1 Pró-Reitoria de Graduação Curso de Direito Trabalho de Conclusão de Curso AS DIFICULDADES DA PESSOA COM DEFICIÊNCIA À LUZ DO TRABALHO ADAPTADO Autor: Saulo Moreira Pereira Orientador: Luiz da Silva Flores Brasília - DF 2012 2 SAULO MOREIRA PEREIRA AS DIFICULDADES DA PESSOA COM DEFICIÊNCIA À LUZ DO TRABALHO ADAPTADO Artigo apresentado ao curso de graduação em Direito da Universidade Católica de Brasília, como requisito parcial para obtenção do Título de Bacharel em Direito. Orientador: Luiz da Silva Flores Brasília 2012 3 Dedico este trabalho aos meus pais e aos meus familiares que tanto contribuíram para minha formação. A minha esposa que guardo profunda admiração e apreso. E a minha filha que é a razão do meu sonhar. 4 AGRADECIMENTOS Agradeço a Deus por ter me dado sabedoria e forças para concluir mais uma etapa de minha vida. Minha querida tia Isabel, pessoa que sempre acreditou em meu esforço e esteve presente nos momentos mais importantes do meu currículo acadêmico. Todos os professores que estiveram comigo ao longo desta jornada. Dentre eles os professores Heli Gonçalves, Juvenal Nery, Vanessa Maria Morais, Maria de Fátima, Humberto Barbosa de Castro e Paulo Henrique Perna Cordeiro. Aos meus amigos José Afonso, Marcelo Dias, Ana Cristina, Thiago Silva, Camilla Rodrigues, Ivonete Magalhães, Socorro de Fátima, Maria Lucena e tantos mais que passaram pelo decorrer do curso. Especialmente ao meu amigo Luiz da Silva Flores que me deu a honra de ser meu orientador. A todos muitíssimo obrigado! 5 AS DIFICULDADES DA PESSOA COM DEFICIÊNCIA À LUZ DO TRABALHO ADAPTADO SAULO MOREIRA PEREIRA Resumo: Com a Constituição Federal de 1988, o Brasil se voltou para as normas de proteção às pessoas com deficiência. Dentre elas as que têm por finalidade reger sobre a proteção do trabalho dos deficientes. Os artigos constitucionais visam à proteção do trabalho e da vida social da Pessoa com deficiência. Palavras-chave: Acessibilidade – Lei – Pessoas com Deficiência – Trabalho. I - Histórico O Decreto nº. 3.298, de 20 de dezembro de 1999 1, é de suma importância na atual legislação que toca na mudança institucional da condição da pessoa com deficiência2 no Brasil. O merecido valor a essas pessoas evoluiu muito no decorrer da História, sendo grande a luta pelo o reconhecimento de seus direitos. O preconceito e a forma "piedosa" da pessoa com deficiência cederam, progressivamente, à idéia de integrá-las a sociedade. Antigamente entre os primórdios, o tratamento destinado aos PCD’s 3 tinham dois caminhos a seguir: alguns os exterminavam por considerá-los empecilho à sobrevivência do grupo, e outros os protegiam e sustentavam para agradar os deuses, ou como gratidão pelos esforços dos que se acidentavam na guerra. O povo hebreu acreditava que a deficiência física ou sensorial, era uma espécie de punição de Deus, e por isso qualquer pessoa com deficiência era impedida de ter acesso aos serviços religiosos. A lei Romena, permitia os patriarcas a matar seus filhos “deficientes”, e os Espartanos, ao terem recém-nascidos, frágeis ou deficientes, jogava-os do alto de abismos de mais de 2400 metros de profundidade. Há exemplos opostos, alguns povos sempre cuidaram de seus deficientes, ou outros que, evoluíram moralmente e socialmente, ao ponto que mudaram a idéia que tinha a respeito dos PCD’s. O povo hindu, diferentemente dos hebreus; consideraram os cegos, pessoas com sensibilidade interior mais aguçada, e pela falta da visão, os estimulavam os deficientes visuais nas funções religiosas. Os atenienses influenciados por Aristóteles, protegiam seus doentes e os deficientes, sustentando-os, por meio de sistema que assemelha à Previdência Social, em que todos contribuíam para o sustento dos heróis acidentados em guerra e de suas famílias. 1 BRASIL. Decreto nº.: 3.298, DE 20 DE DEZEMBRO DE 1999. Regulamenta a Lei no 7.853, de 24 de outubro de 1989, dispõe sobre a Política Nacional para a Integração da Pessoa Portadora de Deficiência, consolida as normas de proteção, e dá outras providências. Publicado no Diário Oficial em 20 de dezembro de 1999; 178º da Independência e 111º da República. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto/d3298.htm>; Acesso em: 22 de janeiro de 2012. 2 A terminologia adotada será a designação: Pessoa Com Deficiência. 3 PCD’s: Pessoa(s) com Deficiência. 6 Assim, também, agiam os romanos já no tempo do Império, por influência ateniense discutiam estes dois povos, se a conduta adequada seria a assistencial, ou a readaptação desses deficientes para o trabalho que lhes fosse apropriado. Durante a Idade Média, sob a influência do Cristianismo, os senhores feudais amparavam os deficientes e os doentes, em casas de assistência que eles mantinham. Com a perda de influência do feudalismo, surgiu a idéia de que as pessoas com deficiência deveriam ser introduzidas no sistema de produção, ou assistidas pela sociedade, que contribuiria para tanto. Na França Henrique II, instituiu, em 1547, a assistência social obrigatória para amparar deficientes, através de coletas de taxas. Mas foi no Renascimento que a visão de assistência ficou de lado para a postura profissionalizante e integrativa das pessoas com deficiência. A maneira científica da visão da realidade daquela época derrubou o paradigma social que influenciava o tratamento para com as pessoas com deficiência, e a busca racional da sua integração se fez por várias leis que passaram a ser promulgadas. Na Idade Moderna por volta de 1789, vários inventos foram criados com intuito de propiciar meios de trabalho e locomoção as PCD’s, tais como a cadeira de rodas, bengalas, bastões, muletas, coletes, próteses, macas, veículos adaptados, camas móveis, dentre outras. Louis Braille foi o criador do Código Braille que propiciou a perfeita integração dos deficientes visuais ao mundo da linguagem escrita. O despertar da atenção para a questão da habilitação e da reabilitação da pessoa com deficiência para o trabalho aguçou-se a partir da Revolução Industrial, quando as guerras, epidemias e anomalias genéticas deixaram de ser as causas únicas das deficiências, e o trabalho, em condições precárias, passou a ocasionar os acidentes mutiladores e as doenças profissionais, sendo necessária à própria criação do Direito do trabalho e um sistema eficiente de Seguridade Social, com atividades assistenciais, previdenciárias e de atendimento à saúde, bem como a reabilitação dos acidentados. No Brasil, a Constituição de 19884 (CF/88) rompeu com o modelo assistencialista, até então operante, pois embora já houvesse ratificado a Convenção 159 da OIT por meio do Decreto nº. 129 5, nossa Nação ainda não programara qualquer arcabouço jurídico hábil a integrar a pessoa com deficiência. A regulamentação da Lei nº. 7. 