Capítulo 1
“50% de desconto!”
Olhando para a grande placa vermelha, Paul White se perguntava aonde seus sonhos tinham dado
errado. Eu realmente não tenho forças para mais um daqueles dias, pensou, e tomou outro gole de sua xícara
de café recém-moída. Depois de tomar um longo fôlego, Paul ajeitou o blazer azul, e entrou na filial da
Hannah’s Shop de Boca Raton.
Plaquinhas vermelhas promovendo os descontos, miniaturas da maior lá de fora, decoravam a loja.
Como gerente da loja, ele depositava muita esperança no sucesso desta venda. No entanto, as filas dos caixas
não estavam mais longas do que o habitual, e os produtos à venda ainda se empilhavam. Os preços mais
baixos não eram um incentivo suficiente.
Passando a mão pelos cabelos grisalhos, Paul deu de ombros.
Havia alguma coisa que pudesse ser feita?
Não era novidade que esta loja não era um enorme sucesso, mas esta manhã Paul havia recebido o
relatório mensal. A loja de Boca despencara para o oitavo lugar em rentabilidade entre as dez da região. Foi
uma nova baixa para ele.
Tentando se livrar da sensação desconfortável, ele caminhou pelos 3.200 metros quadrados que
compunham os seis departamentos sob sua responsabilidade. Ele passou pelos lençóis e edredons, salpicados
de azul e verde, cuidadosamente dispostos. Paul parou por um momento para examinar o banheiro que haviam
montado, onde toalhas espessas e compridas pendiam ao lado de roupões. Diante dele estavam os artigos
têxteis de cozinha, aventais e toalhas se misturavam, ao lado de toalhas de mesa que se combinavam a
guardanapos de pano e jogos americanos em tons outonais. O departamento de carpetes e tapetes
apresentava cores e texturas do mundo todo e, em seguida vinham as cortinas fluidas em tons de branco, ouro
e prata.
A loja sempre tivera uma grande variedade de produtos, e sempre se esforçara para manter uma bela
disposição. Tentando constantemente atender aos seus clientes, Paul tinha iniciado um plano de trabalho de
alterar o interior da loja duas vezes mais que as vitrines. A loja oferecia preços atrativos e promoções, mas as
vendas ainda não decolavam. Havia alguma coisa que poderia ser feita?
Uma jovem estagiária passou e o cumprimentou. Paul devolveu a saudação com um largo sorriso,
enquanto que em seu interior, pensava que se ele não aumentasse mais as vendas, talvez algumas pessoas
fossem ser demitidas. Não era algo que ele queria fazer, mas cortar um membro da equipe de vendas
significava uma economia de cerca de vinte mil dólares ao ano. Ao olhar ao redor, ele viu que, mesmo não
estando no meio da correria de um feriado, todos os seus vendedores estavam ocupados. Não havia como
dispensar algum deles sem colocar algumas vendas em risco. A loja estava funcionando a custos de pessoal
razoáveis.
Então, o que mais poderia ser feito?
“Com licença, moça,” Paul ouviu uma senhora idosa de óculos bronze falando com a Janine, uma de
suas gerentes de departamento. Apontando para uma toalha de mesa de cor castanha, ela perguntou: “Você
tem isso na medida de 1,50m?
“Infelizmente, não”, respondeu Janine. “Ainda temos duas de 2,25 metros nesta cor, e a de 1,50m só
em azul e bege. A senhora prefere em outra cor? Talvez uma com uma estampa diferente?”
“Não, obrigada. É para minha irmã, e sua cor preferida é castanho”.
Quando a senhora idosa se virou, decepcionada, Paul se aproximou dela. “Com licença, senhora”, ele
ofereceu, tentando não fazer sombra sobre ela, apesar de seus 1,90m.
“Talvez eu possa ser útil. Gostaria que eu visse se consigo a toalha em uma das lojas da rede nas
proximidades?”
Ela concordou, e foi feita uma ligação à loja de Boynton Beach. “Gary, você possui uma toalha de mesa
castanho, série ktl-1860? É daquelas de 1,50m.”
“Vou checar,” disse Gary numa voz nasal, e Paul podia ouvi-lo falar com seu pessoal do outro lado da
linha. “Sim, nós temos, mas apenas uma”.
“Eu tenho uma cliente que gostaria de comprá-la. Há como você me enviá-la?”
“Desculpe, Paul, não posso.”
“Eu acho que é isso que vocês chamam de trabalho em equipe”, disse Paul amargamente, revirando os
olhos.
“Se realmente quiser falar em trabalho em equipe, em vez de eu lhe enviar a toalha de mesa, que tal
você me enviar a cliente aqui? Vai ser uma trabalheira a menos para todos”.
Decepcionado com seu colega, Paul decidiu tentar outro caminho. Ele ligou para Roger, o gerente do
depósito regional. Suas filhas frequentavam a mesma escola, e as famílias tinham se tornado amigas. “Oi, Rog.
Desculpe incomodá-lo, mas eu tenho um pedido. Será que me consegue uma toalha série KTL-1860?”
“... Ok, Paul. Posso adicioná-la à sua próxima remessa, na quarta-feira.”
“Obrigado, Roger, vou verificar novamente com a cliente e ligo de novo.”
Paul desligou e virou-se para a senhora idosa. “Minha senhora, fico feliz em informar que a toalha pode
estar aqui na quarta-feira”, relatou ele, com o melhor sorriso de serviço ao atendimento ao consumidor que
conseguiu dar.
“Oh, eu não sei não”, disse ela, friamente. “Eu estou ocupada nas quartas-feiras, e não quero deixar
para a última hora. Talvez, se tiver tempo, eu passe aqui.”
Paul observou desanimado ela sair da loja e amaldiçoou baixinho o fato de ter se preocupado em
intervir. Ele tinha apenas piorado sua situação. Era quase certeza que essa mulher não ia voltar para comprar
a toalha de mesa. Isso significava que a toalha ia acabar como excedente para a loja. Ele já estava fazendo
uma liquidação para se livrar do excedente, com pouco ou nenhum lucro. Não havia necessidade de encher a
loja de itens que não seriam vendidos rápido o bastante. Mas se ele não pedisse e ela voltasse, ela ficaria tão
decepcionada que ele não só perderia uma venda, mas uma cliente. Arriscar-se a perder vendas ou ficar com
excedentes? Este dilema o atormentava. Não admira que os lucros de sua loja não fossem mais elevados. Se
ele soubesse exatamente o que os clientes comprariam...!
Ele ligou para Roger novamente. “Mande-me a toalha de mesa, por favor, Rog. Vou preencher o
formulário de pedido especial quando voltar para minha mesa. Só espero que alguém a compre”, e então Paul
acrescentou: “Roger, você tem uma bola de cristal no estoque?
“Pedi duas à matriz, mas me disseram que vai demorar um pouco.” O sorriso de Roger era quase
audível.
Paul desligou, e ficou se perguntando novamente se havia algo mais que poderia ser feito para
aumentar a rentabilidade de sua loja. E a resposta foi um simplesmente não. Vendas versus excedente era um
dilema que só uma bola de cristal poderia resolver.
Capítulo 2
Caroline saiu da casa à beira-mar dos pais, levando com ela o celular de seu pai. Ao fechar as portas
de vidro, ela viu o reflexo de seus filhos brincando de pega-pega no grande gramado, entre a casa e a baía. As
palmeiras que ficavam de vigília ao redor da varanda que seus pais tinham recentemente reformado faziam
uma agradável sombra no final da tarde.
Caminhando em direção ao seu pai e ao seu segundo-no-comando, Christopher, Caroline passou por
trás de seu marido Paul, que estava conversando com sua mãe e uma amiga.
“Eu achei a obra de Muniz muito impactante”, disse Lydia, mãe de Caroline. “Uma homenagem
maravilhosa.”
“Estava tão bem organizada”, Jackie voltou-se para Caroline e perguntou: “Querida, você viu a abertura
da exposição de aniversário do Museu de Arte de Miami?”
“Não, eu estava fora na época”, respondeu ela.
“Eu levei Lisa e Ben à mostra,” disse Paul sorrindo.
Dando-lhe um beijo na bochecha, Caroline acrescentou: “Acho que as crianças gostaram,” e andou em
direção à churrasqueira.
“Pai, você está tão esquecido quanto Ben”, disse Caroline e entregou a Henry Aaronson seu celular.
Havia muitas semelhanças entre os dois. A filha tinha herdado o cabelo preto e os penetrantes olhos
castanhos, bem como a sua determinação obstinada. O homem corpulento e carismático pareceu surpreso por
ter esquecido o telefone.
“Ele sentiu muito minha falta?”, brincou. Henry fez uma pausa de virar os hambúrgueres na grelha e
rapidamente verificou se não tinha perdido nada de importante. Vendo que não havia ligações novas nem
novas mensagens de texto, ele deslizou o telefone para dentro do bolso.
Apontando para os netos que brincavam, ele acrescentou: “Se Ben herdou minha memória, espero que
também saiba arremessar como eu. Lembra-se do jogo contra o Colégio Miami, Christopher?”
O marido de Jackie era um palmo maior que seu melhor amigo e patrão. “Sim, eu me lembro de seus
arremessos indefensáveis. Também me lembro que antes estávamos discutindo algumas mudanças que
Caroline queria no novo sistema de informática. Acho que temos que parar de introduzir novas alterações.”
“Eu sei que o meu departamento precisa desse recurso. Não é uma questão de talvez. “Ela defendia
seu argumento com paixão. Caroline era chefe de compras da rede Hannah’s Shop, e se esforçava para atingir
a perfeição em todos os aspectos das aquisições. “Isso nos permitirá gerir as propostas e preços com muito
mais eficiência.”
“Minha querida”, respondeu Christopher. “Não podemos continuar fazendo mudanças. As chamadas
intermináveis melhorias vêm causando problemas há mais de um ano. Chega. Em pouco tempo, você estará
dando as ordens. Por ora, eu preciso que aceite que estas mudanças podem ser um desastre.”
“Acho que podemos considerar sua recomendação, se isso nos poupar dinheiro a longo prazo”,
interveio Henry. “Peçam uma avaliação da divisão de informática para mim até terça-feira.”
Vendo que Paul tinha se juntado às crianças, que estavam jogando uma bola, Caroline percebeu que
trabalhando, estava novamente perdendo preciosos momentos. As crianças estavam crescendo rápido, e antes
que ela se desse conta, esse tipo de diversão iria se tornar uma lembrança passageira.
“Sim, pai, pedirei a avaliação o mais rápido possível”, disse ela, e saltou para ficar entre Ben e Lisa.
“Eu também vou jogar”, gritou.
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Enquanto a sobremesa era servida, Henry levantou-se. Ele olhou para o pequeno grupo de familiares e
os amigos que tinham se reunido por causa do aniversário de Lydia. Caroline, Paul e seus filhos; o braço direito
de Henry, Christopher e sua mulher Jackie; Gloria, amiga de infância de Lydia e seu atual marido.
“Há uns quarenta anos eu me apaixonei pela garota mais bonita que já entrou na loja da minha mãe.”
disse Henry, enquanto segurava a mão da esposa com ternura. “Eu soube imediatamente que queria passar o
resto da minha vida com você. Como você já disse tantas vezes, e com razão, passei muito tempo no trabalho.
É hora de realizar meu desejo. Este ano será o meu último como presidente da Hannah’s Shop.”
“Henry, querido, você nunca a deixará – você ama muito essa empresa, repreendeu Lydia. “É o seu
bebê.”
“Então eu vou deixá-la para o meu outro bebê”, respondeu ele. “Caroline irá comandar o show
perfeitamente sem mim”.
Paul congelou na cadeira, e Caroline começou a protestar: “Pai, isso não é nem hora-”
“TIO DARREN!” gritou Ben com o homem bonito de cabelos pretos que estava parado, sorrindo
silenciosamente, na porta da varanda.
“Surpresa!” Darren exclamou, e se aproximou para abraçar Lydia. “Feliz aniversário, mãe! Eu teria
chegado mais cedo, mas houve um atraso no La Guardia.”
“Não haveria atraso nenhum se trabalhasse em Miami”, repreendeu Henry. “E então poderíamos ver
mais os gêmeos e não apenas nos feriados.”
“É bom ver você também, papai.” O irmão mais velho de Caroline sentou-se entre a sobrinha e o
sobrinho, dando um abraço a cada um. “Mas não acabou de dizer que vai ter muito tempo, talvez até para
visitar seus netos em breve?”
“Aceita alguma coisa?” interrompeu Lydia, como sempre, servindo de anteparo ao marido e ao filho.
“Podemos fazer um hambúrguer para você rapidinho.”
“Não, obrigado, mãe. Vou apenas querer duas porções de sobremesa”.
Caroline se inclinou e beijou o irmão na bochecha. Enquanto Paul servia bolo ao seu antigo colega de
quarto, disse: “Temos muito que conversar.”
Capítulo 3
“Eu poderia ter tomado um táxi, sabe”, disse Darren enquanto colocava o cinto de segurança.
Paul insistiu em levar o seu antigo colega de faculdade para o aeroporto. “Faz tempo que não temos
uma conversa tranquila, só nós dois. Achei que deveria aproveitar a oportunidade”, respondeu, esperando o
sinal de trânsito mudar. “Então, está saindo com alguém no momento?”
“Você combinou esse papo com a minha mãe? Não, não neste momento. O trabalho está me
ocupando muito.”
“Algum grande projeto não o deixa dormir?” perguntou Paul, ao virar o Grand Cherokee para a Broad
Causeway. O trânsito não estava muito pesado.
“Estou envolvido numa série de iniciativas, e qualquer uma delas pode se transformar de repente em
algo grande”, respondeu Darren, e seus olhos azuis cinzentos brilharam. “O mundo do capital de risco é cheio
de surpresas. Na verdade, eu acho que fechei um acordo de última hora uns quinze minutos antes de aparecer
lá ontem.”
“E eu pensando que tinha vindo para a Flórida para o aniversário de sua mãe,” disse Paul.
“De qualquer forma, eu tinha certeza que agora você não teria que se empenhar tanto em cada
negócio. As oportunidades não deviam estar atrás de você, e não vice-versa?”
“Sim, eu também pensava assim”, disse Darren, batendo os longos dedos na janela e olhando para a
água. “Mas até eu encontrar meu próprio nicho, é assim que funciona. Você precisa ter uma reputação de
especialista, para as oportunidades irem atrás de você.”
“Entendo. Então, até lá, você se mata para que outra pessoa possa ter lucros a longo prazo, enquanto
tudo o que lhe resta são os honorários de intermediário. Você não gostaria de ser o chefe, em vez de ser só o
intermediário?
“Espere aí, já vejo onde isso vai dar.” Darren se mexeu no banco para olhar diretamente para seu
cunhado. “Você está falando de investimentos ou de artigos de cama, mesa e banho?”
“Eu acho que você deve pensar em voltar para a empresa”, disse Paul, determinado. Entrando na I-95,
ele acrescentou: “Nós todos sabemos que Henry sempre o quis como seu sucessor.”
“De jeito nenhum vou voltar a dirigir a empresa para ele. Mudei-me para Nova York para conseguir meu
espaço”, afirmou Darren. “Além do mais, pelo que vejo, artigos de cama, mesa e banho é um ramo lento, nada
realmente muda. Com empreendimentos, o céu é o limite. Há sempre novas direções para se desenvolver,
sempre algo emocionante te esperando.”
“Sim, talvez esteja certo.” Mesmo sendo uma chance remota, Paul raciocinou, ele tinha que ver se a
determinação de Darren tinha arrefecido. Aparentemente, não tinha.
“Claro que estou certo”, foi a resposta. “Além disso, Caroline será uma boa presidente”.
“Ela será uma grande presidente, mas quando isso acontecer, eu não poderei deixar o empresa”.
“Deixar?” Darren ficou genuinamente surpreendido. “O que está falando?”
“Darren, sabe que estou empacado com esta loja.”
“Você já ficou empacado antes, e sempre que conseguiu sair e surpreender a todos. Estava
desesperado quando estava no Departamento de Aquisições e então teve a ideia daqueles critérios brilhantes
para abertura de novas lojas. Muito disso foi incorporado ao plano de expansão da empresa. Conheço você
melhor do que imagina, Sr. White.” O capitalista nunca tinha visto o seu melhor amigo tão abatido. Tentando
levantar o ânimo de Paul, Darren continuou: “Lembra na faculdade, quando ficou atrasado no último ano,
porque arrumava qualquer pretexto para ir visitar Cara na Flórida?
No entanto, foi o 3º melhor da nossa turma. “Estou confiante de que vai encontrar uma saída para sair
dessa.”
“Quem me dera ter a sua confiança”, Paul deu de ombros. “Desde que assumi em Boca, a loja só
despencou no ranking; este trimestre, caí para oitavo lugar.”
“Então, talvez não devesse estar no comando de uma loja. Você tem um tipo diferente de inteligência,
aquela necessária para gerenciar grandes sistemas. Na sua próxima promoção, você vai se achar de novo, e
se destacar.”
“Lembra-se da condição que impus quando entrei na empresa?” perguntou Paul retoricamente.
“Sem atalhos. Você queria começar por baixo. Para subir de uma posição a outra, e assim conhecer
todos os aspectos da empresa.”
“Sim, mas significa que insisto em não ser promovido a menos que eu mereça a promoção. A lição
mais importante que aprendi com meu pai foi que receber medalhas que você não ganhou, não mereceu de
verdade, é a coisa mais prejudicial para você, para sua autoestima, sua integridade”.
Outra das sábias palavras do Treinador White, pensou Darren. Elas são quase tão ruins como as
regras que meu pai cria sempre que pode.
Paul continuou: “Foi ideia minha começar das trincheiras e galgar posições, em vez de ser alçado para
um cargo executivo, por ser casado com a filha do presidente. Darren, se não quer se sentir como o filho
privilegiado, por que fica surpreso de eu nunca concordar em ser apenas o genro?”
“Não entendo qual é o problema. Você já trabalhou em vários setores na empresa, e tem uma vasta
experiência. Já provou seu valor em todas as etapas do caminho. O que mais você quer?”
“Quase todas as etapas”, rebateu Paul. “Em todas as outras funções, eu fiz uma mudança. Nem
sempre a maior mudança, mas de alguma forma, eu deixei alguma marca. Mas aqui, no coração do negócio da
Hannah’s Shop, no comando de uma loja, eu falhei. Talvez seja porque eu esteja na pior localização possível,
nesse shopping feio e velho. Talvez porque minha clientela é de senhoras ricas e aposentadas, e a rede é
voltada para a classe média. Todas essas desculpas não mudam o fato de eu não ter comprovado o meu valor
nesta etapa mais crucial.
“Talvez você só precise de um pouco mais de tempo?” disse Darren.
“É esse meu problema. Eu não tenho mais tanto tempo.” Paul parecia transtornado. “Eu estou lá há
três anos. Um ano atrás, a pressão para ascender começou, então enrolei o máximo que pude, tentando
ganhar tempo. Mas, a julgar pelo meu desempenho, existem muitas outras pessoas que merecem ser
promovidos antes de mim. Darren, se me conhece, sabe muito bem que eu nunca vou aceitar isso. De jeito
nenhum.”
Paul fugiu de uma moto veloz, e continuou, “Em todo caso, a promoção está chegando. Em seis
meses, eu devo aprender como é minha próxima função. Até a noite passada, estava claro para mim que eu
tinha meio ano para melhorar as coisas ou sair, mas aí Henry vai e me tira essa alternativa também.”
“Por quê? Porque ele está passando as rédeas para Cara?” A pergunta era inevitável. “Há anos
sabíamos – todos sabiam que isso estava previsto. E por que isso o impediria de sair? Cara vai entender a
complexidade da situação, e não vai levar para o lado pessoal. “E talvez se Paul sair, pensou ele, isso mostrará
a papai que esta empresa não é o Paraíso na Terra que ele pensa que é, que não serve para todo mundo.
“Enquanto a promoção era apenas uma previsão, eu tinha tempo.” Paul explicou, “Sinceramente, Henry
sempre falou sobre a aposentadoria, mas até ontem não dera uma data específica. Nós todos achamos que
não iria acontecer ainda por muitos anos. E até lá as crianças teriam crescido.”
“As crianças? Você se refere a seus filhos? O que eles têm a ver com isso?”
“No momento,” Paul respondeu, “com as constantes turbulências no negócio, Cara vai com muita
frequência ao exterior, por isso fico em casa com Ben e Lisa. Com a presidência, ela vai ter ainda menos
tempo para eles. Você sabe muito bem que eu não vou poder encontrar um trabalho decente, que não exija
viajar bastante. Com uma promoção dentro da empresa, eu conseguiria lidar; Cara e eu coordenaríamos
nossas viagens, para que não coincidissem. Mas não vou poder fazer isso se trabalhar fora da Hannah’s Shop.
Isso significa que as crianças não terão nenhum de nós durante esses anos cruciais. Lisa tem só nove anos!”
“E você não vai argumentar que a sua autorrealização é mais importante do que a de Cara ou que as
necessidades de seus filhos”, concluiu Darren, entendendo verdadeiramente seu amigo. “E em vez de pedir a
ela para desistir de seu emprego dos sonhos, você está me pedindo para vir e roubá-lo dela?”
“Mas não é seu emprego de sonho”, declarou Paul.
“Você está brincando comigo? A Hannah’s Shop é a vida dela”, Darren olhou Paul de um jeito
engraçado. “Ela disse que não quer o emprego?”
“Não com essas palavras,” respondeu Paul. “Acontece que Caroline sempre diz que a área de compras
se encaixa ao perfil dela como uma luva. Prever tendências de mercado, escolher as novas coleções,
conseguir os melhores contratos com os fornecedores – é nisso que ela é boa, é o que ela ama. Ela vai odiar
ser presidente, a administradora, imersa em números e politicagem mesquinha e egocêntrica. Eu sei que ela
vai ser infeliz.”
“Então você quer que eu monte no meu cavalo branco, agite minha espada, assuma a presidência,
resgate a linda donzela e salve todos? “Darren não podia deixar de sorrir.” Cara, eu te adoro, mas você está
pedindo demais.”
“Eu sei, eu sei”, Paul pediu desculpas. “Mas eu tinha de tentar.”
“Você vai ter que passar por isso, acho.”
“Sim”.
“E o que Caroline diz sobre essa ideia sua de sair?”
“Ela ainda não sabe”, Paul desacelerou, permitindo que uma van cinza os ultrapassasse.
“Eu não consigo achar um modo de dizer a ela. Há anos, ela me diz que seria tão bom podermos ir
juntos para o trabalho. Eu não sei como dizer a ela que não vai acontecer.”
“Você precisa dizer.” disse Darren, ao entrarem no aeroporto internacional de Miami. “Se há uma coisa
que aprendi com meu divórcio, é que deve discutir o que o incomoda o quanto antes.”
Encostando perto do terminal de partidas, ele respondeu: “Eu sei. Eu só tenho que descobrir como.
“Quando chegar o momento certo, Paul raciocinou, ele diria a Cara. Antes disso, esperava que uma solução
viesse a seu encontro, fazendo com que a difícil conversa fosse completamente desnecessária.
“E se você acabar deixando a empresa,” Darren disse ao abrir a porta do carro para poder sair, “me
telefone. Você sabe que eu valorizo seu talento.”
Capítulo 4
Paul estava escovando os dentes, quando seu celular tocou. Caroline se esticou toda na cama kingsize até a cabeceira e atendeu.
“Oh, entendo”, disse ela, se levantou e caminhou até o banheiro. “Querido, é o alarme da empresa”.
Ele rapidamente enxaguou a boca e pegou o telefone.
“Sim?”
“Sr. White, é a Darla do Serviço de Emergência Granbury. Um vazamento de água foi detectado no
depósito A-5 do Shopping Boca Beach.” A voz dela era quase metálica. Paul confirmou a ligação, e voltou a
escovar os dentes. Um dos aspectos agravantes de ter celular era que as pessoas que monitoravam alarmes
automáticos conseguiam encontrar você em qualquer lugar, a qualquer momento.
Ele vestia uma calça cinza quando o celular tocou novamente.
“Bom dia, Ted,” Paul cumprimentou alegremente seu gerente de loja. “Tudo pronto na loja para a
chegada da nova coleção?”
“Sim, mas temos um grande problema. Um problemão.” O sorriso de Paul desapareceu com a resposta
de Ted. “Um cano estourou no teto do depósito. Tem água por toda parte. Eles acabaram de fechar os canos
principais, então poderei de entrar e ver num minuto.”
“De quanta água estamos falando?” Paul perguntou, e sentou-se para calçar as meias e os sapatos.
“Eu não tenho ideia, mas um bocado. Não sei a extensão dos estragos ainda, mas ouvi o John da
Livraria Kaffee dizer que todo o seu estoque foi destruído”.
“Eu estou a caminho.”
Paul contou a situação para Caroline, pediu a ela que se desculpasse com os filhos por não estar no
café da manhã, e saiu correndo pela porta, com o paletó e a gravata na mão.
No caminho para a I-95, Paul ligou para o seu gerente de andar.
“Ted, me conte rápido o que aconteceu.”
“Parece que a maioria das caixas não foi atingida”, informou Ted, e Paul suspirou aliviado. “Estamos
levando todas as caixas que foram danificadas para cima.”
“Quando todas estiverem lá em cima, peça a uns funcionários que procurem nas caixas o que pode ser
recuperado, mas continuem carregando o restante das caixas,” exigiu Paul. “A umidade e os odores podem
facilmente penetrar nos tecidos.”
“Se eu colocá-las no estacionamento?”
Paul tomou uma decisão rápida enquanto entrava na interestadual. “Não, coloque tudo dentro da loja.
Ligue-me em meia hora e me atualize.”
Seu jipe nunca andara tão rápido antes.
Na sexta tentativa, em algum lugar perto de Aventura, Paul finalmente conseguiu falar com o
administrador do shopping. “Raul, é o Paul da Hannah’s Shop. Eu estou indo para o shopping. Como está a
situação?”
“Paul, não posso falar agora. Não se preocupe, está tudo sob controle. Nosso empreiteiro já está aqui,
e dentro de três ou quatro dias, tenho certeza de que tudo voltará ao normal. “Raul desligou antes que Paul
pudesse fazer mais perguntas.
Quando Paul se aproximava de Deerfield Beach, Ted ligou.
“Sim, Ted.”
“Esvaziamos todas as caixas que foram danificadas e estamos verificando as mercadorias”, disse ele.
“Mike e Isabella acabaram de chegar, então começamos a trazer o resto das caixas, como você pediu.”
“Obrigado, Ted. Eu estarei aí em uns dez minutos.”
Paul agradeceu por seu subordinado mais responsável ter chegado cedo naquela manhã.
É sempre bom saber que você pode confiar em alguém.
Encostando na vaga reservada, Paul não pôde deixar de ver as pilhas de livros molhados e caixas de
sapato no estacionamento. Droga, pensou ele, quanto prejuízo!
Kadence, a proprietária da Livraria Kaffee, estava parada, estupefata, em sua doca de carga.
A visão era assustadora, e Paul começou a temer que Ted havia subestimado o verdadeiro estrago às
mercadorias de sua loja.
Paul entrou em sua loja através da doca de carga. Ele cumprimentou um dos funcionários do andar
que estava esperando com um carrinho de mão vazio ao lado do elevador de serviço. Passando rapidamente
por sua sala, o gerente da loja de Boca tinha que ver como a loja estava. No interior dela, abaixo de corações e
flechas que comemoravam o Dia dos Namorados, um cordão humano tinha sido criado, e sua equipe
trabalhava para trazer a mercadoria para dentro. Ele se aproximou de Ted que estava de pé ao lado de três
vendedores que desembalavam e checavam as mercadorias.
“Qual é o prejuízo?”
“Tivemos sorte, chefe”, o jovem respondeu. “Eu acho que a embalagem plástica protegeu a maior parte
das mercadorias das caixas encharcadas de água. Mas perdemos alguns rolos de carpete de parede e uma
série de cortinas, não sabemos ainda quantas.”
Paul ficou aliviado. Considerando a situação do seu vizinho, ele tinha realmente tido sorte. “Obrigado,
Ted. Você está fazendo um grande trabalho”, disse Paul honestamente. Ele virou-se para todos os seus
funcionários e disse: “Vocês estão indo muito bem. Eu realmente agradeço o esforço e o trabalho em equipe.
Muito obrigado.”
Ao olhar para a situação, ficou claro para Paul que a loja não abriria naquele dia. Para poder abrir
amanhã, ele tinha de liberar o estoque o mais rapidamente possível.
“Estou indo para o estoque”, disse ao homem do sul de Miami. “Preciso ver isso com meus próprios
olhos.”
A primeira coisa que Paul sentiu ao sair do elevador de serviço foi o cheiro de umidade. Muita água
deve ter danificado vários livros, sapatos e sabe-se o que mais para criar um cheiro tão forte tão rapidamente.
As instalações do depósito no subsolo do shopping tinham um sistema de ventilação tão antigo quanto os
visitantes mais frequentes do shopping. Se não secasse logo, o andar todo ia ficar cheirando a mofo.
O piso cinza ainda estava molhado, então, Paul teve de pisar com cuidado para chegar a seu estoque.
As portas duplas foram abertas para ventilar, e ele viu uma rachadura no teto, de onde a água ainda pingava.
Ele olhou para as estantes de unidades industriais que geralmente continham as inúmeras caixas de mais de
2.000 diferentes itens, as SKUs, que sua loja vendia. A água havia atingido quatro prateleiras, então ele tinha
tido muita sorte de tão poucos danos terem ocorrido. Ele agradeceu aos deuses da cobertura plástica e da
embalagem a vácuo.
Ele passou a olhar para o estoque de Kadence, ao lado do dele. O lugar estava uma bagunça. Uma
grande parte do teto tinha desabado, e se via a rachadura nas tubulações antigas. Grandes blocos de gesso
decoravam o chão, em meio a páginas ensopadas, capas de livro e cartões em forma de coração molhados.
No meio do depósito estava um homem de meia-idade com um tufo de cabelos pretos, usando um
macacão de trabalho que dizia: “Encanamentos Al” em letras amarelas nas costas. Ele estava dando ordens a
um jovem que parecia ter medo de sua própria sombra.
“Então, qual é o veredicto?” Paul perguntou ao encanador.
“A combinação mortal de tubulações antigas e o frio repentino da noite passada,” foi a resposta.
“Tivemos um caso como este em Palm Beach no ano passado.”
“Eu sou do estoque A-5 ao lado. Quanto tempo até eu poder guardar minha mercadoria de volta no
estoque?”
Al coçou a testa com um lápis, e deu um passo para a direita, como se a iluminação lá fosse melhor.
“Seis, talvez sete semanas”.
“Você quer dizer dias, não é?” disse Paul, demonstrando seu choque.
“Não há como demorar menos do que isso”, relatou o encanador. “Eu tenho que abrir o teto da seção
inteira, substituir as tubulações principais, e fechá-lo como estava. Como se não bastasse, o sistema todo é tão
velho, que nem sei se consigo encontrar as juntas que se encaixem. Há uma boa chance de termos de
substituir todo o sistema. E eu não posso me responsabilizar por nada deixado aqui até terminarmos o
trabalho.”
“Não há como concluí-lo antes?” Paul estava profundamente preocupado.
“Não”, respondeu Al, e depois acrescentou, “Ainda estou no meio de três outros projetos. Larguei tudo
para vir para cá, e Deus sabe quais outras situações de emergência aparecerão antes de terminar este
trabalho”.
“Mas quinta-feira é Dia dos Namorados!” disse Paul desesperadamente. “Preciso do estoque
funcionando!”
“Ah, obrigado por me lembrar”, disse o encanador. “Eu preciso mesmo comprar umas rosas para a
minha esposa.”
Paul desceu as escadas, furioso, e entrou no escritório do administrador do shopping, só para
encontrar outros três gerentes da loja gritando com Raul.
“Eu não tenho mais espaço!” alegou, Raul, em desespero. “A Livraria Kaffee e a Loja de Sapatos
Eleganz foram mais atingidas, então lhes dei as duas áreas que tinha.”
“E o que você está fazendo para resolver a situação?” gritava Jimenez, o gerente da loja de ferragens.
“Estamos consertando as tubulações. É só o que posso fazer. O seguro vai cobrir eventuais danos.
Vocês não têm com que se preocupar.” O administrador bigodudo do shopping parecia estar recitando um
manual.
“Não se trata só dos estragos”, insistiu, Paul agitando os braços. “Estamos quase no Dia dos
Namorados – Eu não posso me dar ao luxo de perder vendas!”
“Não há nada que eu possa fazer a respeito”, disse Raul. “Mas todos os danos serão cobertos.
Quaisquer danos.”
Paul deixou a sala de Raul frustrado. Nenhuma solução fora oferecida e ele teria que abrir a loja, se
não hoje, mais tardar amanhã. Mas o que ele podia fazer com o seu estoque? Onde ele o colocaria? Um local
de armazenamento alternativo teria de ser encontrado imediatamente.
Voltando à Hannah’s Shop, desta vez pela porta da frente, ele ficou surpreso com o número de caixas
que enchia os corredores até o fundo.
Todo o pessoal estava ocupado. Alguns desembalavam caixas danificadas, alguns verificavam
mercadorias, e outros enxugavam as mercadorias revestidas de plástico. Até sua secretária Alva estava
coberta de toalhas.
Ele entrou em sua sala, abriu as páginas amarelas e começou a ligar para armazéns próximos.
“Você precisa de espaço de armazenamento hoje? Bem, tenho certeza de que podemos entrar num
acordo. O que acha de R$ 250 o metro quadrado?”
Três minutos mais tarde, “Sinto muito, mas acabamos de alugar o último espaço que tínhamos. Parece
que teremos vaga daqui a duas semanas. Quer fazer uma reserva?”
O último da lista dizia: “O que você quer? Esse é o preço em Boca. Você quer algo mais barato? Eu
tenho vaga em Delray Beach.”
Paul baixou a cabeça em desespero. Parecia que ele não teria outra opção senão pagar um preço
exorbitante, a fim de manter a loja aberta. E isso significava quase nenhum lucro até que os tubos fossem
consertados, e não havia como prever quando seria. Esta foi a gota, agora não havia maneira de melhorar o
desempenho da loja e justificar a sua promoção. Seu cargo na Hannah’s Shop logo viraria fumaça.
Neste momento, Ted entrou correndo.
“Chefe, pode vir à doca de carga? O caminhão chegou com a nova coleção”.
“Essa não!” Paul tinha esquecido completamente da remessa. Ele havia pensado em usar a manhã
para substituir o display, mas ao invés disso eles ficaram envolvidos numa emergência. Ele correu para fora e
viu o motorista do caminhão descarregando paletes de mercadoria.
“Não, não, não!” gritou Paul. “Você não pode descarregar isso - não está vendo – não temos lugar para
colocar tudo isso!”
“Eu só faço o que me mandaram”, disse o motorista. “Eu vou deixar essa coisa aqui.”
“Não descarregue mais nada. Pare, por favor”, implorou Paul. “Espere, vou ligar para seu patrão”.
Ele pegou o celular e ligou para o depósito regional.
“Rog, é Paul, estou com uma emergência aqui.” Paul contou a situação para Roger, e perguntou se o
motorista podia levar de volta a nova remessa.
“Claro, Paul. Deixe-me falar com ele.”
Paul passou o telefone ao motorista tatuado, que ouviu, murmurou algo baixinho e começou a
recarregar o caminhão. Agradecendo ao motorista, Paul voltou a Roger.
“Você sabe de algum lugar de armazenamento disponível que eu possa conseguir a um preço razoável
em algum lugar próximo ao shopping Boca? “Paul perguntou.
“Acho que não”, foi a resposta. “Ligou para os armazéns locais?”
“Nada está disponível por um preço normal. Eles são tão solidários à causa que simplesmente
dobraram o preço. Eu deveria estar agradecido por não o triplicarem”, acrescentou Paul. “O mais próximo que
encontrei foi em Delray Beach.”
“Então, você teria que dirigir mais de quinze minutos para pegar sua mercadoria?”
Roger estava surpreso. Lentamente, ele disse: “Se a mercadoria não vai estar facilmente acessível,
que tal guardar tudo no meu depósito? Eu tenho caminhões passando por Boca todo dia, por isso deve ser
possível organizar isso do ponto de vista logístico”.
“Nossa! Obrigado,” disse Paul, aliviado. “Você salvou minha vida.”
“Acho que podemos fazer isso funcionar”, disse Roger. “Não há motivo para desperdiçar dinheiro com
armazenamento extra que para ter acesso, tem de ir até lá. Tenho bastante espaço para seu estoque aqui. É
só me dizer do que precisa, e eu envio para você”.
“O quê – como se fosse um recall?”
“Não”, respondeu Roger. “Tenho uma área livre onde posso colocar o seu estoque. Não quero ter o
incômodo de alterar a propriedade nos livros e não quero a confusão da papelada toda vez que eu lhe mandar
algo. Eles continuarão como bens seus, mas nas minha prateleiras.”
“Excelente. Então, quando seu caminhão pode pegar as caixas?” perguntou Paul.
