REFLEXÕES ACERCA DA PRODUÇÃO DE IDENTIDADES
CULTURAIS NA INFÂNCIA PÓS-MODERNA
EMMEL, Rúbia1; KRUL, Alexandre José2.
Palavras-chave: Infâncias, produção da cultura, docência.
Introdução
O universo infantil é perpassado por “cultura’s e infância’s” (BARBOSA, 2006), uma
vez que ao observar a realidade escolar em que atuamos, nos percebemos cercados por vários
cenários de produção da cultura: jogos de computador, celulares, brinquedos tecnológicos e
consumistas, filmes, acesso a internet e sua nova forma de escrita os “internetês”, alimentação
sedentária baseada em alimentos industrializados, um “agir e se vestir como miniadultos”, o
que faz com que crianças apresentem problemas comportamentais, pois em meio a estas
mudanças culturais e tecnológicas cada vez mais rápidas está a escola. Enquanto educadores,
nos colocamos em processo de reflexão sobre as nossas ações frente a esse novo cenário posto
à infância: E agora professor/a o que fazer? Qual a nossa postura perante essas produções das
culturas infantis?
A Instituição Escolar e as Culturas Infantis
Inicialmente pressupõem-se anunciar que estamos problematizando as instituições
escolares e as culturas infantis da sociedade contemporânea, e nada mais claro do que pensar
no modo como se dão os discursos e os olhares neste tempo e espaço.
Para Silva (2005, p. 141) há uma indústria cultural que perpassa a infância e as escolas
infantis, que com o processo de globalização, também está imbricada à nossa realidade, pois
temos algumas referências de crianças que já vivem na cultura da infância “Mcdonaldizada” e
da “Disney”, entre outras culturas as quais perpassam a infância, e fazem parte das
brincadeiras das crianças da realidade em que atuamos.
O movimento para fora (de mercadorias, de imagens, de estilos ocidentais e de
identidades consumistas) tem uma correspondência num enorme movimento de pessoas da
periferia para o centro, num dos períodos mais longos e sustentados de migração “nãoplanejada” da história recente (HALL, 2006, p. 81).
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Mestranda em Educação nas Ciências, UNIJUÍ, r_emmel@hotmail.
Mestrando em Educação nas Ciências, UNIJUÍ, [email protected].
Sobre o mercado e sua indiscutível penetração na cultura Sarlo (1997) afirma que “a
cultura sonha, somos sonhados por ícones da cultura. Somos livremente sonhados pelas capas
de revistas, pelos cartazes, pela publicidade, pela moda: cada um de nós encontra um fio que
promete conduzir a algo profundamente pessoal, nessa trama tecida com desejos
absolutamente comuns” (p.26).
Sarlo (1997) destaca que vivemos em uma sociedade onde a escola se debilitou e a
cultura letrada já não hierarquiza as culturas. Existe um sentido de igualdade social e o único
empecilho é a desigualdade econômica. Todos pela lógica do capitalismo transmitido pelas
ondas da comunicação audiovisual somos consumidores universais, porém nessa
categorização alguns apenas são “consumidores imaginários”, diz a autora.
O caminho apontado por Sarlo (1997) para se reverter (desconstruir) esse contexto é a
escola utilizar/ trabalhar com eficácia as habilidades que seus alunos adquiriram em outros
ambientes como sua experiência através dos videogames ou pelos conteúdos oferecidos pela
mídia. Sarlo (1997) não acredita numa “pureza” hipotética das culturas populares que na
verdade, a seu ver, elas nunca tiveram.
As palavras infância e cultura, neste estudo são escritas no plural, pois conforme
Barbosa (2006, p. 82) no Brasil conviveram e convivem diferentes infâncias, passadas por
uma história de desigualdades sociais, de dificuldades, mas também uma história de
brincadeiras e reconhecimento social. Neste texto não pretendemos explorar e resgatar a
história da infância, mas cabe a nós educadores um estudo aprofundado da história da infância
em especial no contexto brasileiro, o que contribui para um pensar de ações mais
comprometidas no presente, remetendo-se as possibilidades de ações pensadas ao futuro.
Para Hall (1997), toda a ação social é cultural, sendo que a ação social é significativa
tanto para aqueles que a praticam quanto para os que a observam, e a cultura constitui um
conjunto diferenciado de significados.
No momento histórico em que ocorreram várias transformações sociais promovidas
por sujeitos individuais, as velhas identidades, que por tanto tempo estabilizaram o mundo
social, estão em declínio, fazendo surgir novas identidades e fragmentando o indivíduo
moderno, até aqui visto com um sujeito unificado. Conforme HALL (2006) as identidades
modernas estão sendo “descentradas” (p. 8); um tipo diferente de mudança estrutural está
transformando as sociedades modernas no final do século XX (p. 9).
Isso está fragmentando as paisagens culturais de classe, gênero, sexualidade, etnia,
raça e nacionalidade, que, no passado, nos tinham fornecido sólidas localizações como
indivíduos sociais. Estas transformações estão também mudando nossas identidades pessoais,
abalando a idéia que temos de nós próprios como sujeitos integrados. Esta perda de um
“sentido de si” estável é chamada, algumas vezes, de deslocamento ou descentração do sujeito
(HALL, 2006, p. 9).