853/896, pelo Decreto nº. 3.298, dez anos depois da edição da primeira, é um fato historicamente relevante, de vez que possibilita a concretização dos princípios constitucionais. 4 BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil de 1988. Brasília: Senado Federal, 1988. Disponível em http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/ConstituicaoCompilado.htm>. Acesso em: 23 de agosto de 2012. 5 BRASIL. Decreto nº. 129, DE 22 DE MAIO DE 1991. Promulga a Convenção nº. 159, da Organização Internacional do Trabalho - OIT, sobre Reabilitação Profissional e Emprego de Pessoas Deficientes. Publicado no Diário Oficial em 22 de maio de 1991; 170° da Independência e 103° da República. Disponível em: <http://www6.senado.gov.br/legislacao/ListaTextoIntegral.action?id=112495>. Acesso em 16 de setembro de 2012. 6 BRASIL. Lei nº.: 7.853, DE 24 DE OUTUBRO DE 1989. Dispõe sobre o apoio às pessoas portadoras de deficiência, sua integração social, sobre a Coordenadoria Nacional para Integração da Pessoa Portadora de Deficiência – Corde; institui a tutela jurisdicional de interesses coletivos ou 7 II – O Direito Estrangeiro A partir dos anos 70 e com intensidade crescente dos anos 80, a legislação de diversos países passa a dispensar proteção especial ao trabalho dos deficientes físicos. Na maioria dos casos, o legislador se preocupa com o acesso ao emprego, vale dizer, assegura aos deficientes o direito a certo número de postos de trabalho nas empresas, quer do setor público quer do privado. Segundo Arion Sayão Romita7, às vezes, a lei tem por objeto garantir a igualdade de salários dos deficientes em relação aos dos trabalhadores válidos. É o caso, por exemplo, da lei belga, que torna obrigatória a convenção coletiva de trabalho nº. 268, de 15 de outubro de 1975, cujo artigo 1º assegura aos trabalhadores deficientes remuneração que seja pelo menos equivalente aos salários convencionais mínimos fixados pelas comissões paritárias para os trabalhadores válidos. Quase sempre, porém, a finalidade perseguida pelo legislador é de fato a garantia de obtenção de emprego pelo deficiente. Cientes das dificuldades práticas de incrementar medidas impositivas dessa natureza, alguns países consagram a possibilidade para o empregador de substituir a oferta direta de vagas ao deficiente pelo pagamento de contribuição em dinheiro, especificamente destinada a organismos de formação, readaptação e reeducação profissional dos deficientes. Na Argentina, a Lei de emprego (Lei nº. 24.0139, de 17.12.1991) prevê, no art. 86, os programas para deficientes, que deverão observar os tipos de atividades que as pessoas puderem desempenhar segundo sua qualificação. Ditos programas deverão contemplar, entre outros aspectos, os seguintes: a) promoção de oficinas protegidas de produção e apoio ao trabalho dos deficientes mediante regime de trabalho no domicílio; b) determinar o cumprimento da obrigação de dar trabalho a pessoas deficientes que reúnam condições de aptidão em uma proporção não inferior a quatro por cento do pessoal nas entidades públicas nacionais, incluídas as empresas e sociedades do Estado; c) fomentar a inclusão nas convenções coletivas de cláusulas de reserva de postos de trabalho para deficientes no setor privado. O ordenamento jurídico espanhol consagra o instituto das reservas e preferências de emprego. Segundo o disposto no artigo 17.2 do Estatuto dos Trabalhadores da Espanha, de 1980 (texto aprovado pelo Real Decreto Legislativo 1/199510, de 24 de março), podem ser estabelecidas "reservas de preferências" para ser contratado como empregado. difusos dessas pessoas, disciplina a atuação do Ministério Público, define crimes, e dá outras providências. Publicado no Diário Oficial em 24 de outubro de 1989; 168º da Independência e 101º da República. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/L7853.htm>; Acesso em: 21 de agosto de 2012. 7 Arion Sayão Romita. Trabalho do Deficiente. Disponível em: <http://www.estacio.br/graduacao/direito/revista/revista3/artigo5.htm>; Acesso em: 28 de agosto de 2012. 8 Convenção coletiva de trabalho nº. 26 da Bélgica. Citada por Arion Sayão Romita. 9 Lei nº. 24.013 da Argentina. Citada por Arion Sayão Romita. 10 ESPANHA. Real Decreto Legislativo 1/1995, de 24 de marzo, por el que se aprueba el texto refundido de la Ley del Estatuto de los Trabajadores. Disponível em: <http://noticias.juridicas.com/base_datos/Laboral/rdleg1-1995.html>; Acesso em: 12 de julho de 2012. 8 A legislação francesa também reconhece há tempos as "prioridades de emprego". As normas que obrigam os empregadores a reservar, no pessoal das empresas, certo número de postos de trabalho à pessoas privilegiadas no tocante às admissão são tradicionais. No passado, visavam aos inválidos de guerra. Hoje em dia, visam principalmente aos deficientes. Na Itália, ao lado do sistema de colocação ordinária, existe o de colocação obrigatória, regulado pela Lei nº. 48211, de 2 de abril de 1968. Esta lei com fins de solidariedade social e para ensejar a inserção na vida laborativa de algumas categorias especiais de pessoas, impõe aos empregadores a obrigação de admitir certo número de integrantes dessas categorias. As empresas que tiverem a seu serviço mais de 35 empregados são obrigadas a admitir, entre pessoas que integram as "categorias protegidas", quinze por cento do pessoal, abrangidos operários e empregados de escritórios e excluídos os aprendizes. No Peru, a Constituição12 de 1993 no seu art. 7º, declara que a pessoa incapacitada para velar por si própria por causa de uma deficiência física ou mental tem direito ao respeito de sua dignidade e a um regime legal de proteção, atenção, readaptação e seguridade. A Lei de trabalho para pessoas com limitações físicas, sensoriais e intelectuais (Lei nº. 23.28513, de 15 de outubro de 1981) dispõe em seu primeiro artigo que as entidades e empresas do setor público que derem emprego a pessoas com limitações físicas, sensoriais e intelectuais têm direito, para fim de dedução no pagamento de impostos, a uma bonificação contábil de 50 por cento sobre o montante integral da mão-de-obra que contratar com este tipo de pessoas. Acrescenta o art. 2º que o mínimo de trabalhadores a serem computados para a bonificação contábil não excederá 10 por cento dos servidores de cada empresa. Em Portugal, a lei de emprego protegido (Decreto-lei nº. 4014, de 25 de janeiro de 1983), no art. 1º, define emprego protegido como: "Toda atividade útil e remunerada que, integrada no conjunto da atividade econômica nacional e beneficiando as medidas especiais de apoio por parte do estado, visa assegurar a valorização pessoal e profissional das pessoas deficientes, facilitando a sua passagem, quando possível, para um emprego não protegido". O trabalho em regime de emprego protegido pode ser prestado em centros próprios, em meio normal de produção ou no domicílio do deficiente. A lei define "centro de emprego protegido": de acordo com o disposto no art. 4º, trata-se de unidade de produção, de caráter industrial, artesanal, agrícola, comercial ou de prestação de serviços integrada na atividade econômica nacional, que vise a assegurar aos deficientes o exercício de uma atividade remunerada, assim como a possibilidade de formação e aperfeiçoamento profissional que permitam, sempre que possível, a sua transferência para o mercado normal de trabalho. 