A Escolaridade e o Processo de Tomada de Decisão: o Estudo do Caso Brasileiro.
Autoria: Pedro José Steiner Neto, Eduardo Angonesi Predebon, Paulo Daniel Batista de Sousa
RESUMO
Enormes mudanças e inovações na prática administrativa, especialmente no comportamento
organizacional, estão ocorrendo ao todo o mundo. A educação, em particular, tornou-se uma
preocupação em muitos países, e é considerada essencial na formação executivos de alta
qualidade. A abordagem convencional para o problema da tomada de decisão supõe que o
nível educacional do executivo influencie sua atitude perante o risco. Além da promoção do
debate e da busca da diversidade de idéias, esse estudo explora a relação entre a educação e o
processo de tomada de decisão, permitindo-nos investigar o efeito da educação na atitude,
perante o risco, dos executivos, que nunca havia sido examinada em estudos prévios no
Brasil, e comparar seus resultados com pesquisas sobre o mesmo tema em outros países. Para
apoiar nossas análises, conduzimos um levantamento de campo exploratório, envolvendo 24
organizações e 171 executivos. Os resultados sugerem que o processo de tomada de decisão,
especificamente a atitude perante o risco, não seria fortemente influenciada por fatores
educacionais, tal resultado opõem-se a resultados obtidos em pesquisas em outros países.
INTRODUÇÃO
Os estudos sobre a influência da escolaridade no processo de tomada de decisão,
colocam em relevo aspectos relacionados com esta temática sob a perspectiva das mudanças
sociais, culturais e políticas das sociedades.
No caso do Brasil, as análises sobre este tema são escassas, sendo, pois,
necessário promover uma profunda avaliação de seus impactos e um amplo processo de
discussão sobre esta temática.
O objetivo deste artigo é discutir a influência da escolaridade em aspectos do
processo de tomada de decisão. De maneira mais específica, se concentrará a atenção nos
indivíduos decisores e em suas posições perante o risco – propenso, neutro ou avesso.
Deve-se ressaltar, porém, o foco desse artigo será o eventual impacto da
escolaridade junto ao comportamento decisório do decisor brasileiro, especificamente, na
atitude perante o risco, considerando, apenas o nível de escolaridade atingido pelos indivíduos
pesquisados, ou seja, seu aspecto quantitativo, não atentando para o tipo da educação
realizada, ou seja, seu aspecto qualitativo.
Para atingir esse objetivo, o artigo está estruturado em cinco seções, incluindo esta
parte introdutória. A segunda seção examina, no plano teórico, alguns temas: o risco, a
tomada de decisão, a atitude do decisor perante o risco e a escolaridade. A terceira seção,
apresenta os dados e a metodologia utilizada. A quarta seção, apresenta e analisa a
investigação empírica realizada e os resultados obtidos. E, na última parte discutem-se as
limitações, sugestões e conclusões a que o estudo permitiu chegar.
O RISCO
A incerteza, normalmente, acompanha as escolhas futuras. A incerteza, durante
grande parte da história da humanidade, era abrandada pela consulta a oráculos e divindades.
Apenas após o Renascimento, criaram-se técnicas sólidas que permitiram o tratamento e a
utilização racional do risco (BERSTEIN, 2000). Atualmente, STEINER NETO (1998), define
o risco como sendo a atribuição de uma probabilidade para a ocorrência de um evento futuro.
1
Na teoria clássica da decisão, estabelecida no século passado, o risco definia-se,
normalmente, como reflexo das eventuais variações na distribuição dos resultados possíveis,
com suas probabilidades e com seus valores subjetivos. ( MARCH e SHAPIRA, 1987)
Essa definição tornou-se possível graças aos estudos primordiais de Von
Neumann e Morgenstern, que inovaram ao preocuparem-se com a decisão, considerando as
distribuições de probabilidades como dados anteriormente conhecidos, ao invés de ocuparemse do estabelecimento da probabilidade de eventos incertos ( FISHBURN, 1989). Logo, ao
invés de dizer como poderiam ocorrer, preocuparam-se em avaliar como estavam ocorrendo
as decisões.
