ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL PODER JUDICIÁRIO TRIBUNAL DE JUSTIÇA SFVC Nº 70035672153 2010/CÍVEL PEDIDO DE GUARDA. AVÓ MATERNA E COMPANHEIRO. CRIANÇA POSTA EM FAMÍLIA SUBSTITUTA, SOB GUARDA PROVISÓRIA, EM SEDE DE PROCESSO DE ADOÇÃO. 1. Se o infante já se encontra há três anos sob os cuidados de família substituta, que pretende adotá-lo, mostra-se descabida a pretendida alteração de guarda, mormente quando o estudo social e a avaliação psicológica realizados nos recorrentes, a fim de permitir um exame criterioso acerca da conveniência de eventual alteração de guarda, demonstraram a falta de condições dos mesmos de deter a guarda do infante. 2. As alterações de guarda devem ser evitadas tanto quanto possível, pois implicam mudança na rotina de vida e nos referenciais da criança ou do adolescente, podendo gerar transtornos de ordem emocional. 3. O principal interesse a ser protegido é sempre o do menor. Recurso desprovido. APELAÇÃO CÍVEL SÉTIMA CÂMARA CÍVEL Nº 70 035 672 153 COMARCA DE PASSO FUNDO M.L.C. R.D.R.R.D. .. J.A.C.L.B.C. .. APELANTE APELADO ACÓRDÃO Vistos, relatados e discutidos os autos. Acordam os Magistrados integrantes da Sétima Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Estado, à unanimidade, negar provimento ao recurso. Custas na forma da lei. 1 ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL PODER JUDICIÁRIO TRIBUNAL DE JUSTIÇA SFVC Nº 70035672153 2010/CÍVEL Participaram do julgamento, além do signatário, os eminentes Senhores DES. JORGE LUÍS DALL´AGNOL (PRESIDENTE) E DR. JOSÉ CONRADO DE SOUZA JÚNIOR. Porto Alegre, 23 de junho de 2010. DES. SÉRGIO FERNANDO DE VASCONCELLOS CHAVES, Relator. RELATÓRIO DES. SÉRGIO FERNANDO DE VASCONCELLOS CHAVES (RELATOR) Trata-se da irresignação de MARIO L. C., DILEI R. D. e ROSELI R. D. com a r. sentença que julgou improcedente a ação de regulamentação de guarda, que movem contra JOSÉ A. C. e LIZIANNE B. C. com relação ao infante PEDRO F. D. Sustentam os recorrentes que o contexto probatório demonstra que, atualmente, possuem condições de retomar a guarda de PEDRO, sendo que a genitora não tem interesse em permanecer com o filho. Citam o parecer psicológico e o estudo social, que apontam a possibilidade dos recorrentes assumirem a guarda do menor. Salientam que o ajuizamento da presente ação evidencia o interesse pela guarda do infante. Apontam que acompanharam PEDRO desde seu nascimento, criando forte relação socioafetiva com o menor, sendo que ainda detêm a guarda de CLEITON, irmão de PEDRO. Pretendem que lhes seja concedida a guarda do infante. Pedem o provimento do recurso. 2 ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL PODER JUDICIÁRIO TRIBUNAL DE JUSTIÇA SFVC Nº 70035672153 2010/CÍVEL Intimados, os recorridos apresentaram contra-razões, aduzindo que a genitora, viciada em drogas e bebidas, não possui condições sequer para se sustentar, quanto mais sustentar a prole grande que possuem e que não estão abrigados. Apontam que o menor está residindo com família de classe média e com conforto bem acima das condições dos recorrentes. Pedem o desprovimento do recurso. Com vista aos autos, a douta Procuradoria de Justiça lançou parecer opinando pelo conhecimento e desprovimento do recurso. É o relatório. VOTOS DES. SÉRGIO FERNANDO DE VASCONCELLOS CHAVES (RELATOR) Estou confirmando a bem lançada sentença recorrida, pelos seus próprios e jurídicos fundamentos. Inicialmente, destaco que cabe referir que, na sessão de julgamento desta Câmara Cível, do dia 26 de março de 2008, foi julgado o agravo de instrumento nº 70023087968, onde MÁRIO L. C. e DILEI R. D. se insurgiam contra a decisão que indeferiu o pedido liminar de guarda do infante PEDRO F. D., nos autos da presente ação, que movem contra JOSÉ A. C. e LIZIANNE B. C., recurso este que restou desprovido, ficando o acórdão assim ementado: 3 ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL PODER JUDICIÁRIO TRIBUNAL DE JUSTIÇA SFVC Nº 70035672153 2010/CÍVEL PEDIDO DE GUARDA. AVÓ MATERNA E COMPANHEIRO. CRIANÇA POSTA EM FAMÍLIA SUBSTITUTA, SOB GUARDA PROVISÓRIA, EM SEDE DE PROCESSO DE ADOÇÃO. 1. Se o infante já sem encontra há mais de meio ano sob os cuidados de família substituta, que pretende adotá-lo, mostra-se descabida a pretendida alteração de guarda. 2. As alterações de guarda devem ser evitadas tanto quanto possível, pois implicam mudança na rotina de vida e nos referenciais da criança ou do adolescente, podendo gerar transtornos de ordem emocional. 3. O principal interesse a ser protegido é sempre o do menor. 4. É imprescindível a realização de estudo social e psicológico dos recorrentes a fim de permitir um exame criterioso acerca da conveniência de eventual alteração de guarda. 