11 Lei nº. 482 da Itália. Citada por Arion Sayão Romita. PERU. CONSTITUCION POLÍTICA DEL PERÚ 1993. Brasília: Congreso de la República del Perú, 1993. Disponível em: <http://pdba.georgetown.edu/Constitutions/Peru/per93reforms05.html>. Acesso em: 31 de setembro de 2012. 13 Lei nº. 23.285 do Peru. Citada por Arion Sayão Romita. 14 Decreto-lei nº. 40/83 de Portugal. Citada por Arion Sayão Romita. 12 9 III – CONCEITO DE PESSOA COM DEFICIÊNCIA NO DIREITO DO TRABALHO A Convenção da OIT nº. 159, de 1983, ratificada pelo Brasil através do Decreto Legislativo nº. 51, de 28 de agosto de 1989 conceitua a pessoa com deficiência no artigo 11, da seguinte forma: "Para efeitos da presente Convenção, entende-se por 'pessoa deficiente' todo indivíduo cujas possibilidades de obter e conservar um emprego adequado e de progredir no mesmo fiquem substancialmente reduzidas devido a uma deficiência de caráter físico ou mental devidamente reconhecida". O conceito em questão ressalta o caráter funcional das deficiências físicas ou sensoriais, estabelecendo a Convenção o dever dos países signatários de se engajar em atividades de integração e de fornecerem instrumentos que viabilizem o exercício das atividades profissionais para as pessoas que deles necessitem. Neste sentido, o Decreto nº. 3.298 conceitua as pessoas com deficiência em seu artigo 3º: Define deficiência como "toda perda ou anormalidade de uma estrutura ou função psicológica, fisiológica ou anatômica que gere incapacidade para o desempenho de atividade, dentro do padrão considerado normal para0 ser humano". Incapacidade, que trata o caput é conceituada no inciso I deste artigo como: "Uma redução efetiva e acentuada da capacidade de integração social, com necessidade de equipamentos, adaptações, meios ou recursos especiais para que a pessoa portadora de deficiência possa receber ou transmitir informações necessárias ao seu bem-estar pessoal e ao desempenho de função ou atividade a ser exercida". Já o artigo 4º, especifica a conceituação técnica, sob o ponto de vista médico, das deficiências física, auditiva, visual, mental e múltipla. Percebe-se, portanto, que a finalidade do decreto em comento, ao definir a pessoa com deficiência, foi complementar a Lei nº. 7.853, que não definirá as deficiências hábeis a gerar a proteção jurídica por ela traçada. Outro aspecto relevante é o de que as deficiências são tidas como limitações de caráter instrumental, cientificamente quantificados, balizados de acordo com critérios médicos internacionais. Com isso, é possibilitada a aferição da matéria a ser tutelada pelo Direito e os limites físicos, fisiológicos, sensoriais ou mentais que deverão merecer suplementação por intermédio de instrumentos, próteses, adaptações físicas do meio e procedimentos que possibilitem a devida integração do PCD. Supera-se, destarte, a segregação assistencial até então imperaste em nosso País, apesar do grande avanço jurídico trazido pela Constituição de 1988 e pela Lei nº. 7.853, que carecia de regulamentação, até mesmo conceitual. 10 IV – A LEGISLAÇÃO BRASILEIRA ATUAL E O TRABALHO DA PESSOA COM DEFICIÊNCIA A Constituição Federal de 1988 é a primeira Carta Constitucional que enfatiza, sobremaneira, a tutela da pessoa com deficiência no trabalho. O artigo 7°, inciso XXXI, preceitua: "Proibição de qualquer discriminação no tocante a salário ou critérios de admissão do trabalhador portador de deficiência". Este dispositivo é de vital importância, como se vê, pois a nação brasileira assume o compromisso de admitir o PCD como trabalhador, desde que sua limitação física não seja incompatível com as atividades profissionais disponíveis. O artigo 37, inciso VIII, também da Constituição Federal, determina que "a lei reservará percentual dos cargos e empregos públicos para as pessoas portadoras de deficiência e definirá os critérios de sua admissão". Na esfera privada, também se institui a obrigatoriedade de reserva de postos a PCD’s. A Lei nº. 8 213/91 fixa os seguintes percentuais: "A empresa com 100 (cem) ou mais empregados está obrigada a preencher de 2% (dois por cento) a 5% (cinco por cento) dos seus cargos com beneficiários reabilitados ou pessoas portadoras de deficiência, habilitadas, na seguinte proporção: - até 200 empregados 2% - de 20 I a 500 empregados 3% -de 501 a 1000 4% -de 1001 em diante 5% A Lei nº. 8.11215 impõe que a União reserve, em seus concursos, até 20% das vagas a PCD’s, havendo iniciativas semelhantes nos Estatutos Estaduais e Municipais, para o regime dos servidores públicos. O artigo 203, inciso IV, da CF/88, inclui entre os deveres da assistência social "a habilitação e reabilitação das pessoas portadoras de deficiência e a promoção de sua integração à vida comunitária". O inciso V, do mesmo artigo, dispõe que os deficientes e idosos incapazes de se manter pelo próprio trabalho ou por auxílio da família, terão direito a uma renda mensal vitalícia equivalente a um salário mínimo, mediante regulamentação de norma específica, que veio pela Lei nº. 8.74216 (art. 20). 15 BRASIL. Lei nº.: 8.112, DE 11 DE DEZEMBRO DE 1990. Dispõe sobre o regime jurídico dos servidores públicos civis da União, das autarquias e das fundações públicas federais. Publicado no Senado Federal, 18 de abril de 1991. 170° da Independência e 103° da República. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/L8112cons.htm>; Acesso em: 20 de agosto de 2012. 16 BRASIL. Lei nº.: 8.742, DE 07 DE DEZEMBRO DE 1993. Dispõe sobre a organização da Assistência Social e dá outras providências. Publicado no Diário Oficial em 07 de dezembro de 1993, 172º da Independência e 105º da República. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/L8742.htm>; Acesso em 23 de abril de 2012. 