Nesse sentido, TVERSKY e FOX (2000) ressaltam que, geralmente, tomam-se
decisões sem a posse de um conhecimento definitivo acerca de suas conseqüências. As
decisões avaliariam, singelamente, dois atributos: a utilidade dos possíveis resultados e a sua
probabilidade de ocorrência. Neste caso, temos claramente definidos os dois tipos de
variáveis a serem consideradas : a valoração individual (utilidade) e a atitude perante o risco.
Dessa forma, a teoria clássica da decisão sob risco – teoria da utilidade esperada –
desenvolveu-se para explicar as atitudes perante o risco.
Estes comportamentos possíveis seriam três: aversão ao risco, neutralidade ao
risco e propensão ao risco (TVERSKY e FOX, 2000). Interessante, nesse ponto, ressaltar-se a
dificuldade em encontrar-se comportamentos de neutralidade perante o risco, visto que, o
indivíduo, em geral, não deixa de posicionar-se.
Essa teorização, contudo, encontra-se sobre o crivo de críticas. Para MARCH e
SHAPIRA (1987) inexistem evidências sólidas da sua adoção por parte dos tomadores de
decisão no que tange à adoção de posturas racionais, amparadas na teoria clássica da decisão
sob risco. Nesse mesmo estudo, MARCH e SHAPIRA (1987) evidenciaram, ainda, que os
tomadores de decisão estariam mais preocupados com o montante financeiro de uma possível
perda do que com a sua probabilidade de ocorrência.
Alguns estudos corroboram esse questionamento, ao apontarem um
comportamento de preferência ao risco, em situações que envolvam perdas ou prejuízos, e um
comportamento de aversão ao risco, em situações que proporcionem ganhos ou lucros.
(FISHBURN e KOCHENBERGER, 1979; KAHNEMAN e TVERSKY, 1979)
No tocante à aversão ou propensão ao risco, LAUGHHUNN et alii (1980)
encontraram um comportamento de aversão quando as perdas ou prejuízos foram
demasiadamente elevados e propensão apenas para perdas de valor insignificante. A principal
dedução que pode ser feita desta descoberta seria uma mudança de concavidade da curva de
utilidade individual.
Não obstante estas considerações, SCHOEMAKER (1990) afirma que, não foi
estabelecido um consenso, uma teoria inequívoca, sobre o comportamento do decisor perante
o risco, que permita a previsão e a explicação de como os indivíduos irão formular suas
decisões. Tal fato encoraja o contínuo estudo dos comportamentos das atitudes dos decisores,
especialmente em situações onde fatores culturais, geográficos e educacionais diferem dos
pesquisados anteriormente.
TOMADA DE DECISÃO
Riscos e incertezas diversas acompanham as organizações na resolução de
problemas e situações, das mais simples as mais complexas. A resolução destes problemas
passa pela tomada de decisão, adicionando mais variáveis e incrementando a dificuldade da
sua gestão e do atingimento de resultados adequados. Este fenômeno não seria apenas uma
característica recente ou emergente, pois SIMON (1957) já atentava para esse fator ao
2
salientar que a complexidade adviria das incontáveis premissas constitutivas do processo
decisório.
Apesar de complexo, o processo de tomada de decisão constitui-se em uma tarefa
corriqueira do indivíduo, que a realiza consciente ou inconscientemente, tal qual o exercício
diário da prosa, como bem observam KAHNEMAN e TVERSKY (2000). Por se tratar de
uma atividade não descartável e de fundamental importância, os estudos do processo decisório
refletem a necessidade da busca permanente de aprimoramento da capacidade de decidir. Uma
decisão seria, antes de mais nada, uma escolha entre alternativas. E, na maioria das vezes,
seria afetada por situações futuras sobre as quais não existe controle.
A qualidade da decisão, questão fundamental para os indivíduos de qualquer nível
hierárquico, demanda uma capacidade de administrar todos os fatores envolvidos no seu
processo. Visando reduzir as incertezas e inseguranças, SHIMIZU (2001) propõe a
estruturação e resolução de problemas através de modelos formais, detalhistas, consistentes e
transparentes
Ao analisar com profundidade a crise dos mísseis de Cuba, ALLISON (1971)
definiu três tipos de modelos de decisão: o modelo racional ou clássico; o modelo de processo
organizacional ou organizacional; e, o modelo político ou burocrático, ou, ainda, de política
governamental.