5. Não estando o infante em situação de risco, descabe deferir qualquer providência liminar. Recurso desprovido. E, para ilustrar, transcrevo aqui o voto que lancei na ocasião: Estou negando provimento ao recurso. Cuida-se do pedido de guarda formulado pela avó materna juntamente com seu companheiro, relativamente a uma criança que se encontra, desde julho de 2007, sob os cuidados da família substituta, sendo que a guarda provisória do infante foi deferida em sede de ação de adoção. Os avós pretendem reverter essa guarda alegando que possuem condições de cuidar do infante e que já estão com a guarda do irmão deste, havendo pedido de regulamentação dessa guarda, que já conta com estudo social e a avaliação psicológica favoráveis ao pedido. Mas essa pretensão não pode ser acolhida, ao menos de forma liminar. Com efeito, observo que o infante PEDRO, antes de ser entregue à família substituta, em julho de 2007, esteve abrigado, por receber medida de proteção aplicada pelo Conselho Tutelar, tendo em vista que se encontrava em situação de risco, sendo de se estranhar que, tendo decorrido tanto tempo, somente agora a avó venha a pleitear a guarda do neto, alegando que pretende preservar os laços de afetividade entre os irmãos... No entanto, é preciso convir que o infante já está adequadamente inserido em família substituta, que pretende adotálo, não havendo como ser deferido liminarmente o pedido de guarda formulado pela avó materna. 4 ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL PODER JUDICIÁRIO TRIBUNAL DE JUSTIÇA SFVC Nº 70035672153 2010/CÍVEL Portanto, mostra-se rigorosamente correta a decisão hostilizada, que determinou a realização de estudos social e psicológico dos recorrentes, pois não é demasiado referir que as alterações de guarda devem ser evitadas tanto quanto possível, pois implicam mudança na rotina de vida e nos referenciais da criança ou do adolescente, podendo gerar transtornos de ordem emocional. E não se pode perder de vista que o principal interesse a ser protegido é sempre o do menor. Assim sendo, considerando que inexistindo nos autos quaisquer informações que desaconselhem a permanência da criança com a família substituta, deve ser mantida a decisão hostilizada. ISTO POSTO, nego provimento ao recurso. Sobreveio agora o presente recurso de apelação, interposto pela parte autora, diante da improcedência da ação Observo que PEDRO agora já está inserido na família substituta há três anos e que vem recebendo do casal guardião todo afeto e carinho de que necessita, bem como tem atendidas todas as suas necessidades, conforme a prova carreada aos autos. Com efeito, lembro que a alteração de guarda é fato que reclama sempre a máxima cautela, pois é um acontecimento em si mesmo traumático para a criança, somente se justificando quando fica comprovada situação de risco atual ou iminente para a criança, circunstância esta que inocorre na espécie. Em segundo lugar, lembro que o instituto da guarda está ligado à presença física da criança em relação ao guardião, ou seja, implica na determinação de seu domicílio, e o critério que orienta essa definição é o interesse do infante, que está acima de todos os demais. E foi esse critério que orientou a decisão recorrida. 5 ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL PODER JUDICIÁRIO TRIBUNAL DE JUSTIÇA SFVC Nº 70035672153 2010/CÍVEL O relato social, de fl. 56, datado de 20.05.2008, demonstra claramente que a avó DILEI não tem interesse de possuir a guarda de PEDRO, como se vê: Em entrevista com a avó materna, Sra. Dilei, a mesma referiu que não tem interesse em assumir a guarda do neto Pedro, o qual estava abrigado e está há 10 meses com a família guardiã. Informou que „mandaram‟ (não disse quem) e na época a filha também insistiu, para que ingressasse com a ação de guarda do Pedro já que estava providenciando a documentação para regularizar a guarda do outro neto Cleiton (15738), irmão do Pedro, o qual está há 4 anos sob seus cuidados. A mãe, Sra. Roseli, alcoolizada, como sempre, também nos relatou que sabe que o filho está bem, morando em POA e acha melhor que fique lá, sendo criado pela família que o levou. A avó deixou claro que não tem interesse eis que já sofre para manter o neto Cleiton afastado da mãe, que ela considera perigosa, doente e comprometida emocionalmente. Elas residem na mesma rua, e pela situação observada, acreditamos que a avó só tenha condições, do ponto de vista social, de continuar acolhendo o neto Cleiton, o qual já possui vínculo afetivo com ela e seu companheiro pelo tempo de convivência. As avaliações psicológicas realizadas em DILEI, fls. 52/53, e em MÁRIO, fls. 81/82, demonstraram que ambos não possuem condições emocionais para ser responsável por mais uma criança, pois CLEITON, irmão de PEDRO já está sob seus cuidados. O relato social de fls. 74/75, datado de 1º.10.2008, concluiu que “considerando a situação apresentada, a falta de interesse dos familiares tanto quando as crianças estavam em companhia da mãe e após o abrigamento, pensamos que a avó e seu companheiro possuem condições de permanecer com a guarda de Cleiton, mas com relação ao menino Pedro, é favorável sua adoção pelos guardiães com quem convive há mais de um ano”. 