11 O artigo 227, também da Constituição, grande monumento da doutrina da proteção integral da criança e do adolescente, no § 1º, inciso II, fala na: "Criação de programas de prevenção e atendimento especializado para as pessoas portadoras de deficiência física, sensorial ou mental, bem como de integração social do adolescente e do jovem portador de deficiência, mediante o treinamento para o trabalho e a convivência, e a facilitação do acesso aos bens e serviços coletivos, com a eliminação de obstáculos arquitetônicos e de todas as formas de discriminação." Regulamentando o dispositivo acima, a Lei nº. 7.853, cria a Corde (Coordenação Nacional para Integração da Pessoa Portadora de Deficiência). Grifo nosso. A Corde estabelece mecanismo de tutela dos interesses difusos das pessoas deficientes, pelo Ministério Público, impõe a priorização das medidas de integração dos deficientes no trabalho e na sociedade, institui as Oficinas Protegidas de Trabalho e define como criminosa a conduta injustamente discriminatória de deficientes no trabalho. Dispõe, ainda, em seu artigo 20, inciso III, letra d, que cabe ao Poder Público e a seus órgãos assegurar às pessoas com deficiência o pleno exercício de seus direitos básicos, inclusive do direito ao trabalho, devendo ser dispensado tratamento adequado tendente a viabilizar a adoção de legislação especifica, disciplinando a reserva de mercado de trabalho em favor dessas pessoas, nas entidades da Administração Pública e do setor privado, e regulamentando a organização de oficinas e congêneres integradas ao mercado de trabalho, e a situação, nelas, das PCD’s. Tanto a Constituição quanto a lei ordinária traçam enunciados, princípios, cuja aplicação vinha se fazendo de forma casuística, nos vários níveis da Federação proliferou leis municipais, estaduais ou mesmo editais, adotando critérios profundamente díspares, os quais suscitaram dúvidas de aplicação, ou mesmo inviabilizaram o Direito contemplado nos instrumentos normativos retromencionados. O Decreto nº. 3.298 regulamenta a Lei nº. 7.853, implementando mecanismos para a concretização da reserva de vagas nos concursos públicos. Dedica à matéria os artigos 37 a 44, traçando, a partir da experiência acumulada, novas diretrizes visando a superação de problemas enfrentados pelos PCD’s, que se confrontavam com regras que, a guisa de regulamentar a reserva de vagas, findavam por inviabilizar a aprovação daqueles candidatos. Garante-se a igualdade de condições das PCD’s aos demais candidatos quanto à inscrição, observando-se, igualmente, o percentual mínimo de 5% de vagas reservadas. Excetuam-se desta regra os cargos em comissão ou função de confiança, ou aqueles cujo exercício demande aptidão plena Grande avanço se obteve ao se fixar o percentual mínimo de 5% a maioria das leis estaduais e municipais falavam em até 5%, o que possibilitava a fixação de percentuais irrisórios. Disciplinam-se, ademais, as regras que deverão constar dos editais, pautando-as por critérios concernentes à cidadania do candidato com deficiência Com o intuito de fixar condições de igualdade, o decreto determina que a autoridade competente não pode obstar a inscrição do deficiente, que, por sua vez, deve 12 declarar e comprovar sua condição, indicando os instrumentos de adaptação que poderá necessitar durante a realização do concurso e do estágio probatório. Devem estar previstos, também, o número de vagas existentes e o total correspondente à reserva destinada às PCD’s, bem como as atribuições e tarefas essenciais dos cargos a serem ocupados. A pessoa com de deficiência participará do concurso em igualdades de condições com os demais candidatos, no que se refere ao conteúdo e avaliação das provas, aos critérios de aprovação, ao horário e ao local de aplicação dos exames, a nota mínima exigida para todos os demais candidatos e a publicação dos resultados finais. Assinale-se que o critério de avaliação deverá ser o mesmo utilizado para todos os candidatos, tento ou não deficiências. As regras anteriores ao decreto normalmente atribuíam a uma comissão médica o dever de aferir, após a aprovação no concurso e antes do estágio probatório, se a deficiência apresentada pelo candidato seria compatível com a função a ser exercida, o que impunha duplo ônus às PCD’s. Deviam ser aprovadas no concurso e pela comissão médica e ter o aval dessa comissão para se submeterem ao estágio probatório. Buscou-se afastar essa injustiça inserindo-se, na Comissão, membros da carreira a ser abraçada pelo candidato. Conferiu-se àquela comissão, ademais, o dever de avaliar os instrumentos que o candidato necessitará durante o concurso, bem como, em caso de aprovação, o dever de acompanhá-lo durante o estágio probatório, assegurandolhe os instrumentos e meios de apoio necessários para a sua integração. Na esfera privada, o decreto delineia a inserção competitiva, a inserção seletiva, as oficinas protegidas e o trabalho independente, autônomo. Aponta a inserção competitiva como sendo aquela em que a PCD ingressa no mercado de trabalho em condições de quase absoluta igualdade com qualquer outro trabalhador, no que concerne à execução do seu trabalho, necessitando, tãosomente, de apoios instrumentais que supram suas restrições físicas ou sensoriais. A inserção seletiva dar-se-á quando for necessário, além dos instrumentos de apoio, procedimentos especiais, como horário diferenciado, adaptação do meio ambiente, atuação de orientadores ou acompanhantes etc. Nos dois casos, na inserção competitiva ou na inserção seletiva, serão garantidos todos os direitos trabalhistas e previdenciários. Admite a inserção seletiva por intermediação de entidades especializadas. O decreto incentiva o trabalho independente, por meio das chamadas cooperativas sociais, reguladas pela Lei nº. 9867/9917. Há que se atentar, porém, para as possíveis fraudes, tão usualmente encontradas entre as cooperativas de trabalho. As oficinas protegidas são aquelas que se encontram no interior de entidades que desenvolvem trabalhos terapêuticos, visando à preparação da pessoa com deficiência para um futuro processo seletivo ou competitivo de trabalho. Tal procedimento é indispensável com relação a algumas deficiências mentais ou físicas, cujo grau de comprometimento afete os processos de sociabilização das PCD’s. 17 BRASIL. Lei nº.: 9.867, DE 10 DE NOVEMBRO DE 1999. Dispõe sobre a criação e o funcionamento de Cooperativas Sociais, visando à integração social dos cidadãos, conforme especifica. Publicado no Diário Oficial em 10 de novembro de 1999; 178º da Independência e 111º da República. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Leis/L9867.htm>. Acesso em: 12 de abril de 12. 