do Tribunal de contas paulista opinou pela irregularidade da contratação por conta das seguintes falhas: (i) ausência do parecer do poder executivo municipal em relação à conveniência e oportunidade da qualificação da contratada como OS; (ii) não foi apresentada a certificação governamental de qualificação da entidade como OS, contrariando o artigo 5º da Lei nº 9.637/98; (iii) ausência da proposta orçamentária e do programa de investimentos aprovados pelo Conselho de Administração da entidade; (iv) não foi comprovada a 98 comunicação da contratação ao poder legislativo; e (v) o contrato foi remetido ao Tribunal de contas para fiscalização intempestivamente. Notificada a apresentar suas razões, a Prefeitura informou: (i) haver dois pareceres, um da comissão especial que procedeu à análise técnica e outro do Conselho Municipal de Saúde, que aprovou a habilitação da entidade; (ii) quanto à qualificação da entidade, que na condição de Organização Social nos moldes do Código civil, e tendo o reconhecimento da Lei Municipal e os respectivos cadastros em nível federal, é uma entidade reconhecida como OSCIP e qualificada para atuar na condição de parceira do poder público; (iii) que a Lei das OS‟s (Lei nº 9.637/98) aplica-se apenas à União e que o município possui autonomia como ente federativo, tendo editado a Lei Municipal nº 1.453/00; (iv) que a proposta orçamentária e o programa de investimentos foram apresentados ao Conselho de Administração da entidade, quando da assinatura do contrato; e (v) que todas as condições do contrato estão em conformidade com o parágrafo 1º do artigo 116 da Lei de Licitações. A Assessoria Técnico-Jurídica se manifestou pela irregularidade do contrato, apontando que no plano operacional não constam elementos essenciais, tendo sido discriminados somente o número de leitos, a média de permanência e o total de internações por setor, permanecendo irregularidades como a falta de proposta orçamentária e de certificação governamental de qualificação da entidade como OS. A chefia da ATJ entendeu que a ausência de certificação governamental de qualificação da entidade e a diferença apontada no plano operacional entre o limite de internações e a média mensal são falhas suficientes para a irregularidade do contrato. Por sua vez, a SDG entendeu que a falta de prova de que a entidade tenha sido qualificada como Organização Social pelo poder executivo municipal, a ausência de proposta orçamentária, a ausência de justificativa capaz de fundamentar a vantagem de se contratar a OS, demonstrando afronta ao princípio da eficiência, e a falta de prévia oitiva do conselho Municipal de Saúde são condições suficientes para prejudicar a regularidade da matéria examinada. 99 O órgão concessor foi novamente notificado a respeito das falhas e apresentou novas justificativas e documentos, sendo um deles datado de 17/08/2000 onde consta que a entidade foi habilitada como OS. Informou, também, que em reunião do Conselho Municipal de Saúde do dia 24/10/2006, registrada na Ata nº 139, foi aprovada a habilitação da entidade; que o plano operacional demonstra a realidade do atendimento a ser prestado e que é interesse do município que a entidade atenda o maior número possível de pessoas; e que em relação à proposta orçamentária e o plano de investimentos, afirmou que foram apresentados ao Conselho de Administração da entidade quando da assinatura do contrato. Ao analisar as razões trazidas pelo órgão concessor para justificar as falhas apontadas, o Exmo. Conselheiro Relator entendeu que não foram suficientes para reverter o posicionamento apresentado pelos órgãos da Corte. Inicialmente o Julgador destacou a incoerência dos documentos acostados para comprovar a qualificação da entidade, primeiro um documento de habilitação da entidade como OS datado de 17/08/2000, depois a Ata de Reunião do Conselho Municipal de Saúde com a aprovação final de tal habilitação, mas datado de 24/10/2006, e por fim uma declaração da Prefeitura, datada de 24/06/2008, que contraria a alegação da defesa ao afirmar, ipsis litteris, que a entidade não possui certificação governamental de qualificação como Organização Social. Afirmou o Exmo. Relator que a inexistência de evidências documentais a respeito de uma boa situação financeira da entidade, bem como de estudos que comprovem a vantagem para o poder público e para a população na contratação da entidade são falhas que contrariam não só a finalidade de parceria e de fomento que a Lei nº 9.637/98 carrega, mas também o dispositivo constitucional que estabelece a participação de instituições privadas de forma complementar no Sistema Único de Saúde (parágrafo 1º do artigo 199), já que consta do contrato a gestão, além do Hospital Municipal, de toda a responsabilidade pela contratação de profissionais, aquisição de materiais e equipamentos, dentre outros. Por essas razões, e considerando que o órgão não demonstrou a base de cálculo que justificasse a necessidade do valor de R$ 5.400 mil, não comprovando a compatibilidade dos 100 recursos com os objetivos a serem atingidos no ajuste, votou o Exmo. Conselheiro pela irregularidade do contrato de gestão e pela ilegalidade das despesas previstas, determinando a comunicação da irregularidade à Câmara Municipal, bem como representar ao Ministério Público. Em acórdão publicado aos 15/10/2009, os Exmos. Conselheiros da Egrégia Segunda Câmara do Tribunal de Contas decidiram julgar da mesma forma. 