6 ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL PODER JUDICIÁRIO TRIBUNAL DE JUSTIÇA SFVC Nº 70035672153 2010/CÍVEL O infante PEDRO foi ouvido em juízo, fls. 118/119, se manifestando no sentido de que tem como pai e mãe o casal guardião e o desejo de continuar sob a guarda dos mesmos. Portanto, deve sempre prevalecer o interesse do infante acima dos interesses e conveniência dos recorrentes ou dos recorridos, sendo descabido cogitar agora da alteração da guarda, quando resta comprovado que a criança vem recebendo os cuidados necessários e apresenta desenvolvimento saudável sob a guarda de LIZIANNE e JOSÉ. Aliás, a concepção acerca do que seja o interesse da criança está longe de ser algo estanque e objetivo, sendo composta pelos mais diversos aspectos capazes de influenciar em seu desenvolvimento, o seu futuro, a sua felicidade e o seu equilíbrio. E EDUARDO DE OLIVEIRA LEITE (in “Famílias Monoparentais” Ed. RT), partindo da interpretação mais comumente dada pela jurisprudência, formula alguns quesitos capazes de auxiliar na constatação do interesse do menor, que são o desenvolvimento físico e moral da criança, a qualidade de suas relações afetivas, sua inserção no grupo social, sua estabilidade e, até, “o apego ou a indiferença que a criança manifesta em relação a um de seus pais”. Portanto, inexistindo qualquer fato que justifique, nesse momento, qualquer modificação na guarda, motivo pelo qual deve ser mantida a situação atual, pois a eventual alteração deveria estar embasada em situação de absoluta necessidade, o que não se verifica na espécie e, ainda, resguarda os vínculos entre as irmãs . 7 ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL PODER JUDICIÁRIO TRIBUNAL DE JUSTIÇA SFVC Nº 70035672153 2010/CÍVEL Diante disso, é imperiosa seja mantida a guarda do infante PEDRO com o casal JOSÉ e LIZIANNE, valendo destacar que seria nociva para ele a alteração da guarda pois implicaria mudança de referenciais e rotinas, além de ensejar a ruptura de um vínculo afetivo que se revela tão sólido e saudável. Com tais considerações, estou adotando, como razão de decidir, os doutos argumentos postos no lúcido parecer do Ministério Público, de lavra da ilustre Procuradora de Justiça EVA MARGARIDA BRINQUES DE CARVALHO, que peço vênia para transcrever, in verbis: No mérito, não merece ser provida. Não obstante o teor das alegações dos recorrentes, deve-se ter em mente que, antes de se proceder ao abrigamento do menor e seus irmãos, várias tentativas foram feitas visando o comprometimento dos familiares – dentre os quais a avó materna, juntamente com seu companheiro, ora apelantes – para com os cuidados com as crianças. Isso, à toda evidência, objetivando preservar o vínculo biológico que os apelantes (agora) insistem em se apegar. Como resultou demonstrado por meio dos fartos elementos de prova contidos no feito, não se logrou êxito nesse propósito. Tanto é assim, que Pedro acabou sendo abrigado e, após, encaminhado para adoção. Os estudos sociais realizados àquela época e também depois da propositura da presente ação são bastante elucidativos e demonstram a inviabilidade da concessão do pedido, revelando a total inconveniência e impossibilidade da medida e a ausência de benefícios concretos para a criança, colocando em dúvida, ainda, a genuína intenção dos autores em obter a guarda de Pedro (vide fls. 52-53, 56 e 74-82). Some-se a essas circunstâncias o fato de que, ao ser ouvido, Pedro não demonstrou o menor desejo de retornar ao convívio da família biológica, reconhecendo nos apelados a figura de seus pais (fls. 118-119). 8 ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL PODER JUDICIÁRIO TRIBUNAL DE JUSTIÇA SFVC Nº 70035672153 2010/CÍVEL Ausente, como visto, qualquer elemento apto à desconstituição da sentença, a mesma deve ser mantida em sua íntegra. 3. Em razão do exposto, o Ministério Público opina pelo conhecimento e, no mérito, pelo improvimento do apelo interposto. ISTO POSTO, nego provimento ao recurso. DR. JOSÉ CONRADO DE SOUZA JÚNIOR (REVISOR) - De acordo com o(a) Relator(a). DES. JORGE LUÍS DALL´AGNOL (PRESIDENTE) - De acordo com o(a) Relator(a). DES. JORGE LUÍS DALL´AGNOL - Presidente - Apelação Cível nº 70035672153, Comarca de Passo Fundo: "NEGARAM PROVIMENTO. UNÂNIME." Julgador(a) de 1º Grau: DALMIR FRANKLIN DE OLIVEIRA JUNIOR 9