Influência de variáveis ambientais e relações florísticas em um ecótono entre floresta estacional decidual e semidecidual, no sudeste do Brasil. Hisaias de Souza Almeida¹; Eduardo van den Berg¹; Isaias E. Paulino Carmo¹ & Carlos A. Melo de Almeida Palavras-chave: Espécies raras, Variáveis Edáficas, Composição de Espécies e Calcário. Introdução12 As florestas estacionais são fitofisionomias que naturalmente abrigam extensas áreas econtonais (transições), tanto com fitofisionomias savânica (Cerrado) quanto florestais (Rizzini 1997). Estes ambientes são compostos por intensas variações ambientais, que em muitos casos permitem a existência de uma estrutura e flora peculiar, com considerável diversidade. Por outro lado, apesar da grande importância ecológica destes ambientes, pouco se conhece sobre os processos ecológicos e as relações entre o meio e as comunidades encontradas nas regiões ecotonais brasileiras. Assim, este trabalho teve por objetivo verificar a influência das correlações entre variáveis ambientais e a distribuição e abundância das espécies arbustivo-arbóreas, em uma área ecotonal entre floresta estacional decidual e semidecidual, no sudoeste de Minas Gerais. a altura do peito ou 1,3m do solo) 10,0cm. Além disso, em cada parcela foram coletadas amostras compostas de solo superficial (0,5L entre 0-20cm de profundidade). As amostras foram submetidas a análises texturais, fertilidade (pH, P, K, Ca++, Mg++, H+, Al, S, SB, T, V, Mo, P-rem) e de micronutrientes (Zn, Fe, Mn, Cu e B). Foram mensuradas ainda a profundiade do solo (P>60cm e P<60cm), proporção de pedras afloradas e variáveis de relevo (cota média, desnível e declividade média). Para testar o nível das correlações entre as variáveis e a composição e abundância das espécies, foi utilizada a análise de correspondência canônica (CCA). Após uma análise preliminar foram eliminadas 18 variáveis ambientais, por serem altamente redundantes ou pobremente correlacionadas, com os dois primeiros eixos de ordenação. Assim, permanecendo apenas as variáveis SB, S, Fe e P>60cm. Material e Métodos O trabalho foi realizado em um fragmento de aproximadamente 150ha no município de Arcos, sudoeste de Minas Gerais (Figura 1). O remanescente é composto por um mosaico vegetacional, entre florestas deciduais, semideciduais e Cerrado. Assim, foram alocadas 30 parcelas de 400m² (10 × 40m), distanciadas 10m entre si e distribuídas sistematicamente em três transectos, eqüidistantes 60m. Os transectos foram dispostos perpendiculares à faixa do ecotono floresta decidual/semidecidual. Em cada parcela foram mensurados e idenficados todos os indivíduos com CAP (circunferência Resultados e Discussão Foram amostrados 2.911 indivíduos, distribuídos em 77 espécies, 68 gêneros e 32 famílias. A família Fabaceae ocupou o primeiro lugar em número de espécies (Faboideae – 11; Mimosoideae – 3, Caesalpinoideae – 1 e Cercideae – 1), seguida por Euphorbiaceae (7), Malvaceae (4), Apocynaceae (4), Meliaceae (4), Myrtaceae (4) e Rubiaceae (4). Os dois primeiro eixos de ordenação da CCA apresentaram autovalores inferiores a 0,50 (Eixo 1 – 0,39; Eixo 2 – 0,11), indicando um gradiente curto, ou seja, grande parte das espécies ocorrem ao longo de todo o gradiente, variando essencialmente o número de indivíduos nas populações (ter Braak 1988). A variância cumulativa total explicada também foi relativamente baixa (Eixo 1 19,50% e eixo 2 - 24,80%), todavia a 1 2 Universidade Federal de Lavras, Departamento de Ciências Florestais - DCF, Lavras, MG, Brasil. ([email protected]); Universidade Federal de Lavras, Departamento de Biologia – DBI, Lavras, MG, Brasil. expressiva percentagem de variância inexplicada é comum em trabalhos com vegetação e não interfere na significância das relações espécie-ambiente (ter Braak 1988). Isto pode ser evidenciado pela alta correlação espécie x ambiente (Eixo 1 – 0,92 e Eixo 2 – 0,92) e pelo teste Monte Carlo que apresentou valores significativos (Eixo 1 – F = 5,811 e P = 0,002; Demais Eixos – F = 2,666 e P = 0,002). É possível observar, pelo diagrama de ordenação, dois grupos de parcelas distintos e com tamanhos semelhantes, correspondentes às fisionomias decidual e semidecidual (Figura 2). O grupo de parcelas semideciduais, lado direito do diagrama, é formado pelas cinco primeiras parcelas de cada transecto, mais a parcela seis do transecto um (T1p6). Já as parcelas no lado esquerdo do diagrama correspondem ao grupo com fisionomia predominantemente decidual. Dentro de cada fisionomia, a distribuição das parcelas manteve-se relativamente homogênea. Embora as fisionomias possam ser classificadas como Floresta Estacional Decidual e