5.2.2. TERMO DE PARCERIA JULGADO IRREGULAR O segundo caso de julgamento irregular que apresentaremos se refere a um Termo de Parceria, autuado no processo administrativo de nº TC-25306/026/08, que foi celebrado entre determinada Prefeitura e uma Organização da Sociedade Civil de Interesse Público – OSCIP, com prazo de vigência de doze meses. O objeto do ajuste era a “integração da criança, do jovem e do adolescente na comunidade em que vivem, transformando-os em duplicadores de conceitos e ações de integração comunitária, que se realizará por meio do estabelecimento de vínculo de cooperação entre as partes”, e para o qual foi repassado o valor total de R$ 1.048 mil aproximadamente. A fiscalização do Tribunal de contas paulista concluiu seus trabalhos opinando pela irregularidade do termo de parceria, por conta das seguintes falhas: (i) não foi realizado concurso de projetos; (ii) ausência de justificativa para a celebração do ajuste; (iii) não houve comprovação de que a parceria se enquadra nas atividades previstas no artigo 3º da Lei nº 9.790/99; (iv) ausência de projeto técnico de custos elaborado pela OSCIP; (v) não houve manifestação prévia do Conselho de Política Pública da área correspondente; (vi) ausência, no termo de parceria, de previsão de receitas e despesas para o seu cumprimento, bem como detalhamento sobre a remuneração e benefícios de pessoal pagos com recursos do ajuste; (vii) não foi apresentado comprovante de publicação do demonstrativo de execução físico-financeiro do ajuste; (viii) remessa intempestiva do termo ao Tribunal; (ix) não apresentação do termo de rescisão de outro 101 ajuste ocorrida na vigência do presente termo, bem como justificativa para a celebração de novo ajuste. O Diretor Técnico responsável pela fiscalização ainda apontou os seguintes fatos: (i) que o procurador municipal recomendou à Administração realizar o concurso de projetos, bem como questionou a real necessidade de celebração do ajuste, visto que o objeto poderia ser executado de forma direta; (ii) o ajuste ora analisado é prorrogação de outro termo celebrado 3 meses antes, pelo prazo de 3 meses; (iii) no programa de trabalho apresentado pela entidade estava previsto, além dos recursos repassados pela Prefeitura, o valor de R$ 24 mil de contrapartida da entidade, porém o termo de parceria só menciona o recurso público; (iv) que o registro do estatuto da entidade ocorreu pouco mais de um ano antes da celebração do ajuste; (v) que a entidade apresentou no primeiro ano de existência um superávit de apenas R$ 11,00, e que em seus registros não constam despesas com água, luz, telefone, pessoal administrativo e encargos; e (vi) que no termo de parceria não consta o endereço da entidade, e que o informado no estatuto é diferente daquele que consta dos registros do Ministério da Justiça. As partes interessadas foram então notificadas a apresentar suas defesas em relação ao que foi levantado pela fiscalização, tendo o Sr. Prefeito Municipal apresentado os seguintes argumentos: (i) que a opção pela celebração do termo de parceria com a entidade escolhida justifica-se como a melhor pela relevância do objeto e pelas qualificações dessa entidade, considerando-a capacitada e idônea para a realização do projeto; (ii) que tanto a legislação quanto o Manual de Entidades Sociais do Ministério da Justiça não obrigam a realização de concurso de projetos; (iii) que o parecer jurídico do procurador municipal é meramente opinativo e não vincula a Administração, e que a entidade parceira é a única OSCIP do município; (iv) que as justificativas para a celebração do termo constam no processo; (v) que a configuração das atividades da entidade, nos termos do artigo 3º da Lei nº 9.790/99, é aferida no momento da concessão da certificação pelo Ministério da Justiça, e que isso não pode ser questionado pela Prefeitura; (vi) que o projeto técnico e o detalhamento de custos consta no plano de trabalho apresentado; (vii) que em relação à ausência de manifestação prévia do Conselho de Política Pública, informa que a celebração do instrumento por si só convalida os atos anteriores; (viii) que a previsão de receitas e despesas constou no Plano de Trabalho, e no termo de parceria, a cláusula 102 quarta determinou os aspectos dos recursos financeiros e da prestação de contas; (ix) que os cargos da entidade não são remunerados, por força do estatuto social; (x) que a remessa intempestiva do ajuste para fiscalização do Tribunal é falha meramente formal, não havendo qualquer dano ao erário; e (xi) que os dois termos de parceria questionados são distintos, com objetos diversos. Quanto aos apontamentos feitos pela Diretoria Técnica, o Sr. Prefeito afirma que a atualização ou manutenção dos dados da entidade não são de responsabilidade da Prefeitura; que não é necessária experiência anterior da entidade para a celebração do termo; e que a fonte da contrapartida da entidade é particular, e que apenas será usada em caso de necessidade para ajudar os interesses públicos. A ATJ considerou as justificativas trazidas pelo poder executivo municipal insuficientes para afastar as falhas levantadas pela fiscalização, motivo pelo qual concluiu pela irregularidade do termo de parceria. Mesmo considerando não obrigatório o concurso de projetos, a SDG apresentou entendimento segundo o qual essa é a forma mais democrática, transparente e eficiente para a celebração desse tipo de ajuste, pois permite a escolha da melhor proposta para o poder público. Destacou, ainda, a SDG, que o documento trazido pelo órgão concessor como detalhamento de custos jamais poderia assim ser considerado, já que é abstrato, sem a formalidade necessária. Esse fato, juntamente com a ausência de outros documentos como a previsão de receitas e despesas para o cumprimento do objeto e o detalhamento da remuneração e benefícios de pessoal com recursos do ajuste, bem como da apreciação prévia do Conselho de Política Pública foram determinantes para o posicionamento da SDG pela irregularidade do ajuste, com proposta de aplicação de multa. 