Ao explicar cada um desses modelos, RODRIGUES (1991) utilizou a comparação
do decisor com a atuação de um ator. O ator racional determina as ações lógicas pelas quais
se opta por uma alternativa, visando determinados objetivos. Conhecidos e acordados os
objetivos, fica lógica ou racional a determinação da opção escolhida O ator político toma
decisões mediante barganha e compromissos entre os participantes. O resultado da decisão
fica assim de difícil previsão. O ator organizacional se comporta de acordo com os
procedimentos e repertórios da organização, mesmo que estas se apresentem de forma
contrária às suas convicções ou análises. Embora previsíveis, as decisões pelo modelo
organizacional não obedecem a uma lógica racional.
Diversamente, BELL (1988) divide os modelos de tomada de decisão em
normativos, prescritivos e descritivos. A diferença entre estes seria que os modelos ou
análises normativas dizem o que deve ser feito, sob o ponto de vista de mais de um decisor, de
preferência da sociedade como um todo; enquanto os modelos prescritivos determinam a
decisão que deve ser feita por indivíduos racionais, de forma individual; finalmente, os
modelos descritivos mostram a decisão como ela deveria ser, desconsiderando o que deveria
ser feito.
O DECISOR E A SUA ATITUDE PERANTE O RISCO
Entre as múltiplas fontes de interferência existentes no ambiente empresarial
quanto à tomada de decisão, as atitudes pessoais do decisor perante o risco são
preponderantes(BAIRD e THOMAS, 1985).
HAMBRICK e MASON (1984) já haviam explicitado esse fator ao analisarem os
executivos dos níveis empresariais superiores, quando identificaram que as características
pessoais influenciam mais as decisões do que a racionalidade ou as características da setor
industrial.
Ratificando esse pensamento, HITT e TYLER (1991) concluíram que os efeitos
das características pessoais do decisor na tomada de decisão, apesar de pequenos, seriam
estatisticamente relevantes. Nesse sentido, HAMMOND et alii (1999) salientam que a atitude
perante o risco (valor) seria tão individual quanto a personalidade do próprio decisor, ou seja,
essa atitude individual mensura-se em relação a valoração do outcome (resultado) possível
3
dada pelo decisor e não por sua probabilidade estocástica de ocorrência. YATES e STONE
(1994) consideram, igualmente, o risco inerentemente subjetivo e individual.
Na busca das explicações sobre o que poderia levar decisores a terem diferentes
atitudes perante o risco, existe um sem número de estudos analisando diferentes variáveis
como relacionadas com o comportamento diante do risco. Uma síntese destes estudos pode
ser visualizada no Quadro 1.
QUADRO 1: Estudos de características do tomador de decisões perante o risco
AUTOR
VROOM e PAHL
ANO
1971
VROOM e PAHL
1971
HAMBRICK e MASON
1984
MACCRIMMON e
WEHRUNG
MACCRIMMON e
WEHRUNG
MACCRIMMON e
WEHRUNG
1986
MACCRIMMON e
WEHRUNG
1986
MACCRIMMON e
WEHRUNG
1986
IRELAND et alii
1987
1986
1986
VARIÁVEL
Idade
CONCLUSÃO
Gerentes mais jovens estariam dispostos a correr
maiores riscos.
Funções
Não há diferenças significativas no comportamento
perante o risco de gerentes de diferentes categorias
funcionais.
Idade
Executivos mais jovens estariam mais propensos a
estratégias de alto risco.
Nível Hierárquico Executivos de posições hierárquicas mais elevadas
seriam mais propensos ao risco.
Idade
Gerentes mais idosos seriam mais aversos ao risco,
diferentemente dos mais jovens.
Educação
Executivos com pós-graduação estariam mais
propensos ao risco do que aqueles que possuem
apenas a graduação ou o secundário completo.
Experiência
A experiência, medida em anos de trabalho, não
Profissional
permite concluir se há relação com o comportamento
de aceitação ou aversão ao risco.
Experiência
Quanto maior a experiência, medida em
Profissional
percentagem do tempo total da carreira gasto numa
mesma empresa, maior a aversão ao risco.
Nível Hierárquico O processo de decisão e a incerteza perante o
ambiente varia de acordo com o nível hierárquico.
Fonte: STEINER NETO, 1998.
