DAVID HILL E A FUNÇÃO ÉTICA DO HISTORIADOR:
EXPECTATIVAS DO TRABALHO HISTORICO NAS PRIMEIRAS
DECADAS DO SECULO XX
Marcos Antonio de Oliveira Soares
Universidade Federal de Goiás (UFG)
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A partir de reflexões historiográficas acerca da Historia como ciência no fim do
século XIX e inicio do XX, é feita a pergunta, este debate se restringiu ao continente
Europeu ou isso foi recorrente em outros núcleos de pesquisa Histórica?
Se isso não ficou restrito, como esse debate reflete o pensamento da historia
como ciência em outros núcleos de pesquisa externos ao continente europeu, como a
Inglaterra e Estados Unidos? Com questionamentos como este teve inicio a uma
pesquisa que pretende buscar em autores fora da tradição historiográfica continental
européia, autores que auxiliasse nesse debate, para ajudar a refletir sobre os estudos
históricos a partir da afirmação da historia como ciência, o resultado dessa busca foi o
encontro de diversos autores que trouxeram interessantes contribuições acerca de
refletir da Historia como ciência, onde minha busca ficou restrita ao Estados Unidos
no fim do Século XIX e inicio do XX.
Dentre esses autores venho a apresentar o autor David Hill com Titulo; A
função Ética do Historiador editado no Nr. 1 da XIV edição da revista The American
Historical Review que nos traça interessantes considerações acerca da reflexão da
historia como ciência a partir do ano de 1908.
David Hill levanta questões que refletem não só a historia como ciência, mas
como a questão da verdade na historia e a critica documental levando em
consideração a validade do documento, partindo da comprovação do testemunho e a
autenticidade do documento, isso é interessante pois em muito se assemelha ao que a
escola dos análise debate no pós-guerra, apesar de se tratar de um outro contexto, a
quem se atribui uma revolução na forma de tratar o documento e seus relatos, onde é
entendido como marco na luta pela afirmação da historia como ciência e na
transformação da forma de se ver o documento.
São questões que o autor reconhece a complexidade e busca da melhor forma
responder tais questões uma vez que isso parte de uma reflexão antes da filosofia que
da historia mais propriamente.
Para David Hill o que é historia esta ligado mais propriamente ao “o que é a
vida humana”, definindo a historia como o registro do desenvolvimento humano, “Seja
qual for, na realidade, a vida humana, pode ser historia ela é o registro do
desenvolvimento humano, seu progresso e suas manifestações” nesse ponto
caracterizar a historia como um registro seria considerá-la como algo mais valido, mais
criterioso no que rege o relato em detrimento do registro seria uma validação da
historia como um saber criterioso digno de uma ciencia e não simplesmente um mero
relato, fazendo do historiador um ente preocupado com a validade do que se baseia
sua pesquisa, necessitando de um filtro dos quais os mecanismos pra se obter a
verdade do acontecido foram provador e aprovados tendo eles como validado,
iniciando pelo critério de se definir como original o documento, em buscas dessas
respostas o autor se ampara em estudos de Jean Mabillon i, com a obra De Re
Diplomatica e Louis-Sibasties Le Nain de Tillemontii autor de Historia dos
imperadores e os princípios que tem reinado
¹
Frei Frances que viveu entre 1632 e 1707, criador da paleografia considerado por David Hill o
autor da ciência que determina a autenticidade do documento autor da obra De Re
Diplomática .
iiii²
Eclesiástico Frances que viveu entre 1637 1698 que de acordo Monod “foi o primeiro a
ensinar como verdade histórica é determinada por uma analise rigorosa e comparação de
textos”.
os seis séculos da Igreja, sendo Mabillon um analítico da escrita que propôs a
analise da autenticidade da escrita através da Paleografia e Tillemont um analista da
argumentação escrita sendo um dos primeiros a utilizar a comparação documental
para se fazer historia com uma profundidade na analise textual e a busca de uma
valoração da comparação de relatos escritos na construção da historia uma vez que
segundo Hill “É a valoração da verdade, simplesmente porque é a verdade que esta
por trás e vitaliza toda nossa concepção de ciência moderna e obrigou-nos a
reconstruir toda a nossa concepção do universo e nosso passado humano”(Hill, 1908
pag.11).