103 O Exmo. Julgador da Corte de Contas paulista iniciou seu voto informando que as alegações da defesa foram suficientes para afastar o questionamento em relação à celebração de dois ajustes, tendo em vista que tratam de objetos distintos e que foram firmados em datas distantes uma da outra. Depois afirmou ter sido positiva a iniciativa do órgão concessor de consultar o Manual de Entidades Sociais do Ministério da Justiça, por outro lado também deixou de observar as orientações do Manual Básico de Repasses ao Terceiro Setor editado pelo TCE/SP, que vem recomendando a realização de concurso de projetos. Ainda que não obrigatório o uso do concurso de projetos, lembrou o Exmo. Julgador que sua não realização restringe a participação de outras entidades qualificadas como OSCIP‟s, caracterizando inobservância dos princípios constitucionais da publicidade, da moralidade, da impessoalidade e da isonomia, além ter privado o Estado da escolha da melhor proposta. Fato que agravou as falhas existentes, disse o Julgador, foi a procuradoria jurídica municipal ter apontado a conveniência de se fazer o concurso de projetos, bem como ter questionado a respeito da real necessidade do ajuste, tendo em vista a possibilidade de execução direta daquele objeto. Ademais, as justificativas apresentadas pelo órgão concessor para a escolha da entidade, como já ter firmado ajuste anteriormente com a mesma e o fato de existir apenas aquela OSCIP no município, não são suficientes. Sobre esse aspecto, ressaltou a incoerência da escolha de uma entidade com pouco mais de um ano de existência, com um superávit no primeiro ano de apenas R$ 11,00, sem quadro próprio de pessoal, instalações e endereço fixo, e acreditar ser ela capaz de gerir tamanho recurso (R$ 1.048 mil) e executar objeto tão complexo. Disse, ainda, que a ausência de comprovação da aplicação dos recursos próprios de R$ 24 mil, como previsto estava no plano de trabalho, evidencia que as despesas do ajuste foram suportadas integralmente pelo poder público, o que o assemelha a um contrato administrativo comum. 104 Em face dos fatos verificados e da opinião dos demais órgãos do Tribunal, o Exmo. Julgador decidiu ser irregular o termo de parceria e ilegais as despesas dele decorrentes, determinando, como no caso anterior, a comunicação da irregularidade à Câmara Municipal e a representação ao Ministério Público. Além disso, por infração aos dispositivos legais citados no voto, aplicou multa ao Sr. Prefeito e à Sra. Secretária Municipal de Educação e Cultura no valor equivalente a 500 UFESP‟s a cada um. A Primeira Câmara do TCE/SP, em acórdão publicado aos 28/09/2010, seguiu a decisão do Relator, nos termos acima descritos. 5.2.3. CONVÊNIO JULGADO IRREGULAR Por fim, apresentamos o caso referente ao julgamento de um Convênio celebrado em 2009 entre uma Prefeitura de grande porte do interior do Estado e certa entidade de serviços de saúde pelo prazo de 12 meses, através do qual foram transferidos R$ 70.200 mil. O processo administrativo correspondente foi autuado sob o nº TC-1752/003/09. O convênio tinha por objeto a manutenção, em regime de cooperação mútua entre os partícipes, de Parceria de Assistência Geral à Saúde nas áreas de apoio, diagnóstico, terapêutica, e assistência à saúde, bem como ações de atenção, de extensão, desenvolvimento de projetos e apoio logístico aos processos de qualificação organizacional e profissional. O setor de fiscalização responsável apurou como falhas no processo de celebração do ajuste a ausência: (i) de certificação de utilidade pública da entidade no âmbito municipal; (ii) de comprovação da publicação do ajuste; (iii) do plano de trabalho e cronograma de desembolso financeiro; e (iv) de comprovação da regularidade fiscal da entidade. 105 O órgão concessor, devidamente notificado, trouxe suas justificativas, alegando que: (i) a entidade possui certidões de utilidade pública nas esferas federal, estadual e municipal; (ii) foi dada publicidade ao convênio por meio de publicação no Diário Oficial do Município, além do que o ajuste faz parte de projetos de governo já inclusos nas leis orçamentárias municipais, portanto, de conhecimento da Câmara Municipal; e (iii) em relação à falta de plano de trabalho e demais informações exigidas nos incisos I a VI do §1º do artigo 116 da Lei nº 8.666/93, as metas se encontram em consonância com o determinado pelo Ministério da Saúde para o Programa de Saúde da Família. Mais adiante em suas alegações, a Municipalidade declara que foi apresentado pela entidade novo documento aprimorando as informações contidas no plano de trabalho anterior, que foi aprovado pela área técnica da Prefeitura e pelo Sr. Secretário Municipal de Saúde. O Poder Executivo Municipal também revela que a regularização cadastral da entidade perante a Prefeitura na verdade não foi concluída, mesmo sendo obrigatoriedade determinada pelo Decreto Municipal nº 16.215/08, incluindo a comprovação de regularidade fiscal. Ainda que consideradas as justificativas apresentadas, a Assessoria Técnica do Tribunal entendeu que as falhas persistiam, manifestando-se pela irregularidade do convênio celebrado. A SDG se pronunciou no sentido de que as ausências do detalhamento do plano de trabalho e do cronograma de desembolso são razões para severas críticas ao órgão concessor, mas entende ser possível relevar tais falhas por conta unicamente do cunho social ao qual estão destinados os recursos públicos, opinando pela regularidade do ajuste, sob a condição da prevalência do atendimento digno à população. Em seu voto o Exmo. Conselheiro Relator assevera ser grave a falha envolvendo o plano de trabalho, ainda mais considerando tratar-se de um projeto de R$ 70 milhões num prazo 106 de 12 meses. Em conjunto com a ausência de comprovação de regularidade fiscal, prejudica a regularidade do instrumento celebrado. Para o Julgador, o plano de trabalho apresentado pelo órgão concessor não possui o detalhamento mínimo indispensável para cumprir as condições trazidas pelos incisos I a VI do §1º do artigo 116 da Lei de Licitações. Além de não ter justificado a