“No final do dia, por volta de das cinco. Mas, por favor, cuide para que tudo esteja organizado e pronto.
O motorista estará voltando de uma longa viagem, por isso não quero sobrecarregá-lo.”
“Combinado.”
Paul localizou Ted e lhe deu a boa notícia. “Combinei com o depósito regional de manter os estoques
para nós. O caminhão vai pegar os produtos em torno de 17h.”
“Nossa! Como os fez concordar com isso?”
“Digamos que Roger é um ótimo amigo”, respondeu Paul. “Agora vamos começar.”
“Certo. Vou cuidar para que todos os produtos que trouxemos do estoque sejam levados à plataforma
de carga”, foi a resposta enérgica.
“Não, Ted,” disse Paul sem aprovar, “só quando os produtos de que precisamos estiverem acessíveis.”
“Desculpe, mas não entendi, chefe.
“Ted, quantas vezes o pessoal da loja desce ao estoque para pegar mercadorias – pelo menos uma ou
duas vezes por hora?”
Ted concordou.
“Então, se enviarmos tudo isso, estaremos em apuros. Ao mesmo tempo, quantos itens mantidos na
loja não são tocados há meses? “Paul perguntou ao seu gerente.
“Em resumo, quanta mercadoria guardada no depósito deveria ter sido mantida na loja e vice-versa?”
“Eu não sei,” respondeu Ted francamente, “mas deve ser muita. Agora entendo o que quer dizer. Acho
que poderíamos ser mais eficientes.”
“No momento eu não poderia me importar menos com eficiência”, afirmou Paul. “O que me importa é
enviar ou não as coisas das quais precisamos aqui, mas ainda enviar o suficiente para podermos abrir a loja.
Diga aos gerentes de departamento para prepararem uma lista de coisas que podemos nos dar ao luxo de
mandar para o depósito regional imediatamente. Eles precisarão de tempo para tomar decisões prudentes, e o
caminhão de Roger vai estar aqui mais cedo do que pensamos.”
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A sala do gerente da filial da Hannah’s Shop de Boca Raton tinha sido mobiliada de acordo com o
padrão da rede: uma mesa marrom clara média, atrás da qual havia uma cadeira de encosto alto, um quadro
branco de um lado, uma estante na frente dele e sete cadeiras de metal com assento acolchoado marrom. A
última tinha sido desdobrada, e lá estavam os seis chefes de departamento e o gerente da loja.
Diante de seus empregados, Paul White sentou-se na cadeira alta, e suas feições mostravam
distintamente seu descontentamento. Em sua mesa estavam as listas dos itens a serem enviados para o
depósito que eles tinham compilado. As listas estavam ridiculamente curtas. Paul calculou que todas as listas
combinadas representavam menos de um quarto do inventário que tinha sido trazido do estoque.
“Gente, não é isso”, ele começou, segurando sua frustração. “Obviamente, eu não me expliquei
corretamente. Nós não temos espaço para todas as mercadorias. Mantenham apenas o estritamente
necessário.”
“O que quer que eu faça?” argumentou Isabella. “Eu não posso ficar sem meus produtos. Se eu enviálos, o que vou vender?”
“Isabella”, disse Paul com veemência, “mesmo se lotar as prateleiras e os compartimentos superiores
de armazenamento que tem em seu departamento, você não poderá espremer tudo lá dentro”.
“Eu pensei em manter alguns deles na cozinha, e talvez alguns mais no corredor,” tentou ela.
“Eu preciso do corredor para meus carpetes”, afirmou Javier, sua voz grave quase melódica. “É o único
lugar que vão caber!”
“Ei! Usar a cozinha foi ideia minha”, Mike se levantou e enfiou o dedo no próprio peito. “Eu vou colocar
as minhas coisas lá primeiro!”
“Silêncio!” Paul levantou a voz. “E sente-se, Mike. Ninguém vai usar a cozinha, e nada será
armazenado no corredor. Se o fizéssemos, ficaria tão lotado, que não seria nem capaz de chegar às caixas.”
Como ninguém respondeu, ele continuou. “O depósito concordou em enviar-nos tudo o que quisermos
todo dia. Vou frisar novamente. Por causa da nossa crise, e enquanto não pudermos usar nosso depósito,
Roger, nosso gerente do depósito regional comprometeu-se a enviar todo dia o que precisamos de nossos
estoques. Então, necessitamos manter apenas o que esperamos vender imediatamente. Não há necessidade
de manter montanhas de inventário na loja por ora.”
“O que quer dizer com 'o que esperamos vender imediatamente?” Perguntou Fran, desconfiada.
Paul teve de pensar por um momento antes de responder. “O que pedirmos durante o dia,
receberemos na manhã seguinte. Então, na verdade, precisamos manter apenas o que esperamos vender em
um dia.”
Mike jogou as mãos para cima, “Eu não faço a mínima do que vou vender hoje.”
“Hoje nós não vamos vender nada”, disse Ted amargamente. Voltando a Paul, ele continuou. “Eu
posso imprimir a média de vendas diárias de cada SKU. Eu não acredito que é isso que você quer deixar na
loja?”
Antes que Paul pudesse responder, Mike explodiu: “As médias são uma piada. Um dia não vende
nada, no seguinte, um milhão. Se eu não tiver mercadoria suficiente, eu não poderei vendê-la, no dia bom. Se
mantiver as médias, as vendas desta loja irão pelo ralo, com certeza.”
Os outros gerentes concordaram. Maria, que dirigia o departamento de banho, gritou: “Na maioria dos
dias eu não vendo nem mesmo uma única toalha de banho grande, mas uma vez eu vendi quarenta num dia!”
“Quarenta?” Paul ficou espantado. “Isso é muito distante da sua média diária. Quantas vezes isso
acontece? Quantas vezes vende vinte delas num dia?”
“Aconteceu uma vez, há cerca de um ano, mas isso pode acontecer novamente a qualquer momento”,
disse ela defensivamente. Mesmo sendo Maria a menor funcionária, suas opiniões eram sempre expressas
bem alto.
“Você não pode agir com base em algo que acontece uma vez na vida” Paul foi firme. “Isso é
submeter-se à histeria”.
O debate continuou por um longo tempo. Finalmente, os gerentes de departamento pressionaram Paul
a fechar um acordo para manter, de cada SKU, um montante igual a vinte vezes a média diária de vendas. No
entender de Paul, a histeria tinha vencido o debate, mas faltava-lhe forças para continuar discutindo. Ele não
comera algo desde que tinha acordado nessa manhã e agora estava pagando o preço.
Os gerentes de departamento saíram, mas Ted ficou. “Não tem algo a fazer? “disse Paul. “Eles estão
esperando que você imprima a média diária de vendas.”
“Imediatamente, chefe, mas eu tenho só uma pergunta. O depósito sempre nos envia caixas inteiras,
mas você fala em pedir itens individuais. Será que vão fazer isso por nós? Eles são mesmo capazes de fazer
isso?”
Lembrando-se mais uma vez de não subestimar seu gerente de loja, Paul disse: “Você está certo, não
pensei nisso. Vou verificar com o Roger, e ver o que pode ser feito. Enquanto isso, vá gerar as listas. Nossas
caixas devem estar prontas para ser retiradas.”
Quando Ted deixou sua sala, Paul tomou um longo fôlego e ligou para Roger novamente.
“Desculpe incomodá-lo, Rog. Eu sei que fez de tudo para me ajudar, e sou muito grato por sua oferta.”
Paul pigarreou, pouco à vontade. “Mas tenho outro problema. Eu não posso mais receber caixas inteiras de
produtos.”
“Sim, eu sei. Eu já pensei nisso”, disse Roger, surpreendendo seu amigo.
“É claro que se eu enviar-lhe uma caixa cada vez que você pedir um item, logo, logo, você vai ter seu
inventário inteirinho de volta na loja. Eu discuti isso com o meu pessoal. É uma verdadeira dor de cabeça para
nós, mas encontramos uma maneira de resolver. Iremos enviar-lhe unidades individuais, conforme nos pedir”.
“Devo-lhe um favor enorme, Rog.”
“Muito mais do que um”, e o riso de Roger fez Paul sorrir. “Para começar, você leva as meninas ao balé
tanto este domingo quanto no próximo.”
“Fechado”.
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Maria bateu à porta de Paul.
“Entre”.
“Chefe, estamos começando a fazer o que você disse,” a baixinha informou a ele.
“Enviar tudo acima de vinte dias significa que mandamos para o depósito não apenas o que tínhamos
em estoque, mas também muitas mercadorias que estão dispostas na loja. Você estava ciente disto, ou será
que entendemos mal o que nos mandou fazer?”
“Eu sei que algumas coisas que estavam na loja têm de ser enviadas.”
A resposta de Paul poderia ter sido dita num tom mais suave.
“Chefe”, insistiu Maria, com as mãos nos quadris. “Não são algumas coisas. Metade das prateleiras
ficará vazia.”
Ele passou os números pela cabeça. A loja mantinha cerca de quatro meses de inventário, metade
armazenado no subsolo. Assim, manter apenas vinte dias significa manter menos da metade do que tinham na
loja no momento. Maria tinha razão, e prateleiras vagas estavam longe de ser o que ele tinha em mente. No
entanto, depois de tanto discutir que vinte dias era algo histérico, ele não pretendia reabrir essa discussão. Em
todo caso, até que o estoque estivesse de novo funcionando, Roger enviaria o que Paul solicitasse
diariamente. Por isso, realmente não era necessário manter nem mesmo um mês de inventário.
“Atenham-se ao plano”, disse ele com firmeza. “Nós concordamos em manter apenas vinte vezes a
média de vendas diárias, então que seja. Tudo o que sobrar, espalhem bem nas prateleiras para deixar a loja
com uma cara decente.”
“Ok, você é quem manda.”
Poucos segundos depois que ela saiu, Paul ouviu Maria dizer a Ted na cozinha algo que soava como
“el jefe es loco”, e enquanto seu leal gerente de loja tentava acalmar Maria, Paul torcia para ela estar errada.
Capítulo 5
As luzes no grande edifício do centro de Miami, que abrigava a matriz da Hannah’s Shop estavam
sendo apagadas, uma a uma, como se o prédio fosse fechando os olhos com o cair da noite. Andando pelo
corredor do andar superior, Caroline sentiu o vazio, e desejou estar em casa com o marido e os filhos. Se o pai
dela conseguisse seu intento, e a nomeasse presidente, ela teria que se acostumar com este sentimento.
Espiando através das pesadas portas duplas da sala de Henry, ela o viu estudando um relatório de capa verde.
Bateu
baixinho, para não assustá-lo.
“Papai, você tem um minuto?”
“Não, mas vou ouvi-la de qualquer maneira,” o homem careca sorriu, pousando o relatório em sua
grande mesa. Os tons vermelhos e castanhos que compunham sua sala complementavam bem sua presença.
“Você ouviu falar do Leon’s?” perguntou Caroline enquanto se sentava numa cadeira de mogno em
frente de Henry. Leon’s era um fabricante de jogos de cama com base na Geórgia.
“Eu soube que estão com problemas, nada mais.”
“Eu falei recentemente com Jason Hodge, o mais jovem da família”, relatou ela. “Parece que ele e os
irmãos decidiram não colocar mais dinheiro na empresa.”
“É uma pena. Eu conheci Leon há muitos anos. Ele jamais teria permitido que isso acontecesse, que
Deus o tenha”, comentou Henry, e emitiu um suspiro. Leon Hodge não tinha resistido a um ataque cardíaco
dois anos antes. “Você sabe, querida, que quando comecei, tudo que compramos era feito nos EUA. Agora,
quase nada é. Bem, lá se vai outro.”
“É muito cedo para descartá-los”, opôs-se Caroline. “Leon é uma boa empresa. Com sua excelente
qualidade e design, é provável que eles continuem a operar sob nova direção.”
Henry acenou com a mão: “Quem compraria um poço sem fundo hoje?”
“Talvez nós?”
Henry estreitou os olhos, “Conte-me mais, menina.”
Caroline sorriu. Desde que ela era pequena, seu pai a chamava de “minha menina quando ela
conseguia surpreendê-lo positivamente. Ela foi para o lado dele da mesa e os dedos dançaram sobre o
teclado. “Aqui estão os demonstrativos financeiros da Leon’s durante os últimos cinco anos”.
“Então, você fez sua lição de casa”, disse Henry aparentemente satisfeito. “De onde conseguiu isso?”
“De Jason,” respondeu Caroline secamente e voltou a se sentar, esperando que seu pai examinasse os
documentos. Seus olhos percorreram a tela, e quando pararam, ele perguntou: “Como é que as vendas se
deterioraram tanto, tão rapidamente?”
“Conheço os irmãos Hodge desde que era pequena, nunca se deram bem. Ao encontrar com eles no
ano passado, eu sei que isso não se alterou. Desde que o velho morreu, gastam mais tempo em lutas pelo
poder, em quem é responsável pelo quê, do que em comandar seus negócios. Quando peço uma cotação,
acredita que os três irmãos têm que aprovar qualquer proposta? Tudo demora uma eternidade, está ficando
impossível trabalhar com eles.”
Este era o pior pesadelo de qualquer um que fundasse a sua própria empresa, supôs Henry, que seus
próprios filhos reduzissem a escombros tudo o que havia construído.
Pelo menos com Caroline ele não tinha medo disso. Balançou a cabeça enquanto Caroline continuava.
“Pai, eu acho que temos uma grande oportunidade aqui. Eu acho que podemos facilmente transformar
a Leon’s, quase imediatamente, em um ativo lucrativo para nós”.
“Como?” Henry a incentivou a continuar.
Caroline estava bem preparada. Com confiança, ela respondeu: “Nós somos o seu maior cliente,
constituímos quarenta% das vendas deles. Mas para nós, eles são um fornecedor relativamente pequeno.
Menos de seis% dos nossos produtos de cama são da Leon’s. Se nós dobrarmos as aquisições deles, mesmo
se eu abaixar nosso preço de compra em 5%, isso os deixará no azul. Abra o outro documento na pasta para
ver os cálculos.”
“Não há necessidade”, Henry tirou a mão do mouse, e virou a tela para fora. “Com margens brutas de
quarenta%, é óbvio que esse aumento nas vendas vai resolver os seus problemas financeiros. Mas, minha
menina, e a velha regra “atenha-se ao que você sabe, pura e simplesmente? Nós vendemos produtos têxteis,
não os fabricamos. Nós realmente não sabemos muito sobre o complicado processo de concepção de
produtos, sem mencionar os de produção.”
“Nós não, mas Jason sabe.” respondeu Caroline com firmeza. “Ele cresceu no ramo, e seu pai o
treinou bem.”
“Tenho certeza de que sim. Então você já discutiu o assunto com ele, e...?” O pai dela levantou uma
sobrancelha.
“E ele está não apenas disposto, mas realmente ansioso para continuar como presidente da Leon’s.
Desde que, claro, seus irmãos fiquem de fora. Eu acho que por um salário razoável e bônus modestos,
podemos contratá-lo por cinco anos.”
“Você cobriu bem este aspecto, mas por que está tão confiante de que podemos, na atual base, vender
o dobro da quantidade atual? Eu odiaria ficar com mais excedentes do que conseguimos escoar através de
nossos pontos de venda.”
Caroline parou por um momento e depois disse: “Se eu estivesse absolutamente certa de que não
havia problema para vendê-los, eu teria dobrado as quantidades há muito tempo. É aqui que preciso da sua
ajuda, papai. Você tem que me ajudar a convencer Christopher a dar a esses produtos uma visualização maior
e melhor dentro de nossas lojas.”
“Hmm...” foi a resposta. “E quem vai fiscalizar essa empresa? Para quem Jason prestará contas? Eles
são muito pequenos para prestarem contas diretamente ao presidente”, comentou Henry.
“Eu não pensei nisso”, admitiu Caroline. “Jason pode falar com o vice-presidente executivo de
Operações ou o de Compras. Estou disposta a assumir o encargo suplementar.”
“Não seria algo que a distrairia? Não se apresse em responder. Leve em
conta que você teria que conhecer a empresa dentro e por fora. Seria você que lutaria pelos
investimentos adicionais de que precisarão. E que garantiria que eles tenham a estratégia certa de
crescimento. Caroline, você acha que deve dedicar tanto tempo a algo que representa cerca de 10% de
apenas uma família de produtos dentre tantos outros?
Tenha em mente que o foco da Leon’s não deve apenas ser o que interessa à Hannah’s Shop. Não
deve depender de nós como seu único cliente.”
“Por que não?” atacou sua filha. “Não é hora de a Hannah’s Shop passar a ter produtos de marca
própria? Muitas redes têm seus próprios produtos sobre os quais ganham margens maiores. Eu verifiquei, e
sim, há casos em que as redes perderam dinheiro em tais empreendimentos, mas na maioria dos casos
aumentaram a rentabilidade.
Você não acha que agora que a concorrência está mais acirrada do que nunca, devíamos começar a
explorar isso?”
O presidente da maior rede de artigos de cama, mesa e banho do sudeste do país se inclinou para
trás, meditativo, e pôs as mãos atrás da cabeça.
Esta falta de resposta provocou Caroline a declarar: “Estou convencida de que devemos agarrar esta
oportunidade e comprar imediatamente a Leon’s.”
Henry conhecia o temperamento da filha. Ele sabia que o melhor
remédio seria paciência e moderação. Como futura presidente da empresa, havia algumas coisas que
ela teria que reconhecer e absorver. Assim, após um tempo, ele disse calmamente: “Filha, me ouça. Eu acho
que você tem o instinto assassino que todo bom empresário tem que ter. Também aprendeu a preparar um
discurso persuasivo e ampliá-lo com sua capacidade de pensar por si. Você acabou de demonstrar isso - me
convenceu de que é hora de reexaminar a nossa política quanto a ter nossa própria marca de produtos. E eu
concordo que a Leon’s é uma boa empresa que tem os produtos certos, e que podemos facilmente transformála num ativo bom. Mas...”
“Mas sua decisão é que não compraremos a Leon’s”, completou Caroline.
“Correto”.
“Por quê?”, perguntou ela, num tom de derrota. Toda a preparação dela tinha sido descartada com uma
palavra dele. Ela podia sentir o ar saindo de seu balão.
“Pense sobre o que acabamos de discutir. Adquirir a Leon’s só faz sentido dentro de uma estratégia
mais ampla de desenvolvimento de nossos produtos de marca própria. Mas essa estratégia nos obriga a dar
respostas a muitas questões importantes. Primeiro, temos de cuidar para que não se crie confusão nas
trincheiras, confusão que acabará por se voltar para nós como conflitos que consumirão nosso tempo e
atenção. Portanto, temos que determinar as diretrizes da divisão de displays entre os produtos da marca e dos
produtos normais. E temos que decidir a estrutura organizacional; não é uma questão trivial, como você
certamente notou.”
“Isso não deve demorar muito”, foi a resposta de Caroline. Se essa foi a base para as objeções dele à
ideia, talvez ela ainda o fizesse mudar de ideia.
Henry ignorou seu comentário e continuou. “Há mais do que uma maneira de obtermos produtos da
marca. Se quisermos evitar erros e tropeços, temos que construir os critérios para a aquisição de produtos da
marca; sob quais condições deveríamos comprar da empresa produtora, quando fornecer a concepção e
terceirizar a produção, e quando pedir exclusividade para os produtos que levam o nosso nome”.
A sabedoria do ponto de vista de Henrique começou a se infiltrar em Caroline.
Ele respirou profundamente e continuou. “E ainda temos de decidir o ritmo de implementação, incluindo
um plano de investimento detalhado. O cuidado ao tomar decisões sobre todas estas questões é a chave para
o sucesso ou fracasso. Chegar a decisões prudentes leva tempo. Caroline, eu aprendi errando que não sou
John Wayne. Quando atiro da cintura, em geral acerto meu próprio pé”.
Caroline podia perceber claramente o mérito nestas palavras. Ainda assim, ela se sentia obrigada a
dizer: “Mas quando conseguirmos fazer todas essas coisas, a Leon’s já terá sido vendida. Nós vamos perder
esta oportunidade de ouro, e essa oportunidade é rara. Não deveríamos adquirir a Leon’s e depois fazer todo o
meticuloso planejamento estratégico? Nós aprenderemos muito com um piloto.”
“Caroline, por favor, me escute.” Henry esperou até que seus olhos se encontrassem. “A diretriz mais
importante para um presidente é a de nunca embarcar numa nova direção estratégica como resultado de uma
oportunidade específica, não importa quão única e promissora a oportunidade possa parecer. Oportunidades
vão e vêm. Permitir que elas gerem impacto sobre a estratégia garante que o resultado será uma estratégia em
zigue-zague. E a certeza de que mais cedo ou mais tarde, a empresa irá em zigue-zague contra uma parede
de tijolos.” Henry inclinou-se suavemente e acariciou a mão de Caroline. “Filha, esta é a lição mais importante
que posso lhe ensinar. Você deve aprender a controlar seus instintos. Não se deixe distrair por oportunidades
de ouro; muitas vezes elas são armadilhas douradas.”
Imersa em pensamentos, Caroline levantou-se, “Meus anos nas Compras me condicionaram a agarrar
as oportunidades. É isso exatamente o que eu faço, dia após dia. É o que me faz uma boa gerente de
compras. É isso que sou, e ponto final. Eu não acredito que possa fazer uma mudança tão profunda. Papai,
você acabou de me convencer que eu simplesmente sou inadequada para ocupar sua cadeira.”
Capítulo 6
“Paul, nós temos um problema. Sua loja está nos deixando loucos.”
A ligação de Roger veio apenas quatro dias após o estouro dos encanamentos, e Paul, com o telefone
na mão, sentiu seus temores se materializarem.
“Eu sabia”, disse ele. “Abrir caixas para pegar um item simplesmente não podia dar certo.”
“Não é esse o problema”, respondeu Roger. “São os telefonemas constantes. Eu tenho de dirigir um
depósito regional, e não uma lanchonete fast food. Preciso que meu pessoal trabalhe, e não só fique
recebendo pedidos do seu a cada vinte minutos.”
Paul pensou por um minuto. Cada um de seus seis gerentes de departamento ligando pelo menos uma
vez a cada duas horas: não era surpresa que isso criasse uma confusão no depósito. “Sinto muito”, disse ele,
desculpando-se. “Eu vou cuidar para que cada gerente de departamento apresente uma lista para o depósito
uma vez por dia.”
“Não, Paul, uma lista só. É porque providencio sua remessa apenas uma vez por dia, no final do dia”,
explicou Roger. Ele acreditava firmemente que qualquer complicação, não importa quão pequena, sempre
daria problemas. “A coisa mais simples seria se você me enviar uma lista combinada por e-mail no final do dia.”
“Combinado, Rog. Obrigado por tudo novamente.”
“Espere, esquecemos alguma coisa”, disse o gerente de depósito. “Lembra que recebi de volta sua
nova coleção? Bem, sei que você não tem espaço para tudo isso. Mas você precisa dessa mercadoria. Quanto
disso devo enviar para você?”
“Pode me enviar vinte dias de cada SKU?”, pediu ele.
“Como vou saber o que isso significa?” Roger riu. Como todos os
gerentes de loja, pensou ele, Paul via as coisas de uma única direção – a da de gerente de loja. “Você
tem que ser um pouco mais específico do que isso.”
Paul percebeu que não havia realmente como Roger saber quais eram suas vendas diárias. Ele fez um
cálculo rápido. “Mande-me um décimo dos pedidos originais.”
“No problemo, compadre.”
“Obrigado, Rog. E obrigado por ter comentado.”
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Paul sentou em sua sala, revisou as listas que os chefes de departamento tinham feito, antes de enviar
a Roger. Ele não conseguia entender essas listas.
Não havia correlação entre os montantes necessários para um futuro imediato e o que os chefes de
departamento haviam apresentado. Se ele aprovasse tudo, a loja em breve ficaria inundada de caixas de
mercadoria novamente. Ele entrou no sistema de alto-falantes e chamou os chefes de departamento a sua
sala.
“Eu estava olhando a lista que apresentaram, e gostaria de saber como a produziram.” Paul virou-se
para o experiente gerente do departamento de artigos de cozinha, “Vamos começar com você, Mike. A
quantidade que pediu fará os estoques ultrapassarem a marca de vinte dias.”
“Mas há coisas que eu nem pedi”, explicou Mike. “No final, uma coisa compensa a outra.”
“Isso não explica como decidiu o que pedir, nem quanto”, observou Paul.
“Bem, eu olhei para as prateleiras, e parece que há muito espaço, por isso estou pedindo para
preenchê-las”, respondeu ele com sinceridade.
“Ah, entendi”, respondeu Paul. Começando a se sentir incomodado, ele se voltou para a mulher de
óculos, sentada ao lado de Mike. “Janine, são muitas toalhas de mesa”, disse ele. Ela pedira vinte de cada de
um arco-íris de toalhas de mesa, apesar de a maioria das cores
ser vendida a uma taxa de um item por dia.
“Hoje, as toalhas de mesa vermelhas estavam saindo como água, e eu queria garantir que não ficaria
sem elas amanhã”, disse ela.
“Fico feliz em saber que a vermelha está vendendo bem. Mas como estão as outras cores?”, perguntou
ele.
“Vendi três toalhas azuis e duas verdes”, respondeu ela. “Eu só quero me garantir para não ficar sem
nenhuma delas.”
“Mas de cada uma, ainda tem cerca de vinte unidades. Por que você pediu tantas a mais? Qual é a
lógica disso?”
Ele dispensou a resposta dela com impaciência e virou-se para Fran. A dela era de longe a menor lista,
e seus números não tinham sido arredondados para cima. Três de um item, seis de outro.
“Como você chegou a estes números?”
“Eu contei quanto ainda tinha, e subtraí dos números de vinte dias.”
“Você é um anjo de ordem neste caos”, elogiou Paul. “Este é modo certo de trabalhar. Eu quero que
todos façam o que ela fez.”
“Paul, você não espera que eu faça isso todos os dias, né?” Fran estava irritada. “Levei quase duas
horas! É tempo sem atender os clientes, também!”
“Isso significa uma contagem geral do inventário?”, perguntou Javier. “Isso levaria horas!”
“Você vai pagar as horas extras?” Maria continuou.
“Desculpe por dizer isso, chefe”, disse Ted, “mas uma contagem de inventário completa todo dia vai
tomar tempo demais. Não há outra solução?”
“Você está certo, Ted. Deve haver uma solução melhor.” disse Paul, e fez uma pausa para refletir
sobre o que Fran tinha feito. Como ela tinha chegado à sua lista? Primeiro, ela tinha pego a meta de vinte dias,
e depois contou seu estoque completo no final do dia, e subtraiu um do outro.
Paul riu em voz alta para espanto do seu pessoal, quando percebeu que o que Fran tinha feito era
apenas uma forma elaborada de reconstruir as quantidades vendidas durante o dia, informação acessível ao
toque de um botão.
“Sinto muito”, desculpou-se. “Foi um longo dia, e Fran me ajudou a descobrir o que precisamos. Tudo
de que precisamos são as vendas diárias, que é a mercadoria que saiu da loja, e é essa mercadoria que temos
de trazer do depósito. Vocês não têm mais de gerar listas para o Roger. O computador irá produzir a lista de
itens vendidos a cada dia. Podem voltar ao trabalho, e obrigado por terem vindo.”
Enquanto os outros chefes de departamento levantavam-se da desconfortável cadeira dobrável, Maria
permaneceu sentada. Ela não parecia tão feliz com o resultado.
“Mas e as coisas que estão esgotadas e alguém pede?”, perguntou ela.
“Há meia hora, alguém perguntou sobre roupões de banho que não temos há um tempo, e saiu sem
comprar nada.”
Maria sempre tem que ter a última palavra!, pensou Paul consigo mesmo, mas ao invés disso, ele
disse, “Bem colocado, Maria. Cada um deve fazer uma lista desses itens, e nós iremos adicioná-la ao pedido
enviado para o depósito. Nós pediremos uma quantidade equivalente a vinte dias. Está bom assim?”
Ele sabia que eles não conseguiriam esses itens. A loja tinha pedidos em aberto de cada um dos itens
a que ela se referia. E se a loja não os tinha, era porque o depósito regional também não tinha. Mas para que
discutir?
“Está bom, chefe,” Maria sorriu, refletindo o alívio de tensão na sala de Paul.
Paul ficou feliz que dessa vez ela não tinha usado a palavra loco.
Capítulo 7
A televisão do gabinete estava ligada. A atenção de Paul se dividia entre a grande tela e as páginas de
esporte do jornal Miami Herald. Ele tinha plantado os pés no pufe e o resto do corpo na confortável
namoradeira que Caroline havia escolhido de aniversário de casamento no ano passado. Ele bebeu a última
gota de cerveja, e estava prestes a pegar outra, quando Caroline desceu depois de ter posto Lisa na cama. Ela
sentou ao lado de Paul, e puxou-o pela gravata para dar um beijo.
“Estou exausta”, Caroline levantou os pés, pedindo uma massagem, “mas feliz que o dia foi bom.”
“As crianças lhe deram uma canseira?”
“Nos divertimos muito”, respondeu ela, sorrindo. “Fomos patinar no gelo e vimos um filme, um daqueles
de super-herói.”
“Parece legal,” disse Paul. Normalmente, era ele que fazia esses passeios com as crianças, mas
quando Caroline encontrava tempo entre os frequentes voos ao exterior, ela ia com prazer.
“Você sabe”, disse ela, “na volta as crianças tiveram uma discussão no banco de trás. Discutiram como
será quando eu for presidente”.
Paul dobrou o jornal no colo, e dedicou-se a massagear os pés da esposa. “Tenho certeza que Lisa
estava toda animada, hoje em dia ela só fala no ‘poder feminino’.”
“Não, na verdade, ela teve algumas reservas”, relatou Caroline. “Ben estava entusiasmado com a ideia
de eu ser presidente. Ele disse que eu iria viajar menos. Fiquei realmente emocionada com isso.”
“Lisa teve um bom contra-argumento?” perguntou Paul.
“Quer dizer, além de chamá-lo de cara de porco?” disse ela. “Na verdade, ela tinha. Ela disse que seria
como é com o vovô. Em casa, mas sempre ocupado, em seu escritório.”
“Ela é bem inteligente. Então, quem ganhou o debate?”
“Ah, não deixei se prolongar”, disse Caroline, “Lembrei-lhes que não é a primeira vez que o vovô falou
em se aposentar em breve. Além disso, eu não tenho certeza se quero ser presidente”.
Esta não era a primeira vez que Paul ouvia essas ideias de sua esposa.
“Querida”, disse ele, “Eu sei o quanto você ama seu trabalho, e a satisfação que isso lhe dá, mas
sempre soubemos que viria o dia em que você sairia das Compras e assumiria o lugar de Henry.”
“Eu não sabia disso,” vendo o olhar incrédulo do marido, ela acrescentou, “eu nunca pensei que ele
falava sério sobre sair, não antes de completar oitenta, pelo menos. A Hannah’s Shop é toda a sua vida, e
sempre foi. Eu pensei que tinha mais tempo.”
“Todos pensaram isso,” respondeu Paul, refletindo em silêncio sobre sua própria situação, “mas agora
que é para valer, que diferença faz? Você vai dar uma grande presidente”. Independentemente dos problemas
que enfrentaria quando isso acontecesse, Paul não poderia desencorajar sua esposa a assumir a presidência.
Ao contrário de sua futura promoção, ela receberia a dela por mérito.
“Eu não tenho tanta certeza quanto você”, rebateu ela. “Há muitas chances de eu levar a empresa ao
buraco.”
“Do que você está falando?” Suas mãos involuntariamente pararam de friccionar e ele olhou para sua
esposa, atônito.
“Minha vida toda eu vi meu pai comandar o espetáculo,” Caroline ergueu os joelhos, protegendo-se.
“Eu sei que não posso fazer o que ele faz. Eu conheço, vivo e respiro as Compras – mas isso está longe de ser
suficiente para gerir uma empresa deste tamanho. Papai está envolvido em muito mais coisas. Ele comanda a
empresa na área de marketing, de logística, de pessoal, locais de lojas e até mesmo na disposição delas. E o
mais importante, ele sabe quando pressionar e quando parar.”
Paul ficou surpreendido com a baixa autoestima da sua esposa, e aproximou-se dela no sofá. “Por
favor, Cara. Ambos sabemos que dominar essas áreas não é um obstáculo real para você.”
“Não se trata de dominá-las”, disse ela em voz baixa, “trata-se de juntar tudo isso. O que eu faço
melhor é localizar rapidamente as oportunidades e transformá-las em bons negócios. Esse é o meu diferencial,
o meu talento, a razão pela qual eu sou tão boa nas Compras. Mas para ser presidente, é preciso ter uma
visão holística do sistema. É a diferença entre um estrategista e um tático, e eu sou o último. Há alguns dias
atrás, eu tive um bom exemplo disso; meu pai me mostrou a diferença entre nós”.
“Seu pai não começou como presidente de uma rede enorme, ele teve que chegar lá”, tentou Paul.
“Com o tempo você vai superá-lo.”
“Ele teve tempo de aprender conforme a empresa crescia,” Caroline respondeu. “Hoje a concorrência é
tão feroz, e a margem que temos é tão pequena, que um erro meu seria suficiente para fazer a bola rolar
ladeira abaixo, e não vou poder detê-la. E para piorar ainda mais, isso deixaria meu pai arrasado. Ele trabalhou
muito para transformar a pequena loja da Nana numa grande empresa. Eu não consigo pensar em destruir o
trabalho de sua vida. Estou morrendo de medo de vir a ser sua maior decepção.” Ao dizer essas palavras, ela
afastou a cabeça da de Paul, e olhou para as árvores altas que podiam ser vistas através da grande janela.
Já há algum tempo, Paul procurava a oportunidade certa para contar seu dilema à sua esposa. Agora,
ao ver a aflição dela, Paul decidiu não lhe dizer como ele estava dividido entre sua integridade e seus
compromissos, entre não receber promoções não merecidas e estar presente para seus filhos. Se ele tivesse
feito isso, ela teria usado seus problemas como escudo para os medos dela como desculpa para recusar este
cargo que ela merecia e que lhe convinha. Ele não seria capaz de carregar a culpa de ela abrir mão da
presidência por causa dele.
Paul colocou a mão em seu braço e perguntou: “Não existe outra solução?”
“Como trazer alguém de fora da família? Ele nunca vai fazer isso”, disse Caroline, dispensando a
própria ideia com um encolher de ombros. “E mesmo se o fizesse, eu não tenho certeza se quero. Agora estou
numa posição única, e se meu pai trouxer alguém de fora, a minha influência na direção da empresa pode ficar
comprometida. Você se lembra do que aconteceu quando eu quis introduzir tapetes e carpetes? Eu levei a
ideia para Christopher, que talvez seja a única pessoa fora da família que meu pai confiaria a empresa. Ele não
queria nem saber da minha ideia. Mas quando eu a levei para meu pai, ele viu o potencial, e desenvolveu esse
departamento autônomo que temos hoje. Adoro Christopher, mas não poderia trabalhar recebendo ordens dele
– ele não faz nada de novo, e sufoca qualquer iniciativa. Ele acredita que em time que está ganhando não se
mexe”.
“Mas é um caso, é Christopher, Cara,” implorou Paul. “Talvez outra pessoa seja aberta a novas ideias.”
“Mas é o caso em questão,” seus olhos escuros cintilaram. “O novo presidente não será meu pai.
Ninguém que entrar será capaz de confiar tanto para mim. As coisas vão mudar, e as minhas asas serão
cortadas.”
“Então onde você fica?”
“A única opção que me resta é Darren”, disse Caroline. “Darren é quem tem o instinto agudo para
negócios e a visão estratégica, não eu. Por isso que todos estes anos meu pai quis que Darren assumisse. Se
ele aparecesse amanhã, pronto para voltar à empresa, papai iria perdoar e esquecer todas as palavras ásperas
entre eles, e dar a ele a presidência num piscar de olhos. E com Darren como presidente, eu conseguiria o que
quisesse, facilmente. Ok, não facilmente - mas eu poderia trabalhar com ele”.
Paul inclinou-se e delicadamente afastou o cabelo escuro de sua mulher. Ele sabia que o retorno de
Darren poderia resolver os problemas de ambos. Sua tentativa de convencer o seu colega de faculdade a
voltar para Miami não tinha sido tão bem-sucedida, mas agora era melhor Darren tomar cuidado: uma coisa era
fugir do cunhado, mas outra suportar a irmã caçula. Em vez de apenas trabalhar com ele, Caroline iria fazê-lo
trabalhar até cansar.
Ele beijou-a ternamente, e ela encostou a cabeça no ombro dele, grata pelo apoio. Deixando-se relaxar
em seus braços, Caroline adiou seu dilema para outro dia.
Capítulo 8
Paul desceu com o elevador de serviço ao subsolo do shopping.
Quase quatro semanas haviam se passado desde aquela manhã terrível, e ele ficou satisfeito por
descobrir que os corredores já não fediam. Raul tinha acabado de lhe informar que as últimas junções
tinham sido encontradas, por isso o trabalho estaria concluído antes do previsto, e Paul desceu correndo as
escadas para ver se conseguia uma data para levar sua mercadoria de volta.
