Meu Nininho
Afinal hoje estive à tua espera desde as 5 para as 5 até às 6 h, e não houve
forma de te ver, nem tão-pouco te interessaste em combinar forma de nos falarmos amanhã.
Eu vou enviar esta para tua casa, mas como não tenho cá nenhum selo, tenho que pedir a
minha mãe que m’o compre logo de manhã e não sei se ela poderá fazê-lo.
No entanto conto estar na Av. das Cortes, cinco ou dez minutos depois do meiodia. Amanhã também vou para a Mademoiselle, mas como nada combinaste, estou sem saber
o que hei-de fazer. Estarei também às 8 horas no Cais do Tojo, ao pé da padaria inglesa. Se
quiseres mandar carta à minha irmã prevenindo ou combinando algum local ou hora, manda,
mas até às seis ou pouco mais das 6.
Afinal passaste às 7h com o teu primo; nem ao menos me cumprimentaste!! Tens
empenho em ocultar o nosso amor a teu primo? Ele olhou para cima, e pareceu-me depois, vêlo sorrir, ele disse-te alguma coisa? Eu de propósito continuei sempre seguindo-te com o olhar
e quando paraste a falar a quem encontraste, ele viu bem que eu não tinha tirado os olhos de
ti. Mas tu não te dignaste olhar para trás.
Hoje recebi um postal do tal escritório [a] que eu fui com minha mãe: dizendo
para me apresentar segunda-feira à 1 hora da tarde.
Hoje como a minha mãe foi a casa de minha irmã viemos mais tarde, e enquanto
elas faziam o que tinham a fazer, eu e o meu sobrinho fomos passear até à Avenida, ouvimos
um bocado de música depois viemos para baixo [,] fomos pela Rua 1.º de Dezembro e demos
a volta ao Rossio e fomos para casa, e na Rua 1.º de Dezembro vi o Pantoja com dois rapazes
[,] mas creio que ele não me conheceu. Ele ia muito animado!! Teria bebido aguardente??...
Adeus Ibis mau, até amanhã, nem sei a que horas, não sei nada.
Beija-te muito a sempre tua
Ofélia
12-8-1920
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Carta Ophélia 6 - Casa Fernando Pessoa