A ESCOLARIDADE
Era comum, no passado, haver a indagação sobre o fato de que escolaridade teria
algum um impacto sobre a produtividade e a atividade econômica. Argumentava-se, com toda
a justiça, que por mais indispensável que fosse, um incremento na escolaridade precisava
demonstrar impacto na produtividade para justificar qualquer epíteto revolucionário.
Atualmente, nesse quesito, a escolaridade não têm nada mais o que provar.
Evidentemente, deve-se reconhecer a real dificuldade que existe para medir o
impacto econômico da escolaridade nas empresas, em especial, no que tange a atuação dos
indivíduos tomadores de decisões. No Brasil, a década de 90 foi pródiga no aumento da
escolaridade, mas este fato não foi, necessariamente, acompanhado por um aumento da
capacidade discricionária, embora teorias em voga, como o empoderamento (empowerment),
demandassem um aumento expressivo da necessidade de decidir por parte de integrantes de
todos os níveis organizacionais
O arcabouço cognitivo possibilita, além de diferenças sistemáticas na
interpretação da informação probabilística em sociedades diferentes (países ou culturas
diferentes), a apreciação diversa dos diferentes estratos subculturais em uma mesma
sociedade. (WALLSTEN e BUDESCU, 1983)
Ao avaliar a problemática referente aos estudos havidos após a graduação,
MACCRIMMON e WEHRUNG (1986) desvelaram uma maior propensão ao risco entre os
4
indivíduos que haviam cursado pós-graduação do que entre aqueles que possuíam apenas a
graduação ou o secundário completo.
Isso posto, pode-se evidenciar que a performance de risco das empresas,
atualmente, encontra-se, fundamentalmente, relacionada à dedicação e a capacitação dos
indivíduos tomadores de decisão, visto que, entre as organizações empresariais, existe uma
similaridade entre a oferta produtiva e o arsenal tecnológico utilizado. Esta padronização dos
meios produtivos torna ainda mais evidente a influência dos processos e formas de tomada de
decisão na gestão empresarial hodierna.
Em síntese, ao agregar-se e articular-se a dimensão da escolaridade ao processo
comportamental de tomada de decisão, permite-se abordar uma nova linha de investigação,
cujos estudos empíricos anteriores, predominantemente uni-culturais, não a esgotaram. As
demandas crescentes por maiores níveis de escolaridade em países de desenvolvimento
recente e as diferenças das estruturas educacionais entre as nações, recomendam a realização
de estudos pontuais. Dessa forma, este estudo pretende contribuir para a verificação da
influência da escolaridade no processo decisório na realidade brasileira, cotejando-a, quando
possível, com estudos do mesmo tema conduzidos em outros países.
A forma pela qual pretende-se, neste estudo, demonstrar tal realidade no contexto
brasileiro será discutida na próxima seção.
DADOS E ASPECTOS METODOLÓGICOS
Os dados aqui utilizados foram coletados com o propósito de investigar a
percepção do decisor acerca da exposição ao risco dos indivíduos tomadores de decisão e se
esta encontra-se diretamente associada ao seu nível de escolaridade.
Para a consecução desse objetivo, utilizou-se um delineamento do tipo
levantamento de campo. Essa opção demonstrou-se adequada, visto que procurou-se verificar
a relação entre as variáveis aqui pesquisadas, o que demanda a existência de uma amostra que
permita a inferência estatística.
Tendo em vista o objetivo da pesquisa, delimitou-se a população a ser estudada
como sendo a de indivíduos tomadores de decisão em empresas industriais situadas na região
metropolitana de uma grande cidade brasileira. Desta população, optou-se – após uma
consulta formal ao seus setores de Recursos Humanos – por selecionar uma amostra de
quarenta empresas, eliminando de forma discricionária as demais.
A amostra final ficou, dessa forma, constituída por funcionários de quarenta
empresas para as quais enviou-se um conjunto de questionários da pesquisa, acompanhado de
uma carta de apoio institucional, que explicava o propósito do estudo. Desta forma procurouse minimizar um eventual impacto da cultura organizacional sobre as características do
decisor.
O instrumento de coleta de dados primários consistia em um conjunto de quinze
cópias de questionários, enviados via correio, dos quais se solicitava a devolução de treze
questionários devidamente preenchidos no prazo de três semanas. Determinou-se, ainda, que
os questionários enviados deveriam ser distribuídos entre os indivíduos decisores ou em
posição que implicasse em tomada de decisão, situados nos níveis estratégico, tático e
operacional, a razão de três, cinco e cinco questionários, respectivamente.