falta de comprovação da regularidade fiscal da entidade, a Prefeitura deixou claro, através de declaração, que a regularização cadastral da entidade junto ao órgão não foi concluída. Ademais, destacou o Exmo. Conselheiro Relator a ausência de vocação da entidade para a execução das atividades que são objeto do convênio, os chamados Programa de Saúde da Família e Programa de Agentes Comunitários de Saúde, pois, conforme apurou, a entidade conveniada é referência no tratamento de saúde mental desde 1993, constando em seu CNPJ como atividade econômica principal as atividades de assistência psicossocial e à saúde, à portadores de distúrbios psíquicos, deficiência mental e dependência química. Também aponta o Julgador que no instrumento do convênio existem evidências de terceirização irregular de mão de obra, para escapar do instituto do concurso público, ou seja, ao artigo 37, inciso II, da Constituição Federal. Por conta do acima exposto o Exmo. Relator decidiu pela irregularidade do termo de convênio, determinando, assim como nos casos anteriores de irregularidade, a comunicação à Câmara Municipal e a representação ao Ministério Público. Também no presente caso aplicou multa ao Sr. Prefeito no valor equivalente a 500 UFESP‟s, por infração aos dispositivos legais regentes. Os Exmos. Conselheiros da Egrégia Segunda Câmara do Tribunal acompanharam a decisão do Relator, nos termos do acórdão publicado no DOE aos 23/11/2011. 107 5.2.4. COMENTÁRIOS Da análise dos julgamentos acima expostos, verificamos mais uma vez que o que dita o caminho traçado pela opinião dos órgãos da Casa, bem como pela decisão final dos casos é a característica de cada uma das falhas apontadas na constatação dos fatos. Percebemos que mesmo nesses casos de irregularidade, assim como nos exemplos anteriores, julgados como regulares, as falhas de natureza meramente formal são, até certo ponto, relevadas, pois, isoladamente, não comprometem o julgamento do ajuste ou da aplicação dos recursos. Por outro lado, havendo falhas de natureza material, com violação aos princípios constitucionais da legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência, ou aos demais dispositivos da Constituição Federal e da legislação infraconstitucional que resultem em indícios de desvio de finalidade ou má utilização dos recursos, por exemplo, não há outro caminho se não o de marcar a irregularidade do ajuste celebrado ou da prestação de contas apresentada. Nesses casos o devido processo legal também garante aos interessados o exercício do direito à ampla defesa e ao contraditório, com a oportunidade de apresentar suas razões, porém sendo elas de natureza material, haverá dificuldade para relevar suas consequências. Ao criticar a chamada terceirização das atividades típicas do Estado em seu voto para o julgamento do processo TC-1039/009/08, o Exmo. Sr. Conselheiro Dr. Robson Marinho cita que o parágrafo 1º do artigo 199 da Carta Magna estabelece que as instituições privadas poderão participar de forma complementar do Sistema Único de Saúde, e afirma que “a conjugação dos dispositivos constitucionais e infraconstitucionais faz concluir que a Administração não possui a livre disposição dos bens públicos.” É uma afirmação que vai ao encontro do princípio da indisponibilidade do interesse público, que está intimamente ligado ao princípio da legalidade na administração pública, 108 segundo o qual o administrador público não pode livremente dispor do interesse público, pois esse não é um interesse que lhe é próprio, é da coletividade, e deve ser gerido nos estritos limites impostos pela lei. Podemos concluir, com esses exemplos, que a gestão dos recursos públicos em obediência aos princípios da administração pública, à lei, e em defesa do interesse público será sempre um bom exemplo de regularidade dos atos praticados. 6. CONSIDERAÇÕES FINAIS E CONCLUSÃO Diante daquilo que discorremos durante o desenvolvimento do presente estudo, percebemos que a dimensão do tema vai além dos limites da legislação ou dos números dos repasses financeiros realizados. Os limites são aqueles construídos de tempos em tempos de acordo com os interesses da sociedade, refletidos nas necessidades por ela demonstradas ao Estado, que, por sua vez, no ambiente criado pela política, onde se discutem os interesses e se definem as prioridades, poderá legislar, planejar políticas públicas e executar ações que atendam a tais necessidades. Dissemos no segundo capítulo desse estudo que o Estado Democrático de Direito e a Constituição Federal de 1988 abriram o caminho para o crescimento do Terceiro Setor, e concederam o espaço de participação da sociedade civil organizada nos assuntos de interesse coletivo que antes estavam sob a gestão exclusiva do poder público. O texto constitucional de 1988 não deixa dúvidas sobre a definição desse espaço de participação em diversas áreas de interesse da sociedade, principalmente na saúde, educação e assistência social. Percebemos, também, neste capítulo inicial do trabalho, que o ordenamento jurídico brasileiro deu legitimidade para a atuação das entidades do Terceiro Setor, definindo sua 109 formação, estrutura, atividades, áreas de atuação, formas de relação com o poder público, dentre outras características. Nesse ponto específico podemos concluir que a legislação federal está em um estágio mais avançado de evolução, tendo regulamentado, por exemplo, os detalhes da qualificação de entidades como Organizações Sociais e OSCIP‟s e a celebração de contratos de gestão e termos de parceria, bem como a de convênios com órgãos da administração pública federal. Apesar de as demais esferas de governo – Estadual, Distrital e Municipal – estarem sujeitas à observância da Lei nº 9.637/98, que trata das Organizações Sociais e contratos de gestão, e da Lei nº 9.790/99, que trata das OSCIP‟s e termos de parceria, há uma ausência de