13 As oficinas protegidas podem ser de produção ou meramente terapêuticas tanto nas primeiras como nas segundas não haverá, em tese, vínculo de emprego, exceto nas de produção, desde que presentes os elementos legais caracterizadores da relação de emprego. Finalmente, o Estatuto da Criança e do Adolescente18, em seu artigo 66, também obriga a que a sociedade brasileira atente para a proteção do trabalho do adolescente deficiente, o que faz com acerto, posto que duplas sejam as peculiaridades do adolescente com deficiência, as quais suscitam necessidade mais intensa de proteção, para que se lhe possibilite a integração adequada na sociedade, afastando-o da política de caridade meramente assistencial, que o impelirá inexoravelmente à marginalidade. É com esta intenção que a Lei do Estágio 19 amplia o estágio profissionalizante às escolas especiais de qualquer grau. O direito à profissionalização assume, aqui, papel imprescindível de socialização da pessoa com deficiência, eis que suas limitações para o trabalho se constituem em barreiras tão-somente instrumentais, mesmo que seja uma pessoa com deficiência física, mental, ou sensorial. Todas elas são superáveis, desde que se rompam os preconceitos atávicos, herdados, talvez, das concepções antigas dos povos primitivos, de que a pessoa com deficiência é um "pecador punido por Deus" que deve ser segregado. Cabe ao Direito do Trabalho despir-se destes preconceitos e buscar, cientificamente, a compreensão dos reais limites dos deficientes para, cumprindo seu papel histórico, garantir-lhes condições de igualdade plena aos demais trabalhadores. A reserva de vagas na Administração Pública ou nas empresas privadas jamais poderá ser considerada como uma proteção paternalista trata-se, isto sim, da própria revelação da essência do Direito do Trabalho, o qual nasce da premissa básica de que a lei deve assegurar a igualdade real entre as pessoas, suprindo as desigualdades que se constituam em fatores de segregação. A respeito do trabalho da pessoa com deficiência, tanto no setor público como no privado há leis de proteção ao deficiente. Temos o art. 37, inciso VIII, da Constituição Federal, que determina no setor público a reserva de percentual de cargos e empregos públicos em favor das Pessoas com Deficiências abrangendo a administração pública. 18 BRASIL. Lei nº.: 8.069, DE 13 DE JULHO DE 1990. Dispõe sobre o Estatuto da Criança e do Adolescente e dá outras providências. Publicado no Diário Oficial em 13 de julho de 1990; 169º da Independência e 102º da República. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/L8069.htm>. Acesso em: 12 de abril de 12. 19 BRASIL. Lei nº.: 11.788, DE 25 DE SETEMBRO DE 2008. Dispõe sobre o estágio de estudantes; altera a redação do art. 428 da Consolidação das Leis do Trabalho – CLT, aprovada pelo o o o Decreto-Lei n 5.452, de 1 de maio de 1943, e a Lei n 9.394, de 20 de dezembro de 1996; revoga as os Leis n 6.494, de 07 de dezembro de 1977, e 8.859, de 23 de março de 1994, o parágrafo único do o o o art. 82 da Lei n 9.394, de 20 de dezembro de 1996, e o art. 6 da Medida Provisória n 2.164-41, de 24 de agosto de 2001; e dá outras providências. Publicado no Diário Oficial em 25 de setembro de o o 2008; 187 da Independência e 120 da República. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2007-2010/2008/lei/l11788.htm>. Acesso em: 12 de abril de 12. 14 A Lei nº. 8.112/90, em seu art. 5º, § 2º, diz: Às pessoas portadoras de deficiência é assegurado o direito de se inscrever em concurso público para provimento de cargo cujas atribuições sejam compatíveis com a deficiência de que são portadoras; para tais pessoas serão reservadas até 20% (vinte por cento) das vagas oferecidas no concurso. Duplo, portanto, é o alcance do disposto no art. 37, VIII, da Constituição Federal, explicitado pelo § 2º do art. 5º da 8.112/90, pois veda a discriminação a critérios de inscrição nos concursos públicos e reserva-se um percentual das vagas em favor das PCD’s. A Lei nº. 7.853/89, estabelecendo normas que assegurem o exercício dos direitos individuais e sociais, considerados, entre outros valores básicos, o da igualdade de tratamento. Entre as medidas impostas aos órgãos e entidades da administração direta e indireta, situa-se, na área da formação profissional e do trabalho, a da adoção de legislação específica que discipline a reserva de mercado de trabalho, isto nas entidades da administração pública e do setor privado. Esta lei normatiza ações civis públicas para a defesa de interesses dos deficientes, as quais só o Ministério Público e entidades ligadas aos PCD’s podem propor. O Ministério Público intervirá, obrigatoriamente, nos órgãos públicos, que discuta interesses relacionados à deficiência das pessoas (art. 5º). Constitui crime punível com reclusão de 1 a 4 anos e multa obstar, sem justa causa, o acesso de alguém a qualquer cargo público, por motivos derivados de sua deficiência 20. Consagra Alexandre de Moraes21: Os direitos humanos fundamentais, dentre eles os direitos e garantias individuais e coletivos consagrados no art. 5.° da Constituição Federal, não podem ser utilizados como um verdadeiro escudo protetivo da prática de atividades ilícitas, nem tampouco como argumento para afastamento ou diminuição da responsabilidade civil ou penal por atos criminosos, sob pena de total consagração ao desrespeito a um verdadeiro Estado de Direito. Sobre o quadro de trabalho das pessoas com deficiência no serviço privado, não há uma previsão na constituição Federal. Ficando a cargo de a legislação infraconstitucional abordar o assunto: o art. 93 da Lei nº. 8.213/91 22, dispõe que a empresa com mais de 100 empregados está obrigada a preencher de 2% a 5% dos seus cargos com pessoas com deficiência. Tal proibição de discriminar as pessoas com deficiência envolve no exercício de diversos outros direitos trabalhistas. Tais como, por exemplo, a eles se aplica o disposto no art. 461 da Consolidação das Leis do Trabalho 23, equipara 20 Ibid., Art. 8º caput e inciso III. Mores, Alexandre de. Direito Constitucional. 13ª edição. Ed. Atlas. Ano de 2003. pg. 61 22 BRASIL. Lei nº.: 8.213, DE 24 DE JULHO DE 1991. Dispõe sobre os Planos de Benefícios da Previdência Social e dá outras providências. Publicado no Diário Oficial em 24 de julho de 1991; 170º da Independência e 103º da República. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/L8213cons.htm>; Acesso em: 19 de maio de 2012. 23 BRASIL. Decreto-Lei nº.: 5.452, DE 1º DE MAIO DE 1943 - Aprova a Consolidação das Leis do Trabalho. Publicado no Diário Oficial do Rio de Janeiro, 1 de maio de 1943, 122º da 21 15 salário igual para trabalho igual, sem levar em conta que o empregado seja deficiente ou não. A lei ainda vai também tratar da dispensa, de acordo com o § 1º do art. 93 da Lei nº. 8.213/91: Art. 93 – [...] § 1º A dispensa de trabalhador reabilitado ou de deficiente habilitado ao final de contrato por prazo determinado de mais de 90 (noventa) dias, e a imotivada, no contrato por prazo indeterminado, só poderá ocorrer após a contratação de substituto de condição semelhante. A premissa é válida também para o contrato por tempo determinado, regulado pela Lei nº. 9.601/98 24. Nos casos em que a PCD trabalha, mas não configura relação de emprego. Atendendo a esta circunstância, a Instrução Normativa nº. 5/91, da secretaria nacional do trabalho trouxe o seguinte texto: Art. 1º - O trabalho da pessoa portadora de deficiência não caracterizará relação de emprego quando atender aos seguintes requisitos: I - realizar-se sob assistência e orientação