Ao entrar no estoque, viu que as novas tubulações no teto estavam intactas, mas ainda não rebocadas.
Ao ouvir o barulho da obra do depósito vizinho, ele espiou lá dentro “Estamos indo bem ou não?” gritou Al, o
encanador.
“Está maravilhoso, maravilhoso”, respondeu Paul e deu um tapinha nas costas do homenzinho. “Você
tem ideia de quando posso trazer as minhas coisas para cá?
“Só mais uma semana, no máximo”, foi a resposta. “Temos que fazer um teste amanhã cedo. Tenho
que verificar se está tudo à prova d'água, e ainda temos de rebocar tudo. Fale comigo amanhã à tarde, que
terei uma ideia melhor.”
Paul agradeceu efusivamente. Ele ficou aliviado ao saber que em breve as coisas voltariam ao normal.
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“Papai, Rachel vai dar uma festa do pijama no aniversário neste fim de semana”. Lisa prendeu seu
cinto de segurança e perguntou: “Eu posso ir, né?”
“Eu vou ter que falar com sua mãe, mas acho que tudo bem.” Como sempre nas quartas-feiras, Paul
tinha ido buscar sua filha na volta para casa. Quando a menina começou a enumerar os convidados, o celular
dele tocou.
“Querida, eu tenho que atender”, disse Paul. “Alô, é o Paul White”.
“Olá, Paul, é Bob do Financeiro. Lembra de mim do piquenique da empresa?”
“Sim, claro,” Paul tinha uma vaga ideia de um homem gordinho, com óculos de tartaruga que suava em
baldes. “Bob, você está no viva-voz, e minha filha está no carro comigo”.
“Tudo bem, Paul, tenho certeza que ela ficará feliz em saber que você ficou em primeiro lugar este
mês,” relatou Bob. “Eu quis ligar para lhe dar a boa notícia. Parabéns!”
“Excelente!” Paul reprimiu sua descrença. “Obrigado por me avisar. Tenho certeza que todos na loja
ficarão felizes de saber disso amanhã.”
“Não tem de quê, Paul,” disse o encarregado do Financeiro. “Por favor, mande lembranças a Caroline.”
Paul encerrou a ligação educadamente. Não era a primeira vez que alguém pensava em ganhar pontos
por bajular o genro do chefe.
“Nossa, papai”, disse Lisa. “Você é o número um! Vai ganhar algum prêmio?”
“Um grande beijo da minha filha”, caçoou Paul. “Mas não se anime muito, provavelmente é só um
reajuste.” Embora as vendas da loja tenham sido melhores, recentemente, ele sabia que não havia como ter
ficado em primeiro.
“Reajuste?” perguntou a menina. “O que significa isso?”
“É quando as pessoas do Financeiro fazem uma alteração em partes da empresa, sem comprar ou
vender nada”, tentou explicar. Vendo seu olhar confuso no retrovisor, ele tentou outra explicação. Incapaz de
criar um exemplo apropriado ao caso, contentou-se com um que, ao menos, esclareceria o conceito.
“Por exemplo, se os preços dos imóveis sobem numa área, então o valor da propriedade da empresa
vai lá para cima também. E estes contadores registram-no como lucro, embora não tenha sido ganho nenhum
dinheiro.”
Visivelmente decepcionada, Lisa disse: “Então não é de verdade?”
“Não, querida. Veja, os números da loja provavelmente voltarão ao lugar no mês que vem.” Embora
feliz por sua loja haver alcançado o primeiro lugar, Paul não estava satisfeito. Falso sucesso não era sucesso.
“Ah,” disse ela, mas de repente se animou. “Não importa, papai, você ganha o beijo de qualquer
maneira. Principalmente se eu puder ir à festa da Rachel.”
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“Mãe, sabia que os reajustes podem colocar você em primeiro lugar, mas não de verdade?”
Assim que Paul e Lisa entraram pela porta da frente, Caroline desceu para encontrá-los no hall de
entrada. Ela estava usando seu vestido de noite favorito, quase pronta para a festa beneficente a qual eles
iriam nessa noite. Como ela não tinha ideia a que sua filha se referia, Caroline olhou para Paul, que
rapidamente pediu a sua filha para lhes dar licença e irem para o escritório.
“Vá fazer algo produtivo”, sugeriu ele. “Como ver televisão.”
“Pode explicar isso?” Caroline estava curiosa.
“Bob do Financeiro ligou,” Paul largou sua pasta e começou a desatar o nó da gravata. “Ele disse que a
loja ficou em primeiro na região este mês, então eu expliquei a Lisa que são apenas reajustes, e não números
reais”.
“Reajustes? Que tipo de reajuste levaria sua loja ao primeiro lugar?” perguntou Caroline
encaminhando-se para as escadas. “Além disso, não faz sentido. Se fossem reajustes, o Financeiro não teria
ligado. Eles nunca lhe dariam parabéns se você não tivesse nada a ver com isso.
“Talvez seja exatamente o oposto. Talvez o puxa-saco do Bob quisesse que eu soubesse que devo a
ele meu ranking elevado. Querida, vou tomar um banho rápido e já venho.” Paul entrou no espaçoso banheiro
junto à suíte master.
“Quanto mais eu penso nisso”, disse Caroline, seguindo-o, “mais fico convencida de que o Financeiro
não teve nada a ver com seu ranking. O ranking interno é algo tão sensível que o Financeiro sabe que nunca
deve brincar com ele. Querido, deve ser verdade. Deve ser algo que realmente alavancou o desempenho da
loja.”
“Tudo bem, talvez esteja certa”, admitiu Paul enquanto colocava suas roupas amarrotadas no cesto.
“Realmente tive vendas muito boas este mês. Mas não tem nada a ver comigo. Você sabe que as vendas
sempre flutuam, muitas vezes sem razão aparente.”
“Tenha dó, Paul, você põe de lado rápido demais.” Caroline começou a jogar ideias, querendo
desvendar esse mistério. “Você não lançou nada de novo? Não mudou alguma coisa?”
“Algumas coisas mudaram para mim mesmo. Com certeza estão diferentes agora, mas só que piores”,
gritou o marido de dentro da água quente. “Desde o estouro das tubulações tudo virou de ponta-cabeça. O
estoque está em obras, então toda a mercadoria é guardada fora. Com Roger me enviando mercadorias
diariamente do regional, eu venho vivendo um dia após o outro”.
“Sim, eu sei”, Caroline disse, e saiu para experimentar três pares diferentes de brincos. Quando Paul
saiu do chuveiro com um roupão verde, secando os cabelos, ela continuou, “Se sua loja está indo melhor,
alguma coisa deve ter mudado. Ela está operando de uma maneira estranha nessas últimas semanas. Talvez
tenha algo a ver com isso. Você não notou nada de positivo?”
“Bem, as vendas estão em alta, e já que eliminei várias mercadorias, mais do que era realmente
necessário, a disposição está muito melhor. Será que a disposição tem um impacto tão grande nas vendas?”
“Tem, sim”, respondeu Caroline à sua pergunta pseudo-retórica e se sentou para calçar os sapatos de
salto. “Uma disposição mais bonita atrai muitos mais clientes para dentro da loja.”
“Mas o número de pessoas na loja não aumentou”, Paul pegou as calças do smoking recém-passado
do cabide e começou a vesti-lo. “Eu monitorei cuidadosamente. Todo dia os caixas registram de vinte a 30%
mais, mas o número de clientes que entram na loja não é diferente de antes. Acredite, depois de tantos anos
empacado nessa loja, eu teria notado uma diferença”.
Atenta à frustração expressa nas palavras do marido, Caroline ficou ainda mais determinada a insistir,
para tentar entender a inesperada conquista de Paul.
“Então, deve ser que o aumento das vendas não é porque as pessoas entram mais na loja, mas que,
em média, cada pessoa que entra na loja compra mais”, concluiu.
“O que poderia causar isso?”
“Não sei”, sinalizou Paul, na falta de ideias, enquanto ela colocava abotoaduras nas mangas dele.
“O que pode aumentar as vendas em vinte a trinta%?” Caroline perguntou em voz alta. “Não são os
motivos de sempre, como promoções ou coleções excepcionais. Então, o que pode ser?
Paul terminou de endireitar a gravata. “Eu lhe disse, são apenas flutuações”.
“Talvez”, respondeu Caroline, e entregou a seu marido o colar que ele lhe havia comprado na ocasião
do 10º aniversário de casamento. “Pode me ajudar a pôr?”
Com o colar colocado e de casaco, o casal desceu para o piso inferior da sua casa em Belle Meade.
Lisa estava na cozinha, ajudando Juanita a preparar o jantar, e Ben estava concentrado no console de jogo no
escritório. Eles interferiram em ambas as atividades para dar um beijo de despedida e de boa noite, e disseram
a Juanita que voltariam por volta das onze.
Caroline pegou as chaves perto da porta de forma decidida, e ele entendeu que ela é que dirigiria. Ao
dar a partida, Caroline disse: “Sabe, querido, há outra coisa que aumenta as vendas. No entanto, não vejo
como isso pode explicar o seu caso.”
“O que é?”, perguntou Paul.
“Todo mundo acusa as Compras pela perda de vendas; Se tivéssemos comprado o suficiente do
produto certo... ou se o tivéssemos enviado logo. Sou sempre pressionada a reduzir as faltas. Mas eu não vejo
como o comportamento estranho de sua loja pode ter reduzido isso.”
“Nem eu, mas o engraçado é que eu tenho menos faltas, bem menos do que costumava ter,” confirmou
Paul. “Mas isso não pode ser a força motriz por trás do aumento das vendas. Dois ou 3% eu até acreditaria.
Mas vinte? Sem chance.”
“Apenas dois ou 3%?” retrucou Caroline, surpresa com a resposta. “Isso vai contra todos os relatos que
você me conta. Durante os últimos três anos sempre se queixou sobre todas as faltas que teve. Toda essa
comoção foi por algo que praticamente não afeta as vendas?”
Paul começou a falar, mas Caroline o interrompeu, e pisou com raiva o acelerador. “Não – não
responda, não é só você. Toda semana eu levo gritos dos gerentes regionais, protestando por não ter
comprado estoque suficiente, pressionando-me a expedir este ou aquele item. No entanto, aqui está você,
alegando que isso não é realmente importante. Sem essa, José”.
“Eu nunca disse que não é importante, claro que é”, disse Paul na defensiva, esperando que ela
desacelerasse. “Dois ou 3% é muito significativo. Mas as vendas perdidas devido à escassez respondem por
mais do que isso. Afinal, os itens que vendemos são intercambiáveis. As pessoas vêm querendo toalhas e
compram toalhas. Se não encontram a toalha dos sonhos, contentam-se com outra.”
“Mas e lençóis?” desafiou ela, entrando na rampa de acesso à Route 195. “Se vou comprar lençóis, e a
loja está sem os lençóis de que gosto, não só eu não compro, mas provavelmente não vou voltar a essa loja!”
“O que está falando?” Paul repreendeu sua esposa, brincando. “Lençol é o ramo da sua família – você
nunca teve que ir a uma loja para comprá-los! Mas enfim, você é mais exigente que a maioria.”
“Talvez seja”, rebateu ela, ainda insatisfeita com a resposta. “Mas você está perdendo todos os clientes
exigentes, e sua clientela é de senhoras exigentes de Boca. Francamente, acho que as faltas são a principal
razão para as pessoas saírem da loja de mãos abanando”.
“Tenha dó, Cara, não perca a perspectiva”, disse Paul, vendo as luzes da rua cintilando na água. “Para
começar, apenas um em cada cinco clientes que entra na loja realmente realiza uma compra. E não é devido à
escassez. Desafio-a a encontrar-me uma mulher atrás de um novo tapete ou jogo de cama que não visite, pelo
menos, algumas lojas antes de realmente comprar.”
O instinto de Caroline dizia aos gritos que Paul estava errado, que o impacto da escassez sobre as
vendas perdidas era muito maior do que sua estimativa. Mas como provar isso a ele? Ela tentou outra
abordagem. “Quantas faltas costuma ter? Ou melhor, se pegar a lista de SKUs que sua loja devia ter e fizer um
levantamento do estoque, quantos itens você não tem?”
Paul cantarolou um pouco. “Mmmm... algo em torno de um terço e um quarto, acho eu. Sim, temos
faltas de 500 ou 600 de duas mil SKUs que minha loja devia ter. Mas querida, infelizmente, isso não é por
causa de mim ou de Roger.”
Caroline ignorou sua tentativa de culpar as Compras. Esse não era o verdadeiro assunto em questão.
Ela deixou uma Subaru ultrapassá-la antes de pegar a saída norte para Alton Road. “Imagino que as SKUs que
estão esgotadas são as mais populares, né?”
“Naturalmente”.
“Lá vai você!”, exclamou, mal conseguindo entrar no Mt. Sinai Medical Center. “Se estiver faltando
cerca de um quarto das SKUs e as que estão faltando são provavelmente os itens de melhor saída, como pode
afirmar que perde apenas dois a 3% das vendas devido à escassez?”
Enquanto Caroline mostrava o convite para o homem malvestido que cuidava do estacionamento, Paul
tentou entrar em acordo com essa nova percepção. Não totalmente convencido pelo argumento da esposa,
tentou checar se este fenômeno poderia explicar o recente aumento das vendas. “Eu acho que ultimamente
tenho muito menos faltas. Não me cobre números, não chequei realmente, mas a minha impressão é que a
escassez caiu consideravelmente a não mais de 200 SKUs.”
Ao estacionar o carro na vaga, Caroline não conseguir controlar o seu entusiasmo. “Comparado ao
mês anterior, você está com centenas de SKUs mais em sua loja, muitos dos quais são os itens mais
procurados. Não soa apenas os das senhoras exigentes de Boca! São os itens que seus clientes realmente
querem! Como pôde pensar que isto levaria a que apenas 2% de aumento nas vendas?”
“Está bem. Isso explica um aumento de vendas de vinte%. Mas, querida”, disse Paul, tirando o cinto de
segurança e abrindo a porta do carro, “por que isso aconteceu? Quer dizer, por que é que o número de faltas
entrou em queda livre? Tudo que tenho feito é transportar produtos de um lugar para outro”.
Caroline enrugou a testa, “Talvez o Roger tenha algo a ver com isso?”
“Deve ser”, concordou Paul. “Vou verificar com ele amanhã cedo.”
Eles entraram na festa, ela de braços dados com ele.
Capítulo 9
Na manhã seguinte, quando Paul entrou pela porta traseira, viu Javier e Janine tomando café na
colorida cozinha. Ele ficou imaginando se os dois estavam se vendo depois do expediente.
“Bom dia”, ele os cumprimentou, ao passar.
Javier o deteve. “Bom dia, chefe. Ouvi dizer que a obra lá embaixo está quase terminada. Eu acho que
as coisas vão voltar ao normal em breve, certo?”
“Sim, em mais ou menos uma semana”, disse Paul. “Obrigado pela paciência. Me diz uma coisa,
apesar do caos, como foram as coisas?”
“Eu trabalhei bastante, mas foi bom”, respondeu o gerente da seção de tapetes e carpetes.
“E com você, Janine?”
“Todos os meus clientes estão sorrindo,” respondeu a loira que dirigia a seção de jogos de mesa.
“Deve ser o seminário sobre o poder do pensamento positivo para o qual você nos enviou. Realmente
funciona!”
“Parece ótimo!” Paul fez um sinal de positivo.
Continuando na linha da conversa da noite anterior, ele perguntou: “E quantas faltas vocês têm? Quero
dizer, no mês passado, quantas SKUs se esgotaram?”
“Muito menos do que o normal. Se costumava faltar coisas quase uma vez por hora, agora me falta
algo uma vez, talvez duas vezes por dia. Sabe de uma coisa, chefe”, disse ela, animadamente, “talvez essa
seja a razão para o bom clima. Encontrar o que querem em nossas prateleiras deixa os clientes mais
satisfeitos”.
“Pode ser, mas quanto isso influenciou as vendas?”
“Claro que as pessoas compram mais quando acham o que estão procurando”, disse ela.
“Este é o meu caso, também”, concordou Javier, com um sorriso no rosto.
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Paul usou o sistema para verificar quantas SKUs haviam aparecido na lista de faltas de janeiro. Ele,
então, verificou como esses itens venderam em fevereiro. A renda desses itens correspondia aproximadamente
ao aumento nas vendas. Obviamente, o fato de mais desses itens estarem disponíveis na loja tinha sido
responsável pelo grande aumento das vendas.
Ele, então, verificou a lista de faltas de fevereiro, e viu que elas tinham caído de vinte e nove para 11%.
Caroline estava certa, e Janine, também. Ter menos faltas foi o principal motivo para a melhora.
No entanto, a questão da noite anterior ainda permanecia. Como ele poderia ter menos faltas do que o
normal? Além disso, se a loja estava vendendo muito mais, seria de se esperar que houvesse mais faltas, não
menos. Ele só havia transferido seu estoque de um depósito para outro, ainda mais longe.
A única explicação plausível era que Roger não tinha apenas enviado do lote de Paul, mas que
também tenha aumentado as remessas do depósito regional. O velho Rog.
Não, isso não poderia ser a explicação. Para cada uma das SKUs faltando havia um pedido em aberto;
o sistema o gera quando o estoque na loja cai abaixo do nível de estoque mínimo predeterminado. Portanto, o
fato de haver faltas na loja era porque não havia disponibilidade também no depósito regional. De onde é que
esses itens apareceram de repente? Será que uma grande remessa especificamente com os itens faltantes
chegara ao porto? Não era provável. O que estava acontecendo?
Ele pegou o telefone.
“Roger, bom dia.”
“Oi, Paul, e aí?”
“Eu estou tentando entender uma coisa”, disse Paul. “Você foi me enviando artigos do estoque geral, e
não apenas da minha pilha?”
“Isso. Você não verificou a sua lista de pedidos especiais?”
“Você é um amigão, Rog,” respondeu Paul. “Mas não fiz nenhum pedido especial.”
“De certa maneira você fez,” Roger parecia se divertir. “Quando as suas listas diárias incluem pedidos
de itens que você sabe que não tem há semanas, não é um pedido especial?”
Paul percebeu que seu amigo se referia aos itens adicionais que Maria tinha pedido para acrescentar à
lista diária; itens que faltavam antes do estouro das tubulações. “Mas como é que você tinha os itens
disponíveis? Sempre que você tem no estoque, não envia imediatamente para as lojas o que elas têm em
aberto?
“Depende do que você chama de estoque”, esclareceu Roger. “Todos vocês, gerentes, e ainda mais os
contadores da matriz, ficavam no meu pé por entregar pedidos parciais. Todos alegam que sair das
quantidades pedidas bagunça o balanço do final do trimestre e do final do ano. Parece que é algo tão sério que
o novo sistema não me permite enviar quantidades parciais de um pedido”.
“Fico feliz por você ter encontrado este espaço para despejar sua raiva na contabilidade,” interveio
Paul, “mas como isso se relaciona à minha pergunta?”
“Diretamente”, respondeu Roger. “Se sua loja pede quatro caixas e eu só tenho duas, não posso
mandá-las para você. Portanto, os depósitos sempre acabam com as sobras, os resíduos. Não tem muita
importância para nós, porque, por definição, um resíduo é menor do que um pedido de uma única loja, mas em
relação à quantidade diária que você está pedindo, é bastante. É de lá que esses itens vieram.”
“Roger, muito obrigado”, disse Paul agradecido. “Por causa do que vem fazendo, tenho muito menos
faltas, e como resultado minhas vendas subiram 25% este mês.”
“Impressionante”, disse Roger satisfeito. “Eu vou dizer ao meu pessoal que embala suas mercadorias
que o trabalho deles tem sido útil.”
“Agradeça a eles pessoalmente por mim”, Paul encerrou. “E obrigado novamente, Roger. Para lhe
compensar, da próxima vez que formos a um jogo do Heats, eu pago os ingressos.”
“Também ganho um refrigerante?”
Não só Caroline estava certa, refletiu Paul, mas, graças a Roger, muito mais tinha acontecido. Quando
ele deixou Maria adicionar ao pedido para Roger os itens que faltavam para ela, Paul apenas esperava
conseguir um pouco de paz e tranquilidade de seus empregados. Ele tinha muito conseguido mais do que isso.
Esses pedidos eram a razão de seu sucesso!
As faltas tinham caído e as vendas subido, e Paul via claramente a ligação entre as duas. O
desempenho da loja de Boca definitivamente não era o resultado da flutuação de um mês ou de pura sorte.
Seria este o milagre que ele tinha tanto pedido? Teria ele encontrado a forma sistemática de melhorar
o desempenho de uma loja? Se este fosse o caso, então ele tinha ganhado sua programada promoção de
forma justa.
No entanto, a incerteza o incomodava. Alguma coisa não batia. Em geral, o lucro sobre as vendas na
Hannah’s Shop era de 6%. Portanto, quando as vendas da loja subiram um quarto, a rentabilidade devia ter
aumentado em 6% disso, 1,5%.
Isto teria deixado os ínfimos 3,2% de janeiro de Paul para algo perto de 5%. Longe de Delacruz no
topo, que se mantinha consistente com mais de 7%. Então, como sua loja foi do oitavo para o primeiro lugar na
região?
Para tentar desvendar este mistério, ele pediu a Alva para ligar para o Financeiro.
“Oi, Paul!” Bob parecia genuinamente satisfeito ao ouvir o gerente da loja de Boca.
“Bob, posso perguntar como minha loja foi no mês passado, em comparação com o resto da região?”
perguntou Paul.
“Como eu lhe disse, a loja de Boca Raton alcançou o primeiro lugar este mês.”
“Sim, você disse, obrigado”, disse Paul. “E em comparação? Nós fomos muito melhor que as outras?”
“Paul, eu não me sinto bem divulgando informações sobre outras lojas”, respondeu Bob. “Todas as
informações serão incluídas no relatório que sai na próxima semana. Mas posso lhe dizer os números de seu
desempenho. Embora não sejam definitivos, a sua loja obteve um lucro extraordinário, alcançando 17,4%. É
assim que você chegou ao primeiro lugar na rede. Nenhuma outra teve um lucro nem perto disso.”
Paul agradeceu e desligou. O número um em toda a rede? 17.4%? Isso era absurdo. Deve ser
contabilidade criativa, reajustes ou simplesmente bobagem. Talvez tivessem registrado a indenização do
seguro nos livros como renda.
Talvez tivessem anulado o contrato de aluguel desse mês do depósito.
Mas de uma coisa Paul tinha certeza: que esta rentabilidade não podia ser verdadeira.
Capítulo 10
“Olá, querida”, Caroline disse, aparecendo na entrada de casa. Paul sempre admirara a sua energia.
“Fez alguma descoberta?”
“Descobri que deveria ouvi-la com mais frequência”, Paul confessou e deu-lhe um beijo na bochecha.
“Você estava certa. O aumento das vendas não é puro acaso. Está diretamente ligado ao fato de que eu ter
muito menos faltas. E você estava também estava certa que isso se devia à intervenção de Roger.”
“Então você é o primeiro na região!” Caroline sorriu. “Eu disse que era para valer!”
“Sim, muito”, respondeu ele cinicamente, “com 17.4% de rentabilidade”.
“Por favor, fala sério”, respondeu Caroline.
“Soube direto do Financeiro”, disse Paul. “Você vê o absurdo disso?”
Paul encolheu os ombros e caminhou até a cozinha, para verificar a lasanha feita por ele. Caroline o
seguiu, ansiosa.
“Talvez tenha ouvido errado?” perguntou Caroline. “Ou talvez ele estivesse confuso, e quisesse dizer
7.4?”
Paul virou-se para ela e disse, “17.4%. Bob também disse que eu era o primeiro não apenas na região,
mas de toda a rede. Ele não se confundiu. Essa brincadeira de números está me deixando louco.”
“As pessoas do Financeiro não brinca com números, não com o ranking. Se disseram alguma coisa, é
porque já verificaram,” disse sua esposa contrariada, e pegou quatro pratos do armário.
Paul estava cético: “Talvez sim, mas ainda parece suspeito para mim.”
“É estranho.” Caroline admitiu, dispondo os pratos na mesa da cozinha. “Eu já vi lojas atingirem
rentabilidade de dois dígitos, mas era sempre temporário. O grande aumento das vendas em sua loja é
baseado em algo sistemático – é sustentável. Isso é algo muito diferente.”
“Eu fiz os cálculos, querida”, explicou Paul, ao desligar o forno. O cheiro de tomate, orégano e
mussarela enchia a cozinha. “Com o aumento das minhas vendas, a lucratividade devia ter atingido 5%, no
máximo.”
Dispondo os talheres e guardanapos, Caroline perguntou, “Então, de onde vieram esses 12%, se não
das vendas? Tenho certeza que você não cortou custos em 12%.”
“Claro que não. Com a crise, eu fiquei tão apavorado que minhas vendas cairiam que não ousaria
cortar nada que pudesse comprometer ainda mais as vendas.” Paul franziu a testa, aproximando as
sobrancelhas. “Espere aí. Pensando bem, no mês passado não gastei um centavo a mais, apesar de minhas
vendas aumentarem drasticamente.”
“Isso é interessante”, Caroline pensou em voz alta, com os óculos nas mãos, “Eu achava que quando
as vendas subiam, havia um aumento proporcional das despesas.”
“Não neste caso”, respondeu o marido, pondo uma luva de forno. “Eu tive vendas melhores, mas as
mesmas despesas do mês anterior. Não só não utilizei os descontos para impulsionar as vendas, mas não
anunciei tampouco usei horas extras.”
“Então, os custos gerais foram os mesmos que em janeiro?” Caroline perguntou.
“Com certeza.”
“Então, você vendeu mais 28% sem aumentar um centavo aos custos gerais! exclamou ela, e seu
entusiasmo apagou de sua mente os óculos que ela ainda segurava. “Isso significa que para a venda extra de
fevereiro, os únicos custos foram os custos básicos de aquisição! Você obteve a margem de lucro total sobre
essas vendas extras como aumento no seu lucro líquido!”
“O custo de aquisição é de cerca de metade do preço de venda, certo?” Paul fundamentou
animadamente, com os olhos brilhando, e acenando a luva do forno. “Então, isso significa que a outra metade
das vendas extras da minha loja foi lucro puro”.
“E metade dos 30% das vendas adicionais perfaz mais 14% de lucro que o levou ao primeiro lugar.”
Caroline pulou feliz. “Agora você
acredita que merece estar em primeiro?”
“Nossa, é de verdade”, disse Paul, espantado.
A calma desceu sobre a cozinha. Caroline finalmente largou os óculos. Paul tirou a lasanha do forno e
colocou-a sobre um tripé no centro da mesa, inundado pelas novas conquistas.
Ele tinha tornado a loja realmente rentável! Tinha encontrado uma maneira muito melhor de comandar
uma loja. Seu desafio agora seria garantir que isso não fosse desperdiçado; só se isso se proliferasse por toda
a região, talvez pela rede inteira, sua conquista teria valor. Com estes números, ele sabia sua ascensão na
empresa não teria nada a ver com estar casado com a alguém da diretoria. Não havia razão agora para
divulgar seu currículo.
Ele beijou Caroline apaixonadamente. “Querida, toda aquela correria valeu a pena. Eu tentei apagar
um incêndio, e encontrei um caminho para o sucesso.”
“Era apenas uma questão de tempo”.
“Obrigado, Cara,” disse Paul, “e muitos agradecimentos mais devem ir para Roger. Mas agora, em vez
de lhe pedir para enviar todo o meu estoque de volta, tenho de convencê-lo a continuar com as reconstituições
diárias. Indefinidamente. Isso não será fácil. Enviar-me pequena quantidades a cada dia deve estar
enlouquecendo o pessoal. Eu vou ao depósito falar com ele amanhã cedo.”
“Boa ideia,” disse ela e tirou uma salada da geladeira.
“Crianças! O jantar está na mesa!” Paul estava ansioso para dizer a Lisa que o primeiro lugar era
definitivamente para valer.
Capítulo 11
O depósito regional consistia de mais de 7.400 metros quadrados de caixas.
Plataforma sobre plataforma se espalhavam no comprimento e na largura, e quase alcançavam o teto
de 8 metros de altura. Enquanto Paul atravessava o depósito, duas empilhadeiras passaram, cada uma
carregando grandes paletes de caixas. O caminhão na área de carga estava sendo carregado por três homens
fortes, com macacão da empresa e equipamentos de proteção.
Nos fundos, depois de subir um lance de escadas estava o escritório do gerente, com vista para todos
os processos do gigantesco complexo. Esperando no topo da escada estava o gerente do depósito afroamericano, com um olhar perplexo no rosto.
“Então, você finalmente veio recolher suas mercadorias?” Roger brincou. “Eu posso pedir ao meu
supervisor para ajudar, caso você se perca.”
“Ha, ha”, replicou Paul. “Não é à toa que você está em boa forma – só para chegar à sua sala, perdi
dois quilos.”
“Venha, eu vou lhe servir um “chafé” da máquina”, disse Roger. “Então, o que o traz até este pântano?”
Paul entrou no escritório com ar condicionado e tirou os papéis nos quais ele e Caroline tinham
trabalhado na noite anterior. “Acontece que a melhor coisa que aconteceu para mim recentemente foi esse
estouro do encanamento. Eu lhe disse que minhas vendas melhoraram, só não havia percebido o impacto total.
Agora estou em primeiro lugar na rede!”
Roger assobiou em reconhecimento.
“Olhe para estes números”, salientou Paul. “Mostram o quanto as faltas caíram por sua causa, Rog. E
olha aqui, isso mostra apenas as vendas de itens que, sem você, não estariam disponíveis na loja. Estas
vendas adicionais impulsionaram meus lucros para 17.4%”.
“Impressionante!”, respondeu Roger. “E eu sou o culpado por isso? É por isso que você veio aqui –
para me agradecer pessoalmente?” Ele se perguntava por que Paul tinha ido até o depósito.
Apesar de ter apreciado o gesto, a ligação de ontem tinha sido suficiente para ele.
“Na verdade, eu não vim só para agradecer a você”, ele respondeu. Com cuidado, ele optou por adiar o
que pensava ser uma ideia ameaçadora, a das reposições diárias para toda a região, e preferiu se concentrar
num assunto mais próximo – o de continuar só para sua loja. “Eu tenho outro pedido, um grande favor. Embora
o depósito da loja possa estar em condições de uso na próxima semana, acho que devemos continuar a
trabalhar da maneira que fizemos neste mês.”
Roger ficou em silêncio, concentrando-se. Paul estava preocupado pensando se Roger iria expulsá-lo
dali. Ele podia ter acabado de sair do reino da amizade e entrado para o campo da bagagem extra.
“Rog,” ele começou, “estas operações que desenvolvemos podem aumentar os lucros para níveis que
ninguém achava possível. Você não acha que devemos continuar fazendo isso? Estou pedindo demais?”
“Você sabe que está pedindo muito”, foi a resposta. “Leva-se tempo, mão de obra, e organização, para
não falar das queixas dos meus funcionários. Todo dia, pegam sua lista, veem o que está na pilha do inventário
da sua loja...”
Paul tentou interromper, mas Roger continuava a falar.
“Eles têm que recolher o que está faltando de todo o depósito, trazer isso para sua pilha, abrir caixas
para pegar apenas um ou dois itens, e reembalá-las para transporte. É uma trabalheira, e eles simplesmente
odeiam.”
“Rog, eu estou ouvindo, mas -”
“Nunca ninguém lhe disse para não interromper quando os adultos estão falando?” repreendeu ele.
“Deixe-me terminar. Durante muito tempo eu achei que havia algo errado com a maneira de o depósito operar.
O fato de as lojas manterem meses e meses de inventário, e ainda assim muitas SKUs faltarem simplesmente
não faz sentido. E eu levo muitos xingos, não importa o que faça. Isso só mostra que algo não está certo.”
Roger tomou um gole do líquido preto na xícara, e continuou, ainda muito focado, “sua ideia de remeter
para a loja só o que realmente precisa parece a solução que eu procurava. O fato de ter tal impacto nas vendas
só apoia isto. Mas para que o sistema seja verdadeiramente eficaz, deve ser implementado para toda a região,
não apenas em Boca”.
Paul não acreditava no que estava ouvindo. Ele tinha tanta certeza de que teria que implorar a Roger
para ajudá-lo! A ideia de mudar a forma como todas as lojas da região trabalhavam não era coisa pouca, e ele
achou que poderia levar semanas para convencer seu amigo a colaborar. Essa resposta foi uma surpresa.
“Acontece que,” Roger acrescentou, “para isso teremos que obter a aprovação de Martin.”
“Aquele muquirana,” disse Paul. Ele não morria de amores por seu chefe direto, o gerente regional.
Roger continuou, ignorando o comentário do amigo. “Dito isso, ainda estou preocupado com a logística.
Mesmo se você conseguir a aprovação, são necessárias uma série de mudanças. Enquanto era um favor para
uma loja, era uma coisa, mas eu não sei como gerir reposições para o consumo diário de toda a região.
Preciso de mais tempo para pensar sobre isso. Paul, eu estou com você, mas antes de fazer qualquer
alteração na forma como o depósito funciona, eu preciso saber que esses resultados são sustentáveis”.
Paul perguntou esperançosamente, “Então o que está dizendo – vamos continuar a receber reposições
diárias?”
“Sim, claro”, respondeu Roger. “Vamos manter isso até o final do trimestre, e ver como fica. Enquanto
isso, vou tentar descobrir como fazê-lo numa escala maior. Eu devo receber umas queixas da minha equipe,
mas terão de aguentar.”
“Eu tenho uma ideia que pode tornar as coisas um pouco mais fáceis para eles”, disse Paul. “Você
disse que é uma trabalheira pescar de duas lagoas? Apenas pesque as mercadorias para a minha loja da pilha
geral”.
“Você está ciente de que se eu misturar o estoque da loja de Boca com o inventário do depósito,
também preciso modificar nos livros,” disse Roger. Verificando se o seu amigo compreendera plenamente a
sugestão, ele acrescentou: “Você percebe que o que está sugerindo é abrir mão de quase todo o seu
inventário? Uma vez que fizer parte da pilha geral, não posso garantir a sua disponibilidade para você. Não
tenho permissão para alocar meu estoque”.
“Não é o que me incomoda. A verdadeira questão é que, para tal mudança eu vou precisar da
aprovação de Martin,” bufou Paul. “Acha que há uma chance de ele aprovar?
“Nem ferrando”.
“Obrigado pelo incentivo,” disse Paul. Ele sabia que Martin era bem pão-duro.
“Mas já que você fez tanto por mim, tenho que fazer o melhor possível para aliviar seu fardo. Eu vou
falar com Martin logo que der.”
Enquanto caminhavam para frente do depósito, Paul agradeceu seu amigo e mandou lembranças de
Caroline para Liz e as crianças. Indo para Boca, Paul se sentiu satisfeito consigo mesmo. Roger colaboraria
nos próximos dois meses, dando-lhe uma chance real de provar que o sistema funcionava. Além disso, eles
concordavam sobre a implementação deste novo método de gerenciar lojas e seu inventário por toda a região.
A questão agora saber se ele conseguiria convencer Martin, o gerente regional, a transferir o inventário
nos livros?
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Paul voltou do depósito regional entusiasmado e apreensivo.
Depois de entrar em sua sala, Paul pediu que Alva ligasse para o gerente regional.
“Olá, Paul,” ressoou o agradável barítono tom de Martin. “Eu estava prestes a ligar para você. Recebi o
relatório do Financeiro. Parece que você ficou em 1º neste mês. Eu sei que as coisas têm sido difíceis, com o
estouro da tubulação e tudo, e gostaria de parabenizá-lo pessoalmente. Por favor, diga a todos os seus
funcionários o quanto aprecio o empenho deles.”
“Obrigado”, respondeu Paul, “mas não foi apenas empenho. Mudamos a maneira de fazer as coisas. É
um método totalmente novo.”
“Como?”
Paul disse a Martin que ele e Roger tinha trabalhado nisso. “Como você pode ver claramente,
devíamos aplicar este novo método em toda a região!”
“Espere um segundo”, disse Martin em um tom que implicava qual dos dois era o superior. “Estou feliz
que tenha tido um bom mês. Muito feliz. Mas vamos acertar uma coisa. Nós temos um bom sistema, que
funciona bem. Começar a fazer mudanças com base no desempenho de um mês de uma loja é apenas
ridículo. Ninguém trabalha dessa forma. Você pode estar acostumados com atalhos, sendo o genro e tudo
mais, mas eu acredito em métodos prudentes e estabelecidos. Essa é a única forma de alcançar o verdadeiro
sucesso.”
“Mas os números falam por si”, disse Paul, fumegando por dentro. Se havia uma coisa na qual ele tinha
insistido, era “sem atalhos”. Deixando o insulto de lado, ele continuou. “Rentabilidade de 17%! Tenha dó, se a
loja de Boca apresentasse 7%, não teria ficado satisfeito?”
“É só por um mês. É uma feliz coincidência,” disse Martin decisivamente. “Você não tem ideia das
implicações. Pode ser à custa das vendas do próximo mês, o que significa que estará de volta aonde
começou.”