legislação específica e padronizada que trate dos repasses de recursos públicos a entidades do Terceiro Setor realizados através de convênios. Os Municípios do Estado de São Paulo celebram convênios com entidades privadas sem fins lucrativos fundamentados em legislação municipal própria, muitas vezes individualizada por ajuste celebrado, sem padronização e sem observar todos os princípios constitucionais da administração pública, quais sejam, a legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência. Como cada ente público atua de acordo com interesses próprios, o que não significa uma crítica, pois todo interesse será legítimo, desde que, nesses casos, seja público e legal, seria uma ferramenta importante para todos e uma evolução para o setor uma legislação única e padronizada, que regulamentasse a celebração de convênios para todas as esferas de governo, nos moldes das Leis existentes para os contratos de gestão e termos de parceria. A segurança jurídica trazida por essa legislação seria fundamental para todos os atores que atuam no Terceiro Setor, ou seja, para a administração pública, entidades, controle externo e sociedade, pois auxiliaria o cumprimento dos princípios constitucionais e demais requisitos legais, a cobrança dos resultados, o exercício do controle externo, a transparência e o controle social. 110 Também no segundo capítulo verificamos que as entidades privadas sem fins lucrativos estão sujeitas, ou seja, devem obediência as Normas Brasileiras de Contabilidade e demais atos normativos produzidos pelo Conselho Federal de Contabilidade. Destacamos, nesse ponto, que as entidades do Terceiro Setor devem respeitar os princípios contábeis no registro de suas atividades, devem elaborar demonstrativos contábeis que reflitam os aspectos financeiros (receitas e despesas) e patrimoniais, dentre outros, de seus negócios, e devem segregar seus registros por fonte de recursos e objeto de aplicação desses recursos, para evidenciar se a destinação dada ao recurso foi a mesma para a qual o recurso ingressou na entidade. Daquilo que foi apresentado ficou clara a importância da contabilidade para o gerenciamento da própria entidade beneficiária dos recursos, para o controle e gestão de políticas por parte do Estado, para o controle externo do Tribunal de Contas e para o controle social. Quanto à observância das normas contábeis por todas as entidades privadas sem fins lucrativos que recebem e administram recursos públicos, entendemos que há uma oportunidade de melhoria, pois não há um registro fidedigno a respeito do cumprimento integral da legislação contábil vigente. Esse registro e controle poderiam ser feitos eletronicamente, através de um sistema de informações, como, por exemplo, o Sistema AUDESP do TCE/SP. O controle interno do órgão concessor do repasse, o controle externo do Tribunal de Contas e o controle social têm papel importante na exigência do cumprimento das normas contábeis pelas entidades do Terceiro Setor, seja qual for o porte da entidade. O cumprimento legal, nesse caso, está diretamente ligado à transparência dos atos da administração pública, já que estamos falando do registro contábil de receitas e despesas de recursos públicos. Encerrado o panorama legal, institucional e estrutural do Terceiro Setor, ainda no segundo capítulo, apresentamos o mesmo panorama (legal, institucional e estrutural) para o 111 Tribunal de Contas do Estado de São Paulo, tratando da competência constitucional e legal para o exercício do controle externo. Com o panorama que desenhamos foi possível constatar que o controle externo da Corte de Contas paulista possui o arcabouço legal necessário para o cumprimento eficiente e eficaz do seu papel constitucional. Executa com eficiência a fiscalização dos ajustes celebrados entre o Estado e as entidades do Terceiro Setor, bem como a fiscalização das prestações de contas de aplicação dos respectivos recursos, quando busca a produtividade, e alcança a totalidade dos ajustes e repasses realizados por todos os órgãos jurisdicionados com a estrutura da qual dispõe. E executa suas atividades com eficácia quando busca fazer o melhor, quando, com boa estrutura material e com profissionais qualificados (estrutura intelectual), entrega o resultado da fiscalização e do julgamento com satisfação quantitativa e qualitativa para os interessados, principalmente os órgãos fiscalizados e seus responsáveis, de forma direta, e a sociedade, de forma indireta. Com relação à efetividade das atividades de fiscalização desempenhadas pelo Tribunal de Contas paulista, podemos dizer que há um resultado prático positivo para o jurisdicionado, seus administradores e responsáveis, e para as entidades, pois há um efeito pedagógico e orientador de boas práticas para estes. Apesar de haver um efeito prático positivo indireto para a sociedade, não há uma percepção direta dos benefícios, para o cidadão, da atuação do TCE/SP sobre o Terceiro Setor, o que nos faz entender que há espaço para o desenvolvimento da efetividade. Para tanto, em relação ao lado operacional do desempenho da atividade de fiscalização dos ajustes e prestações de contas do Terceiro Setor, podemos sugerir a reflexão a respeito das seguintes sugestões. 