O procedimento de amostragem ocorreu por adesão, obtendo-se vinte e quatro
empresas respondentes, que corresponde a 60% das quarenta empresas componentes do
universo sob investigação. Foram recebidos 230 questionários, os quais sofreram diversas
depurações, desse modo restaram 171 respostas que foram consideradas válidas para fins
deste estudo, que constituiram a amostra efetiva para fins deste trabalho. O número de
questionários eliminados, aparentemente alto, justifica-se pela necessidade de eliminar os
5
respondentes que apresentavam um nível de escolaridade de primeiro grau, segundo grau
incompleto ou completo, mestrado e doutorado, pelo fato destas categorias não terem atingido
o número mínimo de casos para estudos estatísticos. Assim, os níveis de escolaridade
utilizados nesse estudo foram: superior incompleto, superior completo e pós-graduação.
As perguntas do questionário foram divididas em blocos que se destinaram,
respectivamente, à caracterização do respondente (onze questões), a partir de agora, bloco 1; à
descrição do processo de tomada de decisão (treze questões), bloco 2; e, à avaliação e
solução de situações propostas (sete questões), bloco 3.
Nesse estudo utilizou-se apenas o bloco relativo à avaliação e solução de situações
propostas, bloco 3, tendo como variável de caracterização o nível de escolaridade fornecido
no bloco 1. O bloco 3, em seu bojo, encerrava uma série sete situações básicas de escolha ou
loterias, onde cada qual apresentava um conjunto de três questões, apresentadas a seguir.
A primeira questão de cada situação consistia em uma escolha entre uma situação
de um futuro único, chamada de situação certa; uma situação de dois futuros possíveis, com
50% de probabilidade para cada resultado possível, chamada de situação incerta; além de uma
situação de indiferença entre as anteriores. Associado a cada um dos futuros possíveis, certo e
incertos, havia um valor financeiro determinado de tal maneira que o valor único da situação
certa era a média aritmética dos dois valores apresentados na situação de futuros incertos.
Logo, a esperança matemática dos futuros incertos teria igual valor ao do futuro certo. Dessa
forma, a alternativa de situação incerta foi caracterizada como uma loteria, já que o valor final
dependeria do evento que viria a acontecer. Seus estados finais, ou seja, as situações de ganho
ou de perda na loteria, possuiam, assim uma probabilidade inicial de 0,5 (50%) cada uma.
A segunda e a terceira questões consistiam em perguntas que visavam determinar
o ponto de indiferença entre o valor certo e a loteria; aquela solicitava o valor para a
alternativa certa que tornaria indiferente a escolha entre esta e a situação incerta (loteria), esta,
solicitava a probabilidade de ganho na situação incerta(loteria) que tornaria indiferente a
escolha entre esta e o valor certo. Para os fins almejados por este estudo, utilizou-se apenas as
respostas dadas a primeira questão, do bloco 3.
APRESENTAÇÃO E ANÁLISE DOS RESULTADOS
A elaboração das situações propostas no estudo objetivou estruturar modelos
básicos de problemas de decisão através de sete situações que descreveriam ou imitariam
procedimentos que ocorrem no mundo real, estabelecendo, da melhor maneira possível, um
relacionamento das variáveis com os objetivos do estudo. Dessa forma, as sete situações
procuraram refletir esse posicionamento, conforme o Quadro 2, a seguir.
Por meio dos cálculos do X2 (qui-quadrado) e do valor p para cada uma das sete
situações sob estudo, não foi possível identificar-se evidências que levem a concluir que
existam diferenças significativas entre os diversos níveis de escolaridade pesquisados quanto
a atitude perante o risco, como bem demonstra a Tabela 1.
O valor crítico de X2 com quatro graus de liberdade, no nível de significância de α
= 0,05, assume o valor de 9,488. Como os valores apresentados na Tabela 1 referentes a
estatística do teste X2 não excedem o valor crítico, pode-se evidenciar que a atitude perante o
risco, apresentada nas diversas situações propostas, dos indivíduos de níveis de escolaridade
diferentes, apresentam comportamentos semelhantes. Evidentemente, a simples comparação
dos valores p obtidos com o nível de significância selecionado (α = 0,05) indica a inexistência
de comportamentos diferentes perante o risco entre os indivíduos pesquisados no que tange a
sua escolaridade.