Semidecidual Montana (Veloso et al. 1991), 13% das espécies da fisionomia semidecidual são indicadoras do grupo de florestas semideciduais de baixa altitude (Oliveira-Filho & Fontes 2000). Além disso, a composição de espécies e a estrutura das populações mostraram padrões diferenciados de outras fisionomias semideciduais e deciduais, com o predomínio de espécies de rara ocorrência como Brasiliopuntia brasiliensis (Willd.) A.Berger, Actinostemon concolor (Spreng.) Müll.Arg. e Pachystroma longifolium (Nees) I.M.Johnst. (OliveiraFilho 2006). Tais singularidades podem ser reflexo da presença de um ambiente favorável a estas espécies (Machado et al. 2004), somado a ausência de competidores potenciais (Pacala & Roughgarden 1982). O primeiro eixo da CCA foi mais forte e positivamente correlacionado com a variável P>60, seguido por SB (negativo), Fe (positivo) e por percentagem de pedras afloradas (negativo). Já no segundo eixo de ordenação, apenas a percentagem de pedras afloradas apresentou correlação superior a 0,40 (positiva), indicando certa homogeneidade ambiental no interior das fisionomias. A profundidade do solo foi a principal variável responsável pela separação das fisionomias e a proporção de pedras afloradas, que pode ser considerado como uma medida indireta de drenagem foi, junto com a soma de bases, as principais responsáveis pela distribuição das espécies deciduais. Por outro lado, a topografia têm sido considerada como um dos principais fatores responsáveis pela intemperização dos solos em florestas tropicais, podendo interferir diretamente no regime de água do solo (Oliveira-Filho et al. 2001) e conseqüentemente na disponibilidade de nutrientes. No presente caso, o status nutricional e a concentração de Fe no solo também influenciaram diretamente a separação das fisionomias e a topografia, provavelmente, contribuiu para estas variações (Raij 1981). Foi possível evidenciar neste trabalho, que as duas comunidades avaliadas compartilham um considerável número de espécies, todavia apresentaram padrões de distribuição e densidade das espécies diferenciados. Isto deve-se, em parte, às distintas correlações que cada comunidade (decidual e semidecidua) estabeleceu com as variáveis ambientais selecionadas. Agradecimentos O primeiro autor agradece a CAPES, pelo apoio financeiro. Referências Bibliográficas MACHADO, E.L.M.; OLIVEIRA-FILHO, A.T.; CARVALHO, W.A.C.; SOUZA, J.S.; TRIST, R.A. & BOTEZELLI, L. 2004. Análise comparativa da estrutura e flora do compartimento arbóreo-arbustivo de um remanescente florestal na fazenda Beira Lago, Lavras, MG. Revista Árvore, 28(4): 493-510. OLIVEIRA-FILHO, A.T. 2006. Catálogo das árvores nativas de Minas Gerais. Lavras, UFLA, 423p. OLIVEIRA-FILHO, A.T.; CURI, N.; VILELA, E.A. & CARVALHO, D.A. 2001. Variation in tree community composition and structure with changes in soil properties within a fragment of semideciduous forest in South-Eastern Brazil. Edinburgh Journal Botanic, 58(1): 139-158. OLIVEIRA-FILHO, A.T.; FONTES, M.A. 2000. Patterns of floristic differentiation among Atlantic Forests in southeastern Brazil and the influence of climate. Biotropica, 32(4b): 793-810. PACALA, S.; ROUGHGARDEN, J. 1982. Resource partitioning and interspecific competition in two two-species insular Anolis lizard communities. Science, 217: 444-446. RAIJ, B.V. 1981. Avaliação da fertilidade do solo. Piracicaba, Institutos de potassa (EUA-Suiça), 142p. RIZZINI, C.T. 1997. Tratado de fitogeografia, 2rd edn. Rio de Janeiro, 746p. TER BRAAK, C.J.F. 1988. Canoco – a fortran program for canonical community ordinatin by (Partial) (Detrended) (Canonical) correspondence analysis and redundancy analysis, version 2.1. Wageningen, Technical report LWA-88-2 TNO. VELOSO, H.P.; RANGEL-FILHO, A.L.R. & LIMA, J.C.A. 1991. Classificação da vegetação brasileira adaptada a um sistema universal. Rio de Janeiro, IBGE, 124p. a tam ua Ig 9k m São Fra nc isc o Brasília - DF Arco s São Paulo km Área amostrada Minas Gerais Belo Horizonte Rio Goiás Arc os 1 2 Miguel Rio São Bahia Belo Horizonte ARCOS Figura 1. Localização geográfica da área de estudo, no município de Arcos, MG. 80 T2p7 T2p8 60 T2p5 T3p9 Eixo 2 T1p7 T3p10 T2p6 T1p8 40 S T3p8 SB T3p6 T1p4 T2p9 T1p3 T3p5 T2p3 T2p4 T1p1 P>60 T3p7 Fe T1p5 T1p10 T3p4 T1p2 T2p2 T1p9 Pedra T3p2 20 T3p3’ T2p1 T1p6 T2p10 T3p1 0 0 40 80 Eixo 1 Figura 2. Ordenação nos dois primeiros eixos da análise de correspondência canônica, para 30 parcelas amostras em um ecótone floresta estacional decidual/semidecidual, em Arcos sudoeste de Minas Gerais. ▲- Parcelas alocadas na porção decidual do fragmento e - Parcelas alocadas na porção semidecidual do fragmento.