de entidade sem fins lucrativos, de natureza filantrópica, que tenha como objetivo assistir o deficiente; II - destinar-se a fins terapêuticos ou de desenvolvimento da capacidade laborativa do deficiente. Parágrafo único - O trabalho referido neste artigo poderá ser realizado na própria entidade que prestar assistência ao deficiente ou no âmbito de empresa que, para o mesmo fim, celebrar convênio com a entidade assistencial. V – A PROBLEMÁTICA DAS EMPRESAS PRIVADAS EM CUMPRIR AS COTAS DO ART. 93 DA LEI Nº.: 8.213/91 A Lei nº. 8.213/91, em seu artigo 93, regula a obrigatoriedade das empresas que tenham 100 ou mais empregados preencherem seus quadros de 2% a 5% dos cargos com beneficiários reabilitados ou pessoas com deficiência. Apesar da Lei em questão ter quase 20 anos, as empresas ainda enfrentam inúmeros problemas para conseguir cumprir o determinado, seja por falta de profissionais habilitados no mercado de trabalho, seja pelo ramo da atividade desenvolvida pela empresa, ou pelas as atividades de risco que os funcionários desenvolvem. Ressalte-se que a falta de estrutura fornecida pelo Estado para reabilitar os trabalhadores, agrava a falta de profissionais qualificados com deficiência. A cada dia, a fiscalização nesse sentido fica mais rígida e criteriosa, mais empresas recebem multas em valores exorbitantes, como se verifica nos dados extraídos no site do Ministério do Trabalho e Emprego, que em 2005 das 375.097 empresas fiscalizadas, 3,41% foram autuadas em razão do não cumprimento da Independência e 55º da República. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decretolei/del5452.htm>; Acesso em: 19 de setembro de 2012. 24 BRASIL. Lei nº.: 9.601, DE 21 DE JANEIRO DE 1998 - Dispõe sobre o contrato de trabalho por prazo determinado e dá outras providências. Publicado no Diário Oficial da União em 21 de janeiro de 1998; 177º da Independência e 110º da República. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/L9601.htm>; Acesso em: 19 de maio de 2012. 16 cota de deficientes, quando em 2010 até outubro, das 204.389 empresas fiscalizadas, 11,33% foram autuadas. A despeito de se verificar uma movimentação das empresas e no mercado de trabalho para ocupar as vagas que estariam em “aberto”, a realidade é que faltam pessoas com deficiência qualificados ou reabilitados, por esse motivo, ainda há muitas empresas que não tem condição de cumprir o exposto no artigo 93 da Lei 8213/91. A Lei é taxativa, aplicando apenas números e porcentagens, não tendo analisado o Legislador a particularidade de cada ramo de atuação, bem como a atividade desenvolvida, ou até a estrutura do Estado para qualificar um profissional com deficiência. A fiscalização e a autuação pelo não cumprimento da Lei tem ocorrido com maior freqüência como se verifica pelos números expostos acima, gerando processos judiciais que muitas vezes têm anulado as multas aplicadas. As empresas que exercem atividades incompatíveis com a porcentagem de cargos para pessoas com deficiência indicada na Lei, ou empresas que, apesar de abrir as vagas para contratações, não conseguem completar o número mínimo exigido, vêm obtendo êxito judicialmente na anulação das multas aplicadas pelo não cumprimento da “cota de deficientes”. Como saiu no jornal Valor Econômico, no dia 25.10.2010: “Em decisões recentes, os Tribunais Regionais do Trabalho de São Paulo, Rio de Janeiro e Brasília anularam multas sofridas pelas empresas, por entender que elas, apesar de não alcançarem os índices exigidos, empenharam-se no cumprimento da lei”. Pela Lei nº. 8.213, as empresas com mais de cem empregados são obrigadas a destinar de 2% a 5% de suas vagas para deficientes. Uma empresa de transportes do Rio com 984 funcionários, por exemplo, viu-se obrigada a contratar 40 empregados deficientes - 4% do total de trabalhadores - para cumprir a norma. Mesmo abrindo concurso, só conseguiu 26 funcionários. Por não atingir a meta, foi autuada em 2003 em cerca de R$ 200 mil, em valores atualizados. Na Justiça, a companhia conseguiu cancelar a multa. O juiz José Mateus Alexandre Romano, da 38ª Vara do Trabalho do Rio, entendeu que a aplicação da lei deve respeitar o princípio da razoabilidade. Segundo o magistrado, a companhia demonstrou que "as vagas existem, o que não existe é profissional qualificado no emprego". Para ele, "obrigar empresas a contratarem qualquer um, um despreparado, sem qualificação profissional, é o mesmo que colocar em risco o empreendimento". Esclarece também que além da dificuldade que é a contratação de profissionais qualificados com deficiência, existe a dificuldade da dispensa do profissional com deficiência, uma vez que em razão do exposto no parágrafo 1º do artigo 93 da Lei 8.213/91, se a empresa não comprovar a contratação de substituto em condição semelhante, pode vir a gerar uma estabilidade provisória ao profissional com deficiência, como se verifica nas decisões a seguir: “RECURSO DE REVISTA. ESTABILIDADE. EMPREGADO REABILITADO OU DEFICIENTE HABILITADO. ART. 93, § 1º, DA LEI Nº. 8.213/91. Da interpretação sistemática da norma submetida a exame se extrai a ilação de que o § 1º do art. 93 da Lei nº. 8.213/91 é regra integrativa autônoma, a desafiar até mesmo artigo próprio. Com efeito, enquanto o caput do 17 supracitado art. 93 estabelece cotas a serem observadas pelas empresas com cem ou mais empregados, preenchidas por beneficiários reabilitados ou pessoas portadoras de deficiência habilitadas, o seu §1º cria critério para a dispensa desses empregados (contratação de substituto de condição semelhante), ainda que seja para manter as aludidas cotas. É verdadeira interdição ao poder potestativo de resilição do empregador, na medida em que, antes de concretizada a dispensa, forçosa a contratação de outro empregado reabilitado ou portador de deficiência habilitado para ocupar o mesmo cargo daquele dispensado. Assim, o reclamante tem direito à reintegração ao emprego, até que a recorrida comprove a contratação de outro trabalhador na mesma situação. Recurso conhecido e provido. (...)”(PROC. Nº TST-RR-42742/2002-902- 02-00.8 – Ac. (4ª Turma) Relator- MINISTRO BARROS LEVENHAGEN - DJ - 12/03/2004)”. “ESTABILIDADE PROVISÓRIA. DESPEDIDA. VALIDADE. EMPREGADO REABILITADO. ART. 93, §º 1, DA LEI Nº. 8.213/9.1. O art. 93, § 1º, da Lei nº. 8.213/91, ao vedar a dispensa de empregado deficiente ou reabilitado antes da contratação de outro empregado em condição semelhante, não instituiu propriamente uma modalidade de garantia de emprego, mas um ato jurídico submetido a uma condição suspensiva: admissão de empregado de condição semelhante. 