“Deixe que Roger e eu continuemos”, Paul persuadir Martin, “e vai perceber que não é um acaso, é um
novo sistema; que tais resultados podem ser obtidos por todas as lojas na região. Tenho certeza de que posso
produzir os mesmos resultados, todos os meses”.
“Claro”, respondeu Martin. “Mostre-me que é sustentável ao longo de um período significativo, e depois
conversamos.” Afinal, pensou Martin consigo mesmo, ele não tinha nada a perder. Se Paul conseguisse, seria
bom – a região seria líder da rede, e se fracassasse, pelo menos o gerente da loja de Boca teria aprendido
uma lição.
“Tudo bem, Martin. Mas, para isso, preciso que aprove um pequeno entrave burocrático.” Este era o
objetivo de Paul, e ele esperava que sua tática desse certo. Ele havia começado a conversa deliberadamente
com o que seu gerente regional consideraria uma ideia ultrajante, sabendo muito bem que Martin não
aprovaria. No entanto, isso deixou Martin numa posição onde ele teria de permitir que Paul continuasse
operando do seu modo atual.
Depois de um curto – e não tão bom – debate, Martin concordou com a transferência formal do estoque
da loja de Paul de volta para o depósito.
Apesar do mau humor de Martin, Paul sentia que tinha sido bem-sucedido. O gerente regional tinha
dado o sinal verde necessário para Paul dar prosseguimento à cooperação com Roger. E Paul sabia que com o
novo método de reposição do consumo diário, não havia erro.
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Uma coisa que Ted detestava na área de carga era o barulho terrível que a esteira transportadora
fazia. Tentando fingir que não raspava sua medula espinhal, ele reviu a lista de expedição enquanto os dois
estagiários punham as caixas no carrinho de mão.
“Está faltando coisa”, disse ele em voz alta.
“Não me culpe, sou só o motorista,” foi a resposta impaciente que ele recebeu.
“Eu sei, desculpe,” respondeu Ted.
Ele fez uma careta. A cada dia, mais alguns itens que tinham sido pedidos não eram enviados. A lista
destas SKUs estava agora com mais de uma página de comprimento.
Paul tinha sido claro sobre a importância de ter o menor número de faltas possíveis. Ele teria que levar
esta tendência à atenção de seu chefe.
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Paul tocou a campainha da casa dos Wood. Era a sua vez de levar as meninas à aula de balé.
“Oi, Paul. Oi, Lisa. Vocês estão adiantados – Nikki ainda está se preparando”, Liz abriu a porta e Lisa
correu para cima, para ver o que sua amiga estava fazendo. “Por que não entra?”
“É o Paul?” gritou Roger. Paul seguiu a voz até a cozinha e encontrou o seu amigo com um avental que
dizia “você é gostoso”, e picando legumes. Paul pegou um punhado de palitos de cenoura, apesar do olhar de
Roger.
“O avental combina com você como homem”, zombou Paul. “Será que tem em outros tons de rosa?”
“Não zombe de um homem que está com uma faca,” Roger sorriu, picando uma cebola grande, com
vontade.
“Escuta, já que estou aqui, podemos falar de negócios?”, perguntou Paul.
“Você vai acabar parecendo o seu sogro se fizer isso”, disse Roger, brincando. “Mas tudo bem.”
“Desde que nos falamos há uma semana, estamos de olho nas faltas. Parece que devagar e sempre,
as faltas estão voltando a acontecer. Todo dia mais três ou quatro itens não estão sendo repostos,” disse Paul.
“Por que está surpreso?” perguntou Roger. “Como eu te disse, as SKUs que faltavam eram respostas
dos resíduos que eu tinha. Mas quanto tempo espera que durem os resíduos? Principalmente quando está
vendendo num ritmo tão elevado, não deveria ser surpresa para você que estou ficando cada vez mais sem
SKUs.”
Era exatamente disso que Paul tinha medo. O salto todo nos lucros veio do fato de eles terem menos
faltas. O fato de terem menos faltas foi porque Roger tinha fornecido as mercadorias de seu estoque residual.
Mas, como esse estoque estava acabando, a loja estava gradualmente voltando ao ponto de partida. Havia
ainda uma coisa que poderia ser feita, concluíra Paul. E ele tinha chegado mais cedo, esperando convencer
Roger a fazê-lo.
“Eu estava imaginando se você poderia conseguir mais de outros depósitos regionais da rede. Há nove
deles e pelo menos um ou dois devem ter um considerável inventário das SKUs que não temos, e a maioria
deve ter resíduos. Consegue organizar remessas cruzadas?”
“Está falando sério?” disparou Roger. “Para os montantes necessários apenas em Boca, não posso
solicitar uma remessa cruzada. Não vale o esforço.”
“Roger, pense bem”, Paul quase implorou. “A quantidade que você me manda todos os dias é
pequena, mas as quantidades que eu vendo todo mês não são. Além disso, o fato de haver falta total deles
significa que esses itens têm vendido bem em toda a região! Estes são os itens que as pessoas realmente
querem comprar – os de giro rápido
que nossos chefes tanto adoram. Não peça pequenas quantidades – pegue o que puder. O que você conseguir
de outros depósitos, podemos vender – e vender rápido – então você não terá que se preocupar com a
mercadoria excedente. Isso é bom para toda a região, não apenas para minha loja!”
“Eu vou examinar isso,” e Roger o afastou para o lado. Ele não estava convencido de que tanto
trabalho devesse ser posto em algo tão insignificante.
Vendo a falta de comprometimento por parte de seu amigo, Paul insistiu: “Minha loja pode funcionar
como um indicador para os produtos de giro rápido. Se pedirmos uma SKU, e você só tiver resíduos, significa
que é um item de giro rápido, e deve fazer o máximo de remessas cruzadas dele que poder. Não espere até
ficar sem.”
“Ok, ok,” Roger começou a cortar o aipo.
“Sério?” disse Paul sem acreditar. “Que rápido. Conhecendo você, eu tinha certeza que teria todo tipo
de argumento na manga, sobre logística e custos de transporte. Você está ficando mole com a idade”.
“Fala alto, moço, não estou ouvindo”, riu Roger. “Mas, falando sério, agora que você me forçou a
pensar nisso, tenho certeza que não vai precisar mais que alguns telefonemas. Quer dizer, devo encontrar pelo
menos resíduos em todos os depósitos. E já que não estou procurando uma SKU, mas uma lista, é provável
que uma remessa cruzada será de mais do que simplesmente uma carga de caminhão.”
“Então, você vai organizar remessas cruzadas amanhã cedo?” perguntou Paul, e saiu rapidamente da
cozinha, para evitar uma cebola voadora. Ele falou da escada, “Meninas, vocês não vão se atrasar?”
Capítulo 12
O avião tinha aterrissado pouco antes das sete da manhã. Duas horas depois, Caroline encurralava
Pandey em seu escritório de Nova Deli.
“Olhe só para isso”, ela jogou dois guardanapos de sua mais recente carga na grande mesa da sala de
reunião. “Olhe para eles”, exigiu ela. Somente um observador atento poderia ver uma pequena diferença nas
tonalidades. “Um é amarelo, e o outro é laranja. Você prometeu que a sua garantia de qualidade era
incomparável. Eu não posso vender toalhas de mesa e guardanapos que não combinam!”
Ao invés de discutir, o fabricante indiano pediu desculpas. “Desculpe, desculpe. Prometo que isso não
vai acontecer de novo.”
“Acontecer de novo?” disparou Caroline. “Dê-me uma boa razão para continuar a fazer negócios com
você.”
“Tivemos alguns problemas em nosso processo de tingimento e aumentamos sua remessa com outro
lote.” Suas sobrancelhas grossas apertavam-se acima dos óculos de vovó.
“Mas eu lhe garanto que já foi resolvido. Você não vai mais encontrar essas inconsistências
novamente.”
Caroline não respondeu.
“É nossa culpa”, ele tentou apaziguá-la.
Ciente de sua posição superior no debate, ela continuou a olhar para ele.
“E vamos compensá-la.” Antes que ela pudesse perguntar como, ele se apressou em dizer, “Posso
mostrar-lhe agora a fantástica nova coleção que preparamos para este ano?”
Caroline concordou, e colocou uma mão sobre os guardanapos, garantindo que ficariam sobre a mesa.
Duas horas depois, quando finalmente entrarem num acordo, Caroline pegou os guardanapos e disse,
“Acrescente mais vinte caixas de toalhas de mesa com estampas de flores, às suas próprias custas, e
tentaremos esquecer que esse fiasco aconteceu.”
Pandey hesitou por um segundo, mas depois, sorrindo para mostrar seu apreço à habilidade de
negociação de Caroline, respondeu: “Pois não”.
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Observando da parte de trás do carro, Caroline ainda estava espantada com a forma que as antigas
áreas rurais foram se transformando em algo tão complicado e urbano. A sociedade ocidental estava se
infiltrando nesta nação asiática em todos os níveis. Enquanto um trem de carga carregado passava, ela
recebeu um telefonema de seu assistente pessoal em Miami.
“Bom dia, Caroline. Que barulho é esse?” perguntou Mateus.
“Estou voltando da fábrica Dhonsi que fica do outro lado de Pune,” explicou ela. “Estou tão exausta.”
“De uma visita a uma fábrica de roupa de cama? O que ele fez – fez você se sentar na frente de uma
máquina de costura durante três horas?”
“Quem dera!”, brincou Caroline. “Pelo menos eu teria ficado sentada. Depois de andar de carro por
duas horas – e nem me fale sobre como as pessoas dirigem na Índia – Dhonsi insistiu em me mostrar cada
canto da sua fábrica. Cada cantinho. Levou mais duas horas.”
“Por que ele a faria passar por essa tortura?” perguntou Mateus.
“Para provar porque sua roupa de cama é cara”, explicou Caroline. “Da última vez que conversamos,
eu tentei baixar os seus preços; esta deve ter sido a sua versão da vingança. Meus tornozelos doíam tanto!
Fiquei convencida de que sua roupa de cama vale o preço, ou pelo menos convencida de que não quero outra
turnê.”
“Coitadinha”, consolou Matthew.
“Mesmo assim, consegui baixar mais 2%! Enfim, por que ligou?”
“Rhianna ligou,” Caroline podia ouvir o receio em sua voz. “Eles não podem fornecer os tapetes no
prazo. De novo”.
“Três faltas, e ela está fora”, afirmou Caroline, rangendo os dentes. “Por favor, informe-a que
infringiram o contrato, e que vamos cancelá-lo.”
“Você está brincando, não é?” A simplicidade de Mateus era contrabalançada por sua vontade de
trabalhar. E pelo fato de que suas dicas sobre o que vestir eram insuperáveis. “Ela é tão legal. Dê-lhe uma
chance!”
“Não, Matt. A Miss Arizona deve aprender o significado de prazo.”
“Eu prometo que vou lhe dar um sermão, mas precisamos dos tapetes.”
“Sério? Quantos depósitos estão sem? Quero um relatório completo quando chegar ao meu quarto no
hotel.”
“Quanto tempo isso me dá?”
“Cinco minutos”, disse Caroline com um sorriso no rosto.
“Então você quer o normal – três gráficos-torta, sete diagramas e uma estátua de cisne de gelo?”
“E batatas fritas para acompanhar.”
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Voltando à metrópole indiana, Caroline teve tempo suficiente apenas para tomar banho e se trocar
antes de sua última reunião do dia. Ela cantarolava enquanto se vestia. Já que o jantar de hoje à noite era com
um futuro novo fornecedor, ela escolheu usar um tailleur azul marinho com calça, que deu ênfase às suas
feições quase nórdicas. Ela não tinha nada a perder e, como futura cliente, estava numa posição forte.
Pradeep estava esperando, quando ela entrou no refinado restaurante do hotel. De alguma forma,
pensou Caroline, a combinação de culinária indiana e do refinamento pós-moderno não combinava bem neste
caso. Apesar de seu parceiro de treino ter escolhido usar uma gravata colorida, o paletó preto insinuou que ele
estaria focado somente em negócios.
Eles discutiram as tendências em seus negócios durante a refeição, cada um tentando ganhar tempo
enquanto o verdadeiro jogo não começava. Caroline já selecionara alguns itens e estampas para Hannah’s
Shop, mas foi agradável encontrar furos em seus argumentos sobre a singularidade de seus designs e
características. Café e doces sinalizaram o momento de falar de negócios. Na antiga tradição dos mercadores,
começaram a pechinchar.
“Esta é uma fase-piloto, por isso é de alto risco para nós”, ela declarou com firmeza. “Embora eu goste
da textura das toalhas xadrez, 85 centavos cada é demais.”
“Sra. White, seria bom para nós os termos como clientes, mas usamos os melhores fios, e como sabe,
os salários estão subindo rapidamente.” Seu adversário optou por uma abordagem tradicional.
“A 85 centavos não vou correr o risco de comprar trezentas caixas. Dê-me um preço real, e não esse
ridículo, e vou considerar o pedido de quinhentos caixas.” Ela sorriu como uma tigresa. Iria raspar cada centavo
possível, mesmo que tivesse de encomendar mais do que tinha planejado.
O jovem vendedor não se surpreendeu. Pelo contrário, a possibilidade de uma quantidade maior era o
que ele queria. “Que preço tem em mente?”
“Estamos discutindo toalhas de copa, não de banho. Cinquenta e dois centavos seria mais adequado.”
disse Caroline impiedosamente.
O rapaz fingiu estar chocado, “Nós não podemos vender a um preço inferior ao nosso custo”.
Caroline não piscou diante da performance dramática dele. Ela apenas sorriu cinicamente.
“Talvez eu possa chegar até 82 centavos.” O vendedor tentou a sua sorte.
“Quinhentas caixas...” Caroline respondeu com uma voz ritmada.
“Setenta e nove centavos”.
Caroline acenou para o garçom trazer a conta.
“Ok, ok. Eu acho que posso vender para você a 75 centavos. Mas isso vai certamente custar-me a
comissão”.
“Sessenta e cinco e inclua o jogo de luva de forno e pegador de panela a US$1,95 em vez de US$2,25,
e encomendo uma centena de caixas disso”.
“Você está me torturando”, Pradeep torcia as mãos. “Trinta centavos é uma queda muito grande.
Podemos baixar para US$2,10, e já está muito baixo.”
“Arredonde para US$2, e levo uma grosa de kits de chapéus de chef e casaco,” ofereceu ela. “Eles vão
combinar bem com seus outros produtos.”
“Fechado. Setenta pelas toalhas, US$2 pelos jogos de pegador de panela e US$10 pelas roupas de
chef.” O comerciante estava mais do que satisfeito. Para um primeiro negócio com a Hannah’s Shop, ele tinha
fechado uma grande encomenda.
“Não tão rápido”, ela rebateu. “Para a quantidade que estou encomendando, vou pagar 67 centavos
pelas toalhas”.
“Você é uma negociadora dura”, disse ele sério, e após uma ligeira hesitação, sorriu e disse “fechado.”
Eles apertaram as mãos para finalizar o acordo. “Vou pedir para enviarem a papelada para cá, para
seu hotel, logo cedo.”
“Foi um prazer fazer negócios, Pradeep. Espero fazer mais negócios no futuro”.
Depois que ele saiu, Caroline permaneceu em sua cadeira por um tempo, curtindo a noite e a vista do
grande pátio. Ela ficou satisfeita consigo mesma. Era por isso que amava tanto seu trabalho. Ela sabia que
ninguém poderia ter feito um negócio melhor para a rede. Não só ela tinha baixado os preços dos produtos de
forma significativa, mas também tinha adicionado um novo acessório – chapéu de chef e casaco – que ela
tinha certeza de que seria um sucesso.
Ela não estava pronta para assumir o leme de seu pai, mas pelo menos conhecia as Compras como a
palma da mão. Neste campo, ela sempre fez apenas o que era certo para a empresa.
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A feira estava um arco-íris de cores, com estandes e barracas decoradas para seduzir compradores a
olharem a mercadoria em exposição. Camisas de lantejoulas reluzentes, amostras quadradas de lençol de
cetim e meias de seda prateadas. Caroline chegou cedo para o primeiro dia da IndiTextile Exposition, e
caminhou para cima e para baixo nos corredores que enchiam o grande salão acompanhado pela compradora
da Florida Fashions. Julie era o tipo de amiga que conhecia em Mumbai, mas com quem nunca almoçava no
próprio país, mesmo que morassem na mesma cidade.
“Viu? Usamos o mais recente software para agilizar o processo,” a voz vinha de baixo de um turbante.
“Você pode levar para casa uma amostra, e os meus dados, e começamos daí, sim?”
“Olha, Caroline,” a loura tingida disse: “Eles têm lençóis de super-heróis que combinam com pijamas.
Talvez você possa vendê-los em conjunto.”
“Pare de atiçar”, respondeu Caroline enquanto tomava notas em seu PDA. Pegou o pacote do
fornecedor e respondeu à sua amiga: “Você sabe que não mexemos com moda. É quase tão arriscado como
mudar a cor do cabelo. Vamos indo – há muito para ver, e somente algumas horas no dia.”
Andando pelos corredores laterais, elas procuraram Baruah Textile, que uma conhecida em comum
lhes tinha recomendado. Um novo nome no mercado sempre valia a pena examinar. Além disso, ela tinha
descoberto que a Craig’s, seu maior concorrente no Alabama, já tinha feito um contrato com eles.
Finalmente elas o localizaram. Um pequeno estande estava no meio de um grande espaço expositor.
Uma jovem no estande pedia desculpas num monótono tom tipicamente indiano.
“Havia muita logística, e não conseguimos chegar a tempo para nos organizarmos para a abertura esta
manhã. Mas o caminhão está a caminho, e amanhã teremos um display completo.”
Sabendo que não estaria lá amanhã, Caroline raciocinou, se tiveram tanta dificuldade para montar uma
exibição digna dentro da Índia, quem sabe que tipo de problemas podem surgir quando tiverem de enviar a
mercadoria para o exterior. Melhor não fazer negócios com fornecedores arriscados. Julie e Caroline
prosseguiram.
Capítulo 13
“Paul, o Bob do Financeiro está na linha”.
Três semanas haviam se passado desde que Bob vazara a boa notícia para ele. Imaginando o que
seria desta vez, ele respondeu alegremente, “Bom dia. Como vai?”
“Estou bem, Paul, muito bem.” Bob parecia preocupado. “Tudo bem com você?”
“Sim, tudo ótimo”.
“Ok, então. Posso lhe fazer uma pergunta sobre a loja?”
“Claro, diga.”
“Há algo estranho em nossas listas”, disse o adjunto do Financeiro com cuidado, “E estamos tentando
descobrir onde está o erro. Meus registros mostram o estoque da loja de Boca Raton num nível parcial, algo
em torno de um quarto do que deveria estar. Eu pensei em verificar se, por acaso, esse acidente aconteceu na
sua loja.”
“Não houve erro nenhum”, Paul sorriu. “Nós transferimos a propriedade da maioria do inventário da
loja, na verdade, tudo acima da marca de vinte dias, para o depósito regional”.
O que estava acontecendo? Bob perguntava a si mesmo. Em primeiro lugar, uma loja não poderia
operar com um nível tão baixo de inventário. Em segundo lugar, falsa transferência de propriedade era
praticamente um ato criminoso. Estes dois dados significavam, pensou ele, que alguém estava adulterando a
contabilidade. No entanto, e este era o terceiro aspecto envolvido, Paul era genro do próprio Sr. Aaronson. A
aprovação pode ter sido dada no mais alto nível. Este campo minado devia ser cruzado com o máximo de
cuidado.
“Isso é uma transação irregular”, disse ele em resposta e, em seguida, perguntou: “Então se eu
verificar o inventário do depósito regional do Sul da Flórida, vou encontrar uma mudança correlata para nas
listas de inventário?
“Sim, com certeza.” Paul respondeu. “Pelo menos, deve estar lá.”
“Paul,” disse Bob, ainda se sentindo pouco à vontade, “você está ciente de que tal transferência não
está em conformidade com os regulamentos da nossa contabilidade. Ela exige a aprovação de instâncias
superiores.”
Há muito tempo atrás Paul chegara à conclusão que os “contadores de feijão” vivem em um mundo à
parte, um mundo de regras e regulamentos. Sem se alterar, ele comentou: “Foi autorizada por Martin Langley,
o gerente regional.”
“Temo que isso não seja suficiente.” Sabendo que os gerentes tendem a ignorar tal declaração, Bob
esclareceu, “Eu vou ter que levar isso à atenção do meu chefe.”
Paul não queria perguntar quem tinha poder de autorizar tal ato, pois temia que a resposta fosse o
chefe de operações. Paul sabia perfeitamente que as chances de Christopher lhes permitir operar desta
maneira não-tradicional, antes de ele poder mostrar resultados sustentáveis eram quase nulas. A intervenção
de Bob poderia arruinar tudo o que ele e Roger tinha feito. Maldita burocracia.
Em voz alta, ele educadamente perguntou: “Por que a aprovação de Martin não basta?”
“Exceto em circunstâncias especiais, que têm de ser documentadas na íntegra e requerem aprovação
executiva, nossos procedimentos exigem que todo inventário seja registrado de acordo com a localização
física.”
A voz de Paul estava ligeiramente alta quando respondeu: “Mas o estoque está no depósito regional.”
“O estoque foi fisicamente transferido da sua loja para o depósito?” A descrença de Bob se mostrou
com clareza. “Então a loja está realmente operando praticamente sem nada?”
“Se você chamar um montante igual a vinte dias de vendas futuras de praticamente nada”, Paul
respondeu. “O que estamos descobrindo é que é bastante. Como você mesmo sabe pelos números que
compilou no mês passado, nós ficamos em primeiro lugar, não é?”
“Eu não entendo”, respondeu Bob. “No mês passado você teve um mês espetacular, reconheço. Mas o
que isso tem a ver com sua decisão de transferir os estoques? De acordo com a contabilidade, esta
transferência aconteceu no início deste mês.”
Bob estava relativamente embaixo na hierarquia da empresa, mas se ele fosse iniciar uma
investigação, chamaria a atenção de Christopher. Paul respirou profundamente e começou a explicar. “Bob,
você deve ter ouvido dizer que há uns dois meses tive uma inundação no depósito. Ao invés de alugar um
espaço caro, decidi transferir temporariamente muito do meu estoque ao depósito regional.”
“Estou lhe acompanhando”, comentou Bob.
“Desde então”, Paul continuou, “a minha loja tem mercadorias para apenas vinte dias de vendas.
Estimulados pelos resultados do mês passado, resolvemos estender isso até segunda ordem.”
“Mas isso faz com que seja uma mudança permanente.” interrompeu Bob: “Você tem que registrá-lo
corretamente.”
“É exatamente isso que fizemos.”
“Entendo. Então, os livros, agora, refletem a transferência que foi feita realmente dois meses atrás”.
“Correto”.
“Nossa, então os números são reais!” Bob estava satisfeito por ter desvendado este mistério.
“Do que você está falando?” Paul perguntou.
“Estou espantado”, disse o gordinho. “Estava de olho na sua loja. O aumento dos lucros, naturalmente,
melhorou seu Retorno de Investimento também. Mas agora que reduziu seu inventário de forma tão dramática,
seu ROI atravessou o telhado. Eu nunca vi nada assim!”
“Obrigado”, disse Paul: “Agradeço por ter me contado”.
“Você acha que pode manter isso?”
“Eu pretendo.”
“Nossa, isso é tão incrível,” disse Bob, entusiasmado. “Você ainda está em primeiro lugar em
rentabilidade em toda a rede e agora, com esse retorno, cara, eu sei em quem apostar no bolão do escritório.”
*****************************************************************************
Mais tarde naquela noite, a família White fez uma ligação pela internet com vídeo entre a Flórida e
Mumbai. Quando as crianças acabaram de falar sobre a escola, esportes e rivalidades entre irmãos, Paul as
apressou a irem para a cama. Depois que Ben e Lisa finalmente saíram do iluminado escritório, Paul disse:
“Querida, só para lembrar, amanhã à noite, Lydia vai nos levar ao balé da cidade. Eu não sei por que deixo
vocês duas me convencerem a deixar as crianças irem. É uma noite de semana.”
“Ben ainda está fazendo careta?”
“Sim”, disse Paul com um sorriso irônico. “Ele está reclamando, dizendo que balé é só para meninas, e
como não ouso deixá-lo levar seu MP3. De qualquer forma, não tenho certeza se vamos poder conversar,
antes de você ir para o trabalho.”
“Sim, querido”, respondeu ela, seu sorriso se espalhando pela tela do computador. “Eu coloquei um
lembrete no meu PDA. Diz claramente – não acordar antes das oito”.
“Você pode acordar assim tão tarde?”, disse ele ironicamente. “Eu achava que toda manhã você pulava
da cama e corria para ir às compras com Julie!”
“Quem me dera!”, respondeu ela. “A exposição não foi tão interessante. A do ano passado foi muito
melhor. Como estão as coisas em Boca?”
“Bem, hoje o “explicadinho” do Financeiro, Bob, me ligou de novo e me deu um sermão sobre a
transferência do meu estoque para os livros de Roger.” Paul fez um relato da conversa para Caroline.
Quando ele terminou, ela perguntou: “Por quanto é que ele disse que o seu ROI melhorou?”
“Ele não deu um número. Ele apenas disse que nunca viu nada parecido. Mas posso lhe dar uma boa
estimativa. Minha rentabilidade foi cerca de três vezes maior do que a de uma loja média, e os meus estoques
estão cerca de um quarto do que estavam.”
“Isso faz com que o ROI da sua loja seja mais de 10 vezes o que era antes”, disse Caroline,
completando o seu cálculo.
“Dez vezes”, disse Paul pseudo-orgulhoso. “Não é legal?”
“Legal? Só legal? Paul, é inacreditável.” Caroline não entendia a indiferença do marido.
“E eu pensando,” Paul riu em voz alta, “que só os contabilistas eram fascinados por números. Esqueci
que os executivos gostam de brincar com eles também.”
“Paul, não percebe como é importante?” Caroline ficou surpresa.
“Francamente não”, admitiu Paul. “Eu não vejo nenhum motivo para ficar animado. Deixe-me acabar,
querida. O aumento do lucro é real, mas não é caso para a redução do inventário.”
“O que quer dizer?” disse Caroline, perplexa. “Você não acabou de dizer que o ROI da sua loja é dez
vezes maior do que qualquer outra loja que temos?”
“Sim, é”, respondeu ele: “E daí?”
“Mas veja como é importante”, argumentou Caroline. “Olhe para o quadro geral...”
“Se olhar para o quadro geral, querida, os estoques que foram retirados da minha loja estão agora no
depósito de Roger. O valor da mercadoria simplesmente passou de um bolso da empresa para outro, então o
ROI da empresa permanece o mesmo. Eu não entendo por que você está tão animada.”
“Paul, pode acreditar que, na empresa, o retorno sobre o investimento é ainda mais importante do que
o lucro”.
“Se você está dizendo, querida.
Caroline viu que não tinha convencido o marido. Se ela pudesse, teria atravessado a tela do
computador e lhe dado um bom chacoalhão. “Por que estou animada? Porque este aumento do ROI é tão
importante quanto o aumento em suas vendas. Ele tem enormes implicações na velocidade com que a rede
pode ser expandida.”
E então, num tom quase suplicante, tentando convencer o teimoso marido, ela acrescentou, “Paul, não
vê que o desempenho da sua loja demonstra que uma loja pode operar com sucesso com apenas um quarto
do inventário? Podemos abrir novas lojas com uma fração do investimento. Com tal um ROI tão elevado por
loja, a aprovação do capital é fácil”.
“Ah, eu estou entendendo”, disse Paul. Caroline tinha um bom argumento, pensou ele.
“Desculpe, mas a medição do ROI me pegou de surpresa. Como uma pessoa de Operações, eu vejo
as coisas mais claramente quando se utiliza a medição equivalente – o giro de estoque. Meu modo diferente de
operar também fez a operação na loja ser muito mais eficiente. Ele impulsionou o giro de estoque da loja. Isto é
importante. Isto é realmente importante.”
Caroline vibrou do outro lado da tela. “Mal vejo a hora de discutir o assunto com papai.”
Sua relutância em usar qualquer atalho familiar fazia Paul reagir instintivamente.
“Espere, por favor”, disse ele e acrescentou: “O problema é que não posso me dar ao luxo de falhar
nem um mês. Um mês ruim, uma queda nos números, e Martin nos forçará a voltar. E então tudo estará
perdido.”
“O que pode fazer para garantir que Martin não pare tudo? Devo falar com ele?” Caroline começou a se
preocupar.
“Querida, por ora deixe isso comigo.” disse Paul com determinação.
“Meu herói”, disse ela e mandou-lhe um beijo. “Desculpe, eu tenho que ir, ou Julie vai me mergulhar
num pote de curry verde picante. Excelentes notícias. Belas notícias. Boa noite, amor”.
“Bom dia para você, também.”
Capítulo 14
Ted tinha comprado frozen yogurt de uma das bancas coloridas em Boca Beach. Sua namorada tinha
dito algo sobre seu físico então ele estava reduzindo o consumo da quantidade de sorvete. De qualquer forma,
o iogurte de mirtilo, amêndoa e caramelo estava delicioso. Pondo outra colherada cheia na boca, ele ouviu
duas vozes familiares caminhando em direção à praça de alimentação.
“Eu passei pelo novo shopping depois do trabalho na sexta-feira”, disse Javier à Isabella, “e há três
lojas de departamento novas. Tenho certeza que eles precisam de uma vendedora experiente como você.”
“Obrigada”, disse Isabella, “Eu vou dar uma olhada. Você e Janine já encontraram alguma coisa?”
Ted ficou surpreso ao saber que três dos gerentes da loja estavam à procura de novos empregos.
Andando em direção a eles, perguntou: “Do que vocês estão falando?”
Isabella cantarolou e por fim respondeu: “Pensamos que, com a loja fechando logo, seria uma boa
ideia ficar de olho no mercado.”
“A loja não vai fechar”, disse Ted calmamente. “Paul teria dito alguma coisa. Ele é muito honesto. Além
do mais, nós não tivemos uma liquidação total de bota-fora.”
“Ações falam mais que palavras”, foi a resposta de Javier. “Os depósitos no subsolo estão acessíveis já
há duas semanas. Até a Livraria Kaffee, que foi mais atingida, já voltou ao normal.”
“Nós somos os únicos cujo depósito está vazio, e a única loja vazia com espaço de armazenamento
suspenso,” acrescentou Isabel. “Paul não pediu o estoque da loja de volta, e só pode haver duas explicações
para isso. Ou a loja está se preparando para uma clientela mais elegante, ou vai fechar. E todos nós sabemos
que a mercadoria não mudou. Num mês, no máximo, as placas de liquidação para fechamento vão aparecer.”
“Eu não acho que vamos fechar”, disse Ted, embora ele mesmo já não estivesse tão certo como
quando acordou naquela manhã. “Mas, por favor, não falem tão alto, esse tipo de boato pode arruinar a
reputação de uma loja.”
“Bela reputação,” concluiu Javier. “É melhor eu ficar de olho nas vagas de assistente de gerente de
loja?”
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Ted bateu na porta do escritório de Paul. Paul levantou a cabeça dos números que tinha rabiscado
num pedaço de papel.
“Será que eu estou te interrompendo?” perguntou Ted. “Eu não queria interferir”.
“Não, não,” Paul fez um gesto para seu gerente entrar. “Muito pelo contrário. Eu ficaria feliz com a sua
opinião sobre algo que estou trabalhando.”
Reconhecendo o elogio implícito, Ted entrou de cabeça erguida.
“Eu quero que você me ajude a descobrir como reduzir nosso inventário”, disse Paul.
Ouvindo isto, os ombros Ted caíram.
“Reduzir?” Ele ficou chocado. “Então, os chefes de departamento estavam certos? Tem intenção de
fechar?”
Paul riu. “Fechar este lugar? Do que está falando? Somos a loja mais rentável e mais eficiente de toda
a rede! Por que alguém iria pensar em fazer isso?”
Ted corou de vergonha, então Paul continuou, indicando para seu gerente de loja se sentar, “Mas é o
seguinte, eu sei que poderíamos ser ainda mais eficientes. Quando aceitei ficar com vinte dias de estoque, eu
sabia que era algo radical. A única questão para mim era em quanto reduzir.”
“Mas como a redução do inventário ajuda?” Ted não entendia. “Se não temos o que precisamos, isso
só irá reduzir as vendas. E sem vendas, com certeza vamos perder o primeiro lugar.”
“Isso seria verdade somente se reduzíssemos os itens de que precisamos”, Paul tentou elucidar. “Você
está certo ao dizer que a redução do inventário não ajuda a aumentar a nossa lucratividade, mas irá melhorar o
nosso giro de estoque”.
Vendo o olhar de incerteza no rosto do seu subordinado, Paul tentou uma abordagem diferente.
“Você concorda que um comerciante deve tentar aumentar seu giro de estoque?”
“Sim, claro.”
“Por quê? Nós dois sabemos a resposta; mesmo assim, diga o óbvio.”
Ted encontrou mais dificuldades do que pensava. Depois de várias tentativas em falso, ele conseguiu
expor claramente. “Como varejistas, nós compramos, e depois vendemos exatamente o que compramos.
Quando compramos, nós investimos o nosso dinheiro. Ganhamos dinheiro somente quando vendemos.”
“Correto”, Paul o encorajou a continuar.
“Supondo que compremos no início do ano e vendamos apenas no final, ganhamos dinheiro apenas
uma vez.”
Paul acrescentou, “No caso que você descreve, giramos o estoque só uma vez por ano. Agora o que
acontece se o comerciante é muito mais eficaz; imagine que ele termine o ciclo de compra e venda em seis
meses?”
“Ele vai ganhar o dobro de lucro com o mesmo investimento.”
“Exatamente.”
Curioso, Ted perguntou: “Qual é o giro de estoque de nossa loja?”
“Para calcular o giro de estoque, o Financeiro divide as vendas anuais da loja pelo custo médio do
inventário que temos. Já que ficamos com cerca de quatro meses de inventário e nossa margem de lucro é de
cerca de 100%, nossos giros de estoque tradicionais foram de cerca de seis por ano.”
O rosto de Ted iluminou-se quando disse, “E agora, reduzimos o inventário a cerca de um quinto do
que era. E aumentamos nossas vendas. Nossa, nossos giros de estoque estão acima de trinta por ano. Em
breve, chegaremos a números que só um supermercado tem.”
“Sim, Ted,” respondeu Paul. Ele sorriu ao ver Ted praticamente saltar de sua cadeira. “Estamos
comandando a loja mais eficiente de toda a rede. Mas eu acho que pode ficar ainda melhor. Nós ainda temos
uma quantidade excessiva de estoque.”
“Mas, chefe, podemos aumentar nossos giros de estoque sem deixar o pessoal das vendas tão
chateado,” Ted via claramente como a ideia de Paul encontraria resistência; resistência que ele teria de
resolver. “Vamos aumentar as vendas, em vez de reduzir estoques.”
“Como?” revidou Paul. “E não me diga que temos de lançar outra promoção cara. Nosso aumento dos
lucros aconteceu porque não aumentamos as despesas.”
“Eu não estou falando de aumento de gastos. Quero que a gente reduza ainda mais as faltas.”
“Como podemos fazer isso?”, perguntou Paul. “Graças ao Roger, quase não temos faltas. A gente já
tirou tudo que podia, por assim dizer.”
Escolhendo as palavras com cuidado, o gerente disse: “Uh, chefe, você diz que quase não temos
faltas. Mas, para ser sincero, ainda temos um bocado”.
“Sim, claro”, disse Paul, concordando. “Claro que temos faltas de SKUs que Roger não tem em
estoque, mas não podemos fazer nada a respeito.”
“Eu não estou falando disso. Estou falando de SKUs das quais Roger tem muito no inventário.”
Com o rosto expressando descrença, Paul sinalizou para ele continuar, “Vá em frente.”
Ted respirou fundo e falou, “A cada dia, ficamos sem um tanto de SKUs, o que significa que não
podemos mais vendê-los até chegarem no dia seguinte. Temos falta de alguns itens ainda antes do almoço.”
“O quê? Está me dizendo agora que frequentemente ficamos sem SKUs de giro rápido? Por que
ninguém disse nada?”
“Para ser sincero, ficam com receio de informar ao senhor, considerando a última reunião que tivemos
sobre o assunto,” respondeu Ted.
Paul não se apressou em reagir. Inclinou-se para trás e ficou pensando nas palavras de Ted. Como
podem ter vendido o equivalente a vinte dias de uma SKU em um só dia? E como isso pôde ter acontecido
várias vezes? Não encontrando resposta, perguntou: “São as mesmas SKUs que faltam, todo dia? Ou a cada
dia é uma SKU diferente? Você vê algum padrão consistente?”
“Eu realmente não sei”, admitiu Ted.
Paul continuou perguntando, “Quando os gerentes de seção reclamam com você sobre isso, eles
mencionam SKUs específicas?”
“Geralmente, sim.”
“Mencionam as mesmas SKUs toda vez que eles reclamam?”