6
Quadro 2: Descrição das situações de estudo propostas
SITUAÇÃO
I
Domínio
Pessoal
II
Beneficiário
Mercado de Capitais
III
Beneficiário
Mercado de Produtos
IV
Beneficiário
Mercado da Organização
V
Domínio
de Ganhos
VI
Domínio
Misto
VII
Domínio
de Perdas
DESCRIÇÃO
Modelo verbal, complexo e de risco. Onde os payoffs estavam
associados a uma probabilidade de ocorrência dos estados
propostos e seus resultados possíveis afetariam, exclusivamente,
o interesse do indivíduo decisor.
Modelo verbal, complexo e de risco. Onde os payoffs estavam
associados a uma probabilidade de ocorrência dos estados
propostos e seus resultados possíveis afetariam, exclusivamente,
o interesse financeiro da unidade empresarial pesquisada.
Modelo verbal, complexo e de risco. Onde os payoffs estavam
associados a uma probabilidade de ocorrência dos estados
propostos e seus resultados possíveis afetariam, exclusivamente,
o interesse mercadológico da empresa pesquisada.
Modelo verbal, complexo e de risco. Onde os payoffs estavam
associados a uma probabilidade de ocorrência dos estados
propostos e seus resultados possíveis afetariam, exclusivamente,
o interesse dos funcionários da empresa pesquisada.
Modelo verbal, complexo e de risco. Onde os payoffs estavam
associados a uma probabilidade de ocorrência dos estados
propostos e seus resultados possíveis, ganhos líquidos,
afetariam, exclusivamente, o interesse da unidade empresarial
pesquisada.
Modelo verbal, complexo e de risco. Onde os payoffs estavam
associados a uma probabilidade de ocorrência dos estados
propostos e seus resultados possíveis, ganhos ou perdas
líquidos, afetariam, exclusivamente, o interesse da unidade
empresarial pesquisada.
Modelo verbal, complexo e de risco. Onde os payoffs estavam
associados a uma probabilidade de ocorrência dos estados
propostos e seus resultados possíveis, perdas líquidas, afetariam,
exclusivamente, o interesse da unidade empresarial pesquisada
Fonte: Dados primários
Os resultados globais sobre a atitude perante o risco para cada uma das sete
situações propostas evidenciam que os indivíduos decisores pesquisados possuem atitudes
conservadoras em relação a sujeição pessoal ao risco e atitudes mais liberais em relação ao
risco empresarial, como evidencia a Tabela 2.
TABELA 1: CÁLCULO DO X2(4) e Valor p
SITUAÇÃO
Domínio Pessoal
Beneficiário Mercado de Capitais
Beneficiário Mercado de Produtos
Benefeciário Mercado da Organização
Domínio de Ganhos
Domínio Misto
Domínio de Perdas
Fonte: Dados primários (n = 171)
X2(4)
Valor p
0,81
3,79
2,93
8,12
2,63
1,93
1,46
0,94
0,43
0,57
0,09
0,62
0,75
0,83
Esta conclusão resulta da constatação de que na situação do domínio pessoal
existe uma predominância do comportamento de aversão ao risco. Interessante destacar que o
indivíduo decisor analisado apresenta, apesar de tênue, uma igual predominância de aversão
ao risco quando confrontado com uma situação onde a comunidade organizacional estaria
7
posicionada como beneficiária. Estes resultados reforçam a anterior conclusão de que os
indivíduos decisores seriam conservadores quanto a propensão ao risco.