2. A inobservância da Lei, ante a ausência de prova do implemento da condição, acarreta a nulidade da despedida, seja em face da Lei Civil (CC de 2002, art. 125), seja em face da CLT (art. 9º), mormente porque frustra o patente escopo protetivo da Lei. 3. Exegese que se revela mais consentânea com o postulado constitucional da não discriminação do trabalhador portador de deficiência (art. 7º, XXXI, da CF). Ademais, a proteção conferida a tais empregados, em razão da fragilidade da situação em que se encontram, beneficia antes a coletividade que a si mesmos. 4. Não se sustenta a diretriz segundo a qual, em semelhante situação, caberia tão somente impor sanção de natureza administrativa ao empregador. A prevalecer tal orientação, frustar-se-iam os desígnios do legislador. Patente que resultaria vã a proteção que se quis oferecer aos empregados deficientes e reabilitados, malogrando-se o escopo da Lei e esvaziando-lhe o seu próprio sentido, pois decerto conviria mais ao empregador suportar o ônus financeiro da multa. 5. Recurso de revista de que se conhece e a que se dá provimento para determinar a reintegração do Reclamante e sua manutenção no emprego até que o Reclamado promova a contratação de substituto de condição semelhante. (TST; RR 199/2002-008-17-00; Primeira Turma; Rel. Min. João Oreste Dalazen; Julg. 09/06/2004; DJU 09/07/2004)”. Para que a criação da “cota de deficientes” possa dar certo de maneira efetiva, não gerando apenas multas, processos e transtornos as empresas e ao Estado, deveria ser criada uma estrutura para qualificar e reabilitar os profissionais, assim os mesmos poderiam se inserir e, principalmente, se manter no mercado de trabalho em qualquer circunstância. Passada cerca de uma década do inicio das fiscalizações da lei 8.213/91, benefícios podem ser percebidos como: maior acesso ao mercado de trabalho formal, melhora no nível econômico e independência financeira das pessoas com deficiência. Impactos significativos também podem ser identificados na dimensão subjetiva, como aumento da autonomia e da independência, e construção de uma nova identidade – “ser trabalhador” - que rompe com o estigma da vitimização. Destaca-se ainda que a lei de cotas tenha contribuído para promoção da diversidade e superação do preconceito no ambiente organizacional. Entretanto, estudos apontam dificuldades para o cumprimento dessa legislação e para a inclusão das pessoas com deficiência no trabalho: barreiras arquitetônicas, incluindo 18 dificuldade de transporte, falta de conhecimento em relação à deficiência, baixa qualificação e escolaridade, resistências por parte de dirigentes empresariais, falta de flexibilização do perfil exigido, falta de recursos das instituições para qualificação profissional, falta de apoio e ações do Estado,.atitude protecionista da família, receio em renunciar ao benefício de assistência continuada e a “força da lei” como principal razão para a contração das pessoas com deficiência. A compreensão dos avanços e dificuldades para a inclusão das pessoas com deficiência no mercado de trabalho requer uma análise que a contextualize historicamente no cenário do capitalismo de acumulação flexível, o que raramente observa-se nos estudos sobre o fenômeno. A exclusão é inerente ao capitalismo e a criação de políticas públicas que a reduzam é vista como prejudicial, à medida que diminui a competição, considerada o grande motor social. A raiz social da exclusão é omitida, e culpabiliza-se o excluído por sua condição, reafirmando a lógica do individualismo e de seu mérito. No que se refere à inclusão das pessoas com deficiência no trabalho, percebe-se a presença desse discurso de culpa do sujeito e individualização do problema quando se aponta como uma das principais justificativas para o não cumprimento das cotas as faltas de qualificação e escolaridade. Percebe-se o caráter ideológico de tal argumento, sua função de manter relações de dominação, à medida que transforma as conseqüências do processo histórico de segregação (restrição do acesso ao Trabalho) em justificativa para perpetuar a exclusão. Destaca-se ainda que os movimentos sociais de desinstitucionalização surgiram a partir de 1960, década que antecedeu o inicio do capitalismo de acumulação flexível. Esse se caracteriza pelo avanço tecnológico, crise do taylorismo25 e advento do toyotismo26 como nova tecnologia de gestão. A seguir passa-se a discutir de que forma essas características impactam na inclusão das pessoas com deficiência no trabalho. Em relação aos avanços tecnológicos, destaca-se o desenvolvimento de diversas tecnologias acessivas, compreendidas como equipamentos, serviços, estratégias e práticas concebidas para minimizar os problemas funcionais das pessoas com deficiência, como próteses, softwares para deficientes visuais, hardwares para deficientes físicos, pistas táteis, etc. As tecnologias acessivas visam proporcionar uma maior independência e qualidade de vida às pessoas com deficiência, à medida que ampliam as possibilidades de comunicação, mobilidades, habilidades, aprendizado e trabalho, contribuindo, portanto para a inclusão. As empresas, porém, muitas vezes desconhecem a existência dessas tecnologias já disponíveis ou consideram que envolvem alto custo. A nova tecnologia de gestão vigente – o toyotismo – caracteriza-se pela flexibilidade que se expressa nas práticas de just in time27, no trabalhador multifuncional e no trabalho em equipe. Os trabalhadores com deficiência podem ter dificuldade em assumir as exigências dessa polivalência devido à ausência da 25 Taylorismo é o modelo de administração de empresas. O taylorismo caracteriza-se pela ênfase nas tarefas, objetivando o aumento da eficiência ao nível operacional. 26 Toyotismo é um sistema de organização voltado para a produção de mercadorias. 27 Just in time é um sistema de administração da produção que determina que nada deve ser produzido, transportado ou comprado antes da hora exata. 19 aquisição de tecnologias; por limitações da própria deficiência e de políticas de qualificação profissional. Flexível, o capital encontra formas de transformar as adversidades em algo funcional a sua acumulação. Assim, diante da obrigatoriedade do cumprimento da lei, há empresas que passaram a definir o tipo de deficiência como critério para a contratação, privilegiando as que exigem menores adaptações ou que sejam funcionais à produção. Esses critérios inclusive podem ser mais decisivos na contratação do que a própria qualificação. Observa-se, assim, o predomínio do paradigma da integração/normalização, no qual é a pessoa com deficiência que deve se adequar à sociedade, e de uma “inclusão excludente”, à medida que se cria uma preferência pelos deficientes auditivos, por aqueles que possuem deficiências leves e imperceptíveis do ponto de vista estético, e obstáculos para deficientes visuais, intelectuais e deficientes físicos, sendo os dois últimos os que são em maior número no Brasil. Essa “preferência” por alguns tipos de deficiência conduz a uma disputa das empresas por trabalhadores