112 A criação de um sistema eletrônico e de acesso público de informações sobre as entidades seria um passo inicial para a melhora do controle e transparência dos ajustes celebrados pelos órgãos públicos concessores, qualquer que seja o valor do repasse. Nesse sistema cada órgão concessor cadastraria todas as entidades sem fins lucrativos que dele recebem repasses de recursos públicos, com a inserção de dados sempre atualizados de cada uma das entidades, como, por exemplo, dados dos dirigentes (endereço, nome e função, p.ex.), estatuto ou contrato social, endereço da sede, objeto social, certificação e detalhes de todos os ajustes em andamento ou encerrados (órgão público parceiro, objeto, vigência e valor dos repasses, dentre outros). Outra sugestão é a divulgação de informações referentes à execução das atividades das próprias entidades e do objeto dos ajustes por elas celebrados, como, por exemplo, as metas definidas no ajuste, o prazo para execução do objeto, plano de execução financeira, dados referentes ao quadro de funcionários, balancete e demais demonstrativos contábeis exigidos pela legislação (conforme comentamos anteriormente), os dados quantitativos e qualitativos da execução do objeto e o confronto com as metas previamente definidas. A divulgação dessas informações poderia ser feita através de um sistema eletrônico com banco de dados administrado pelo Tribunal de Contas, ou pelos órgãos jurisdicionados, alimentado pelas próprias entidades e órgãos públicos concessores dos repasses, e com acesso público pela rede mundial de computadores, a internet. A publicação no DOE da quitação das entidades e seus responsáveis após o julgamento regular das prestações de contas pelo TCE/SP, acrescida de dados que identifiquem o ajuste ao qual se referem, completaria o conjunto de informações necessárias para o cidadão, que saberia o resultado do controle externo para cada um dos ajustes e repasses, independentemente do valor do ajuste. 113 A publicidade das informações que acima exemplificamos, individualizadas por entidade e órgão concessor, em conjunto com a publicação da quitação das entidades, na forma acima proposta, contribuirá para uma maior efetividade das ações do controle externo. A publicidade, da qual falaremos mais adiante, e o acesso público a todos esses dados são fundamentais para uma maior efetividade das atividades do Tribunal de Contas, além de colaborarem para a transparência dos atos da administração pública, o que vai ao encontro do que determina o parágrafo único do artigo 48 da Lei Complementar nº 101/00, a Lei de Responsabilidade Fiscal, que dispõe sobre medidas para assegurar a transparência na gestão pública. O controle externo exercido pela Corte de Contas paulista sobre o terceiro Setor é, como vimos no capítulo 2, profundo e abrangente em relação aos contratos de gestão, termos de parceria e convênios celebrados com valor igual ou superior a R$ 1.746.000,00, o que não ocorre no mesmo grau com os ajustes de valor inferior, obviamente, em razão da relevância individual e do grande volume. Os ajustes de valor inferior são, muitas vezes, inexpressivos individualmente, mas quando agrupados por órgão concessor, por exemplo, ganham em volume e importância, como no caso da Prefeitura de São José dos Campos, que repassou a entidades privadas sem fins lucrativos nos anos de 2009 e 2010, respectivamente, os montantes de R$ 22 milhões e R$ 19 milhões, aproximadamente.63 Podemos perceber, só com este exemplo, que todos os ajustes celebrados, independentemente do valor, são relevantes no conjunto, e, por essa razão, entendemos que as sugestões acima podem colaborar com a transparência dos atos praticados pela Administração Pública e entidades, bem como com a efetividade da prestação jurisdicional do Tribunal de Contas, ou seja, para um impacto positivo e perceptível para o cidadão. 63 Dados extraídos dos processos administrativos TC-29311/026/10 e TC-33381/026/11 do TCE/SP, referentes aos anos de 2009 e 2010, respectivamente. 114 Encerrado aí o panorama institucional, estrutural e legal do Terceiro Setor e do controle externo exercido pelo Tribunal de Contas, construímos, no capítulo seguinte, um panorama teórico sobre as ferramentas de avaliação e controle da execução de políticas públicas. A importância inicial deste terceiro capítulo foi demonstrar como os indicadores sociais, como ferramentas de avaliação, e a contabilidade, a publicidade e a transparência, como ferramentas de controle, são excelentes instrumentos de gestão de políticas públicas para o Estado, de gestão administrativa para as próprias entidades do Terceiro Setor, bem como são importantes para o exercício das atividades de fiscalização do Tribunal de Contas. Quando analisamos as ferramentas de controle, tratamos da contabilidade como o instrumento de registro, organização e divulgação dos números da entidade, cujos princípios e normas, quando respeitados e devidamente aplicados, auxiliam na demonstração da realidade financeira, patrimonial e orçamentária da entidade, e resultam na transparência de suas contas e atividades. Tratamos, também, da publicidade, como aquele princípio constitucional que dá legitimidade aos atos da administração pública, pois os torna de conhecimento público, tanto para fins de validação, quanto para contestação, colaborando, da mesma forma, com a transparência desses atos. Observamos, portanto, que a contabilidade e a publicidade dão transparência às contas e atividades das entidades do Terceiro Setor, que por sua vez possibilitam um controle mais efetivo por parte do Estado, auxiliam o controle externo do Tribunal de contas e também o controle da sociedade civil. Por essa razão que, como dissemos anteriormente, é fundamental a exigência do cumprimento das normas e princípios contábeis pelas entidades do Terceiro Setor, bem como da publicidade de dados sobre o Setor, as entidades e os ajustes por elas celebrados. 