TABELA 2: PREFERÊNCIAS ENTRE AS SITUAÇÕES PROPOSTAS (%)
SITUAÇÃO
Domínio Pessoal
Beneficiário Mercado de Capitais
Beneficiário Mercado de Produtos
Beneficiário Mercado da Organização
Domínio de Ganhos
Domínio Misto
Domínio de Perdas
Fonte: Dados primários (n = 171)
Avesso
57
47
27
52
47
67
29
Propensão ao Risco - %
Neutro
Propenso
5
38
1
52
1
72
2
46
4
49
2
31
3
68
Total
100
100
100
100
100
100
100
Em contrapartida, nas demais situações analisadas, o comportamento decisório do
indivíduo decisor tende a ser liberal, principalmente, quando envolvem a empresa onde
atuam. Dessa forma, pode-se concluir que os indivíduos decisores, quando sua decisão está
afeita a empresa, tendem, diante da perda a assumirem comportamentos de propensão ao
risco, talvez pela chance de não realização desta perda. Este comportamento aparece,
igualmente, quando a decisão está afeita ao mercado de produtos, quando o indivíduo decisor
prefere assumir um comportamento de propensão ao risco, provavelmente assumindo uma
posição de jogador (gambling), preferindo um retorno maior, com maiores riscos, do que
aceitando um retorno menor e menores riscos. Este resultado aparece, ainda, ao analisar-se o
domínio das perdas, quando sua propensão ao risco desponta, já que, diante da possibilidade
de perder, os indivíduos seriam avessos à perda e, dessa forma, propensos a um maior risco.
Em suma, observando-se as preferências expostas na Tabela 2, vê-se, neste caso,
que o decisor brasileiro apresenta um comportamento preferencial de exposição ao risco, à
exceção dos domínios pessoais ou que importem em riscos sociais da organização. Em todas
as demais situações, seu comportamento decisório seria, predominantemente, de propensão ao
risco.
Portanto, ao analisar-se as Tabelas 1 e 2, conclui-se que o nível de escolaridade do
decisor brasileiro não influencia a sua percepção e o seu comportamento perante o risco,
porém, talvez por razões culturais, o decisor brasileiro apresenta uma certa propensão ao
risco, ou, uma certa aversão à perda.
LIMITAÇÕES, SUGESTÕES E CONCLUSÕES
Certas limitações da pesquisa devem ser aqui mencionadas e espera-se que
estudos futuros possam superá-las. Primeiro, a amostra estudada foi extraída de uma mesma
região metropolitana brasileira, logo, não sendo possível generalizar os resultados além desse
universo. Segundo, seria de bom alvitre ampliar a amostra pela incorporação de novas áreas,
metropolitanas ou não, aos futuros estudos, bem como incluir mais níveis de escolaridade,
como o primeiro e segundo graus, mestrado e doutorado. Finalmente, o estudo realizado
concentrou-se, na variável escolaridade, apenas em seu aspecto quantitativo (grau de
escolaridade do indivíduo decisor), o que pode ter influenciado os resultados obtidos.
Dessa forma, restam como sugestões a estudos futuros, a ampliação e
incorporação de novas áreas, metropolitanas ou não, bem como o aumento do tamanho da
amostra a ser pesquisada. E, pesquisar a influência da escolaridade sob o aspecto qualitativo
(tipo de escolaridade do indivíduo decisor).
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Destarte, este artigo teve por objetivo discutir e analisar a influência da
escolaridade no processo decisório e sua influência na atitude perante o risco do indivíduo
decisor. Considerando a importância do estudo da atitude perante o risco e a crescente
demanda por aumento da escolaridade, torna-se fácil a percepção da relevância do tema aqui
abordado.
Sobre os resultados obtidos na pesquisa empírica, estes permitem concluir que,
aparentemente, não existe um relacionamento significativo entre a escolaridade e a atitude
perante o risco do decisor brasileiro. Interessante ressaltar que este estudo apresentou
resultados divergentes de estudos anteriores ( MARCH e SHAPIRA, 1987; HAMBRICK e
MASON, 1984) que apontavam para uma influência da escolaridade sobre a atitude do
decisor perante o risco. Como não foram analisados outras variáveis de caracterização da
amostra (idade, tempo de experiência, etc...), torna-se difícil comparar estes estudos nestes
quesitos. Resta evidente que tal diferença pode ser ocasionada por diferentes características
culturais ou pela influência conjunta de mais de uma variável.
Acredita-se que o tema aqui apresentado mereça maior exploração e pesquisa.
Não obstante, procurou-se abordar alguns aspectos que, certamente, requererão atenção futura
por parte dos pesquisadores. Enfim, o esforço realizado para apresentar alguns elementos
importantes da relação entre escolaridade e atitude perante o risco será mais uma contribuição
na direção de discussões mais profundas acerca do tema.
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1 A Escolaridade e o Processo de Tomada de Decisão: o