Williams (1992) diz que sociologia cultural se confunde com sociologia histórica, pois
para estudar a sociologia cultural, tem que se analisar em um determinado período histórico
aquele contexto, por isso se diz que cultura é tradição, é o significado das palavras em um
determinado tempo e contexto. Aqui cabe, o exemplo: o paulista entende o gaúcho como
aquele que anda a cavalo, usa bota e bombacha, sendo assim nas escolas da cidade de São
Paulo estuda-se a cultura gaúcha histórica, como a cultura atual. Pelo exemplo, percebemos
claramente que se confunde estudo sociológico cultural com a história. Trata do estudo
empírico local que é generalizado (o individual é generalizado, pois o gaúcho é aquele que
anda a cavalo nos pampas, sendo que os pampas, ficam somente na parte sul do Rio Grande
do Sul). Assim Williams (1992) pensa que é fundamental, ter este estudo empírico, como
ponto de partida, para questionar a realidade. Estes aspectos trazidos por Williams (1992) são
reafirmados por Hall (2006), quando este traz as culturas nacionais como sendo compostas
não apenas de instituições culturais, mas também de símbolos e representações (p. 50), sendo
a nação uma comunidade imaginada.
A instituição escolar para Santomé (1995, p. 163) se caracteriza pelas ausências e os
ocultamentos dos modos de vida dos grupos infantis e juvenis, tanto na atualidade quanto no
passado, e no campo social o adultocentrismo de nossa cultura nos leva a uma ignorância
realmente grande acerca do mundo idiossincrático da infância. O autor descreve que as
crianças desconhecem por que são crianças, todo seu mundo de relações, predileções,
interesses, jogos e brinquedos, é objeto de atenção, de reflexão e crítica apenas no quadro das
instituições acadêmicas. Por este fato é que nos colocamos neste estudo como acadêmicos e
educadores, mas se estas questões não tivessem sido estudadas e elencadas na academia,
talvez não fosse possível uma reflexão acerca dessa nova postura que apresentamos no viés
das culturas infantis. Evidenciamos que este estudo só foi possível devido as nossas vivências
na academia e na escola, nos colocamos enquanto docentes na educação com crianças com
uma nova postura frente à empiria já descrita no estudo.
Santomé (1995, p. 163) descreve que a relação dos adultos com as crianças perpassam
um notável grau de sentimentalismo por parte das pessoas adultas, que colocam a infância em
um mundo paradisíaco, costuma-se contemplar as pessoas nessa fase de desenvolvimento
como: ingênuas, inocentes, desvalidas, etc., e, portanto, sem maiores preocupações, interesses
e desejos. Esta concepção traz como conseqüência um silenciamento de outras infâncias mais
reais (SANTOMÉ, 1995), e até mesmo nós professores passamos a ver como absurdas e
condenamos algumas ações que nossos alunos têm na escola, não considerando a criança
como produto da cultura e das influências do meio no qual o sujeito infantil está inserido,
desconsiderando assim a realidade e as individualidades subjetivas.
Considerações finais: entrelaçando novos fios
A discussão das produções culturais que permeiam o universo infantil, permitiram
neste estudo um entrelaçar de novos fios a nossa constituição docente, afim de ressignificar
nosso trabalho enquanto profissionais docentes. Considerando as várias nuances que
perpassam os estudos acerca da Infância e das Escolas de Educação Infantil, o que valida as
reflexões apresentadas é a possibilidade de olhar para as relações e os elementos de gênero e
para as produções culturais.
Pelo viés apresentado neste estudo, possibilitamos uma concepção de escolas como
“máquinas de sonho” (SIMON, 1995) enquanto conjuntos de práticas sociais, textuais e
visuais planejadas para provocar a produção de significados e desejos que podem afetar a
idéia que as pessoas têm de suas futuras identidades e possibilidades.
Buscamos contribuir para um pensar do desenvolvimento de nossas práticas
específicas que rumem a consideração dos campos culturais que permeiam a nossa
“identidade cultural e as identidades culturais” (HALL, 2006) das infâncias que se apresentam
em nossas realidades escolares.
Portanto, enquanto professores, consideramos as culturas dos sujeitos que estão
envolvidos no processo de ensino e no processo de aprendizagem, ao passo que alunos e
professores juntos produzem culturas.
Referências
HALL, Stuart. A centralidade da cultura: notas sobre as revoluções culturais do nosso
tempo. Revista: Educação e Realidade. Porto Alegre: n. 22, p. 15-46, jul./dez., 1997.
HALL, Stuart. A identidade cultural na pós-modernidade. 11. ed. Rio de Janeiro: DP&A,
2006.
SANTOMÉ, Jurjo Torres. As culturas negadas e silenciadas no currículo. In: SILVA,
Tomaz Tadeu (org.). Alienígenas na sala de aula: uma introdução aos estudos culturais em
educação.Petropólis: Vozes, 1995.
SARLO, Beatriz. Cenas da vida pós-moderna: intelectuais, arte e videocultura na argentina.
3. ed. Rio de Janeiro: UFRJ, 1997.
SILVA, Tomaz Tadeu da Silva. Documentos de identidade: uma introdução às teorias do
currículo. 2. ed. Belo Horizonte: Autêntica, 2005.
SIMON, Roger. A Pedagogia como uma tecnologia cultural. In: SILVA, Tomaz Tadeu
(org.). Alienígenas na sala de aula: uma introdução aos estudos culturais em
educação.Petropólis: Vozes, 1995.
WILLIAMS, Raymond. Cultura. 2. ed. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1992.
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