“É disso que não tenho certeza,” Ted respondeu honestamente. “Dê-me um tempo para analisar isso.”
“Não, isso é muito importante”, disse Paul sem concordar. “Vamos ver juntos. Agora. Você consegue
se lembrar do número de um item do catálogo que faltou, de preferência de um que faltou antes do almoço?”
“Sim, claro. Você quer rever os dados?”
Quando Paul assentiu, Ted foi ficar ao lado de Paul na mesa e os dedos dedilharam o teclado.
“Como pode ver,” disse Ted apontando para a tela, “as toalhas vermelhas LP5, que eram parte da nova
coleção, a meta é de nove dias, mas por três vezes durante as últimas duas semanas, o inventário no fim do
dia foi de zero.”
Paul analisou os dados e acrescentou: “E, exceto por uma vez, ao longo destas duas semanas o
máximo que tivemos em nosso estoque no final do dia foi de três. Um nível tão baixo de estoque em relação à
meta deveria ter ligado o alerta para nós. Mas o importante é que não é uma questão de variabilidade.
Começar cada dia com nove unidades e fechar com quase zero significa que as vendas diárias são sempre
muito maiores do que se pensava.”
Ted considerou a conclusão de Paul ao voltar para sua cadeira. “A meta de nove unidades para as
vendas de vinte dias significa que a taxa deveria ser inferior a uma unidade vendida em dois dias. Mas, na
verdade, nas duas últimas semanas, vendemos mais de seis por dia. Nossa, isso não é aumento de demanda,
isto é um erro, e dos grandes. Acho que é porque é uma nova coleção, e as previsões de venda estavam
erradas. A culpa é minha, eu deveria ter verificado isso.”
“Tudo bem, Ted,” Paul acalmou seu empregado. “Nossas previsões estão longe de serem precisas,
mas não creio que muitas SKUs sofram do mesmo erro. Não mais de cinquenta.”
“Provavelmente menos”, Ted apressou-se em concordar. “Vou corrigir isso imediatamente.” E
acrescentou, desapontado: “Mas mesmo que vendam bem, já que lidamos aqui com um pequeno número de
SKUs, corrigir estes erros não afetará muito as vendas. Bem, pensei que tinha uma boa ideia. Eu tinha
calculado de acordo com a intensidade das reclamações dos vendedores e não me preocupei em verificar qual
tinha sido o impacto real”.
“Mesmo assim, você acertou em levantar o assunto”, encorajou Paul. “Estas SKUs podem ser poucas,
mas cada uma deve fazer a pressão arterial dos gerentes de seção subir. Eu não deveria ser tão teimoso,
deveria ter escutado.” Num tom firme, ele concluiu, “No entanto, devemos corrigi-lo o mais rapidamente
possível”.
“Sem dúvida,” concordou Ted.
“O mais importante,” disse Paul, “é que você me mostrou o caminho para reduzir os estoques.”
“Eu fiz o quê?”
“Olhe novamente para o que discutimos. Você me mostrou que devíamos ter dado atenção especial
para uma SKU que na maioria dos dias fecha com muito pouco em estoque; muito pouco em relação à sua
meta. Concluímos que tais situações deviam dar um alerta, advertindo-nos para aumentar a meta de estoque.”
“Correto, chefe. Como disse, vou fazer isso imediatamente. Mas estamos falando de um aumento de
inventário,” checou Ted, só para ter certeza.
Alva interrompeu-os trazendo uma bandeja com duas canecas de café fumegantes e um prato cheio de
biscoitos. Como um cavalheiro do Sul, Paul agradeceu e voltou para Ted.
“Bem, isso depende,” disse Paul calmamente, “E os casos opostos, SKUs que piscam a luz verde;
SKUs que fecham quase todos os dias com inventário relativamente alto?” Apontando para a tela do
computador, ele continuou: “Veja estes tapetes – os de cor flamingo. Em média, vendem menos de um por dia.
No entanto, estamos com quinze! O fechamento do inventário destes nunca foi inferior a dez unidades. O que
acha que devemos fazer?”
Percebendo aonde Paul queria chegar, Ted não deu a conclusão óbvia; em vez disso, Paul falou.
“Considerando que estamos repondo todo dia, por que deveríamos pedir a Roger para deixar sempre com 15
unidades? Uma meta de dez, ou mesmo apenas cinco, não seria mais do que suficiente?”
Ted estava relutante em concordar imediatamente. “Deixe-me imprimir algumas planilhas e verificar se
a lógica se mantém.”
“Tudo bem”, disse Paul. “Agora já não estamos falando de menos de cinquenta SKUs. Eu aposto que
pelo menos metade das SKUs está no verde.” Triunfante, ele acrescentou, “Ajustar a meta dos inventários para
ser mais razoável pode nos dar a redução de estoques de que precisamos.”
Ficou claro para Ted que Paul estava determinado a reduzir mais o estoque da loja. Sabendo que
intensificaria a convicção dos funcionários de que a loja estava prestes a ser fechada, ele tentou uma tática
para enrolar. “Não bastará fazer uma correção única. O consumo muda ao longo do tempo. Então é preciso
instalar um programa de computador para monitorar as metas de estoques. Vou ter de descobrir como fazer
isso. Não é algo trivial. Pode demorar algum tempo”.
“Não”, discordou Paul. “Eu não quero um sistema sofisticado, quero algo simples que funcione. E quero
agora”.
Ted contestou, “Eu não quero apressar isso – caso contrário, posso cometer outro erro, um erro caro
para a loja.”
Pensando compreender o temor de seu funcionário, Paul tentou tranquilizá-lo. “Vamos fazer isso
juntos. E eu vou assumir total responsabilidade por quaisquer erros.”
“Quando devemos começar?”
“Imediatamente. E antes que pergunte, é óbvio por onde começar,” disse Paul um pouco impaciente.
“Se, por um período considerável, digamos uma semana, o inventário fica no verde”...
Ted interrompeu, “Para programar isso, eu preciso de uma definição numérica de verde.”
Em vez de responder diretamente, Paul perguntou: “Como você definiria vermelho?”
Ted hesitou.
“Imagine que a meta é de nove unidades,” pressionou Paul. “Quando você se diria que é importante
aumentar a meta? Quando na maioria dos dias fechar com apenas uma unidade?”
“Eu vou sentir melhor quando a maioria dos dias fechar com menos de quatro”, Ted esboçou uma
risada. “Afinal, você me ensinou que, quando o resultado pode ser perda de vendas, vale a pena ser
paranoico.”
Paul deu-lhe uma olhada. “Você coloca o limite em um terço da meta. Então, quando o estoque cai
abaixo de um terço da meta, nós vamos chamar a situação... vermelha. Se durante a maior parte de um
período razoável, digamos, uma semana, a cor for vermelha, vamos chamá-la de alerta vermelho, e subimos a
meta. Faz sentido?”
“Sim”. Entendendo aonde Paul queria chegar, e atento à velocidade com que Paul corria para reduzir
os estoques, Ted assumiu. “Então, quando o inventário no final do dia for superior a dois terços da meta,
vamos chamá-lo de verde. Mas acho que uma semana não é o suficiente. Para garantir que não vamos perder
vendas, talvez devêssemos exigir que, por pelo menos duas semanas a situação permaneça verde, antes de
reduzir o inventário-meta.”
“Todo dia, durante duas semanas? Está bem.” disse Paul. “E a zona entre o vermelho e o verde, onde
achamos que temos estoque suficiente, vamos marcar de amarelo.”
“Como um sinal de trânsito,” Ted sorriu.
“Sim, e vamos acompanhar de forma inteligente”, comentou Paul. “Não vamos reduzir estoques
arbitrariamente, mas deixar que o mecanismo faça o certo. Nós só cortaremos estoques do que temos em
excesso, o que deve aliviar as preocupações do pessoal de vendas.”
“Tudo bem”, disse Ted. “Vou começar a trabalhar na criação das planilhas agora mesmo.”
“Obrigado”, disse Paul quando o gerente de cabelo amarelado deixou sua sala.
Ted esperou um momento antes de abrir as portas que separavam as salas e a copa da área de
compras. Não havia maneira de convencer os gerentes de seção que este corte no inventário levaria a algo
bom. Uma vez que nada seria mandado para o depósito, mas apenas não se pediria itens de reposição dos
quais tinham bastante, não haveria problema em não compartilhar o conteúdo desta reunião com eles.
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Três dias mais tarde, durante sua ronda habitual das onze horas na loja, quando Paul chegou à seção
de artigos de mesa, ficou feliz em ver muitos clientes examinando os produtos. Ele atendeu uma ou duas, e
olhou ao redor, procurando o gerente da seção. Como este não era encontrado, ele perguntou a Marco, um
vendedor júnior, aonde Mike tinha ido. Paul ficou surpreso ao saber que o seu vendedor mais antigo tinha
escolhido uma hora de movimento para ir fumar um cigarro. Pediu licença, e saiu para o estacionamento dos
funcionários do shopping.
E lá estava Mike, no banco preferido, fazendo anéis de fumaça no ar.
“Mike, está tudo bem?”
“Você poderia ter tido a decência de me dizer,” Mike praticamente cuspiu. “Eu estou aqui há mais de
vinte anos. Não deveria ter de descobrir isso dos ajudantes, que disseram que os caminhões pararam de trazer
os nossos estoques.”
“Do que você está falando?”, perguntou Paul. “Os caminhões nos trazem mercadoria todo dia.”
“Duas caixas, e a segunda somente pela metade”, Mike bateu o cigarro contra o banco, a cinza caindo
no asfalto.
Paul percebeu que isso era porque a maioria das SKUs da loja estava no verde, então não seria
encomendada por um tempo, permitindo que os inventários caíssem. Não era de admirar que a carga de hoje
fosse tão pequena.
“Isso não é mercadoria, Paul”, ressaltou Mike. “São sobras para fazer a loja trabalhar mais um dia.
Primeiro você reduz o estoque, esvaziando o depósito suspenso, depois não traz as mercadorias de volta, e
agora para de fazer reposição da loja. Entendo o que está fazendo, mas por que não ter a decência de me
dizer que a loja vai fechar. Arrancaria algum pedaço ter me dito?”
“Você percebeu que estamos em 1º lugar em toda a rede?” exclamou Paul. “Você percebeu que os giros de
estoque estão atravessando o telhado? A rentabilidade está elevada, e nosso retorno sobre investimento está
praticamente em órbita. Ninguém vai fechar a loja! Quem, em sã consciência, vai sugerir a melhor loja da rede?
Tudo que eu fiz foi baixar os excedentes excessivamente elevados. Não temos nenhuma razão para manter
grandes quantidades de SKUs que vendemos em ritmo de tartaruga”.
“Paul, eu respeito você”, disse o bronzeado homem de meia-idade: “mas você é da diretoria. Eu não
acredito em você.”
“Isso é ridículo”, disse Paul, balançando a cabeça.
“Sim, é. Estamos sendo mandados embora e você ainda está escondendo fatos.”
“Vou convocar uma reunião e explicar a todos que não há nada a temer. Pelo contrário, a loja de Boca
em breve será o modelo para toda a rede”.
Mike deu uma tragada. “Paul, você não entende. Até esta manhã, eu era único chefe de seção que
ainda pensava que a loja não fecharia. Eu tinha discutido esta questão, defendendo você e seus motivos
cegamente. E então a mercadoria para de vir”.
Paul percebeu que as palavras não iriam ajudá-lo. Nem com o Mike, nem com o resto do pessoal. Sem
ideias, ele perguntou: “Como posso provar que não vamos fechar?”
“Você quer me provar que a loja não vai fechar? Traga-me mais mercadorias!” respondeu Mike.
“Ninguém dá SKUs a uma loja que vai fechar. Você quer se livrar do excesso? Eu também. Mas isso significa
que você abriu espaço. Preencha-o, mesmo com algo que não tenhamos em estoque.”
“Como o quê?”
“Estamos atualmente com apenas uma parcela do que a rede tem a oferecer. Você diz que não quer
manter muito estoque, tudo bem. Traga-me um pouco de cada SKU que puder. Basta preencher as
prateleiras.”
“Mesmo que sejam aventais fúcsia?” Paul tentou fazer Mike sorrir.
“Consiga algo, qualquer coisa, não importa o quê”, disse Mike num tom correto. “Se você só conseguir
fúcsia, vou mostrá-los também. Se forem SKUs novas, não fecharemos.”
“É uma grande ideia”, disse Paul.
Mike balançou a cabeça, surpreso.
“Sério, Mike. Você descobriu alguma coisa. Se a loja tiver mais SKUs, vamos vender mais. A única
razão de não termos mais delas no passado foi por causa do espaço limitado, que agora – como você salientou
- temos de sobra.”
“Seria ótimo se minha seção mostrasse uma maior variedade”, disse Mike, ainda cético.
“Não apenas a sua, Mike, a loja inteira,” disse Paul. “Eu tenho um palpite de que você não é o único
que se sente assim, nem o único que ficaria feliz com a chance de vender SKUs adicionais. Eu acho que se
cada gerente de seção fizer duas ou três viagens para outras lojas na região, eles poderão elaborar uma boa
lista de itens que querem. E depois de alguns dias da elaboração das listas, eu vou garantir que tenhamos os
itens. Com sorte, irá acabar com o receio de fechamento da loja.”
“Claro que vai,” confirmou Mike.
“É o seguinte, vou pedir que Ted anuncie que amanhã cedo teremos uma reunião com a equipe onde
vou contar a todos o plano e cronograma,” disse Paul.
“Então, vai aprovar os itens que queremos?” perguntou Mike.
Paul parou, pensando que não queria peso-morto excedente em suas prateleiras. Introduzir SKUs na
loja sempre trazia esse risco.
Sem receber resposta do seu empregador, Mike disse, “Claro, quis dizer que, se o depósito tiver em
estoque, vai aprová-los?”
Os estoques do depósito? imaginou Paul. Se tudo que ele pedisse fossem itens dos quais Roger tinha
apenas resíduos, havia uma chance maior de que venderia bem. Mas como dizer a Mike que ele vai aprovar
qualquer SKU que o depósito não tem?
“Eu lhe prometo que vou aprovar pelo menos a metade da sua lista”, disse ele.
“Isso é magnífico.” Um grande sorriso se abriu no rosto de Mike. “Vamos entrar. Os clientes estão
esperando.
Capítulo 15
O restaurante favorito de Caroline era um lugar pequeno e tranquilo no Village; seu irmão preferia
lugares mais modernos, mais barulhentos, de preferência perto do Central Park. Ela havia deixado ele escolher
a localização desta vez, mas com uma condição – que fosse tranquilo o suficiente para desfrutar tanto da
refeição quanto da companhia. Ele concordara, não sem reclamar que ela não sabia o que estava perdendo.
A decoração era um pouco espalhafatosa demais para o gosto de Caroline, mas seu carpaccio de atum
estava divino. Darren pediu uma salada simples e vinho branco, alegando estar com o estômago sensível. A
conversa tinha sido leve: falaram dos gêmeos na nova escola particular que sua ex havia escolhido e sobre o
novo interesse de Ben em meninas e futebol.
O garçom tirou os pratos, e disse algo em francês sobre sobremesas chegando em breve. Caroline
decidiu que era hora de começar.
“Darren, eu quero falar sobre a Hannah’s Shop com você.”
“Está bem”.
“E sei que já passamos por isso antes”, Caroline estava seguindo seu plano de jogo, “mas tenha
paciência comigo. Repita, por que se afastou da empresa, mesmo sabendo muito bem que deixaria papai fulo
da vida?”
“De novo isso?” gemeu Darren. Sabendo da ambivalência a respeito de sua irmã em assumir o lugar
de seu pai, e se compadecendo por ela, ele decidiu colaborar. “Tudo bem, você sabe por quê. Ao contrário do
que papai me disse, eu não fiz isso apenas para irritá-lo. Está na hora de ele entender que eu não estou
disposto a sacrificar a minha vida só para fazê-lo feliz. A empresa atingiu a maturidade; não pode continuar a
se expandir e crescer com rapidez. Papai construiu algo muito grande. Quero seguir seus passos, não viver à
sua sombra. Eu também quero construir algo grande e significativo. E a Hannah’s Shop não é o lugar onde eu
possa fazer isso. Mana, para mim, o varejo de artigos de cama, mesa e banho é como dirigir na Flórida –
senhoras de idade dirigindo carros antigos mais devagar que uma tartaruga”.
“E o capital de risco é a Indy 500,” Caroline completou a frase que seu irmão tinha já dito a ela muitas
vezes. “Então, por favor me diga, meu irmão piloto, que tipo de empresa faz você vibrar? Quer dizer, o que
você procura, quando analisa uma oportunidade para investir? O que realmente o deixa empolgado?”
“Quando eu encontro uma empresa que tem potencial real, mas ainda não reconhecido”, respondeu
Darren. “Uma que tenha uma boa chance de alcançar tanto uma rentabilidade elevada quanto um alto retorno
de investimento dentro de seu ramo. Naturalmente, o truque é não se deixar cegar por sonhos arriscados. A
chance sólida deve estar lá. Algo que garanta que, com a devida orientação e, claro, o capital adicional, a
empresa irá florescer”.
Enquanto falava, seus olhos brilhavam, seu corpo irradiava energia. Era óbvio o quanto ele amava seu
trabalho. Caroline sorriu. Esse é o irmão que ela tanto ama.
“É preciso apreender o conhecimento pertinente rápido”, Darren continuou, “e em seguida analisá-lo
corretamente, inclusive os elos fracos, os fatores ocultos. Porque mesmo que pareça animador, você precisa
estar convencida de que as pessoas certas estão por trás dele – práticas, confiáveis, trabalhadoras e,
sobretudo, apaixonadas pelo negócio.”
Depois de ter trazido o seu irmão para o cocho, era hora de deixá-lo beber.
“Darren”, ela mudou de assunto suavemente, “você diz que está à procura de oportunidades que
possam alcançar alta rentabilidade e ROI dentro de seu ramo. Pegue os artigos de cama, mesa e banho, por
exemplo: o que considera uma verdadeira oportunidade? Quais os números que está procurando?”
Darren decidiu abrir os olhos de sua irmã para a dura realidade. “Para a Hannah’s Shop ser
interessante para um capitalista de risco, você tem que me mostrar que pode levar a empresa a mais de 10%
de lucro líquido sobre as vendas. E isso não é suficiente, você tem que provar que pode fazer isso enquanto
duplica, sim, duplica, os giros de estoque”.
Numa voz mais macia, ele acrescentou, “Mana, você sabe que levar um grande varejista de cama,
mesa e banho a mais de 10% de rentabilidade não é viável. É difícil até mesmo para uma boutique. E lembrese, para um empreendedor, ainda mais importante é o ROI potencial. Quanto ao risco envolvido, estamos à
procura de um lucro substancial sobre nosso investimento. Eu falo sério quando coloco a demanda de
duplicação de giros de estoque. Agora fala sério, papai, que é uma das melhores pessoas nesse ramo, fica
satisfeito em melhorar os giros de estoque em alguns percentis, duplicar é praticamente impossível.”
Quando ele viu que Caroline não parecia estar desencorajada, acrescentou, “Não vê que não há como
você fazer ficar interessado na Hannah’s Shop? Esqueça, mana.” Primeiro Paul, pensou ele, agora Cara.
Como se papai não o incomodasse o suficiente.
Em resposta, ela perguntou: “Quando foi a última vez que você conversou com Paul?
“Quatro meses atrás, no aniversário da mãe, ele me levou para o aeroporto e tivemos um papo. Ele
parecia um pouco chateado por causa do desempenho da loja.” Pensando que ela pudesse ter mudado de
assunto, ele disse: “Você acha que eu deveria convidá-lo para trabalhar comigo? Tenho certeza de que preciso
de um cara brilhante, alguém que eu possa confiar plenamente.”
Caroline sorriu afetadamente, “Algo interessante aconteceu nos três meses desde sua visita. Paul
conseguiu sucesso. Para valer”.
“Ele conseguiu? Isso é fantástico,” o rosto de Darren se iluminou. “Eu sempre disse que ele
conseguiria”.
Caroline decidiu ignorar este comentário e, em vez disso, seguiu seu roteiro, “Você diz que, no nosso
negócio, é impossível alcançar mais de 10% de lucro líquido e dobrar os giros de estoque. Bem, seu amigo
vem provando que você está errado.” Ela abriu sua pasta e entregou a ele um maço de papéis. “Estes são os
números do último trimestre da loja de Paul.” Enquanto Darren folheava as páginas, ela continuou: “Olhe, Paul
provou que pode fazer uma loja ter quase 20% de lucro e fez isso enquanto o inventário aumentava os giros
em cinco vezes. Não o dobro, mas cinco vezes! O que diz agora, meu irmão sabichão?”
Darren olhou rapidamente os números, o seu cérebro treinado absorvendo como uma esponja.
Caroline continuou a martelar sua mensagem, “Olhe para esse números! Imagine-os multiplicado pelas
cem filiais da Hannah’s Shop! “
“Eu estou vendo os números”, disse ele, calmamente. “Isso é ótimo. Parece incrível.” Então, ele chegou
às duas páginas em que Paul explicava como isso foi conseguido. “Deixe-me lê-lo com cuidado, isso é
interessante. Pode pedir outro cappuccino?”
Duas xícaras de café, uma porção de mousse de chocolate e uma fatia de cheesecake chegaram
prontamente.
Mas só depois de Darren terminar a última gota que ele largou as páginas. A próxima coisa que fez foi
olhar para o grande lustre de cristal.
Depois de um tempo, disse Caroline não se segurando mais, “Então?”
“Bem”, Darren não estava com pressa de responder. “O que Paul fez é incrível.”
Conhecendo o irmão dela, ela continuou, “Mas...”
“Eu não quero que você interprete as minhas palavras como uma crítica sobre o que Paul fez. É um
avanço real. Ele quebrou todas as regras sem quebrar o sistema. Talvez eu ainda não entenda completamente,
mas o que eu vejo é que Paul encontrou uma maneira de usar as ineficiências do sistema para melhorar
notavelmente sua loja. Mas temo que ele não tenha encontrado uma maneira de melhorar o sistema em si.”
“O que quer dizer?” Caroline estava realmente perplexa.
“Eu não vejo como o que Paul fez possa ser expandido para alcançar esses resultados a nível da
empresa.”
Caroline entrou na zona de guerra. “Não me diga que Paul só transferiu o inventário de sua loja para o
depósito regional, e, portanto, as melhorias nos giros de estoque não significam nada. Você sabe que não é
isso.”
Darren levantou a mão para detê-la. “Mana, me dê algum crédito. Não faz tanto tempo que saí da
empresa que esqueci o básico.” Para provar que ele reconhecia o que Paul fizera, ele elaborou, “É impossível
aumentar o giro de estoque apenas reduzindo estoques. Só reduzir estoques comprometerá a disponibilidade,
e as vendas cairão.”
“Esse é o ponto”, disse Caroline com uma voz aguda. “Paul conseguiu encontrar uma maneira de
reduzir os estoques das lojas, enquanto quase eliminava as faltas. E, como resultado, suas vendas cresceram
sem qualquer alteração nas despesas da loja. É por isso que os lucros são inacreditáveis.”
“É exatamente esse o meu problema”, Darren comentou calmamente. “Qual é o seu problema? Você
não está sugerindo que estes números são inventados, está?”
Darren zombou e disse: “Se eu entendi corretamente o que Paul escreveu, a redução nas faltas não
veio dos estoques que ele devolveu ao depósito”.
“Claro que não. Como poderia? Mas permitiu que utilizasse os saldos que o depósito tinha.”
“Correto. Mas saldos podem ser suficiente para uma loja. Talvez até mesmo para uma região. Como
vai basear as vendas da rede em saldos? Para isso, minha querida irmã, você terá que comprar mais e isso vai
levá-la de volta à estaca zero.”
Caroline pensou sobre isso. O irmão dela tinha razão. E colocou o problema em suas mãos, não nas
de Paul.
“Agora você sabe por que eu disse que Paul não encontrou uma maneira de melhorar a rede, ele
encontrou uma maneira de usar as ineficiências do sistema, os saldos, para melhorar sua loja.”
Vendo a frustração de Caroline, ele continuou. “Mas, quanto a operar a loja com tão pouco estoque, há
algo aí. Claro, já que os estoques que foram retirados da loja ainda estão nos livros da empresa, o impacto
atual do ROI na empresa é pouco. Contudo, deve haver uma maneira de traduzir isso em uma redução real de
estoque. Há algo importante aqui. Se eu fosse você, continuaria a explorar isso. Pensando bem, talvez eu
devesse encontrar um tempo para falar com Paul.
Caroline sorriu. Era isso que ela queria. A isca fora lançada. E ela estava contando com que a
afinidade natural entre Paul e Darren se encarregasse do resto.
“Eu gostaria de poder analisar as coisas da forma clara e rápida que você faz”, disse Caroline,
timidamente.
“Tente trabalhar em investimentos durante um tempo”, Darren tentou consolar sua irmã caçula. “Isso
vira quase uma segunda natureza”.
Capítulo 16
Entrando no depósito regional, Paul sentiu que se destacava estando de gravata entre todos os
funcionários de macacão do depósito. Ao olhar ao redor, viu Roger em discussão profunda com seu supervisor
e um motorista de empilhadeira. O supervisor sinalizou algo para o gerente afro-americano do depósito. Ao se
virar, Roger dispensou seus funcionários com um aceno.
“Bom dia, Rog. E aí?”, disse Paul. Ele havia recebido uma mensagem de texto durante o café da
manhã, perguntando se poderia dar uma passada lá no caminho.
“Venha, deixe-me lhe mostrar.” Roger levou seu amigo para um recinto fechado, que foi organizado de
forma diferente do resto do depósito. Em primeiro lugar, as prateleiras estavam cheias apenas até um palmo
acima da cabeça de Paul. Em segundo lugar, uma longa mesa ficava no meio do recinto.
“Ah, entendi!” Paul exclamou. “Caixas! Que surpresa! E encontrá-las logo aqui, num depósito!”
Roger sorriu. “Sim, Sherlock, estas são as caixas que guardam o estoque da sua loja.”
“Eu pensei que você ia colocá-las com o resto de seus estoques”, disse Paul, bastante surpreso.
“Quando eu vim discutir o assunto com o pessoal do depósito”, explicou Roger, “eles me pediram para
deixar as coisas como estão, dizendo que seria melhor assim.”
Paul não entendeu. Afinal, ele havia se esforçado em obter a aprovação de Martin para a transferência
de propriedade nos livros, com o propósito explícito de facilitar as coisas para a equipe do depósito. “Não
concordamos que era uma trabalheira para eles?”
“Quando se lida com caixas inteiras, a seleção é um dos principais problemas”, Roger elucidou. “Mas
os funcionários que eu designei para essa função disseram que daria muito mais trabalho se tivessem de
desembalar, selecionar um item e reembalar com as empilhadeiras no meio dos corredores. Com todo o
estoque de sua loja guardado numa área concentrada, fica muito mais fácil de administrar”.
“E era isso que você queria me mostrar? Que não usou da liberdade de fundir o meu estoque à pilha
geral?” perguntou Paul. “Obrigado pelo passeio, mas poderia ter me informado por telefone. Eu teria
entendido”.
“Escute. Eu o chamei porque temos um grande problema.” Roger continuou, “Como você sabe, estive
pensando muito sobre como gerenciar as reposições diárias, em todas as dez lojas da região. Meu ponto de
partida era de que seria uma boa ideia imitar a forma eficaz de fornecimento para sua loja. Vou colocar o
estoque retirado de cada loja num recinto separado. Dez compartimentos separados, um por loja, todas
semelhantes a esta.”
“E depois de brincar com essa ideia por algum tempo você chegou à conclusão de que não tem espaço
suficiente,” disse Paul preocupado.
“Isso é apenas parte do problema”, respondeu Roger. “Ontem, eu percebi que tenho um problema
muito maior. Francamente, eu estou num beco sem saída”.
“O que aconteceu ontem?”
“Trabalhamos na lista que sua equipe montou, a lista das cem novas SKUs para sua loja. Preparar a
remessa nos fez ficar aqui até o meio da noite.”
“Sinto muito”, desculpou-se Paul. “Não foi minha intenção. Se demora tanto, não acrescentarei tantas
SKUs novas à loja de uma só vez. Não há problema em distribuí-las. Se adicionarmos apenas vinte SKUs por
dia, minha equipe ainda ficará satisfeita. Vinte por dia ainda é demais?”
“Paul, pode ter calma? Ouça, por favor.” Quando ele certeza de que Paul prestava atenção, ele
continuou. “No momento, se envio uma SKU especial para uma loja, vou enviar novamente a mesma SKU só
depois de uns quatro meses. Para lhe poupar dos cálculos, isso significa que as empilhadeiras têm que
apanhar das prateleiras uns duzentos paletes por dia. Ontem, quando a empilhadeira teve de retirar trezentas
SKUs, percebi o que vai acontecer quando nós tivermos de atender a todas as lojas no dia a dia. O problema
não é só de espaço, é a capacidade da empilhadeira.
Isso foi um pouco rápido demais para Paul. Vendo a expressão perplexa no rosto de Paul, Roger
decidiu pular a parte de como percebeu que o problema existe e explicar o problema em si. “Paul, quando eu
tiver os dez compartimentos, um para cada loja, ainda vou ter que manter um espaço de armazenamento
geral”.
“Por quê?” Paul perguntou. “Por que não pode dividir todo seu estoque entre os dez compartimentos?
Isso também vai lhe dar o espaço adicional necessário.”
“Pense bem”, disse Roger. “Não há estoque suficiente de muitas SKUs a pré-alocar para cada
compartimento. Vou ter que manter essas SKUs num só lugar. Caso contrário, logo, logo, vou ficar mudando o
estoque sem parar de um recinto para outro. É muita bagunça.”
“De quantas SKUs estamos falando?” Paul tentou minimizar o problema.
“Faça o cálculo você mesmo”, respondeu Roger. “Lembre-se, para cada SKU que a loja não tem
estoque suficiente, o sistema já emitiu um pedido. O fato de que ainda estar na loja indica que, para essas
SKUs, só tenho saldos.”
Paul fez o cálculo de cabeça. Faltas respondem por 30% das SKUs. Roger guarda cerca de cinco mil
SKUs. “Você tem para umas 15 mil SKUs apenas saldo,” concluiu Paul.
“Agora vê o problema?” perguntou Roger. “Entende o que significa mexer com tantas SKUs num dia?
As empilhadeiras não dão conta disso, mesmo se triplicarmos o número de horas em um dia.”
“E se aumentarmos empilhadeiras e mão de obra?” propôs Paul. “Quando Martin vir os números da
minha loja, projetados para dez filiais, não importa do que precise, ele vai aprovar!
“Por mim, ele poderia aprovar a 3ª Guerra Mundial”, Roger jogou um braço para cima, para enfatizar.
“Não tenho espaço para tantas empilhadeiras manobrarem aqui!
“Então o que faremos agora? Não vou aceitar que não há solução para este problema.”
“Nem eu”, disse Roger, “mas estou sem saída. Estive pensando sobre isso desde que acordei hoje.
Talvez possamos utilizar outros equipamentos. Alguns depósitos que precisam remeter pequenas quantidades
usam separadores de pedido em vez de empilhadeiras. Cada um desses pode apanhar cinquenta caixas
diferentes individuais por hora.”
“Então, qual é o problema?” disse Paul, aliviado. “Se precisar, tenho certeza de que conseguiremos a
verba.” Então, com mais cautela, perguntou: “Quanto custam?”
“Não é com o investimento que estou preocupado”, respondeu Roger. “Para operar tal equipamento, o
depósito inteiro tem que ser organizado de forma diferente. Mesmo o espaço entre as prateleiras terão de ser
alterados. Paul, será como comandar outro tipo de operação. E não tenho certeza de que sei comandar isso.”
“Talvez a mudança não precise ser tão grande”, Paul tentou consolar o amigo. “Você conhece
depósitos que utilizam tanto empilhadeiras quanto separadores?”
“Para que seja apropriado”, disse Roger cautelosamente, “temos de encontrar um que tenha uma
situação similar à nossa. Por um lado, deve ser uma grande operação que tem um grande número de SKUs,
mas que, por outro, lide com muitas entregas de pequeno porte.”
Tanto Paul quanto Roger procuraram uma resposta. Após um breve silêncio, Roger disse, “Ainda estou
um pouco perturbado para pensar direito. Você vai para Boca, eu volto para o trabalho. Quem tiver uma ideia
primeiro avisa o outro.”
Paul estava refletindo ao dirigir para o norte. Sem uma adequada solução logística, o novo método não
poderia ser implementado. Que pena. Enquanto estacionava na sua vaga, atrás do velho shopping, seu celular
twittou. Ele abriu a mensagem que chegou de Roger.
“Livros”, dizia, com um emoticon.
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Uma hora e trinta e cinco minutos depois, Paul estava em Hallandale. Roger já estava do lado de fora
um grande depósito com o conhecido logo do jacaré sorridente da Editora Gator State.
“Como pensou em livros?” perguntou Paul ao seu amigo de ombros largos.
“Já que nada me ocorria, resolvi ver quem eu conhecia e procurar inspiração lá,” respondeu Roger.
“Passei pelos contatos de e-mail e me deparei com o nome de Jack – ele dirige um depósito da GSP. Quando
pensei em livros, me dei conta de que as livrarias guardam uma enorme quantidade de SKUs, uns vinte mil
títulos diferentes facilmente. De cada novo título que publicam, eles devem mandar paletes inteiros para os
depósitos da rede. Mas, ao mesmo tempo, para os títulos já lançados, não enviariam nem uma caixa cheia de
cada título às lojas. Uma loja nunca conseguiria vender – nem estocar – tantos livros, imaginei. Liguei para o
Jack e contei a ele sobre a nossa situação. Ele confirmou que usa tanto empilhadeiras comuns quanto
separadores e sugeriu que passássemos para ver como são.”
Roger apertou o botão do interfone, e depois de se identificarem, uma voz rouca pediu-lhes para
esperar. Uma pequena porta dentro das grandes portas de metal se abriu e um careca de jaqueta de couro,
barba, e óculos escuros os cumprimentou.
“Oi, Rog,” disse Jack com um sotaque sulista. “Quem é a figura?”
“Paul, este é o Jack Galvez, que gerencia o depósito da Gator”, Roger fez as apresentações. “Jack,
este é o Paul White, que dirige a filial da Hannah’s Shop de Boca, a loja que teve o problema do cano
estourado que lhe contei.”
Jack grunhiu uma resposta, e indicou para que entrassem. O depósito parecia não ter fim, era o dobro
do tamanho do de Roger. Os olhos de Paul percorreram a enorme instalação, para cima e para baixo. Paletes
e paletes de livros empilhavam-se em seis níveis de prateleiras de metal numa área, muitas caixas de papelão
corrugado, e paletes em estruturas azuis e vermelhas em outra. Ele viu cinco empilhadeiras em ação, e ouviu a
buzina das outras. Seu nariz se encheu com o cheiro de papel, papelão e madeira. Esta era uma enorme
operação, e ele não conseguia nem imaginar o número de livros que este depósito abrigava.
Depois de levá-los para dentro, Jack explicou como o depósito da GSP funcionava, “Nós temos dois
tipos de remessas. A primeira é a grande, para os atacadistas e depósitos das redes maiores. Para estes nós
enviamos as caixas originais, como vieram da gráfica. A segunda é de remessas menores, diretamente para
cada estabelecimento. Para uma loja, temos que combinar algumas cópias de vários títulos numa caixa, ou
para quantidades menores fazer caber num pacote.”
“Isso significa que tem que selecionar manualmente muitos livros”, exclamou Roger. “Como faz isso
para tantas lojas, sem mandar empilhadeiras para cima e para baixo no depósito?”
“É bastante simples”, o ex-ciclista bronzeado indicou uma grande área onde várias pessoas
trabalhavam enfileiradas ao lado de mesas especiais, com cilindros rolantes de um lado.
Enquanto Paul e Roger assistiam, Jack explicou: “Olhem aqui”, ele apontou para as prateleiras perto
das mesas. “Aqui temos uma pequena quantidade de cada livro que está no catálogo. Ou seja, os livros que
estão vendendo. Nós o chamamos de minidepósito”.
“O que quer dizer com ‘uma pequena quantidade’”? Roger perguntou, sedento por mais informações.
“Boa pergunta”, respondeu Jack. “Temos no depósito mais de 50 milhões de livros, uns vinte mil títulos
diferentes”.
“Tantos assim?” Paul não pôde conter sua surpresa.
“O depósito de uma grande editora estoca mais que o dobro disso”, comentou Jack e continuou. “Mas
não se impressione tanto. A maioria dos títulos não é encomendada por vários meses, por isso não temos
nenhum no minidepósito. Para satisfazer os pedidos dos que têm pouca saída, usamos outra área. Vou lhes
mostrar depois”.
“Eu estou interessado apenas na mercadoria para a qual você tem muitos pedidos toda semana”, disse
Roger. “Quantos, de cada um deles, você mantém nos minidepósitos?”