Esta nova forma de se pensar o mundo criado pela modernidade que germinou
uma ciência cada vez mais pragmática trás sua nova forma de se ler o mundo, a forma
cientifica que criou em se desenvolveu em seu cerne a capacidade de se descrever o
mundo
matematicamente
passando
a
se
compreender
ciencia
como
algo
exclusivamente quantitativo, o que David Hill tenta mostrar é que a ciencia quantitativa
não é o bastante para se entender a mente humana e suas relações não é capaz de
equacionar valores humanos e pra isso é necessário se pensar qualitativamente, a
partir de uma forma já criada a forma ética o que iremos retomar mais tarde.
Em resposta a preocupação com a conceituação da verdade se faz um
questionamento
Qual então é a forma de se estabelecer a verdade e quais as funções para qual
o autor necessita estabelecê-la.
“...Há, no entanto, tanto a maior necessidade de compreender
exatamente a natureza essencial da verdade histórica e distingui-lo
tanto quanto possível, a partir do grande corpo de conceitos que
constituem a ideologia filosófica da época em que vivemos, pois
enquanto as diferentes ciências freqüente lançar luz sobre um outro, e
nossa concepção cósmica, como um todo, pode receber contribuições
valiosas de todos eles, cada um deles pode também sofrer
contribuições valiosas de todos eles, cada um deles pode também
sofrer uma lesão por importação injustificada de princípios neles
emprestados em outras ciências que possuem um caráter diferente.”
(Hill p.6 1908)
Nesse ponto o autor se mostra preocupado com a questão de se compreender
a natureza da verdade histórica, qual é seu sentido e como se valida, uma vez que a
forma de conhecimento através de grandes mitos não mais transmite o cientificamente
desejado, onde os cronistas não mais satisfazem a necessidade de verdade e
transmitem um amontoado de fatos preenchidos com imaginação mesclado a mitos
sem compromisso com a verdade dos acontecimentos, portanto sem critério e ao
mesmo tempo a importação pura e simples das ciências da natureza para trato da
historia não caberia dentro da argumentação histórica, a conceituação do argumento
histórico não se dá da mesma forma, uma vez que na historia é o registro do
progresso humano ele trabalha com valores.
A historia tem um caráter sucessivo com ele mesmo descreve a historia
aparecendo como “ . . . uma ordem de sucessão no tempo, e é com essas
transformações no tempo que a historia tem de lidar” nesse instante já importante as
transformações do homem no tempo uma vez que seria insuficiente tratar as reações
humanas pura e simplesmente através de dados quantitativos.
Refletir historicamente é muito mais propriedades de um exercício qualitativo do que
uma reflexão quantitativa, David Hill leva em consideração etapas do desenvolvimento
da natureza onde estaríamos no topo desse estagio de evolução a natureza partiria do
principio físico, para o físico químico dai para o biológico até chegar aos fenômenos
psicológicos que de uma escala ascendente se chega-se ao homem, havendo um
diferencial qualitativo na escala psicologia com os demais animais o que o coloca num
grau de complexidade sendo o ser humano o ser mais complexo psicologicamente do
que qualquer outro ser na natureza conhecido pela ciência, sendo a ciencia da
natureza um mecanismo de estudo valido até o nível biológico estaria atendendo
satisfatoriamente, no entanto com o ser humano os fatores psicológicos que só
poderia se compreendido de forma qualitativa não poderia ser mensurados uma vez
que ele transcende o quantum e atua na formulação de conceitos e valores não
matematicamente descritos.
“...vida social do homem o progresso da civilização a formação
e o desenvolvimento das instituições políticas a ascensão e queda de
impérios, as relações entre estados independentes, todas essas
transformações pertencem a esfera
de transformações qualitativa
sendo desafiadoras aos cálculos matemáticos que necessita de um
instrumento de comparação e compreensão”.(Hill p 8 1908)
A distinção das questões da ciências exatas para as ciências humanas é de
que enquanto as ciências da natureza esta preocupada com o “quanto” de recorrência
há no objeto de pesquisa e a partir dai vai em busca de suas transformações as
ciências humanas estariam preocupadas com “de que tipo” ocorreriam as
transformações, sendo elas relevante para esse tipo de ciência pois um evento nunca
ocorre da mesma forma duas vezes podendo ser repetido em suas estruturas mas
nunca será idêntico ao outro nem poderia ser reproduzido com os mesmos efeitos.