115 E sob esse aspecto tem sido importante a atuação do Tribunal de Contas, cujas atividades de controle externo já incorporam tais ações, porém entendemos que há espaço para novos esforços, e as sugestões que foram feitas anteriormente nesta etapa final do estudo podem preencher esse espaço. Também no terceiro capítulo, abordamos a definição de alguns conceitos sobre eficiência, eficácia e efetividade na gestão pública, sobre a avaliação de resultados, e analisamos o conceito de indicador social, suas fontes e principais tipos. O objetivo desta parte do capítulo 3, concluído em seu item 3.3.3., foi fazer uma análise de como os indicadores sociais, no papel de ferramentas de avaliação, podem ser instrumentos norteadores das políticas públicas do Estado, na medida em que fornecem informações sobre a realidade social, ou seja, sobre os problemas e as necessidades da população, orientando a tomada de decisão do poder público. No presente estudo não foi feita qualquer análise em relação ao uso efetivo de indicadores sociais pelo poder público em casos reais de definições de políticas públicas ligadas ao Terceiro Setor, ou na avaliação do resultado dessas políticas, porque tal tarefa demandaria um estudo mais profundo, específico e de longo prazo. Por outro lado, é possível refletir a respeito de como os indicadores sociais podem auxiliar o controle externo do Tribunal de Contas no exercício da competência que lhe foi outorgada pela Constituição Federal e legislação ordinária. Sob esse aspecto destaca-se no ordenamento jurídico brasileiro o princípio constitucional da eficiência, e a determinação constitucional e legal de que toda “pessoa física ou jurídica, pública ou privada, que utilize, arrecade, guarde, gerencie ou administre dinheiros, bens e valores públicos” está sujeita à jurisdição do Tribunal de Contas, bem como deverá prestar contas.64 64 Artigo 37, caput, e artigo 70, parágrafo único, da Constituição Federal, e artigo 14 da Lei Complementar Estadual nº 709/93, a Lei Orgânica do Tribunal de Contas do Estado de São Paulo. 116 Desses dispositivos é possível extrair a competência do Tribunal de Contas para avaliar a escolha de determinada política pública assistencial e a escolha da entidade que a executou, bem como avaliar o resultado alcançado com a execução dessa política, o que, entendemos, pode ser feito através do uso das ferramentas de avaliação tratadas nesse estudo: os indicadores sociais. Poderiam ser utilizados, por exemplo, indicadores demográficos e de saúde como a taxa de natalidade, a de mortalidade infantil, a esperança de vida ao nascer e a de desnutrição, dentre outros, para a avaliação, pelo TCE/SP, da definição da região beneficiada e da entidade privada que recebeu os recursos públicos para a execução de determinada política de assistência gratuita de pré e pós-natal para mães e crianças de baixa renda, assim como a definição da própria política. Em outro exemplo, na avaliação da escolha de determinada política pública de educação profissionalizante ou técnica, da região atendida, da entidade beneficiária e até dos resultados alcançados pela execução da política, podem ser utilizados indicadores educacionais como a taxa de escolaridade média, de acesso à informação e cultura e indicadores de ciência e tecnologia, bem como indicadores de renda, como o PIB per capita e a renda familiar média. Por fim, em um último exemplo, na avaliação da definição de certa política pública de inclusão social com o objetivo de reduzir índices de violência em um bairro carente, da escolha desse bairro e da entidade beneficiária dos recursos públicos, bem como na avaliação dos resultados atingidos, de bom uso seriam os indicadores de qualidade de vida, como os de criminalidade e homicídios, além dos indicadores de renda e pobreza humanos, como o IPH – Índice de Pobreza Humana. Percebemos como é possível o uso dos indicadores sociais na avaliação da escolha feita pelo poder público para estabelecer uma necessidade, definir uma política pública que a satisfaça, bem como na avaliação da execução dessa política e do resultado por ela alcançado e que tenha trazido um impacto positivo para os cidadãos (efetividade). 117 Na avaliação de resultado da execução das políticas públicas poderá haver certa dificuldade em relação à utilização eficaz dos indicadores sociais, já que o processo de produção do indicador é lento e de certo custo, o que reduziria a agilidade na realização da avaliação em alguns casos. Ainda assim o tema merece reflexão, pois verificamos que os indicadores sociais podem ser ferramentas úteis de avaliação, para o Tribunal de Contas, das políticas executadas pelos órgãos jurisdicionados, sendo importante colocar o assunto em discussão e buscar alternativas de aplicação prática dessas ferramentas. Essa é uma sugestão do presente estudo, que, inclusive, vai ao encontro do conteúdo das novas „Missão‟ e „Visão de Futuro‟ definidas pela Gestão Estratégica do Tribunal de Contas do Estado de São Paulo, divulgadas em seu sítio na internet (www.tce.sp.gov.br), no caminho „Instituição‟ e depois „Gestão Estratégica‟65, conteúdo esse que pode ser resumido pelo objetivo de focar a atividade fim do controle externo em uma fiscalização (auditoria) de resultado, que traga benefícios para a sociedade (efetividade). Após as considerações teóricas das etapas iniciais do estudo, necessário se fez a construção de uma dimensão da realidade não só do Terceiro Setor, mas também da atividade jurisdicional do Tribunal de Contas. No capítulo 4 foram apresentados os números e dados referentes aos repasses realizados pelo poder público nos anos de 2008 a 2010, que mostraram uma dimensão financeira do Terceiro Setor nos Municípios e Governo Estadual de São Paulo, e cuja análise demonstrou a relevância e a importância do tema para o Estado, para a sociedade e para a Corte de Contas paulista. 65 A „Missão‟ do TCE/SP: “Fiscalizar e orientar para o bom e transparente uso dos recursos públicos em benefício da sociedade”, e sua „Visão de Futuro‟: “Fiscalizar, orientar e divulgar, em tempo real, o uso dos recursos públicos, priorizando a auditoria de resultados e a aferição da satisfação social, consolidando uma imagem positiva perante a sociedade.” 