“O número varia muito. Dos best-sellers, mantemos o equivalente a três dias de vendas, cerca de um
palete. Mas a maioria dos livros não vende em grandes quantidades, de modo que temos o equivalente a duas
semanas, umas duas ou três caixas. Não é muita coisa. Está tudo aqui.”
“E eu imagino que você reabasteça de acordo com a popularidade,” comentou Roger. “Best-sellers a
cada três dias, os outros, duas vezes por mês.”
“Nós reabastecemos quando só resta uma caixa”, disse Jack. “Mas acho que você tem razão, bestsellers a cada dia mais ou menos, e os demais em algumas semanas.”
“Quantos minidepósitos você tem?” Roger perguntou com uma voz estranha.
“Não entendi”, respondeu Jack, “Por que eu deveria ter mais de um?”
Roger pôs a mão na cabeça e começou a gemer. “Eu sou um idiota”, disse ele. “Um completo idiota.”
“Eu odiaria ter que discordar com você sobre isso”, zombou Paul, e então perguntou: “Mas do que está
falando?”
“Eu tinha a solução o tempo todo, bem na cara, e não quis enxergar. A área que eu tinha separado
para a sua loja já era um tipo de minidepósito”, respondeu Roger.
“Certo”, comentou Paul. “E você falou de separar mais para as outras lojas, então estava no caminho
certo.”
“Eu estava num caminho parecido, não no certo.” Roger balançou a cabeça. “Não está vendo? Eu
queria separar um minidepósito para cada loja que atendemos. Jack não mantém minidepósitos em separado
para cada loja!”
Jack riu. “Dois mil minidepósitos? Imaginem só. Roger, você não estava raciocinando.”
“Claro que não”, disse Roger. “E para que manter o inventário da loja inteira no minidepósito? O
equivalente a duas semanas de cada SKU deve ser mais do que suficiente para a reposição diária de
consumo. Pensando bem, depois de agregado, o equivalente a duas semanas das dez lojas deve ocupar o
mesmo espaço de quatro meses do estoque da loja de Paul.”
“Que é o que você mantém naquele recinto, agora,” disse Paul. “Isso resolve o problema de espaço,
mas e quanto ao fato de não poder pré-alocar os saldos?”
“Qual é o problema exatamente?” Roger sorriu. “Eles vão ser tratados como todas as outras SKUs. A
questão de como distribuí-los foi retirada completamente. Todos os itens retirados das lojas serão mantidos
nas prateleiras, exatamente do jeito que guardo o estoque hoje. Com apenas um minidepósito, e não dez, não
há divisão de bens. Não há saldos, apenas itens de pouca saída.”
“Então, isso pode ser aplicado para toda a região?” perguntou Paul, ansioso.
“O método de Jack resolve os dois problemas – o do espaço e o das manobras da empilhadeira. Com
a necessidade de repor cada item do minidepósito somente uma vez a cada duas semanas, eu devo conseguir
me virar com as empilhadeiras que já tenho. Talvez precise de uma ou duas, mas com certeza não preciso dos
sofisticados separadores. Ainda tenho que pensar nos detalhes – em quantas empilhadeiras mais e
selecionadores são necessários, quanto espaço requer o minidepósito, como organizar o estoque. Mas...”
Roger sorriu para Paul e lhe fez um positivo com o dedão.
“Se eu soubesse que os livros o deixariam tão feliz”, disse Paul, “teria recomendado que lesse um.”
Jack riu alto. Roger, que sentiu como se uma montanha de tijolos tivesse sido retirada dos ombros, riu também.
As alterações na maneira que seu depósito funcionaria eram pequenas, praticamente insignificantes. Tudo já
estava lá.
Eles agradeceram a Jack do fundo do seu coração e saíram, Roger assobiando uma música alegre.
Quando seu amigo entrou no carro da empresa, Paul ficou surpreso por não estar tão exultante. Se havia uma
coisa que as últimas semanas haviam lhe ensinado, era para não contar com os ovos na galinha. Ele tinha a
sensação de que uma nova surpresa estava esperando para dar o bote, a qualquer momento.
Capítulo 17
Na manhã de uma quinta-feira, pouco mais de um mês após a visita à Editora Gator, uns três meses
após o estouro do encanamento, quando Paul entrou na loja, Alva avisou que o gerente regional, Martin
Langley, havia chegado sem avisar.
Maravilha, pensou ele. O desempenho da loja de Boca Raton tinha se mantido forte, então o pão-duro
tinha se curvado. Cheio de confiança, ele abriu a porta de sua sala.
“Bom dia, Martin,” disse Paul alegremente. “Como posso ajudá-lo?”
Paul convidou Martin a se sentar na cadeira – o único assento decente em sua sala. Depois de se
sentar, Martin respondeu: “Como prometi, chequei o desempenho do mês passado da loja de Boca. Muito bem,
você me convenceu. Devemos experimentar suas ideias nas outras lojas. Para isso, preciso que você elabore
um documento incontestável, incluindo um relato completo do que fez aqui”.
Paul largou sua pasta e abriu uma das pouco confortáveis cadeiras dobráveis antes de comentar: “Se
houver alguma ênfase que eu deva dar, qualquer coisa que ache que deva ser incluída no relatório oficial à
matriz, é só me dizer.”
“À diretoria?” perguntou o baixinho, com um olhar perplexo. “Eu não o levaria à matriz antes de
experimentar, pelo menos, em mais duas lojas. Eu preciso do documento para convencer os outros gerentes
de loja.”
“Um documento? Será que uma explicação simples, cara a cara, não seria mais convincente?
perguntou Paul.
“Eu já tentei essa abordagem”, Martin respondeu. “E não fez muito sucesso. Veja, eu percebi que
devemos ir com cuidado, ou seja, começando com apenas mais duas lojas funcionando neste seu novo
sistema. E depois, veremos.” Martin escolheu não dizer nada do fato de que de acordo com seus cálculos, com
apenas mais duas lojas mostrando os níveis de desempenho de Paul, ficar em primeiro entre as regiões seria
uma barbada. Ao invés disso, ele acrescentou: “Então, claro, eu fui aos dois gerentes de loja com o melhor
desempenho, Delacruz e Gary, mas eles não quiseram nem saber.”
Paul ficou surpreso ao saber que estes dois superempreendedores não aproveitaram da chance de
vender ainda melhor. Antes do estouro da tubulação, a disputa pelo primeiro lugar entre os gerentes de loja do
centro de Miami e as filiais de Boynton tinha sido bastante intensa. Este sistema poderia ter lhes dado a chance
de ser a loja-líder de toda a rede.
“Posso perguntar o que disse a eles?”, perguntou Paul.
“Eu disse o que você me disse,” disse em tom áspero o gerente regional de cabelo escovinha. “A
resposta de Delacruz foi que, enquanto ele for julgado de acordo com o desempenho da loja, se recusa a
renunciar ao controle sobre seu estoque. Se ele transferisse o estoque para o depósito, qualquer outra loja
poderia pegá-lo, e ele sairia perdendo. Nem quero repetir a terminologia em espanhol que ele usou.”
“E Gary?
“De sua parte, Gary disse que jamais correria o risco de perder vendas, enquanto espera o depósito lhe
enviar uma ou duas toalha em falta. Ele prefere ter o que precisa por perto, no seu estoque. Pela primeira vez,
os dois concordaram em alguma coisa.”
“Não veem que o novo sistema traz benefícios enormes?” Paul perguntou ansiosamente. O que os
segurava? Ele não conseguia entender. “Eles foram tão doutrinados a manter grandes inventários que não
veem quão melhor é o novo sistema? Eles vêm lutando há anos para ganhar um simples décimo de
percentagem de melhora da rentabilidade, e isso lhes oferece 10% adicionais. Eles não acreditam que 17% é o
número real a que cheguei? Não querem o enorme salto nos giros do estoque! Para trinta! Trinta!”
Ao ver o entusiasmo de Paul, Martin respondeu: “Quer saber? Em vez de eu lhes apresentar um
documento, que tal você explicar isso a eles?”
“Tudo bem,” foi a resposta de Paul. “Dê-me alguns dias para preparar algo, eu levá-la para você
analisar e, depois me reúno com eles.”
“Não podemos nos dar a esse luxo”, afirmou Martin. “Conhecendo meus gerentes estrelas, eles vão
começar a espalhar o boato, tentando fazer o plano ruir. Precisamos avançar rápido.”
“Então, vamos conversar com todos os outros gerentes, logo que possível, antes deles”, propôs Paul.
“É melhor. Afinal, queremos que todos participem, por que não começar agora?” No fundo, Paul pensou que se
não conseguisse convencer os gerentes de sua própria região, haveria pouca chance de a diretoria concordar
em implementar o sistema em toda a rede, e suas descobertas iriam pelo ralo.
“Tudo bem”, concordou Martin, sabendo que só precisaria de mais duas lojas com esses números para
alcançar o primeiro lugar. A ele não importavam quais seriam. “Eu consigo isso. Vou marcar uma reunião com
os gerentes, onde você vai apresentar o novo sistema, assim que possível, o que significa segunda de manhã.
Vou pedir a minha secretária para organizar tudo”.
Vendo Martin ir embora, Paul suspirou. Convencer as pessoas a fazer uma mudança nunca fora fácil,
mas a difícil batalha que ele enfrentava agora fez a sua adrenalina acelerar.
Ele tinha que encontrar uma maneira de convencer os outros gerentes; algo diferente do que Martin
tinha feito. Como ele os convenceria a abdicar de seu rígido controle de estoque, e se concentrarem nas
vantagens do sistema? Como ele poderia explicar que desta forma seu inventário seria muito melhor
administrado, e que permitiria que suas lojas prosperassem? Administração de estoque não era sua
especialidade, por isso ele ligou para a pessoa cuja especialidade era.
“Roger, você está livre neste fim de semana?”
Capítulo 18
Paul abriu a porta para Roger. A manhã de sábado estava clara e com uma brisa agradável.
“Obrigado por vir.”
Roger deu de ombros ao entrar no corredor e disse com um sorriso: “Faz parte do trabalho.”
Comparado à sua casa, a casa de Paul e Caroline era impecável. Com seus cinco filhos, Roger só
poderia ter inveja da ordem que os White mantinham.
Caroline estava sentada na sala, com o laptop aberto na adornada mesa de centro. Roger e ela se
cumprimentaram, e ele começou a caminhar em direção ao escritório nos fundos da casa.
“Sente-se,” Caroline indicou com um gesto. “Aceita um café?”
Sentado numa cadeira Queen Anne, Roger disse: “Só um de açúcar, Caroline, estou tentando reduzir
minha ingestão de carboidratos.
Quando ela saiu da sala, Roger – um pouco surpreso – perguntou, “Caroline vai ficar conosco?”
Apesar de estar muito mais embaixo que Caroline na hierarquia da empresa, as duas famílias eram
amigas desde que suas filhas começaram no jardim-de-infância. Mas funcionava porque ele e Caroline tinham
o cuidado de nunca falar de trabalho.
Vendo o rosto do amigo, Paul explicou: “Eu pedi a ajuda da Caroline porque esta apresentação é muito
importante para nós e, sinceramente, eu praticamente não tenho nenhuma experiência na preparação de
apresentações. Você tem?”
Roger apenas riu.
“Eu até peguei emprestado o laptop da Caroline. Ela tem todos os mais recentes softwares para fazer
slides profissionais”.
“Isso é bom”, disse Roger se inclinando para a frente, “Posso ver?”
Quando Caroline retornou, com uma fumegante caneca na mão, os dois homens já estavam
absorvidos no computador. “O que estão olhando?”, perguntou ela.
“As três alternativas que preparei como página de título,” respondeu ele. “Qual delas você acha que é
mais impressionante? Pessoalmente, gosto da animação da terceira; acha que começar com um pouco de
humor ajuda?”
“Você chama essa coisa feia... de humor?” Roger sorriu. “Além disso, não gosto do título da
apresentação; ‘Levando o Sul da Flórida ao Primeiro Lugar’ soa muito bombástico. Algumas pessoas podem se
desinteressar desde o início, Delacruz, com certeza.”
Paul virou-se para Caroline, “Eu sei que não é esta a questão, ninguém se impressiona mais com
animações bonitinhas. Mas estou empacado. Tudo que pensei em fazer me levou de volta ao que Martin
tentou. E ele falhou.”
“Não é uma apresentação que você tem que dar”, explicou Caroline. “Precisa realizar algo muito mais
difícil: uma venda. Você tem que vender seu novo modo de gerenciar uma loja, e tem que vender não para um
público receptivo, mas hostil. Eles já souberam dele e já rejeitaram; pelo menos, os líderes de opinião.”
“Ela tem razão”, Roger consentiu.
Paul fechou o laptop e perguntou: “Então de onde é que começamos?”
“Temos de começar por esclarecer para nós mesmos porque rejeitam...” ela hesitou, “na verdade, a
julgar pela descrição de Martin, rejeitar não é uma palavra forte o suficiente.” Ao encontrar a palavra certa, ela
continuou com confiança, “Por que eles se ofendem com qualquer sugestão de fazer o que você fez? E não me
diga que é porque ‘resistem à mudança’, ou que são ‘maníacos por controle’. Se não entender totalmente o que
provocou uma reação tão forte, você não tem chance de convencê-los”.
“Para ser sincero, fiquei bastante decepcionado”, disse Roger. “Eu tinha certeza de que, vendo os
resultados, eles iriam perceber que os leva direto à elite da empresa. Eu tinha certeza que todos iriam saltar
para o lado vencedor. Mas, como sempre reclamo, ninguém entende um gerente de loja.”
“Mrbl-glrbl”, respondeu o gerente da loja de Boca Raton em tom de brincadeira. “Mas, falando sério,
Roger, você pode, ao menos uma vez, se colocar na nossa situação? Tente entender o que significa viver num
mundo de incerteza. Lembra-se da bola de cristal que lhe pedi?”
Como se aceno de Roger fosse uma deixa para ele agir, Paul se levantou e começou a andar.
“Como gerente de loja”, disse ele, “você nunca sabe quantas pessoas irão entrar na loja. E quando
entram e olham a mercadoria, você ainda não sabe se vão comprar alguma coisa. Mas, acima de tudo, você
nunca sabe o que vão comprar. Nossa previsão quanto ao que vai sair bem e que vai encalhar é só um
palpite... embora seja baseada em fatos.”
“Com isso, concordo”, disse Caroline.
Paul parou de andar, encarou sua mulher e seu amigo, e tentou explicar seu ponto.
“Mas, finalmente uma cliente entrou, finalmente ela decidiu o que comprar, finalmente decidiu
exatamente o que quer. Metade do milagre aconteceu. Mas você não o tem em estoque. Você não tem o
tamanho exato, ou a cor específica. É muito sofrimento! Não admira que os gerentes de loja fiquem paranoicos
por não ter estoque suficiente. Agora percebe que ter o máximo possível de estoque está arraigado em nós?”
“Mas você não pode estocar uma quantidade infinita – que é o que todos os gerentes de loja querem. A
fim de ser rentável, temos de controlar os custos, certo? No final das contas, o que importa é o ROI. Isso não
conta nada para os gerentes de loja?” perguntou Caroline.
Em vez de responder, Paul voltou a andar.
Roger tomou o partido de Paulo: “E o fato de que, se tem estoque demais, vai acabar com excedentes?
Isso não conta também?”
Sem errar um passo, Paul respondeu: “Vocês dois podem encarar a verdade? Podem falar o quanto
quiserem sobre a importância do ROI e mesmo dos giros de estoque, podem acenar os enormes excedentes
na frente dos nossos narizes. Mas a verdade é que somos pré-condicionados a estocar. Cada uma de nossas
lojas é entulhada até o topo com mercadorias. Se nos der mais espaço, pode ter certeza que nós vamos
preencher esse, também.”
“Eu entendo o que quer dizer,” Roger concordou. “Mas pode me fazer um favor?”
“O que é?”
“Estou me sentindo como se estivesse assistindo a um jogo de tênis. Será que podem, por favor, se
sentar?
“Desculpe”, Paul se sentou e resumiu. “Se você disser ao gerente de uma loja para devolver seu
estoque, a partir desse momento você estará falando com as paredes. E não estamos pedindo que enviem
uma ou duas caixas. Queremos que enviem a maior parte. Por que estamos tão surpresos de eles nem sequer
pensarem nisso?”
“Aparentemente, você está certo”, disse Roger. “Então o que vamos fazer?”
Os dois olharam para Caroline.
“Temos que ir mais fundo”, respondeu ela.
“O que quer dizer?” Paul perguntou.
“Quero dizer que, se você quer ganhá-los logo de cara, não deve começar do final, como Martin fez. É
melhor não começar dizendo o resultado final e as medidas que têm de tomar. Isso nunca vai funcionar”.
“Sim, isso eu já sei, mas por onde devo começar?” perguntou Paul.
“A solução que eles têm é manter muito em estoque. Para convencê-los a adotarem sua solução, é
melhor conseguir um acordo quanto ao problema,” disse Caroline categoricamente. “E, para isso, é necessário
ir mais fundo. Você tem que começar com as razões para manter estoques, a necessidade que ter um grande
estoque satisfaz. E uma vez que conseguir um acordo sobre a necessidade, explicar por que, apesar de
manter muito estoque, a necessidade ainda não é satisfeita. E só então lhes mostrar que você tem uma
maneira de melhor satisfazer essas necessidades. Consegue fazer tudo isso?”
“Precisamos de estoque para apenas uma finalidade: apoiar as vendas,” disse Paul confiante. “A
questão real é, considerando a incerteza na qual operamos, quanto estoque será que realmente precisamos
manter na loja?”
“O estoque que precisa realmente manter é o que espera vender até que seja reabastecido”, Roger
raciocinou.
“Claro”, concordou Paul. “E nós temos uma ideia de quanto tempo demora para ser reabastecido;
sabemos aproximadamente quanto é o tempo de reposição. Mas temos apenas uma vaga ideia do que e
quanto vamos vender, durante esse período de tempo.”
“Esse é o verdadeiro problema.” Caroline interrompeu. “A precisão do nosso prognóstico é apavorante
e a variabilidade é muito alta. Ouço isso em todas as reuniões que já tive com os gerentes de loja.”
“Concordo”, disse Paul. “Então, o que fazemos? Fazemos o melhor possível. Para cada SKU, o
sistema calcula o estoque inicial. Nós, como gerentes de loja, argumentamos, contestamos e, às vezes
conseguimos modificar estes números, mas na verdade, se pensarmos bem, nossas intervenções não ajudam
muito.”
“Será melhor você não enfatizar esta última observação”, informou Caroline. Ela se ajeitou um pouco
no sofá e pegou uma maçã.
“Correto”, concordou Paul. “Principalmente quando a realidade é que o sistema está fazendo todas as
outras decisões importantes também. Exceto em casos extremos, podemos deixar o sistema decidir quando e
quanto encomendar”.
Roger estreitou os olhos, e em resposta, Paul pegou um bloco de anotações da mesinha e desenhou o
conhecido gráfico de serra. Apontando para o lado esquerdo do gráfico, ele explicou: “Esta é a forma como a
empresa opera agora. Este é o estoque inicial de uma loja. Conforme a loja vende, o estoque gradualmente
diminui. Ao atingir o nível pré-determinado de estoque mínimo, o sistema gera um pedido de reposição.”
(Inserir gráfico 1)
Roger e Caroline assentiram e Paul continuou a explicar o gráfico. “É claro, demora até que as
mercadorias cheguem e até lá o estoque continua a decrescer. “Uma vez que a mercadoria chega, o estoque
aumenta de novo e o ciclo se repete.”
“Eu já vi este gráfico sintético em todos os manuais,” zombou Roger, “infelizmente, na prática é muito
diferente.”
“Como assim?” Caroline ficou surpresa. “É exatamente assim que funciona o nosso sistema”.
“Sim”, Roger se apressou a explicar: “Isso é como o nosso sistema informatizado e os dos nossos
concorrentes funcionam. No entanto, neste gráfico sintético a nova remessa chega sempre antes das lojas
ficarem sem estoque. Nós todos sabemos nem sempre é isso que acontece.”
“Com certeza”, admitiu Caroline. “Os gerentes nunca se esquecem de nos lembrar das faltas. Não ter,
em algum momento, nada no estoque de um quarto das SKUs significa que esse gráfico fica no zero por
longos períodos. Não me admira que os gerentes estejam lutando para aumentar seus estoques.” Após uma
breve pausa, ela acrescentou em voz baixa: “E considerando o enorme impacto que a perda de vendas tem na
lucratividade, talvez eles estejam certos.”
Enquanto ela falava, Paul rascunhou o gráfico corrigido. A linha agora encostava no eixo inferior por
longos períodos. “Espere aí, não estamos tentando justificar o aumento de estoques. Estamos tentando chegar
ao fundo do problema. Vamos tentar entender a situação um pouco melhor. Vejam, a distância entre dois picos
é o tempo de reposição. Isto é, o intervalo de tempo que determina o nível de estoque inicial que temos de ter.
O tempo desde a emissão do pedido até o estoque chegar é o tempo de espera de reposição: o tempo que
leva para produzir e enviar.” (Inserir gráfico 2)
Caroline comentou: “O tempo de produção é aproximadamente de três meses e já que compramos a
maioria dos nossos produtos do Extremo Oriente, o tempo de envio acrescenta mais seis a sete semanas. Mas
mantemos seis meses, em média, o que significa que os nossos estoques iniciais são mais elevados do que
isso. Então, por que temos tantas faltas?”
“Olhe novamente para o gráfico”, disse Paul: “A resposta está bem diante do nosso nariz”.
Como ninguém disse nada, ele elaborou, “O tempo de espera é só uma parte do tempo de reposição.
Vejam, eu começo a vender neste momento,” apontou ele para um dos picos, “mas o sistema não encomenda
de imediato, ele espera até que o estoque atinja o nível mínimo. Todo esse tempo, desde a chegada do
estoque até encomendarmos de novo, todo este tempo de espera de reposição na verdade é desperdiçado. E
veja como é considerável: cerca de metade do tempo de reposição”.
“Não admira que eu acabe não tendo tempo suficiente”, disse Caroline. “Eles estão gastando metade
do tempo disponível e eu acabo levando xingos por não trazer o novo lote a tempo”.
“Sim”, disse Paul, colocando a mão em seu braço. “Mas vamos nos concentrar novamente nas lojas.
Vocês agora entendem por que o nosso método funciona tão bem? Reduzimos o tempo de espera de
reposição de meses para menos de um dia! Se vendo algo, não espero. Informo o Roger no mesmo dia.”
Olhando para o gráfico, Caroline disse pensativa, “Entendo, querido. Isso ajuda, mas algo ainda não
faz sentido.”
“Correto”, disse Roger. “Tem alguma coisa faltando. Mas, felizmente, eu também passei um tempão
pensando nisso. E acho que tenho a outra metade da explicação”.
Demorou algum tempo até que o casal White parasse de olhar para o gráfico e se concentrasse em
Roger.
“O problema é,” disse ele num tom sério, “que nós, como empresa, não admitimos que temos
depósitos.”
“Rog, você acha que agora é o momento adequado para demonstrar seu ‘complexo de inferioridade’
como gerente de depósito?” disse Paul, meio brincando.
“Sei que soa estranho”, Roger sorriu, “mas me escutem. Lá no passado, não tínhamos depósitos. Na
verdade, ainda hoje, muitas redes de varejo não têm depósitos regionais – o que elas compram é
imediatamente colocado nas suas lojas. Mas conforme as empresas passaram a ter mais lojas numa região, a
economia de remeter uma grande quantidade para um lugar e depois distribuí-la para as lojas tornou-se cada
vez mais evidente. Os primeiros depósitos eram apenas pontos de divisão. E sim, há varejistas que ainda
operam dessa forma.”
“Continue”, incentivou Caroline, “isso é interessante”.
“Uma vez que os depósitos regionais estavam em funcionamento”, continuou Roger, “eles permitiam
uma confortável dissociação entre a quantidade que cada loja pede e a quantidade que é mais econômica de
encomendar dos fornecedores. As considerações da loja e as das Compras são muito diferentes; comprar em
quantidades maiores tem vantagens de preço, por exemplo.”
Caroline concordou com a cabeça e completou o pensamento de Roger: “Então, a diferença entre a
quantidade encomendada pelas lojas e a quantidade que estou comprando é armazenada nos depósitos
regionais.”
“Que é a situação atual”, resumiu Roger, triunfante.
“Faz sentido”, Paul comentou: “Mas como se relaciona com nosso tema?
“Não percebe?” Roger estava genuinamente surpreso. “Temos depósitos regionais, mas continuamos a
pensar e a agir como se não tivéssemos. O abastecimento para a loja não é feito diretamente do fornecedor. O
prazo de fornecimento para a loja é apenas o tempo necessário para levá-lo a partir do depósito. O prazo de
fornecimento para o depósito é longo, como já foi dito. Inclui o tempo de produção e o longo transporte por mar.
Mas o tempo de fornecimento de um depósito regional para a loja não é mais do que alguns dias, na maioria
dos casos, apenas um dia. Agora volte para o seu gráfico de serra e veja o que acontece quando reconhece
que o tempo de entrega é de apenas um dia. Combine isso com o que disse sobre o tempo de espera de
reposição ser inferior a um dia e que você tem?”
“Nós temos a nossa solução”, Paul ficou encantado. “Apesar de toda a variabilidade, não temos de
estocar mais de duas semanas na loja e não devemos ter faltas. Roger, você é sensacional. Agora está tão
claro.”
“Vamos com calma”, Caroline não aderiu à comemoração. “Será que você apenas não transferiu o
problema da loja para o depósito? Ainda tem longos prazos de reposição e toda a variabilidade”.
“Não exatamente”, disse Roger num tom agradável. “Primeiro de tudo, se me deixarem manter o
estoque em vez de mandá-lo para as lojas, devemos ficar numa situação muito melhor. Nesse momento eu
poderia mostrar-lhe inúmeros casos em que uma loja tem uma carência de uma SKU, enquanto uma outra loja
na região tem demais do mesmo item. Se aplicarmos o nosso método, as duas lojas teriam o suficiente.”
Ainda se lembrando de algumas coisas básicas do seu curso de estatística na faculdade, Paul explicou
a si mesmo a razão para a melhora. A variabilidade no depósito, uma vez que ele atende a várias lojas, é muito
menor que a variabilidade individual de cada loja. Sabendo que ainda tinha que pensar mais sobre isso, ele
não interrompeu Roger, que continuou a falar com Caroline.
“Em segundo lugar, o tempo de reposição para o depósito regional não é necessariamente longo.
Devido à amolação desta figura,” e Roger apontou para Paul, “fui forçado a lançar mão de uma grande
alternativa. Quando estou prestes a ficar sem uma SKU, eu ligo para outros depósitos. O tempo para receber a
mercadoria deles em geral não passa de uma semana.”
Paul pegou o gráfico e uma caneta. “Ao admitir que o depósito regional existe”, ele piscou para Roger,
“O gráfico de serra se torna mais semelhante a isto.” Paul desenhou outro padrão que oscilava muito mais
frequentemente perto, mas nunca encostando, na linha do zero. (Inserir gráfico 3)
Satisfeitos, os três se entreolharam.
“Ok, agora estamos prontos para montar a apresentação?” perguntou Roger a Caroline.
“Quase”, respondeu ela. “Eu acho que o que discutimos até agora será suficiente para conduzir os
gerentes de loja a um ponto onde eles estarão dispostos a começar a ouvir o que você tem para sugerir.”
“Só começar a ouvir?” A voz de Paul indicou que ele estava muito mais otimista.
“É um avanço”, Caroline argumentou. “E depois os ‘sim, mas’ vão começar.”
“Gerentes!”, suspirou Roger. “Concordam pouco e reclamam muito”.
“É um grande avanço da postura ‘isso não faz sentido, eu não quero ouvir’, ela rebateu, “Gente, para
estarem realmente preparados vocês têm que trabalhar muito mais.” Vocês têm que especular quais serão as
restrições deles e ter uma boa resposta para cada uma dessas reservas.”
“Eu conheço muito bem alguns desses ‘mas’,” disse Paul.
Eles continuaram a trabalhar até altas horas da madrugada.
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Uma hora tinha passado e até agora a apresentação estava indo bem. Os gerentes de loja se reuniram
numa das pequenas salas de reunião da matriz da Hannah's Shop. Roger e Paul tinham terminado a primeira
fase da apresentação, e abriram para perguntas. Tudo bem até agora, pensou Paul, tinham conseguido evitar o
confronto, e a hostilidade que era palpável quando a reunião começou, tinha sido substituída por uma leve
curiosidade.
A primeira pergunta veio de Carter, a mais jovem entre os gerentes de loja.
“Apesar de tudo o que você disse”, declarou ela, “Eu ainda não gosto da ideia de enviar meu estoque
inteiro para o depósito. Se eu fizer isso, e outra loja vender meus itens mais rápido do que eu – principalmente
uma das lojas maiores – o estoque atualmente reservado para mim será liquidado até a hora que eu precisar.
Prefiro estar no controle a perder minha mercadoria. Perder vendas significa perder vendas”.
“Muito bem”, respondeu Paul. “Mas deixe-me perguntar, você tem faltas no momento?”
“Demais”.
“Bem, das faltas que sua loja tem agora, que você sabe que poderia vender se tivesse os itens em
estoque, quantas destas SKUs podem ser encontradas, neste exato momento, paradas em outras lojas na
região?”
“Eu não sei”, foi a resposta honesta. “Muitas, imagino eu.”
“Bem, nós apuramos,” Paul clicou num slide que mostrava um gráfico de pizza. “No momento, nossas
lojas sofrem de 30% de faltas. Esta é uma característica do ramo. A constatação que foi surpreendente para
nós é que, neste momento, 68% das SKUs que estão faltando em pelo menos uma loja na região, as outras
lojas têm mais de dois meses em estoque. Percebe o que isto significa?”, perguntou ele, e sem esperar
resposta, continuou. “Isso significa que quando agregarmos nossos estoques no depósito, cada loja vai sentir
uma queda imediata de uns dois terços das suas faltas; as faltas se reduziriam a meros 10%. Resumindo, isso
significa um aumento imediato de pelo menos 20% nas vendas. Carter, você não quer suas faltas caiam para
apenas 10%?”
“Gostaria, mas Paul, o que vai acontecer após dois meses?” insistiu Carter. “Pense numa SKU que eu
tenho em estoque, e outra loja não. Se eu enviar meu estoque ao depósito, estou aceitando que fico protegida
por dois meses, porque a região tem, no total, estoque de dois meses. Mas o que vai acontecer depois desses
dois meses? O setor de Compras reabastece em intervalos de quatro a seis meses. Eu prefiro manter o meu
estoque.”
Roger, vendo que Paul ficou um pouco irritado com essa resposta, interveio. “Deixe-me responder
esta”, e Roger passou a explicar. “É aqui que eu entro. Hoje, quando uma loja está sem uma SKU,
francamente, eu nem penso duas vezes. Sei que provavelmente há muitas delas em outras lojas. Se não se
incomodam em controlá-la corretamente entre vocês, então não parece ser tão importante fazer uma remessa
cruzada de outra região. Com tanta coisa que uma loja precisa nas prateleiras de outra, considero isso uma dor
de cabeça inútil. Mas se nós agregarmos os estoques, o que estiver faltando numa loja vai estar em todas as
lojas! Tenha certeza de que vou mover montanhas para obtê-las de outras regiões. E há bastante em estoque
nas outras nove regiões.”
“E vai conseguir?”, continuou ela a perguntar. “Se for um item que tem muita saída para nós, é provável
que venda bem nas outras regiões.”
“Aqui posso responder por experiência”, disse Roger, com segurança. “Nos últimos meses, eu fiz
remessas cruzadas de cada vez mais itens, em resposta à necessidade real expressa na loja de Boca. Em
75% das vezes não tive problema em obter o que era necessário. Isso significa que você pode esperar que
suas faltas caiam de 30% para um máximo de 10%.”
Dwight, sentado ao lado de Carter, sussurrou algo em seu ouvido. Sorrindo, ela respondeu, “Se você
consegue baixar minhas faltas à metade do que são hoje, eu ficarei muito satisfeita.”
Ontem os dois tinham hesitado em seguir o conselho de Caroline, de esperar e não apresentar
números quando falassem a respeito da queda resultante nas faltas. Ela tinha alegado que haveria muito mais
impacto se esperassem que seu público superasse sua desconfiança. Paul olhou para o público, tentando
avaliar o que pensavam. Uma cara feia se destacou – Delacruz. Bem, pensou ele, não se pode ganhar todas.
Paul bebeu um pouco de água antes de perguntar, “Alguém mais?”
Moti, o gerente da loja em Jupiter, ergueu o lápis e perguntou: “Posso falar?”
Paul assentiu.
“E se o depósito tiver um problema?”, perguntou o gerente israelense. “Por exemplo, se um caminhão
enguiçar? Foi o que aconteceu há duas semanas –pergunte ao Rog.”
“Moti”, Paul respondeu, “Nós não estamos pedindo que você mantenha apenas um ou dois dias de
estoque na loja. Mas o equivalente a duas semanas. Estamos conscientes de que uma força maior, como a
quebra de um caminhão, pode afetar a equação. Mesmo sem tais eventos, levamos em consideração a
flutuação das vendas. O nível de variação é alto, nós sabemos, mas ter duas semanas de estoque deve dar
proteção suficiente. Imagine ter duas semanas de cada um de suas SKUs. Então, se o caminhão não for na
terça, vai na quarta-feira. Você não tem que ficar esperando, porque continua vendendo – e melhor do que
antes.”
“Eu entendo que duas semanas é suficiente, em comparação com a quantidade que vendemos”, disse
Nick Nguyen, o gerente da filial de Palm Beach.
“Fico feliz que concorde, Nick.”
“Só um segundo, ainda há um problema. Com apenas duas semanas de mercadoria nas prateleiras, a
loja não vai ficar meio vazia?”
“Então, preencha-a com outras SKUs”, respondeu Paul. “Eu fiz exatamente isso. Eu tinha umas duas
mil SKUs, e só no mês passado adicionei mais 500. O depósito oferece mais que o dobro da quantidade de
SKUs que as lojas expõem. E a receita proveniente destes itens adicionais é enorme. Veja os números; é a
razão para o último salto em rentabilidade que minha loja teve”.
Nick recostou-se na cadeira, obviamente satisfeito com a resposta. Mesmo Moti, que sempre parecia
suspeitar de tudo, ostentava um pequeno sorriso.
“Com licença?” Eleanora era a mais veterana dos gerentes. Paul sabia que convencê-la seria
importante para convencer o resto.
Limpando seus óculos, ela perguntou: “E se isso não der certo? E se entregamos nosso estoque ao
depósito regional, retiramos dos livros, e o desempenho da minha loja não melhorar, ou mesmo piorar?”
“Quer dizer que o sistema funcionaria em todas as outras lojas e só no seu caso daria errado?”
perguntou Martin, o gerente regional, que tinha ficado calado até aquele momento.
“Não, claro que não”, disse a gerente da filial de Orlando. “Isso não faz sentido. Eu quis dizer o que
acontece se essa experiência for um fracasso.”
“Se o desempenho das lojas cair, simplesmente devolvemos a vocês o estoque original,” rebateu
Martin. “Isto é apenas um arranjo interno de estoque, afinal de contas. Temos um ‘botão de desfazer’.”
Duas ou três cabeças balançaram, aceitando as palavras de Martin.
Delacruz emitiu um curto relincho.
“Está tudo muito bem”, disse o elegante gerente da loja de Miami. “Mas há uma coisinha que me
incomoda. Algo trivial.”
“Toda questão é importante”, respondeu Paul, escondendo os seus reais pensamentos.
“Nós estamos falando sobre confiar demais no depósito”, comentou Delacruz, praticamente zombando.
“Até agora, nenhum de nós ficou satisfeito com a velocidade com que fomos reabastecidos, e isso foi quando
nos enviavam caixas pré-embaladas. Seu sistema exige que o pessoal da logística lide com pequenas
quantidades, até mesmo uma simples toalha de mão, se foi isso que foi vendido. Tem certeza de que o
depósito dá conta disso? Isso significa não só entregas muito mais frequentes, mas muito mais trabalho por
entrega. Estou perguntando porque, quando o depósito não der conta dessa tarefa impossível, nós não
queremos afundar com ele.”
Paul notou que todos os gerentes ficaram tensos com esta questão.
“Este é o seu campo, Rog,” sorriu ele.
“Vamos ver o slide 17”, disse Roger, cheio de confiança. “É uma questão de logística, mas é muito
mais fácil do que se pode pensar.” Ele passou a apresentar o minidepósito em menos de cinco minutos,
utilizando três slides. “Para resumir, é assim que eu venho suprindo a loja de Paul. Deve responder a todas as
necessidades deste método, e não há nenhum problema em atender a todos vocês. A única limitação que
tenho é a velocidade com que as lojas vão aderir à iniciativa. Já que terei que tomar providências para receber
todos os meses de estoque que cada loja atualmente possui, o depósito só pode receber de duas lojas por
semana”.
Paul olhou em volta, para os rostos dos nove gerentes. Exceto pela cara fechada de Delacruz, todos
pareciam relaxados.