“O objetivo primeiro a descobrir as uniformidades que existem
no espaço e no tempo, ou seja, para atingir o maior numero possível de
generalizações as leis de ação invariável. O objetivo da historia é
exatamente o oposto. Não procurar a lei de recorrência, ou qualquer
outro elemento de uniformidade no espaço ou no tempo, mas para
saber quais mudanças especificas ocorreram em um tempo definido, a
fim de estimar as suas relações como uma serie de atos, ou de
apreciar o seu valor e importância como manifestações do aspecto
qualitativo do universo.” (Hill, 1908 pag.13)
Nesse ponto David Hill busca uma finalidade para historia num critério
comparativo temporal no intuito de se compreender as transformações do homem ao
longo do tempo e assim produzir conhecimento antes de leis de recorrência ou
regularidades históricas.
Voltando a uma questão terminológica do porque se utilizar a “Função Ética do
Historiador” ao invés da “Função do Historiador” onde para o autor em uma
contraposição da natureza de pesquisa a área da matemática atuante como uma
ciência quantitativa e a ética (na falta de um termo melhor) como uma ciência
qualitativa, sendo ambas mecanismos de compreensão do universo humano
descrevendo uma atuante no quantidade física de matéria e a ética tratando de
valores humanos descrevendo a natureza humana em suas relações e transformações
pautada em construção e desconstrução de valores, seja na ordem das instituições
comportamento ou no simples caráter de símbolos através da linguagem.
Onde o historiador não seria com um juiz moral, apesar de não poder esta
isento de um ponto pra se refletir o passado, mas a partir de ações humanas iria
refletir seu passado, em busca de recorrências e diferenças que ajudasse a
compreender o próprio passado a partir de ações seja coletivas ou individuais
buscando sentido no emaranhado de ações do presente que só podem ser
compreendidas historicamente, como ele mesmo trata, “Todo grande movimento
histórico é uma luta em que forças contrarias se opõem”.
O autor encerra:
“É bom para a humanidade a perceber que, embora vivendo em um
universo regido por leis como um resultado da sua liberdade que por
vezes tem errado e que, sem uma adesão fiel a grandes princípios, que
podem
dar
errado
novamente.
O
melhor
antídoto
pra
esta
eventualidade é uma verdadeira ciência do passado. Mas, seja pra o
bem ou para o mal, como homens de ciência, lidar como o aspecto
maior mais instrutivo do desenvolvimento humano, os historiadores
estão vinculados por essa consciência cientifica, que é o teste, o
emblema e a gloria de sua profissão para desvendar a realidade e dar
sentido a palavra “Die Weltgeschichte ist das Weltgericht””³.(Hill p.21,
1908)
Este é um exercício que pretende ser o primeiro de uma serie de outros que
virão em busca de autores que debatem a expectativa da historia como ciência, no
intuito de se contribuir ao o que recorrentemente estamos acostumados no intuito de
encontrar uma outra forma de se construir uma historia cientifica, buscando nos
primórdio de sua racionalização as diferentes necessidades na construção da historia
que viria só a enriquecer nossa forma de fazer historia.
³ A historia do Mundo é o Tribunal do Mundo
BIBLIOGRAFIA
MARTINS; Estevão C. de Rezende. A dinâmica do Historicismo: Revisando a historiografia
moderna, Belo Horizonte, v. 6 p. 15 - 48, 2008.
GARDINER, Patrick L., Teorias da historia
HILL, DAVID J., The Ethical Function of the Historian, The American Historical Review, Nova
York
Vol. XIV Nr. I. p. 9-21, 1908
MATA, SERGIO DA, Elogio do Historicismo: Revisando a Historiografia Moderna, Belo
Horizonte, pag. 49 a 61,ano: 2008.
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