que as possuem, o que gera uma rotatividade elevada dos mesmos. A lei da oferta e da procura, tão enaltecida no capitalismo, é rechaçada nessa questão, e passa-se a individualizar o problema, alegando-se que é preciso “trabalhar” essas pessoas, para que sejam comprometidas e permaneçam na empresa, auxiliando-as a cumprir as cotas. É perceptível que o direito ao trabalho é transformado, à medida que se espera que a pessoa com deficiência seja grata a empresa que a empregou e nela permaneça. Como forma de reduzir custo, aumentar a lucratividade e adaptar-se rapidamente as oscilações de mercado, no capitalismo de acumulações flexível foram implantadas diversas alterações nas legislações trabalhistas, implicando em perdas de direitos conquistados, fragilidade dos vínculos empregatícios, redução de salários e benefícios, cortes de pessoal, gerando uma precarização do trabalho. Há autores que denunciam a presença de formas precarizadas de trabalho na inserção das pessoas com deficiência nas empresas: desvios de função, remuneração incompatível com a função, formação de setores compostos apenas por pessoas com deficiência, restrição das mesmas a um único tipo de função. Há ainda o risco da inserção precarizada das pessoas com deficiência no trabalho tornar-se funcional ao capitalismo através das chamadas oficinas protegidas presentes em algumas instituições, nas quais, através de convênios com empresas, as pessoas com deficiência realizam o trabalho dentro da instituição, geralmente sem nenhum vinculo empregatício e recebendo uma remuneração irrisória. É nesse contexto que se deve compreender o receio de algumas pessoas com deficiência e de seus familiares em ingressar no trabalho formal e ter que abdicar ao benefício de assistência continuada. Se por um lado, o processo de exclusão propicia a construção de uma identidade estigmatizada, dependente e frágil, o que poderia gerar conformismo, em grupo focal realizado junto a trabalhadores com deficiência, percebe-se que o “não querer abrir mão do benefício” está mais vinculado a um temor de perda do emprego e consequentemente ficarem sem nenhuma fonte de renda e ainda somar à deficiência a marca do desemprego. Há inclusive o receio de que a lei deixe de ser fiscalizada, ou até abolida, e que tenham que concorrer em condições desiguais com os demais trabalhadores. 20 Um outro risco da inserção das pessoas com deficiência nas empresas é o de tomá-las como “agentes motivacionais”. Ao contrário do taylorismo, caracterizado pelo serviço braçal, o toyotismo privilegia o trabalho imaterial, que consiste no conjunto de atividades corporais, intelectuais, criativas, afetivas e comunicativas inerentes ao trabalhador. Nesse contexto, a área de gestão de pessoas torna-se estratégica: ao tentar produzir mais com menos funcionários, as empresas não têm outra escolha senão tentar envolver não só o corpo, mas a mente e a alma de cada um deles. Assim, algumas empresas fazem da contratação das pessoas com deficiência no trabalho um meio para reduzir conflitos internos, promover a maior colaboração entre os trabalhadores, aumentar o comprometimento e a produtividade, à medida que são ainda colocadas como “exemplo” de superação e dedicação. A contratação das pessoas com deficiência torna-se funcional ao capitalismo também quando é utilizada como estratégia de marketing (responsabilidade social) e para reduzir conflitos externos (colocando-as na “linha de fogo” em setores de atendimento ao público). O capitalismo flexível também se caracteriza pela fragilidade dos vínculos sociais como conseqüência da exacerbação do individualismo e da competição: o outro é visto como um inimigo, um concorrente que deve ser vencido. A valorização do indivíduo sobre o coletivo, não implica, entretanto, em uma valorização e respeito à singularidade, mas na massificação dos sujeitos. A partir dessa perspectiva, a inserção social das pessoas com deficiência possibilitada é pautada no paradigma da integração/normalização, que defende a necessidade da pessoa com deficiência se adaptar à sociedade e aos padrões de “normalidade”, “beleza” e “produtividade” estabelecidos. Já o paradigma da inclusão, pauta-se no resgate da cidadania, das potencialidades, da autonomia e da independência e no respeito e valorização da diversidade, sendo que cabe a sociedade criar condições para atender as especificidades e necessidades das pessoas com deficiência, promovendo sua conscientização. Assim, a resistência em contratar pessoas com deficiência por parte das empresas, não é decorrente de uma mera falta de conhecimento sobre a questão da deficiência – o que poderia ser facilmente sanado haja vista a facilidade de se obter informações atualmente – mas vincula-se ao fato da inclusão questionar o individualismo, a competição, a padronização dos sujeitos, à medida que requer um olhar e uma ação solidária frente às singularidades das pessoas com deficiência. VI – Conclusão As leis do ordenamento jurídico brasileiro sobre a proteção dos direitos trabalhistas das PCD’s são boas, o que tem necessidade é de um melhor cumprimento e fiscalização para que cumpram. Para que essas leis sejam exemplos não podemos nos perder em negligencias. Para ter uma melhor execução, a legislação tende a acompanhar o estágio de evolução em que se encontra a sociedade na qual ela pretende legislar. A sociedade brasileira está amadurecendo para entender, cumprir e fazer cumprir as leis de proteção aos direitos não só trabalhistas, mas como um todo das Pessoas Com Deficiência. 21 A legislação brasileira de proteção aos direitos das pessoas com deficiência inclui-se entre as melhores do mundo. Não basta, contudo, legislar para obter os resultados socialmente desejáveis: é de rigor cumprir e fazer cumprir as leis. As leis brasileiras sobre a proteção dos direitos dos deficientes precisam ser cumpridas. De nada vale a excelência da lei quando sua execução é negligenciada. Como em toda parte, no Brasil existem boas leis, mas o problema não reside na busca da boa qualidade da legislação, e sim em sua eficácia. Lei eficaz é aquela que se cumpre espontaneamente. Para ser executada, a legislação exige sintonia com o momento e o estágio de evolução em que se encontra a sociedade na qual ela pretende atuar. A sociedade brasileira está perfeitamente amadurecida para acatar - cumprir e fazer cumprir - as leis de proteção aos direitos dos deficientes. THE DIFFICULTIES OF PEOPLE WITH DISABILITIES IN THE LIGHT OF LABOR ADAPTED Abstract: With the Constitution of 1988, Brazil turned to the standards of protection to people with disabilities. Among those theyare intended to rule over labor protection of the disabled. The constitutional articles aimed at the work protecting and social lifeof the disabled person. Keywords: accessibility - Law - Disability - Work.