Sentindo-se incentivado, e com seu melhor sorriso de vendedor no rosto, ele disse, “Obrigado por
perguntar, Delacruz. Alguém mais?”
Como não viu mais mãos erguidas, Paul apostou.
“Então, quem quer ir primeiro?” perguntou ele, e quatro mãos se levantaram. Martin escolheu Eleanora,
a gerente mais antiga, e Dwight, cuja loja em Homestead tinha ficado lá embaixo na lista da região durante
anos.
Quando Martin começou a agradecer a todos por terem vindo, Gary interrompeu: “Espere um minuto,
espere um minuto.”
Paul ficou de prontidão, esperando críticas do homem que rejeitara o sistema uma semana antes.
“Paul, você pode dar essa mesma apresentação aos gerentes do meu departamento?”
Capítulo 19
“Sabe a diferença entre plié e relevé?” zombou Paul.
“Sem chance”, respondeu Roger. “Eu observo a Liz, e tento aplaudir na hora que ela aplaude.”
Durante o intervalo da apresentação de balé de suas filhas, as esposas de Paul e Roger lhes pediram
para pegar bebidas. Roger pediu dois refrigerantes ao garçom, e disse a Paul, “Soube que Delacruz finalmente
se dobrou?”
“Quer dizer que depois de todas as caretas que ele fez durante a apresentação, finalmente se juntou
ao resto da região?”, perguntou Paul. “Bem, considerando que no mês passado ficou em 9º lugar, e este em
10º, ele deve ter corrido para Martin e achado uma desculpa para ser incluído.”
“Ah”, disse Roger. “Isso explica tudo.”
“Então, agora que ele está a bordo, o trabalho deve ficar mais fácil”, declarou Paul. “Com todos a bordo
do navio, você não está mais administrando os dois métodos de distribuição ao mesmo tempo. O sistema está
indo bem, não é?”
“Indo bem?” Roger fez uma careta. “Eu não diria isso.”
“Por que não? Martin não forneceu as empilhadeiras extras e mão de obra que prometeu?”
“Sim”, e Roger acalmou seu amigo enquanto atravessavam a multidão, tentando voltar às esposas. “E
com a nova disposição, o depósito está caminhando. No entanto, tenho problemas cada vez maiores com as
remessas cruzadas. Nós estamos vendendo tanto mais que o depósito sofre cada vez mais de falta de
produtos.”
“Mas todos transferiram os estoques para você. Deve ter mais mercadoria no seu depósito do que
nunca.
“Correto”.
“Mais mercadorias e mais faltas? O primeiro não devia reduzir o último?” perguntou Paul.
“No total, temos menos faltas do que tínhamos antes de agregarmos o estoque no meu depósito”,
explicou Roger. “Como prevíamos, não há mais casos em que uma loja tem uma falta e eu não tenho o produto
para reabastecê-la enquanto há um monte numa outra loja. Porém, reunir todo o estoque não me ajuda quando
há faltas em toda a região.”
Paul colocou a mão no ombro de Roger, evitando que ele entrasse numa foto de família que estava
sendo tirada.
“Obrigado,” continuou Roger após o flash ter disparado. “O problema é que quando anunciei que
conseguiria rapidamente os produtos de grande saída de outros depósitos, eu não sabia onde estava me
metendo. É uma trabalheira danada.”
“Deve ser”, disse Paul, solidário.
“Você não entende”, disse Roger, frustrado, “Fazer remessas cruzadas só para a sua loja me deu a
falsa impressão do tanto de trabalho em fazê-lo para toda a região. Entrei nessa furada de olhos vendados”.
“Eu não entendi”, comentou Paul. “Do que está falando?”
Emitindo um grande suspiro, Roger começou a elaborar. “Quando você ficava sem uma SKU, eu fazia
uns dois telefonemas e conseguia um lote econômico, equivalente a seis meses para sua loja. Claro que
durava até a próxima entrega do fornecedor chegar. Uma ligação e eu não tinha de pensar nessa SKU num
futuro próximo. Mas agora estou abastecendo dez lojas. O mesmo lote econômico dura apenas dez dias. Não
sai da lista, e tenho de lidar com as mesmas SKUs várias vezes. E você sabe quantas delas tenho de
procurar? Mais de mil”.
“É tão ruim assim?” Paul viu as esposas na outra ponta do foyer.
“Não, é pior”, afirmou Roger, “Antes eu ligava para dois, talvez três depósitos, e achava o que
precisava. Agora, depois de umas quatro rodadas, muitas vezes não se acha mais nada em nenhuma região.
Eu fico ao telefone todos os dias.”
“E aposto que os outros depósitos não ficam lá muito felizes em ajudar”, acrescentou Paul. “Eu sei
como era, quando tentava conseguir os itens de que precisava de outras lojas da região e eles viam meu
pedido como sinal de que o item estava vendendo bem. Posso imaginar que conforme o nosso sucesso
aumentar, isto irá só se agravar.”
“Sim”, respondeu Roger. “Eles estão ficando mais ligados. Karl, da Louisiana, até me disse na cara que
já percebeu que, se estou pedindo um item a ele, então suas lojas estarão pedindo o mesmo item em um mês
ou dois. A busca pelos produtos de boa saída parece interminável, e cada vez mais, muitas vezes, acaba por
ser uma busca inútil.”
Paul não tinha percebido como o trabalho seria frustrante. “Está arrependido de ter aceitado?”,
perguntou ele.
“Nem em pouco,” respondeu Roger. “Desculpe se lhe dou a impressão de que estou reclamando.”
“Como eu ficaria com essa impressão?”, provocou Paul.
“Paul, é trabalho duro, mas vale a pena. Cada lote que eu consigo trazer sei que tem um impacto direto
na lucratividade da empresa. Um impacto real. No geral, está muito melhor do que era.”
“O que está melhor?” Liz perguntou ao marido.
“A dança de Nikki,” disse Roger, beijando sua mulher no rosto. “Mas nós estávamos falando de
negócios.”
“O que foi agora?” perguntou Caroline.
“Estávamos discutindo os problemas que Roger vem enfrentando”, disse Paul, entregando a sua
esposa um copo de papel. “Ele está tendo altos e baixos dos itens que a região tem carência. Talvez alguém
das Compras pudesse nos fornecer esses itens mais rápido do que o habitual...”
“Gente, não depende de mim”, explicou Caroline. “Você pode me dar uma previsão exata do que sua
loja vai vender daqui a seis meses?”
“Da última vez que verifiquei, a bola de cristal não tinha chegado,” riu Roger.
“Nós fazemos o melhor com o que temos”, resumiu em tom de gestora. “Como sabem, não é um
problema de logística interna como o seu. Sem uma previsão exata, fico totalmente dependente dos
fabricantes.”
“Não estamos falando sobre todos os nossos produtos”, declarou Paul. “Mas sobre os que vendem
mais. A região está perdendo muito dinheiro devido às faltas. Só minhas vendas caíram 5%. Multiplique essa
perda por dez lojas, e pelo tempo que levará até a remessa chegar. É espantoso!”
“Eu sei, e os prejuízos para a rede são dez vezes isso”, observou Caroline. “Mas, como já disse, não
há nada que eu possa fazer.”
Roger interveio. “Eu penso em pequena escala, apenas na minha região. Será que existe uma maneira
de os fabricantes fornecerem os pequenos lotes que a nossa região precisa, agilizarem a remessa entre os
enormes lotes que os fornecedores estão produzindo para a rede?”
“Eu vou apurar.” Caroline foi evasiva. Darren estava certo o tempo todo, pensou ela. Metade do poder
do método dependia de uma única fonte – o excedente de outras regiões – sendo assim, uma fonte limitada. A
chave para resolver isso, se houvesse uma, devia estar nas Compras. Todo mundo sempre colocava a culpa
nas Compras. Agora, ela começou a conjecturar se eles tinham razão.
“A campainha tocou”, disse Liz. “Vamos voltar lá para dentro.”
Capítulo 20
Martin estava de bom humor para assobiar ao se dirigir ao elevador para o piso superior.
O mais recente relatório mensal colocou a região novamente em primeiro lugar, bem à frente das
outras. Tal aumento significativo das vendas, combinado aos giros de estoque de dois dígitos não era algo só
inédito, era praticamente inacreditável. Além disso, cada loja também estava mantendo cada vez mais SKUs.
Ele estava confiante de que o lugar seria dele por algum tempo.
O baixo, porém imponente gerente regional, andou pelo corredor até a sala do diretor de operações,
onde a secretária o fez entrar. Sentado atrás de sua mesa de pinho escura, Christopher percebeu a entrada do
seu subordinado, e pediu-lhe para se sentar.
“Parabéns pela classificação”, disse o COO. “Vi que você inspirou suas equipes, e os resultados têm
sido extraordinários. Continue assim.”
Martin teve uma nítida sensação de déjà vu. “Obrigado, senhor. Foi preciso muito planejamento e uma
rigorosa supervisão para garantir este sucesso que tivemos”.
“Então por que pediu para me ver?” Christopher parecia curioso. A revisão anual periódica aconteceria
no mês seguinte.
“Senhor, não foi apenas o esforço que colocou minha região em primeiro lugar”, respondeu Martin.
“Minha equipe desenvolveu um novo método, e como agora acredito que seja sustentável, gostaria de
recomendar que fosse implementado em outras regiões.”
“Este sistema de vocês vem funcionando há quanto tempo – apenas um trimestre, não é?” O COO não
estava tão entusiasmado quanto o gerente regional. Vendo Martin concordar, ele continuou. “Vamos colocar
isso em perspectiva, está bem? Quando as vendas da sua região subiram, três meses atrás, eu comecei a fica
de olho na sua região. Analisei seus números. Eu normalizei o impacto da forma cambaleante em que as lojas
embarcaram neste método não convencional, bem como o impacto de adicionar novas SKUs e a verdadeira
tendência surgiu. Você consegue um salto inicial, mas todo mês desde então, suas faltas voltaram a crescer
novamente e suas vendas diminuem em proporção. Segundo meus cálculos, vai estar onde começou em
menos de meio ano.”
“Isso é só porque os produtos mais vendidos são rapidamente tirados das prateleiras”, disse Martin. “E
tem sido mais difícil de adquirir mais deles de outras regiões.”
“Exatamente, mas é uma tendência”, respondeu Christopher. “Foi um pico maravilhosamente alto, mas
com o passar do tempo, os números do seu desempenho retornarão aos níveis normais.”
“Dê algum tempo”, Martin tentou explicar. “Você vai ver que os números vão permanecer elevados, e
que este novo sistema pode ser implementado em toda a rede”.
“A que custo?” As sobrancelhas grossas de Christopher se uniram, desafiadoras. “Este único pico fez
seu depósito regional executar cinco vezes mais remessas cruzadas que qualquer outra região. E a sua taxa
de eficiência desabou. Você acabou de dizer que o aumento nas vendas está ligado às remessas cruzadas. O
que acha que vai acontecer quando as outras regiões perceberem isso, e não quererem mais remeter produtos
para vocês? Além disso, se a rede toda operar desta forma, onde alguém conseguiria os itens mais vendidos?
Das outras regiões, que precisam deles tanto quanto vocês?”
“Mas mesmo os produtos que não saem tão rápido estavam vendendo melhor”, Martin tentou defender
suas ações, mas Christopher persistiu.
“Não é significativo o suficiente para justificar uma revolução completa no modo que operamos.
Durante o último período, o seu depósito sistematicamente manteve quatro vezes mais estoque que suas lojas,
exatamente o oposto da maneira que nosso ramo opera. Encare a realidade. Você tem dados reais para provar
que o seu método é operacional e sustentável para toda a rede? Não – é por isso que ninguém no ramo fez
algo semelhante a este novo método.”
“Eu sei que é inovador”, disse o gerente regional, mexendo-se desconfortavelmente na cadeira. “Mas
isso não é razão para não experimentá-lo. O sistema tem muitas vantagens. Por exemplo, cada loja tem agora
cerca de 500 SKUs mais do que costumava ter, o que é um fator importante no aumento das vendas.”
“Que torna ainda mais difícil gerir a logística.”
“Já resolvemos esse problema”, Martin respondeu. “Desenvolvemos um novo sistema de informática
para este fim.”
Assim que a expressão “sistema de informática” saiu da boca de seu subordinado, a cara de
Christopher G. Smith se transformou numa parede de pedra.
“Não outro sistema de informática. Estou por aqui de novos sistemas de informática. Nós mal
acabamos de resolver a confusão que o último fez. Não tenho certeza se valeu a pena todo esse calvário.
Como está agora, nós perdemos dinheiro com este maldito software e seus bugs. E o novo programa de
previsão custou uma fortuna, causou muitas dores de cabeça e suas previsões são tão ridículas quanto as do
antigo. A última coisa que eu preciso é o pessoal de IT iniciar um outro projeto!” Christopher estava mais do
que inflexível. Ao se levantar do lugar, ele dominava a mesa e Martin. “Limpar os dados, reprogramar os
campos e menus, treinar todo o pessoal de novo, os testes e o trabalho interminável de depuração, Henry não
aceitaria algo assim, e fim de papo. Desculpe meu tom, mas não estou disposto a aprovar a sua ideia.”
Christopher parou por um momento. Ele não tinha a intenção de desmotivar seu subordinado.
“Contudo”, disse ele, sentando-se outra vez lentamente, “Eu reconheço que foi um tremendo esforço por parte
de vocês e todo o pessoal da região. E vocês produziram resultados excelentes de verdade... por um tempo.
Continue assim”.
Tendo sido dispensado por seu superior, Martin andou pelo corredor, desta vez um pouco mais
humilde. Não haveria nenhuma utilidade em argumentar mais.
Ao entrar no elevador, ele percebeu que realmente não importava. Ele tinha certeza que o sucesso da
sua região continuaria. E não tinha medo de que as outras regiões parassem de enviar mercadorias. Eles não
estavam fazendo isso por generosidade. Estavam fazendo isso para se livrar de seus enormes excedentes.
Ele tinha feito o que devia. Havia alertado o patrão sobre as vantagens de seu sistema. Mas, verdade
seja dita, se a sua região continuasse sendo a única que guardava o estoque no depósito dessa maneira, e a
única a reabastecer diariamente de acordo com o consumo real, ele certamente manteria a primeira posição na
lista de desempenho.
E uma vez que Christopher estava perto da aposentadoria, dois ou três anos como gerente de melhor
desempenho garantiriam que o seu nome seria colocado na porta do escritório do vice-presidente de
Operações. Ele podia se dar ao luxo de ser paciente. O menino que tinha começado como gerente assistente
há anos e tinha subido a Gerente Regional do sul da Flórida, viu que seu caminho o levaria direto ao topo da
montanha.
Capítulo 21
Caroline estava no seu melhor momento. Duas horas depois do encontro com o maior fornecedor da
Hannah’s Shop, ela sabia que tinha tirado bastante de seu diretor executivo. Sentada na sua sala dele em
Nova Delhi, Caroline sorriu ao assinar suas iniciais na parte inferior do formulário de pedido para os próximos
seis meses.
“Sempre um prazer fazer negócios”, disse Gupta, com um sotaque britânico. “Estou ansioso para
recebê-la novamente.”
“Na verdade, há mais uma coisa”, respondeu Caroline.
Há algumas semanas atrás, ela havia prometido a Paul que veria se algo poderia ser feito para
acelerar as SKUs que Roger não conseguia de nenhum outro depósito. Sem muita esperança, ela continuou,
“A última vez que nos encontramos, encomendei cinco mil jogos de cama. Eu sei que devem ser exportados só
daqui a três meses, mas queria saber se você poderia agilizar isso.”
“Para quando?”
“Na próxima semana seria bom”, tentou Caroline. “Poderia achar alguma brecha?”
“Por que é que tudo tem que ser assim?” perguntou o Sr. Gupta, num tom gelado. “Você sabe que
faríamos quase tudo que pudéssemos para ajudá-la, mas isso não é possível.”
Caroline nem piscou; ela esperava este tipo de resposta.
O cortês empresário retirou uma partícula de poeira invisível de suas lapelas e continuou, “Se você
estivesse pedindo algumas centenas de unidades, talvez, mas milhares, impossível!”
“Espere”, disse ela, surpresa, “acelerar algumas centenas para mim para a próxima semana seria
viável?”
“Talvez.” O fornecedor indiano puxou o pequeno bigode. “Tudo depende se o tingimento foi concluído
em tecido suficiente. Quantos jogos de cama você precisa que eu agilize para você?”
Caroline passou rapidamente os números pela cabeça. Cinco mil deveriam dar para um semestre. Isso
significa que a rede vende cerca de duas centenas de unidades por semana. “Eu preciso de duzentos”,
respondeu ela. Isso deve ser suficiente para a região Sul da Flórida.
Vendo que Gupta apenas balançou a cabeça e pegou o telefone, ela decidiu forçar a sorte. “Duzentos
por semana, todas as semanas, até que a remessa maior seja feita.” Duzentos responderão às necessidades
da região de Paul. Duzentos por semana vão resolver as necessidades de todas as regiões.
O Sr. Gupta fez uma ligação para seu gerente de materiais e perguntou algo em tâmil. Enquanto
esperava pela resposta, ele explicou, “A costura é feita em pequenos lotes, uma grosa, no máximo. A
tecelagem e o tingimento do tecido são coisas completamente diferentes. Aqui, para ter mesmo um lucro
pequeno, devemos ter grandes quantidades.”
Sons saíram do telefone. Ele ouviu e disse: “Você está com sorte. Parece que o suficiente para mil
unidades foi tingido na semana passada. Enviar-lhe duas centenas de unidades por semana nos daria tempo
suficiente para tingir o resto do tecido necessário. É esse seu desejo?”
“Com certeza!”, disse Caroline, decidida.
“E as condições de pagamento?” perguntou o Sr. Gupta.
“O procedimento operacional padrão”, Caroline se perguntou por que ele havia perguntado. Afinal, a
Hannah’s Shop nunca se desviou desta regra. “Dentro de quarenta e cinco dias do recebimento da
mercadoria.”
“Isso é injusto”, reclamou Gupta. “Foi você que pediu remessa parcial, por que eu deveria aguardar o
meu dinheiro? Eu até entendo que atrase o pagamento até que todo o pedido seja entregue quando eu falho
em alguma coisa, mas neste caso, você está pedindo uma remessa parcial antecipada.”
“Desculpe, talvez eu deva reformular a minha resposta”, ela se desculpou. “Eu deveria ter sido mais
clara. Dentro de quarenta e cinco dias do recebimento de cada remessa semanal.”
Gupta não ficou tranquilo. “Já que nós vamos entregar o pedido em múltiplas remessas, isso irá
implicar o pagamento de várias vezes sobre o mesmo pedido de compra. Você pode pedir ao seu
departamento de contabilidade que não use isso como desculpa para atrasar o pagamento?”
Caroline não teve problema em garantir que ela mesma iria cuidar disso, percebendo que o pagamento
por remessa semanal abria as portas para tais acordos no futuro. Agora, com a agilização destas pequenas
quantidades ele não estava fazendo um favor a ela; este foi um bom negócio para ambos os lados. Ela
recebendo a mercadoria de que precisa antes; e ele recebendo pagamentos semanais por três meses, em vez
de uma soma no final desse período. Isso significava que o seu fluxo de caixa seria muito mais tranquilo. Não
admira que ele estivesse disposto a se desdobrar.
Para garantir que não houvesse mal-entendidos, o Sr. Gupta disse: “Você percebe que vai ter que
pagar cerca de três vezes mais pelo transporte, já que a quantidade que encomendou não preenche um
contêiner?”
O rosto de Caroline escureceu. Ela estava tentando aumentar as vendas para a empresa, não
aumentar as despesas. É verdade, as vendas adicionais que resultarão de ter esses produtos disponíveis
facilmente compensavam os custos adicionais de envio, mas pagar mais era contra a sua criação.
Ao ver sua expressão, e com medo de perder o que poderia ser um acordo favorável, o Sr. Gupta
sugeriu: “Talvez haja mais itens que pudéssemos entregar semanalmente, até a remessa principal? Se você
dividir os pedidos semelhantes em pequenas quantidades parecidas, irá preencher um contêiner.”
Caroline sorriu. Abriu a lista que Roger tinha compilado dos itens que não conseguia obter de outras
regiões. Em menos de quinze segundos, ela extraiu os itens comprados da empresa Gupta. Virando seu laptop
para ficar de frente para o Sr. Gupta, ela disse: “Tenho mais uns vinte itens. O tecido está tingido para estes?”
E havia tecido suficiente para apenas quatro.
“Isso não é suficiente”, disse ele, preocupado. “Mas espere. Eu vejo um padrão aqui. Todos os jogos
de cama que você está me pedindo para acelerar são conjuntos king size. Também encomendou o queen size.
Vamos usar exatamente a mesma estampa para ambos os produtos. Talvez...”
Ele não completou sua frase, mas o que disse foi o suficiente para Caroline. “Se eu trocar, levando em
conta a soma envolvida, o queen size pelo king size, sua carteira de pedidos fica intacta. Você concorda então
em fazer as mudanças necessárias?”
“Como não cortamos o tecido, não há nenhum problema.” Gupta assegurou a ela.
A uniformidade dos tecidos tingidos e mais ainda, do tecido cru, e a vontade de Caroline e Gupta de
passar o material de um produto para outro ajudou. Quase metade dos itens da lista de Roger que esta
empresa forneceria começaria a ser enviada na semana seguinte.
Caroline percebeu que esta não era a solução de tudo, longe disso. Mas foi um avanço, um passo
importante. É possível reagir mais rapidamente às faltas. Também é possível reduzir consideravelmente o
tempo de espera de produção nestes casos.
Ao fecharem o negócio, Caroline não pôde deixar de notar algo não menos importante. Ela observou
como seu fornecedor estava satisfeito. Ele conseguiu um melhor fluxo de caixa e quantidades menores, mais
fáceis de manusear. Não era frequente quando ela fechava um acordo sentir que ambos os lados tinham saído
ganhando. Mas será que outros fornecedores colaborariam tanto?
Capítulo 22
“O que está vendo aqui?” Henry deslizou o relatório mensal em sua larga mesa. “Eu estava certo, o
desempenho de Paul foi muito melhor do que o previsto.”
“Eu já vi os números”, respondeu Christopher enquanto se sentava diante de seu velho amigo e patrão.
“Tanto a loja de Paul quanto a região do Sul da Flórida. Eles estão bem. Meu problema é que estão bem
demais. Eu não entendo.”
“Leia meus lábios,” rebateu Henry. “Quando você reduz as faltas e, ao mesmo tempo adiciona mais
SKUs, o lucro aumenta.”
“Isso eu compreendo”, Christopher mostrou irritação. “Mas você é quem sempre insiste que devemos
obedecer àquela sua regra: se não entendemos, não mudamos nada até entendermos.”
“O que você não entende?” perguntou Henry. E numa voz mais macia, ele acrescentou, “Christopher, o
que está incomodando você?”
“Essa sua regra seja que número for”, respondeu Christopher. “Se você não resolver o problema
central, não espere melhorias significativas. O problema central, como já dissemos centenas de vezes, é que
não conseguimos prever com precisão suficiente a demanda futura, e nosso tempo de abastecimento é muito
longo. Então, acabamos comprando muito pouco de alguns itens e muito de outros. As mudanças da região do
Sul da Flórida nada têm a ver com o que compramos. A discrepância entre o que compramos e o que
vendemos permanece. E enquanto permanecer, como esperar um novo nível de desempenho?”
“Você tem razão ao dizer que essa nova maneira não corrige o descompasso inerente que sofremos
das Compras”, respondeu Henry. “Mas isso não resolve o descompasso inerente que temos na logística. Você
está ignorando o fato de que nossa previsão por loja é ainda pior do que a previsão que guia as Compras. Nós
não podemos corrigir a defasagem externa, mas eles corrigiram a defasagem interna, que é de onde vem este
magnífico desempenho.”
Ele acenou com a mão para dispensar a resposta de Christopher. “Ouça-me. Não ter uma boa previsão
sobre o nível de estoque nos levou a enviar demais para uma loja e não o suficiente para outra. É isso que eles
corrigiram. Partindo do fato de que internamente o tempo de reposição é muito curto, eles fizeram as lojas
manterem apenas o que precisam num futuro próximo. O resultado é que os itens que ficavam parados em
Boynton estão agora disponíveis para venda em Keys. Esta maneira de utilizar o estoque de forma mais
inteligente é sistemática. Isso é uma coisa que eles fizeram. E a outra coisa, que já foi mencionado, é que isso
permite manter muito mais SKUs por loja, e também é uma forma muito mais prudente de se utilizar o que
temos.”
Christopher pensou sobre isso por um tempo. Ele olhou através da janela, a vista do 14º andar do
centro de Miami.
“Mas ninguém nunca trabalhou dessa forma”, disse ele, ainda cauteloso. “Nós teremos que prosseguir
com muito cuidado.”
“Está bem, galinha mãe. Concordo em prosseguir de forma prudente,” Henry sorriu. “Mas acho que já
vimos o suficiente para dar a largada. Concorda?”
“Concordo, mas temos que verificar mais a fundo”, foi a resposta de Christopher. “Eu vou cuidar disso”.
“Quem você acha que é a melhor pessoa para liderar esta iniciativa?”
“Há alguma dúvida?” Christopher olhou bem no olho do presidente da Hannah’s Shop. “A ideia é de
Paul, a iniciativa é de Paul. Ele é quem melhor entende. Ele também conhece as armadilhas. Além disso, é um
dos gerentes mais práticos e cuidadosos que conheço. Durante muito tempo, eu pedi para você para acabar
com este absurdo de desperdiçar o tempo dele em trabalhos de baixo nível. Eu sei que ele não quer tratamento
especial, mas deveríamos ter mandado seu tuchus para o nível executivo há muito tempo.”
“Tudo bem, eu vou ter uma palavra com ele”, Henry estava praticamente radiante. “Qual deve ser o seu
título – Vice-Presidente Executivo da Reorganização?”
“Que tal algo simples, algo na linha de Diretor de Operações?”
“O quê?”
“Estou aqui há muito tempo, Henry,” respondeu Christopher, passando a mão pelo cabelo, tentando
abaixar os fios brancos. “Mais do que você, na verdade. Quando você saiu e se divertiu na faculdade, fui eu
que camelei na loja ao lado de sua mãe, que Deus a tenha. O que achou que eu faria – assistir você sair para
brincar com os netos e ficar sentado aqui, esperando receber ordens da garota que eu pegava no colo? Você
deve estar brincando comigo. Acho que tenho o direito de escolher o meu sucessor, tendo passado mais de
quarenta anos aqui.”
“Meu caro amigo”, respondeu Henry simplesmente, “certamente tem. Deixe-me fazer uma ligação.”
“Henry! Que surpresa!” exclamou Lydia. “E a que devo o prazer de ouvir sua voz assim tão cedo?”
Henry sorriu ao ver o humor da esposa. “O que você acha de convidarmos Paul e as crianças para o
jantar hoje à noite? Faz muito tempo que não vemos Ben e Lisa”.
“O que posso dizer?” Henry podia praticamente ver a expressão de espanto no outro lado do telefone.
“O que está planejando, exatamente?”
“Ah, nada, querida”, disse ele.
“Tudo bem, deve ser sobre negócios. Eu não quero saber”. Lydia não estava acreditando na história de
seu marido. “Vou pedir a Paul para estar aqui às seis e meia. As crianças merecem uma boa refeição, mesmo
quando sua mãe está no exterior.”
Capítulo 23
Ben e Lisa correram para a fazenda Aaronson à frente de seu pai. Paul atravessou o hall de entrada e
entrou na espaçosa sala de estar, onde seus filhos foram abraçar os avós. Lydia cumprimentou-o com um
abraço, um beijo na bochecha e um cochicho “eles estão aprontando alguma coisa” em seu ouvido.
Henry entrou, apertou a mão do seu genro com firmeza e disse: “Como vai, Paul? Decepcionado com a
derrota de ontem à noite para o Knicks?”
“Estou bem, obrigado”, disse Paul, sem jeito. O que Lydia queria dizer com “eles”?
“Bom, bom,” respondeu Henry. “Aceita algo para beber? Eu tenho uma nova garrafa de uísque no meu
gabinete. Por que não experimentamos?”
Henry fechou as portas de correr do gabinete. As paredes tinham sido pintadas recentemente num leve
tom de linho cru, e a grande mesa de pinheiro foi substituída por um jogo de estar extravagante. Um dos
enormes sofás de couro fora ocupado por Christopher.
Então é isso, Paul pensou, cumprimentou Christopher e murmurou um elogio sobre o novo design.
“Lydia disse que se falo sério em me aposentar”, disse Henry, servindo três copos de uísque, “então eu
não posso ter uma sala que parece um escritório de executivo. Bebam, bebam!”
Quando Paul afundou no outro sofá, Henry começou.
“Estivemos observando o progresso da sua loja”, disse Henry. “Muito impressionante. Você realmente
foi muito criativo”.
“Obrigado”, respondeu Paul. “Mas eu não tive escolha. Estava apenas reagindo à crise. Parece que a
situação de crise obrigou-me a operar de uma maneira melhor”.
“Não se diminua”, disse Christopher. “Nós tivemos muitas crises ao longo dos anos. Mas sempre
voltamos à operação padrão, uma vez que melhorava.”
“Eu quase fiz isso também; por sorte Caroline me impediu.”
“Nós também ficaram impressionados com a velocidade com que você fez todo o Sul da Flórida adotar
seu sistema.” Henry tomou um gole e perguntou: “Então me diga, este sistema que você inventou. Pode ser
implementado em toda a rede?”
“Sim, até certo ponto,” respondeu Paul com reserva. Embora esperasse que a bola caísse no seu lado
da quadra, ele não tinha uma resposta clara. “Eu acredito que a maior parte possa ser implementada em toda a
rede com sucesso, e que podemos ganhar muito com isso. Cada região, por si só, pode operar dessa maneira
e melhorar o desempenho da loja.”
“Mesmo assim, você está hesitante”, afirmou Henry.
“Eu estou hesitante porque uma grande quantidade de mercadoria que está sendo vendida na minha
região, hoje, é obtida através de remessas cruzadas das outras regiões”, explicou Paul. “Atualmente, nós
fazemos remessas cruzadas de quantidades significativas entre as regiões. Mas, quando todas as regiões
utilizarem o novo método, eu temo que serão necessárias muito mais remessas entre as regiões. Meu
problema é que muitas dessas remessas cruzadas serão por nada. Não há motivo para transferir uma SKU de
um depósito para descobrir dois meses depois que isso criou uma falta”.
“E se proibir todas as remessas cruzadas”, perguntou Christopher, “ainda ganhamos muito, não é?
“Então, perdemos uma oportunidade.” Henry não gostou. “Muitas vezes existem excedentes reais de
coisas numa região que estão faltando em outra.”
“Melhor um pássaro na mão do que dois voando”, foi a resposta de Christopher.
Henry virou-se para Paul, “O que você acha?”
“Eu tenho que concordar com Christopher, só que sem as remessas cruzadas, convencer os gerentes
a cooperarem será duas vezes mais difícil”, disse Paul. “Só quando lhes foi prometido que as faltas cairiam,
porque mais mercadorias seriam trazidas de outras regiões, eu realmente ganhei os gerentes na minha região.
E sem a cooperação dos gerentes, uma mudança tão grande na maneira em que operam levará séculos.”
Os dois homens idosos trocaram olhares, aparentemente satisfeitos por ver que o rapaz era prudente.
“Vamos dar um passo para trás?” propôs Henry. “Entre as lojas da região sul da Flórida, não há
atualmente nenhuma remessa cruzada. Talvez devêssemos analisar como você conseguiu esse milagre, e ver
o que é relevante para as remessas cruzadas entre regiões.”
“Está bem”, admitiu Paul. “Embora, para ser franco, eu não ache que nada disso seja relevante. Uma
remessa cruzada justificada significa deslocar excedentes de um ponto a um ponto que tem uma falta. Ao nível
da loja, isso significa que qualquer remessa cruzada de sucesso é uma indicação clara de que houve um erro,
que, para começar, muito foi transferido para essa loja, caso contrário, ela não teria um superávit. Na nova
configuração, admitimos o tempo de reposição curto entre o depósito regional e as lojas, e, portanto, não
colocamos a mercadoria nas lojas. Nós não formamos excedentes, então não precisamos corrigir através de
remessas cruzadas”.
“E por que você acha que isso não é relevante?” perguntou Christopher em voz alta.
“Por duas razões”, respondeu Paul. “Em primeiro lugar, o período muito mais longo que leva para
abastecer os depósitos. E em segundo lugar, os depósitos não recebem mercadorias com muita antecedência
– eles são o ponto de partida para a distribuição.”
Um silêncio caiu sobre a sala, e um pequeno sorriso surgiu lentamente no rosto de Henry.
“De acordo com o seu argumento,” Henry fundamentou, “já que temos tantas remessas cruzadas entre
depósitos, isso significa que uma quantidade significativa de nossos produtos está no local errado. Nós
desnecessariamente enfiamos mercadoria nos depósitos, em vez de fornecer-lhes apenas o que eles pedem”.
“Nós não podemos suprir nossos depósitos com só o que precisam de imediato”, argumentou
Christopher. “Isso faria com que todo o estoque da rede ficasse parado no cais em Fort Lauderdale.”
“Precisamente,” concordou Henry. “E o que precisamos é de um depósito central, situado ali mesmo
perto dos portos. O transporte de Fort Lauderdale para qualquer um dos nossos depósitos regionais não leva
mais que uma semana. Isso é relativamente curto. Então, se vamos construir um depósito central, poderíamos
expedir estoque para os depósitos regionais com base no consumo real, garantindo que cada item, seja roupão
de banho ou pegador de panela, vai estar no lugar certo na hora certa”.
“Isso vai significar o fim das remessas cruzadas”, disse Christopher, pasmo. “Henry, por que não
pensamos nisso há tempos?”
“Lembre-se do que sempre dissemos,” rosnou Henry: “Se é vergonhosamente óbvio, deve estar certo.”
Paul, que tinha escutado atentamente, de repente percebeu, “Henry, com todas as SKUs guardadas
num lugar, você não estará apenas cuidando da logística interna. Metade do problema de Caroline também
será resolvido”.
Henry sorriu. “Nós saberemos exatamente o que entregar, para que ponto, e quando. As lojas e os
depósitos regionais não irão gerar pedidos, eles serão reabastecidos de acordo com suas vendas reais
diárias.”
“Assim, os pedidos de compra serão gerados apenas pelo depósito central”. Paul estava muito
animado. “O estoque vai realmente diminuir, e vamos estabelecer um novo recorde de ROI.”
Dando um tapinha nas costas de Paul, Henry disse: “Eu gosto da sua maneira de pensar, filho.”
“Obrigado, Henry.”
“Mas isso nos deixa com muito trabalho a fazer”. Christopher sorriu. “Temos que encontrar um depósito
grande o suficiente no porto, configurar o projeto...”
“Calcular quanto estoque ele deve manter, organizar a frequência de entrega”, continuou Henry. “Há
muitas perguntas sem resposta.”
“Precisamos de um gerente de depósito excepcional”, disse Christopher, esfregando o queixo.
“Eu conheço a pessoa perfeita para o trabalho”, ofereceu Paul. “Roger Wood, o gerente do depósito
regional do sul da Flórida. Ele tem sido um parceiro neste processo. As soluções logísticas foram totalmente
ideias dele, e jamais teríamos conseguido sem ele. Ele já trabalha na empresa, tem muita experiência. Além
disso, já que ele mora perto, não terá que pagar para realocá-lo.”
“Excelente, eu vou pedir para minha secretária marcar uma entrevista,” disse Christopher, e inclinou-se
para Paul. “Mas acho que precisamos de alguém para fiscalizar toda a solução, e não apenas o depósito
central. Tal mudança impacta cada loja e cada depósito, sem falar na sobrecarga no nosso sistema de
informática.”
“Sim, alguém que conhece bem a empresa,” Henry olhou para o teto, fingindo inocência. “Alguém cujo
tuchus precisa ser chutado na direção certa...”
Paul corou.
“Paul”, disse seu sogro, “Gosto de você ter aprendido como funciona tudo, de baixo para cima. Eu sei
que você é uma pessoa muito capaz. Seu olhar perspicaz e talentos têm se destacado em todas as funções
que teve. Meu amigo aqui sinalizou nos últimos cinco anos que você deve começar a visitar a sala dele, para
assumir, quando ele se aposentar. E está na hora de nós dois começarmos a ouvi-lo.”
“Sinto-me honrado”. Paul conseguiu dizer.
“Espere um segundo, Henry,” disse Christopher, “você acabou de dizer que iria finalmente começar a
me ouvir? Eu tive que esperar até me aposentar para isso acontecer?”
Capítulo 24
Era o fim de um longo dia de trabalho, e Henry Aaronson tinha arrumado os documentos restantes
sobre sua mesa, colocando alguns deles em sua pasta, e saído para o corredor do piso superior da matriz da
Hannah's Shop. Ele notou que uma luz ainda estava acesa no escritório de Caroline. Ele ficou imaginando se
ela estava trabalhando tanto porque queria, ou porque ela precisava. Ele havia colocado uma pressão
considerável sobre ela ao anunciar que seria a sucessora, e ele esperava que ela percebesse – como o fez –
que ela estava mais do que pronta para isso.