118 Para o Tribunal de Contas do Estado de São Paulo a segunda parte do capítulo 4 ainda reservou espaço para demonstrar os números referentes à sua atividade, tendo sido apresentadas a quantidade dos processos abertos nos anos de 2008 a 2010 relativos ao Terceiro Setor e a quantidade de processos julgados e seus resultados, oportunidade que tivemos para analisar a dimensão do próprio controle externo sobre as atividades do Terceiro Setor, ou seja, o volume de trabalho produzido pelo TCE/SP, e constatar que a Corte de Contas paulista aplica boa parte de seus esforços e estrutura na fiscalização e julgamento de ajustes e contas do citado setor. Mostrados os números do controle externo, foi necessário exemplificar os resultados práticos do exercício dessa atividade pelo Tribunal de Contas, e no Capítulo 5 descrevemos alguns casos reais de julgamento de ajustes e prestações de contas, desde os fatos apontados pela fiscalização, até a decisão dos órgãos julgadores da casa. Foi possível verificar nesse último capítulo que os atos em desrespeito aos princípios constitucionais da administração pública, à legislação que trata da matéria, e ao interesse público, que resultem em indícios de desvio de finalidade ou má utilização dos recursos, serão sempre combatidos pelo controle externo do Tribunal de Contas. Conforme dissemos no início dessas considerações finais, apesar dos limites impostos pelo ordenamento jurídico e pelo orçamento público reservado ao Terceiro Setor, esses limites estão sujeitos à mudanças de acordo com os interesses e necessidades da sociedade, que através da política e do Estado, podem provocar modificações na legislação. No início deste estudo vimos como a Constituição Federal bem definiu o campo de participação da sociedade civil organizada nos assuntos de interesse público, ou seja, o espaço de atuação do Terceiro Setor e de suas entidades, assim como os princípios constitucionais da administração pública, principais orientadores das ações do poder público e de seus representantes, juntamente com o interesse público. 119 Esses são os princípios a serem observados tanto pelas entidades sem fins lucrativos, na execução, com recursos públicos, de políticas cuja responsabilidade lhe foi transferida pelo Estado, quanto pelo Tribunal de Contas, no exercício do controle externo. Analisamos como a adoção das normas contábeis pelas entidades sem fins lucrativos, algumas medidas relacionadas à publicidade e transparência das contas e atividades dessas entidades, a divulgação de informações sobre o resultado da atuação do controle externo, e o uso de indicadores sociais como ferramenta de avaliação podem auxiliar o Tribunal de Contas do Estado de São Paulo a executar sua missão e a alcançar sua visão de futuro, aproximando-o da sociedade e do cidadão. Dessa forma, o presente estudo terá atingido seu objetivo e trará resultados práticos positivos para os interessados, digam-se os atores do Terceiro Setor e o Tribunal de Contas, bem como para a sociedade, se ao menos provocar discussões em torno das sugestões ora apresentadas, com o objetivo de obter melhorias práticas nas atividades desses interessados. Alcançando esse objetivo, esse estudo conquistará sua efetividade. ********** 120 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS COELHO, Fernando de Souza. 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Lei nº 10.406, de 10 de janeiro de 2002. Lei que instituiu o Código Civil vigente. Brasília. Diário Oficial da União de 11/01/2002. BRASIL. Lei nº 12.101, de 27 de novembro de 2009. Lei que trata da certificação das entidades beneficentes de assistência social. Brasília. Diário Oficial da União de 30/11/2009. 123 BRASIL. Lei nº 12.465, de 12 de agosto de 2011. Lei Orçamentária Anual Federal de 2012. Brasília. Diário Oficial da União de 15/08/2011. BRASIL. Decreto nº 6.170, de 25 de julho de 2007. Regulamenta a celebração de convênios no âmbito federal. Brasília. Diário Oficial da União de 26/07/2011. BRASIL. Decreto nº 93.872, de 23 de dezembro de 1986. Brasília. Diário Oficial da União de 24/12/1986. BRASIL. Secretaria do Tesouro Nacional. Instrução Normativa nº 1, de 15 de janeiro de 1997. Disciplina a celebração de convênios de natureza financeira. Brasília. Diário Oficial da União de 31/01/1997. BRASIL. Conselho Federal de Contabilidade. 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Trata da fiscalização dos órgãos estaduais do Estado de São Paulo. São Paulo. Diário Oficial do Estado de 18/12/2008. SÃO PAULO (Estado). Tribunal de Contas do Estado de São Paulo. Instruções nº 02, de 10 de dezembro de 2008. Trata da fiscalização dos órgãos municipais do Estado de São Paulo. São Paulo. Diário Oficial do Estado de 18/12/2008. SÃO PAULO (Estado). Tribunal de Contas do Estado de São Paulo. Ordem de Serviço SDG nº 02, de 24 de junho de 2009. Modifica, atualiza e consolida procedimentos de instrução e trâmite de processos no TCE/SP. São Paulo. Diário Oficial do Estado de 25/06/2009. SÃO JOSÉ DOS CAMPOS. Lei nº 2.233, de 01 de outubro de 1979. Autoriza a celebração de convênio. São José dos Campos. Publicação no Boletim do Município de 03/01/1980. SÃO JOSÉ DOS CAMPOS. Lei nº 5.801, de 29 de dezembro de 2000. Autoriza a celebração de convênio para implantação de Centros Comunitários de Convivência Infantil - CECOI. São José dos Campos. 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TRIBUNAL DE CONTAS DO ESTADO DE SÃO PAULO, TC-1200/005/09, Relator Conselheiro Eduardo Bittencourt Carvalho, DOE 19/07/2011. TRIBUNAL DE CONTAS DO ESTADO DE SÃO PAULO, TC-270/003/10, Relator Conselheiro Cláudio Ferraz de Alvarenga, DOE 21/12/2010. TRIBUNAL DE CONTAS DO ESTADO DE SÃO PAULO, TC-1039/009/08, Segunda Câmara, Relator Conselheiro Robson Marinho, DOE 15/10/2009. TRIBUNAL DE CONTAS DO ESTADO DE SÃO PAULO, TC-25306/026/08, Primeira Câmara, Relatora Substituta de Conselheiro Maria Regina Pasquale, DOE 28/09/2010. TRIBUNAL DE CONTAS DO ESTADO DE SÃO PAULO, TC-1752/003/09, Segunda Câmara, Relator Conselheiro Edgard Camargo Rodrigues, DOE 23/11/2011. **********