Ele olhou para o relógio antes de bater em sua porta.
“São 20h48”, disse ele. “Fazendo serão?”
“É tão tarde assim?” disse Caroline. Olhando para cima, ela piscou os olhos. “Eu perdi a noção do
tempo.”
“O que é tão urgente que você não podia ir para casa ficar com Paul e as crianças?”
“É a defasagem externa”, disse ela. “Eu não consigo tirar isso da cabeça, então gasto muito tempo
nisso. Tenho uma solução para uma parte da questão, mas há um enorme problema que não consigo superar.”
“Menina, você é muito melhor do que eu”, Henry entrou e sentou-se. “Tudo o que consegui foi andar
em círculos.”
“Então, você pensa nisso também?”
Henry sorriu: “Nos últimos quarenta anos.” Em um tom mais sóbrio, acrescentou, “Mas durante os
últimos três meses, desde que Paul mostrou que a defasagem interna pode ser resolvida, eu fiquei consumido,
tentando descobrir a forma de estender sua solução para resolver a defasagem externa”.
“Eu também”, admitiu Caroline. “Durante anos estava totalmente convencida de que não havia nada a
ser feito sobre a defasagem entre a compra e o consumo real, que a combinação mortal de previsões
imprecisas e do longo tempo de reposição nos condenava a sofrer com um grande número de faltas de um
lado, e de enormes excedentes do outro.”
“É exatamente nisso que Christopher e eu acreditávamos. Não admira que levamos tanto tempo até
nos convencermos que a solução Paul funcionava. Então, que progressos você fez?”
“Eu achei que a essência da solução de Paul daria um bom ponto de partida”, explicou ela. “Assim, na
tentativa de ver como seria relevante para resolver a defasagem externa, tentei realmente compreender essa
essência, a sua estrutura conceitual.”
“Muito bom”, disse Henry satisfeito. “Eu fiz algo semelhante. Vou supor que você já descobriu que, na
base da abordagem dele está a constatação de que, embora a previsão seja péssima, não é uniformemente
ruim em toda a empresa.”
Caroline sorriu. “Levei algum tempo e pesquisa nas anotações da faculdade. Mas sim, eu descobri
isso. “E então ela resumiu suas descobertas,” A previsão é pior na loja, e não podemos mudar isso. Segundo a
teoria do caos, tentar prever com precisão qual será a demanda de uma SKU em especial numa determinada
loja é tão útil como tentar prever com precisão o clima com um mês de antecedência.”
Depois de gastar, em vão, somas consideráveis de dinheiro em sistemas de previsão
computadorizados, Henry tinha investido seu tempo estudando em profundidade o campo para chegar à
mesma conclusão sombria. Ele assumiu: “Mas a demanda de um depósito regional é a demanda agregada de
todas as lojas a que ele atende. Essa agregação faz com que a previsão no nível regional seja cerca de três
vezes mais precisa do que a previsão de cada loja – isto é estatística fundamental. E a previsão, no depósito
central, que agrega a demanda de todas as dez regiões, é novamente três vezes melhor.”
“Correto”, concordou Caroline. “E a solução de Paul se baseia em aproveitar a melhor previsão que já
existe. As redes de varejo não deviam manter os estoques no pior nível de previsão, nas lojas. Em vez disso,
devia manter a maioria dos estoques no melhor nível de previsão, ou seja, no depósito central. E usar a
flexibilidade proporcionada pelo tempo de reposição relativamente curto para direcionar a mercadoria para
onde a realidade mostra ser necessário.”
“Bela maneira de colocar, minha menina”, comentou Henry. “Mas é aqui que fiquei empacado, dentro
dos limites da empresa. Isso é o mais longe que cheguei. Você disse que tem uma solução. Já conseguiu
refletir melhor? Se conseguiu, deve estar faltando alguma coisa.”
Orgulhosamente, Caroline respondeu: “Se formos para além das fronteiras da empresa, para os
fabricantes, não há agregação geográfica adicional. No entanto, existe um outro tipo de agregação, que
melhora ainda mais a precisão da previsão.” Vendo que Henry não estava acompanhando, ela explicou:
“Muitas SKUs diferentes são produzidas com o mesmo tecido tingido. Em média, cerca de dez diferentes SKUs
são feitas do mesmo tecido.”
Lentamente, Henry disse: “Eu ainda não vejo como isso se relaciona com o nosso caso”.
“Posso entender isso, no início também não ficou claro para mim”, disse ela. “Estamos acostumados a
pensar no ambiente dos fabricantes como um ambiente rígido: um ambiente onde a produção de grandes lotes
é determinada com antecedência. Mas minhas recentes interações com os nossos grandes fornecedores têm
me mostrado que essa rigidez não é inerente ao fabricante, é por nossa causa. Veja, depois que o tecido é
tingido, eles não trabalham em grandes lotes. E enquanto lhes dermos proteção, fazendo pedidos de guardachuvas que garantam determinado valores em dinheiro por um longo período, eles não terão problemas em
ajustar sua programação de costura com apenas uma semana de antecedência.” Ela fez uma pausa para
permitir que Henry digerisse as ramificações.
Não demorou muito. “Isso significa que devemos manter os estoques no ponto de previsão mais exata,
na fase de tecido tingido. E já que o fabricante tem total flexibilidade após essa fase, não há razão para decidir,
com vários meses de antecedência, de quais SKUs vamos precisar. Nós agilizamos os pedidos necessários,
de acordo com o consumo real do depósito central. Menina, você é fantástica.”
Caroline corou um pouco pelo elogio e elaborou, “Nós fazemos pequenas encomendas, encomendas
semanais, apenas com a antecedência do tempo de transporte. Tempo de transporte mais uma semana para
corte e costura, para ser exata. Nos últimos três meses, começamos a trabalhar desta forma com todos os
nossos grandes fornecedores. Eles adoram. Isso lhes dá segurança para o futuro – eu garanto as compras
mensais, durante seis meses - e lhes dá estabilidade, tanto em sua operação quanto no fluxo de caixa”.
“Brilhante. Mas, querida, sua flexibilidade para ajustar a quantidade de que precisa depende de eles
terem tecido tingido o bastante. Como você garante isso?”
“Simples”, o seu sorriso irradiou das bochechas rosadas, “eu compro os tecidos tingidos com três
meses de antecedência, e os fabricantes os guardam nas suas instalações.”
Henry refletiu sobre isso. “Entendo”, disse ele. “Esse é o ponto mais preciso de previsão, portanto, o
risco de adquirir pouco ou muito é o menor.” Vendo seu sorriso, ele continuou, “Você não tem medo de ficar
com tecido excedente – pois pode encontrar um uso para ele, e também garante que não vai faltar tecido.
Menina inteligente. Muito bom. Então, onde está o seu problema? Parece que você resolveu todos eles.”
“Não é bem assim. O que eu fiz até agora é reduzir a dependência da nossa previsão de longo prazo e
reduzir o tempo de reposição pela metade. Mas, para tirar o máximo partido disso, devemos reduzir,
consequentemente, os estoques que mantemos no depósito central.”
“Claro”, reagiu Henry imediatamente. “Nós podemos reduzi-los a menos de metade. Você já não
começou?”
“Pai, não me atrevo”.
Henry não tinha pressa de perguntar por quê. Ele percebeu qual era o motivo. “Você não confia nos
fornecedores”, afirmou, em vez de perguntar.
“Como poderia?” Caroline despejou sua frustração. “É claro que eles prometem entregar no prazo. E a
maioria deles, eu sei que têm intenção. Mas o que acontece quando um outro cliente vem e os pressiona a
entregar antes? Sob tal pressão, eles cedem e nós acabamos com entregas atrasadas. Enquanto mantivermos
meses e meses de estoque não há nenhum prejuízo real, ou pelo menos isso fica mascarado pelo estoque já
ter falta de tantas SKUs. Mas, agora, se reduzirmos os estoques, o dano será real... e muito visível”.
“Se for assim,” Henry reconheceu o problema, “vamos garantir que seja do interesse do fornecedor
entregar no prazo.”
“Como? Cobrando multas pesadas? Eles nunca vão concordar com isso,” Caroline descartou a
sugestão. “Principalmente agora, que estou pedindo que se tornem nossos parceiros; pedindo-lhes para mudar
completamente o acordo tradicional entre fornecedores de produtos têxteis e varejistas.”
“Então, se não pode usar a vara, use uma cenoura”.
“Premiá-los?” perguntou Caroline. “Por algo que eles já se comprometeram a fazer?
“Caroline, logo você não será a vice-presidente executiva de Compras. Então pare, por favor, de seguir
o instinto de tentar tirar cada centavo dos fornecedores? Você disse a frase-chave. Está pedindo que eles se
tornem nossos parceiros. Parceiros partilham também dos benefícios.”
Caroline fez um barulho engraçado. “Quando você entrou, eu estava calculando os benefícios que
obteria se pudéssemos confiar plenamente em nossos fornecedores e reduzir os estoques. É enorme. Além
disso, isso abre novos horizontes. Isso muda o índice de recompensa do risco, na medida em que realmente
poderia contemplar trabalhar com mercadoria de moda. Eu estava brincando com os números, para aumentar
a minha motivação e encontrar uma solução. Mas só agora, devido ao seu comentário, vejo que aí reside a
solução. Nossos ganhos serão tão grandes que poderíamos facilmente ter recursos para dar bônus para os de
bom desempenho”.
“Apenas vincule isso diretamente ao nosso desempenho”, Henry advertiu.
“Vou vincular ao fato de eles nos ajudarem a melhorar o nosso desempenho”, raciocinou. “O bônus
será proporcional aos nossos giros de estoque de seus produtos.” Sem ver nenhuma resposta de seu pai, ela
acrescentou: “E, claro, para ter direito ao bônus, o desempenho da data de vencimento não pode cair abaixo
de 95% nos três meses anteriores. Dessa forma, eles são obrigados a resistir a qualquer pressão de dar
prioridade a um concorrente.”
Henry não demorou mais do que alguns segundos para analisar. Em vez de dizer qualquer coisa, ele
se levantou, caminhou até a filha e beijou-a na testa.
“Agora que você já encontrou uma solução que procurei durante quarenta anos, como Moisés no
deserto”, Henry sorriu calorosamente, “você ainda tem dúvidas de que está apta a se sentar na minha
cadeira?”
Capítulo 25
Os quatro netos cantaram canções de Hanuká juntos. Henry e Lydia não podiam estar mais
orgulhosos. Ryan e Sean, os gêmeos de Darren, tinham uma voz linda, como também a prima loura Lisa. E
ninguém ficou surpreso que Ben, cuja voz estava mudando, cantasse o mais baixinho possível.
Após a apresentação receber merecidos aplausos, Paul e Caroline trouxeram os dreidels e moedas de
chocolate cobertas de ouro. Quando o clã Aaronson sentou-se para iniciar o jogo, Henry tocou no ombro de
Darren.
“Pode vir comigo ao gabinete?”
Darren acomodou-se no sofá de couro, pronto para a batalha. Toda vez que seu pai falava com ele a
sós, pensou ele, era a mesma história. Papai dizia que ele tinha errado por ter deixado a Hannah’s Shop. Desta
vez, com os novos números espetaculares, ele ficaria insuportável. Darren prometeu tentar controlar o seu
temperamento.
Henrique sentou-se diante de Darren e perguntou: “Qual é sua avaliação sobre o futuro da empresa,
meu filho?
Pelo menos o tom em que a pergunta foi feita era agradável, pensou Darren, escolhendo
cuidadosamente as palavras, “Eu acho que a empresa já era bem sólida para começar. E o que Paul e
Caroline criaram vai transformar a Hannah’s Shop em algo à parte”.
“Hmmm...” foi o único comentário de Henry.
“Pai, nestes últimos dez anos adquiri um profundo conhecimento sobre como avaliar empresas. Paul e
Caroline me ajudaram a realizar uma profunda investigação. Minha opinião como profissional é que você não
precisa se preocupar. Este casal irá provavelmente enfrentar inúmeras dificuldades na implementação de suas
novas ideias, mas suas ideias são sólidas e têm o que é preciso. Não deve demorar mais de um ano até que o
desempenho da empresa estabeleça novos recordes em no setor varejista de têxteis; em rentabilidade; em giro
de estoque, em número de SKUs por metro quadrado, em fluxo de caixa... em cada parâmetro.”
Henry não respondeu. Ele continuava com uma expressão preocupada.
Sem saber o que dizer, Darren acrescentou: “Em um ano, a empresa terá o trampolim para se
estabelecer.”
“Trampolim”, repetiu Henry. “O que quer dizer com trampolim?”
A inquisição de novo, pensou Darren. Não evite, mas responda a pergunta educadamente. Logo
acabará. Em voz alta, ele respondeu: “Como capitalista, sou treinado a buscar empresas que conseguiram
desenvolver um decisivo diferencial competitivo. Mas qualquer diferencial competitivo dá à empresa apenas
uma janela de tempo limitada; mais cedo ou mais tarde, a concorrência irá se aproximar. A sabedoria do
negócio está em capitalizar esse diferencial competitivo enquanto durar.”
Os olhos de Henry se estreitaram quando ele perguntou: “E você acha que a Hannah’s Shop tem, ou
terá em breve um diferencial competitivo?”
“Sem dúvida”, disse Darren. “Acredito também que, uma vez que isso decorre de um desafio aos
princípios mais fundamentais do negócio, irá durar por vários anos. A coisa mais difícil de os concorrentes
imitarem é uma mudança fundamental. Ainda vão levar dez anos, talvez até quinze anos.”
“E o que você acha que a Hannah’s Shop deve fazer nesta janela de tempo?” Henry perguntou.
“Capitalizar sobre isso. Expandir. Você levou a vida inteira para fazer a empresa crescer a partir de
uma pequena loja e se transformar numa rede que se estende pelo Sudeste. Esta rara oportunidade deve ser
utilizada para acelerar as coisas de forma dramática.”
Para surpresa de Darren, Henry disse: “Eu concordo. Assim, no máximo em dez anos, devemos cobrir
todo o país?”
Darren decidiu arriscar e expressar sua verdadeira opinião. “Com esse fantástico diferencial, só pensar
em termos do país é perder chances. Eu diria que a meta deve ser a expansão internacional”.
Um silêncio caiu sobre a sala. Darren esperava uma forte reação, ou pelo menos um sermão sobre
prudência de seu pai. Em vez disso, Henry disse, muito calmamente, “Não importa quão rentável a Hannah’s
Shop seja; tal expansão não pode ser financiada com receita interna. Você vai tentar me convencer a atrair
investidores?”
“Para quê?” respondeu Darren. “Você nunca vai concordar em vender mesmo uma parte da empresa,
nem de arriscar a empresa sobrecarregando-a com dívidas.”
“Correto”, disse Henry com firmeza. Mas então, para surpresa de Darren, ele continuou, “Será que isso
significa que devemos esquecer – como chamam isso? - oportunidade rara, fantástico diferencial?”
“Isso seria um grave erro”, disse Darren, decidido.
“E então?”
Ele está procurando uma briga, pensou Darren. Tudo bem. Friamente, ele disse, “Há outras formas de
levantar dinheiro.”
“Isso é o que eu estava pensando, também,” disse Henry, para surpresa de Darren. “O que acha de
franchising?
Darren quase caiu para trás. “Papai, você está falando sério?”
“Sim, estou. Você sabe como construir algo de forma prudente?”
Pego de surpresa, Darren só conseguiu balançar a cabeça.
Henry perguntou: “De quanto tempo você precisa?”
“Pai, essas coisas levam tempo. Pelo menos seis meses.”
“Ótimo. Mas, filho, temos um problema maior.” Henry levantou-se e serviu-lhes uma bebida. “Darren,
classifico as pessoas em dois campos. Aqueles que se medem pela forma como agem em relação a alguma
referência, e aqueles que não se preocupam com o que os outros conseguiram. Estes indivíduos se medem de
acordo com o potencial inerente à situação na qual estão”.
Ele fez uma pausa para deixar que Darren comentasse. Darren sabia exatamente do que seu pai
falava. Esta era a parte mais frustrante de seu trabalho. Muitas empresas buscam investimentos, mas a maioria
deles não tem o que ele quer. Eles não têm o potencial de gerar retornos elevados, ou o investimento neles é
muito arriscado. O problema com o que ele considera as oportunidades reais, as empresas com grande
potencial, é que elas se comparam com a norma, e como resultado, ficam satisfeitas com o que estão
conseguindo. Elas estão indo muito bem, estão indo muito melhor do que seus concorrentes. E é tão difícil, às
vezes impossível, abrir os olhos deles para o fato de que há muito mais; que o potencial inerente, sólido, que
eles criaram pode ser usado para tolher o que for que já tenham conquistado.
“Eu entendo”, Darren garantiu ao pai. “E você acha que Caroline e Paul pertencem ao primeiro grupo?
Que eles vão ficar satisfeitos com o que estão criando agora? Acho que você os está subestimando.”
“Sério?”, disse Henry um pouco sarcástico. “Filho, imagine que você diga a sua irmã que seja o que for
que eles consigam, ser o número um em rentabilidade, ser o valor de referência do ramo, etc. tudo isso é
apenas um... que termo você usou? Apenas um trampolim. Qual você acha que será a reação dela?”
A expressão de Darren revelou que para ele era uma pergunta retórica.
“Então você concorda que não adianta forçar essa questão com eles agora”, disse Henry.
“E não há como fazê-los mudar”, Darren acrescentou, “antes que eles possam ver claramente de onde
virá o dinheiro necessário para a rápida expansão.”
Henry sorriu, “A rápida expansão? É mais uma explosão. Filho, quando for a hora...”
“Não devemos esperar muito”, exclamou Darren, “Pela minha experiência, posso afirmar que se eles
não forem instigados, vão começar a se mexer só quando alguns concorrentes conseguirem nos alcançar.
Então será tarde demais.”
“Filho, quando for a hora certa...” Henry repetiu, “Eu não vou estar em posição de ajudar nisso. Se
existe um modo de levar a empresa à falência é se, depois de eu me aposentar, continuar a atuar como
motorista no banco de trás. Você entende que a bola vai estar do seu lado?”
Darren esvaziou seu copo. Respirou fundo e disse: “Não se preocupe. Eu quero e sou capaz de
convencê-los. “Com um grande sorriso, ele acrescentou:” Claro, eu também vou arranjar franqueados e pegar
minha comissão”.
Henry levantou-se, “E pensar que durante estes anos todos, eu estava convencido de que você tinha
tomado a decisão errada, que tinha jogado a vida fora. Venha, filho, vamos reunir a família. Eu quero me
desculpar com você na frente de sua mãe.”
Capítulo 26
Darren entrou na sala de Caroline.
“Engraçado, eu achei que você faria mais mudanças na sala do papai”, disse ele.
Caroline e Paul riram. Nada havia permanecido igual desde que ela assumira a presidência, um ano
atrás.
“Eu vim trazer presentes”, afirmou Darren e colocou um porta-copos de papelão, com três copos de
café, estampados com o logotipo de uma marca bem conhecida. “Preto para Paul, blend colombiano para Cara
e uma novidade sino-italiana para mim.”
“Mateus poderia ter feito café”, disse Caroline.
“Eu sei”, Darren respondeu, sorrindo. “Mas este é um bom café”.
Após trocarem histórias sobre os filhos, Paul disse: “Tudo bem, vamos ao que interessa. Você pediu
para discutir conosco a expansão. Preparei todos os relatórios para você analisar. Como pode ver, no último
ano expandimos com o dobro de velocidade de alguns concorrentes. Acabamos de terminar o trabalho
preliminar na nossa terceira nova região.” Paul estava, obviamente, orgulhoso desta conquista.
“Isso é ótimo”, disse Darren, mas não olhou para o relatório, “mas não é por isso que estou aqui.”
“O quê?” Caroline perguntou. “Você disse especificamente que queria fazer uma reunião conosco
sobre a expansão.”
“Sim, sim”, respondeu o nova-iorquino. “Sobre a expansão que devem fazer, não sobre a lentidão com
que planejam andar”.
“Nós estamos progredindo duas vezes mais rápido que a concorrência!” Paul ergueu os relatórios que
havia preparado. “Duas novas regiões em um ano. Pelo que sei, superar os demais se chama andar mais
rápido.”
“Vocês estão três vezes mais rentáveis e suas lojas giram o estoque seis vezes mais rápido”,
respondeu Darren. “Mas Paul, para que se comparar com seus concorrentes – por que não se concentrar no
que faz sentido para nós?”
“Ele tem razão”, disse Caroline antes que Paul se opusesse. “Não imaginamos o futuro da Hannah’s
Shop olhando o que os concorrentes estavam fazendo.” Vendo que o marido concordava, ela voltou-se para
Darren e disse, “Muito bem, comece do começo, por favor.”
“A Hannah’s Shop tem uma vantagem considerável”, disse ele, “e devemos capitalizar sobre isso antes
que os concorrentes comecem a encostar. Podemos e devemos expandir rapidamente o alcance geográfico da
rede, e para isso precisamos de dinheiro. Agora, antes que iniciem o ataque, eu acho que não devemos trazer
dinheiro de fora, nem investidores, nem empréstimos, nem devemos hipotecar os bens da família.”
“Uma das regras do papai – você tem o que tem,” citou Caroline.
“É isso o que temos feito até agora sobre a expansão”, explicou Paul. “Eu levei em consideração
apenas o dinheiro que vamos gerar, considerando, claro, que conforme crescemos, temos de aumentar
também nossas reservas de caixa. E Darren, não importa quão atraente seja a oportunidade, nem eu nem
Caroline concordaremos em navegar muito próximo ao vento.”
“Eu não estou sugerindo que vocês façam isso”, assegurou-lhes Darren. “Mas antes de discutir com
que velocidade devemos andar, se importam de gastar alguns minutos discutindo para que precisamos de
dinheiro?”
“Não é óbvio?” perguntou Caroline.
“Não está vendo que ele tem um ás na manga, Cara?”, perguntou Paul. “Certo, Darren, a fim de
expandir precisamos de dinheiro para a construção da infraestrutura e para a abertura das lojas.”
Darren pegou o gancho. “Nas lojas, vocês reduziram o item número um; precisamos apenas de uma
fração dos investimentos convencionais em estoque. Vocês também reduziram drasticamente os investimentos
necessários para o estoque guardado no depósito regional.”
“Darren”, Paul começou a perder a paciência, “Uma grande parte do dinheiro vai para a publicidade. E
não se engane, o fato de sermos uma marca reconhecida num estado está longe de ser o suficiente quando
nos expandirmos, mesmo para um estado vizinho. Só este ano eu gastei somas exorbitantes na construção da
nossa marca em dois novos estados.”
“Exatamente”, Darren sorriu e sugeriu, “Mas talvez haja uma maneira diferente de construir a sua
marca.”
“Como o quê?” Paul pediu e tomou um gole do café que seu ex-colega de faculdade tinha trazido.
“Eu tive uma revelação”, relatou Darren. “Se abrir muitas lojas de uma só vez dentro de uma área
pequena – presto! – terá uma marca, sem gastar um centavo em publicidade. É brilhante!”
“Então, a sua assim chamada ‘brilhante ideia’ é que devemos poupar dinheiro em publicidade, e gastar
uma pequena fortuna de uma só vez?” Caroline perguntou.
“E quem disse que isso dá certo?”, perguntou Paul. “Pode ser que a gente abra todas essas lojas, e por
não termos publicidade suficiente, todas elas afundem?”
“Você quer uma prova de que funciona?” perguntou Darren com um sorriso no rosto. “Dê uma olhada
no que está em suas mãos.”
“Café?” perguntou Caroline.
“Sim, Cara”, disse Paul, compreendendo a ideia de seu cunhado. “Olhe o logotipo nos copos. Lembram
como esta empresa de café abriu suas lojas – sete no centro de Miami, da noite para o dia, sem nenhuma
propaganda? Eles praticamente afugentaram a concorrência da cidade”.
“Tudo bem, eu já vi a isca – mas não estou mordendo ainda”, disse Caroline. “Mas, voltando à minha
pergunta anterior, onde vamos encontrar tanto dinheiro para abrir várias lojas tão rapidamente? Conhecendo
você, Darren, acho que quer que a gente abra dez ou até vinte regiões ao ano, pelo menos.”
“Quem disse que você precisa de dinheiro?” respondeu Darren.
“Ao abrir uma loja, você aluga um lugar”, declarou Paul. “Tem de reformar. Contratar pessoal. Investir
em mercadoria. Isso envolve muito dinheiro.”
“Eu sei disso”, respondeu Darren. “Mas quem disse que tem que ser o nosso dinheiro? Poderíamos
franquear a marca. Dessa forma, manteríamos o controle sobre a rede, sem hipotecar os bens.”
“Mas por que é que alguém concordaria em ser um franqueado da Hannah’s Shop?” perguntou
Caroline.
“Eu não confio que um franqueado vá comandar corretamente uma loja. Com certeza não da forma que
comandamos”, acrescentou Paul.
“Alguma bala mais para eu desviar?” perguntou Darren cinicamente. “Nós estamos do mesmo lado,
lembram?
Sorrindo, Caroline respondeu: “Prove”.
“Já ouviram falar de ‘financiamento mezanino’?” Ao ver suas expressões, Darren continuou. “Foi o que
pensei. É um canal que muitos investidores conservadores, mas sofisticados escolhem. São pessoas que não
estão dispostas a correr o risco de investir na bolsa de valores ou, Deus nos livre, numa empresa nova. Mas
estão à procura de um retorno muito maior do que os retornos abismais que consegue com títulos.”
“Até agora parece bom”, comentou Caroline.
Darren continuou, “Eles não querem gastar tempo e dinheiro para fazer a devida pesquisa e não
querem se envolver na direção da empresa. Então, eles procuram uma forma de emprestar seu dinheiro a uma
empresa sólida, com experiência comprovada, a uma taxa de juros de 25%. Eles não pedem garantias, em vez
disso, a segurança vem de seus direitos de converter em propriedade ou participação acionária na empresa, se
o empréstimo não for pago no prazo e na íntegra”.
“Você está brincando?” perguntou Caroline abruptamente. “Nós não queremos um empréstimo e
certamente não estamos dispostos, sob quaisquer circunstâncias, a dar direitos de propriedade do capital da
empresa.”
“Mana, pode confiar em mim por um segundo? Eu não tenho qualquer intenção de fazer um
financiamento mezanino puro. Eu só quero que você entenda o espírito destes investidores, o que eles
realmente estão procurando.”
“Continue”, disse Paul: “Eu acho que sei aonde você quer chegar com isso.”
“Darren, desculpe”, disse Caroline. “Você me pegou de surpresa. Eu estou com você, por favor,
continue.”
Darren sorriu, demorou-se um pouco terminando seu café, e só então continuou: “Você sabem qual é o
retorno sobre o investimento incremental de uma única loja numa rede de varejo têxtil?”
“Não”, respondeu Caroline, “sabemos qual é o ROI de uma rede, não de uma única loja, mas podemos
fazer uma estimativa. Um bom varejista têxtil ganha cerca de 6% de lucro sobre as vendas e gira o estoque
numa loja três vezes por ano. Considerando todos os fatores habituais, o ROI de uma única loja deve ser em
torno de 15%.”
“Esse seria o meu palpite também”, comentou Darren e continuou perguntando: “E qual você acha que
é o ROI incremental de uma única loja da Hannah’s Shop?”
“Eu sabia,” disse Paul com um largo sorriso. “sabia que você ia nos levar a este ponto. Nosso
investimento numa loja é de cerca da metade e os nossos lucros são cerca de três vezes maiores. Nosso
retorno está com certeza acima de 100%. Para quem procura um retorno de 25% é quase bom demais para
ser verdade.”
“Você não oferece algo que é bom demais para ser verdade, não para um investidor conservador,”
disse Darren. “Mas se o dinheiro do investidor é investido numa loja de uma empresa sólida, e a Hannah’s
Shop está no ramo há mais de 50 anos, tem zero de dívida e uma excelente reputação, é seguramente sólida.
E há as estatísticas de mais de cem lojas, cada uma mostrando um retorno de investimento de mais de 100%
ao ano. E o investidor é o primeiro da fila, antes de a empresa tirar um centavo dos lucros dessa loja. E sua
parte será de 30% por ano sobre seu investimento nessa loja em particular da rede Hannah's Shop. Com tudo
isso referência, o investidor vai se preocupar que não vai ter seus 30% ao ano?”
“Só para ter certeza”, disse Caroline, “O investidor vai investir na nova loja, e no caso improvável de
que a rentabilidade da loja seja inferior a 30% do seu investimento, ele não terá direito sobre a empresa,
apenas nos ativos dessa loja específica.”
“Exatamente”, respondeu o irmão. “E a Hannah’s Shop tem uma opção de comprar o seu investimento
de volta depois de alguns anos a um preço pré-determinado”.
“Isso não é franchising”, comentou Paul.
“É, no sentido de que em cada loja você tem uma entidade externa, e você não investe na loja, apenas
na infraestrutura de apoio”, afirmou Darren. “E para isso, levando em conta que você não tem que investir
muito nos estoques do depósito regional, a Hannah’s Shop tem mais dinheiro que o suficiente para abrir muitas
regiões por ano.”
“Teremos de abrir grupos de lojas para minimizar o investimento em publicidade,” recapitulou Paul.
“Mas o que eu mais gosto é que as operações estão totalmente sob nosso controle.”
“Nós vamos ter de fazer uma contabilidade separada para cada loja”, observou Caroline.
“Sim”, Paul concordou, “Mas veja o lado positivo – eu sei que muitos gerentes ficarão felizes em ter
equidade da loja que comandam.”
Ouvindo a conversa entre a sua irmã e o marido dela, Darren cuidou para manter sua boca fechada.
Seu trabalho fora feito; agora eles estavam tentando convencer um ao outro.
“Isso é importante”, disse Caroline. “Ele nos proporciona uma excelente canal de promoção,
principalmente se expandirmos rapidamente.”
“Deixe-me dizer-lhes que para os bons gerentes, é um presente dos céus”, relatou Paul. “Saber que
sete pessoas dentro de sua loja estão de olho na sua função não é divertido. Atualmente, temos muitos
gerentes de seção e de loja talentosos que não têm para onde ir dentro da empresa. Isto não só oferece uma
opção real de promoção para eles, mas funciona como um incentivo para outros funcionários trabalharem
mais”.
Caroline reconheceu que concordava, “Provavelmente é o caminho certo. Claro, há um milhão de
detalhes que precisam ser resolvidos.” Voltando-se para Darren, ela acrescentou, “Mas antes de pensar nisso,
há uma questão sobre a qual eu preciso de uma resposta sua. Nós não temos nenhuma ideia de como fazer
isso – como encontrar investidores, como negociar as ofertas, o que deve e não deve estar no contrato. Nós
precisamos de sua ajuda.”
“Nada tema, minha querida irmã”, sorriu Darren como o Gato de Cheshire. Como ele havia dito a seu
pai naquela manhã, ele estava com todas as suas bases cobertas. “Eu gostaria de oferecer meus serviços. Aos
honorários de sempre, é claro.”
Epílogo
A vista da cobertura do prédio era de tirar o fôlego. Paul olhou para as luzes de São Paulo, que se
estendiam até onde a vista alcançava. Combinada com a brisa fresca, tornou a noite de festa dos investidores
brasileiros em algo quase milagroso. Um sambinha tocava, e o som de conversas podia ser ouvido lá de
dentro.
De repente, Paul ouviu a voz de Darren: “Então, Ben resolveu o que quer fazer, agora que concluiu o
curso?” O nova-iorquino saiu para o terraço, com a taça de champanhe na mão.
“Eu vou lhe contar, deve haver algo errado com aquele rapaz”, brincou Paul, “Ele começou a trabalhar
na Hannah’s Shop. E pediu para começar na empresa devagar, aprendendo como funciona, de baixo para
cima”.
“Você deve estar orgulhoso”, observou Darren.
Paul sorriu enquanto sua esposa se juntava a eles na varanda.
“Ah, vocês estão aí, dupla dinâmica”, disse. “Eu queria ter uma palavra com vocês.”
Assim como papai, pensou Darren, o negócio vem sempre em primeiro lugar. Eu acho que faz parte.
“Agora que tudo está indo tão bem, eu queria falar de um assunto que vem me incomodando há algum
tempo”, disse ela, sentada num banco almofadado. “Darren, você virou um especialista em franchising, não é?”
“Acho que sim”, disse seu irmão, encolhendo os ombros e fingindo modéstia. “Deixe-me ver, com
franquias de sucesso funcionando em todo os EUA e Canadá, Europa, China, Austrália e agora no Brasil, acho
que eu me tornei um expert na área.”
“Então, por que não esteve tão ativo fora da Hannah’s Shop?” perguntou Caroline. “Quero dizer, por
que você não emprestou os seus conhecimentos na área para outros negócios?”
Darren encostou-se na grade, e respondeu: “Eu estive acompanhando a expansão por nove anos, e só
agora você pergunta?”
“Cara tinha uma boa pergunta,” disse Paul ao se sentar ao lado da esposa. “Quero dizer, não é que
nós o tenhamos impedido de usar nossas ideias em outro lugar.”
“Eu não sei”, disse Darren, obviamente desconfortável. “Eu nunca encontrei a oportunidade certa.”
Isso não soou bem para Paul. Ele conhecia bem seu cunhado. “Em nove anos não surgiram
oportunidades?”, perguntou ele.
“Eu tentei”, admitiu o capitalista de risco. “Mas quando eu me aproximei das empresas e revelei uma
partezinha das ideias que vocês dois desenvolveram, todos eles disseram que eu deveria me concentrar em
investimentos, e deixar o lado operacional para eles. A única maneira de poder convencer a diretoria era
comprando a empresa. Mas não havia razão para fazer isso porque com certeza eu iria ficar preso nisso,
porque não sei como convencer a gerência.”
“Eu entendo a sua frustração”, disse Paul.
“Eu vejo o potencial, e que vai se perder”, Darren continuou. “Há tanta coisa que poderia ser feita com
esses conceitos. Nós podemos comprar redes inteiras e dentro de um ano ou dois, decuplicar seu valor. Eu
poderia deixar Warren Buffet morto de vergonha”.
“Então o que está dizendo é que você precisa de um cara de operações ao seu lado, para completar o
quadro, não é?” perguntou Caroline. “Como Paul.”
Nem Paul nem Darren podiam acreditar no que Caroline disse. Ela estava propondo que Paul deixasse
a empresa?
“Querida”, perguntou Paul, “Do que está falando?”
Caroline pegou a mão do marido e disse: “Paul, você é uma pessoa incrível. Amo você demais. Mas
você está se tornando insuportável.”
“O quê?” Paul ficou surpreso ao ouvir isso.
“Onde quer que vá, você continua encontrando problemas”, respondeu ela. “Como na vez que você foi
comprar aquela camisa de beisebol para Ben e eles não tinham; então você deu uma palestra para o rapaz
atrás do balcão.”
“Camisa de futebol americano”, murmurou Paul.
“Seja qual for”, acrescentou ela. “Ou quando comprou o delineador que eu gosto, e você deu uma
bronca naquela senhora simpática, que a vitrine deve estar sempre completa, e que eles deveriam arrumar as
coisas diariamente.”
“Mas isso é só porque poderiam ganhar mais, e não é tão difícil fazer isso”, argumentou Paul,
fervorosamente. “Eles não precisam de uma bola de cristal, nem devem esperar que o encanamento estoure.
Por que não melhorar as coisas agora?”
“Está entendendo o que quero dizer?” Caroline virou-se para seu irmão. “Eu não posso levá-lo a mais
nenhum lugar.”
“Esqueça isso”, Paul continuou. “Nós trabalhamos juntos, formamos uma boa equipe”.
“Isso não significa que eu precise retê-lo, cortar suas asas”, disse Caroline.
“Você fica tão frustrado por ver que nossas ideias podem ser implementadas em outras áreas. Mantê-lo
preso no varejo têxtil não seria nada mais do que um ato egoísta. Eu não poderia fazer isso com você”.
Claro que ela tinha razão, percebeu Paul. Este tinha sido o desejo do seu coração. Ele valorizou ainda
mais Caroline por falar disso. O gesto o deixou sem palavras.
Felizmente, Darren falou: “E agora que já demitiu esse shegetz, você quer que eu seja parceiro dele?”
“Deixaria qualquer um botar as mãos nele?”, perguntou ela. “Pensem nisso. Juntos, vocês poderiam
tomar qualquer área – artigos esportivos, eletrônicos, cosméticos, o que for – e fazer por ele o que fez pela
Hannah’s Shop. Afinal, Darren, foi você quem nos mostrou que tem sempre que pensar maior, melhor, que
mais pode ser feito, mesmo quando você está no topo, mesmo que pareça quase impensável na época. Agora,
não há nada o segurando.”
Paul sorriu e levantou a taça para um brinde, “O céu é o limite.”
“Não”, Darren sorriu, e tocou seu copo contra o de Paul.
“Nem mesmo o céu é o limite.”
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