ANÁLISE DA APLICAÇÃO DO MÉTODO DE TIEDERMAN
AO ESTUDO DE ESTRUTURAS COERENTES
Nisia Krusche
Departamento de Geociência - Fundação Universidade de Rio Grande
Caixa Postal 474, 996201-900, Rio Grande, RS
e-mail:[email protected]
Abstract
Tiederman method for detecting bursts in the neutral atmospheric surface layer was applied to a
data set from Iperó’s field experiments. It is shown that, in this particular case, the method is
dependent on the detection level criteria.
These bursts share with the coherent structures known as ramps similar characteristics of initial
longitudinal turbulent velocity, thus enabling comparison between different methods. The number of
bursts found by Tierdeman method is similar to the number of ramps identified by intermittent
function. The difference between them can be due to the different levels of data measurement, which
was 11.4 m for the longitudinal velocity and 9.4 m for the temperature (used to detect the ramps).
Palavras chaves: estruturas coerentes, turbulência atmosférica, método de Tiederman.
1. Introdução:
No escoamento turbulento de camada limite, definido a princípio como caótico, foram
identificadas, nas últimas décadas, estruturas quasi-determinísticas de grande escala (Hussain, 1983).
Estas estruturas coerentes tem sido extensamente estudadas, por vários métodos. Um destes métodos é
aplicação de técnicas de amostragem condicional, que permitem separá-las do escoamento de menor
escala. Estas técnicas tem como limitação, em geral, a escolha subjetiva de um limiar de seleção de
eventos.
Dentre estas estruturas coerentes, aquelas denominadas do tipo rampa são caracterizadas por
um aumento (decréscimo) gradual do sinal, seguido por um descrécimo (aumento) brusco, nas séries
temporais de temperatura, no período convectivo (estável). Elas estão associadas a um campo de
velocidade característico, um movimento ascendente (w’>0 e u’<0, onde w’ é a componente vertical
da perturbação de velocidade e u’, a componente longitudinal), no período inicial, e descendente com
aceleração longitudinal (w’<0 e u’>0) , no período final (Gao et al., 1992). Em um trabalho anterior
(Krusche, 1997), as características deste tipo de estruturas foram determinadas usando quatro técnicas
de amostragem condicional. Concluiu-se que a técnica de função intermitência, com formulação
objetiva de escolha do critério de seleção, fornece resultados semelhantes às demais técnicas.
Por outro lado, no estudo do escoamento turbulento de camada limite, foram detectados
eventos explosivos (“bursts”), que podem ser definidos como uma ejeção do fluido (w’>0 e u’<0) a
partir da superfície, causada pela passagem de vórtices (Robinson, 1991). Recentemente, foi
desenvolvido um método, que se supõe independente da escolha do limiar de seleção, para detectar
este tipo de eventos explosivos e excluir os de curta duração, que estariam ocorrendo, na realidade,
durante os eventos de maior duração. Este método foi formulado por Tiederman, para o estudo de
camada limite em laboratório. Foi demonstrado por Högström e Bergström (1996) que ele se aplica ao
estudo da camada limite atmosférica neutra.
O movimento inicial das estruturas do tipo rampa e dos eventos explosivos tem, portanto, as
mesmas características. Logo, pode-se comparar os resultados da aplicação de técnicas diferentes,
desde que estes se restrinjam àqueles relacionados ao que os dois tipos de eventos tem em comum,
como o número de eventos por período estudado.
Propõe-se aplicar o método de Tiederman, verificar sua independência do limiar de corte e
comparar com os resultados obtidos pela aplicação da função intermitência para determinação de
estruturas coerentes do tipo rampa.
2. Metodologia:
Os dados que serão analisados foram coletados durante IV Experimento de Iperó, entre 8 e 21
de março de 1993. Durante esta campanha de medidas, foram utilizados três conjuntos de sensores de
turbulência (anemômetro sônico, termômetro de arame fino e higrômetro de Kripton, que medem,
respectivamente, perturbação de velocidade vertical, de temperatura e de umidade específica)
colocados em uma torre de 12 m, nos níveis de 3, 5 e 9,4 m acima da superfície. Anemômetros do tipo
Gill mediram as componentes longitudinal e transversal da velocidade do vento e estavam instalados
no nível de 11,4 m. As medidas foram realizadas com freqüência de 1 Hz. A superfície, onde foi
instalada a torre, era plana e coberta por uma plantação de milho em estágio de crescimento, com altura
média de 50 cm, com área de influência (“fetch”) de 500 m em todas as direções (Oliveira, 1993).
A função intermitência seleciona os eventos para os quais o valor do sinal de temperatura é
maior que um limiar (T’>kc), durante um período mínimo de 10 segundos. Este limiar é o valor,
proporcional ao desvio padrão da série (kc=κcσT), para o qual o maior número de eventos é detectado
(Krusche, 1997).
O método de Tiederman, descrito por Högström e Bergström (1996), consiste em selecionar os
eventos para os quais o sinal de velocidade longitudinal é menor do que um limiar negativo
proporcional ao desvio padrão da série (u’<ku= - L σu) até o momento em que a velocidade
longitudinal torna-se maior do que um quarto deste limiar (u’<ku= -0,25 L σu). Högström e Bergström
(1996), doravante denominado HB, demonstraram que os resultados da aplicação deste método a dados
de turbulência atmosférica independem da escolha de L, no intervalo 0,3≤L≤1,5. Define-se, então, o
intervalo de tempo Te, entre o fim de uma ejeção e o início da outra, e constroi-se um gráfico
semilogarítimo da distribuição de freqüência acumulada de Te. Este gráfico mostra uma divisão entre
dois regimes estatísticos, pela diferença de inclinação da curva, e permite determinar um valor crítico
de Te. Valores menores do que este valor crítico indicam eventos explosivos não fundamentais. Uma
nova série é então formulada, onde todas as ejeções mais próximas que este valor crítico são associadas
a uma mesma ejeção. O intervalo médio entre eventos explosivos, TB, é então obtido pela divisão do
tamanho da série em estudo pelo número total de eventos.
Como esta metodologia aplica-se no caso de estratificação térmica quase neutra (|L>100, onde
Lé o comprimento de Obukhov), foramselecionados, dentro os dados já analisados (Krusche, 1997), o
conjunto de seis arquivos, composto por 7128 dados, para os quais esta condição era aplicável.
Utilizou-se as medidas de velocidade longitudinal e de temperatura do nível superior.
3. Resultados
Buscou-se, em primeiro lugar, determinar se havia variação significativa dos resultados para a
variação do limiar L entre 0,2 e 1,4. A figura 1 mostra a distribuição de freqüência acumulada para três
valores de L. Constata-se, como principal diferença entre este gráfico e o gráfico similar a este
apresentado por HB, o fato dos valores de probabilidade acumulada, no intervalo de 0≤Te≤20s, serem
uma ordem de grandeza maior, enquanto o valor de corte de Te aqui determinado (7 s) é o triplo do por
eles encontrado (1,9 s). Uma das possíveis explicações para esta diferença é a freqüência das medidas,
que é de 20 Hz no caso de HB. Medidas realizadas com freqüência maior implicam em maior
sensibilidade às pequenas variações e na detecção de um número maior de eventos menores.
2
Freqüência Acumulada (%)
10
L=0,4
L=1,0
L=1,4
1
10
0
4
8
12
16
20
Te (s)
Figura 1: Distribuição de Freqüência Acumulada em função do valor de corte Te, para L=0,4; 1,0 e
1,4.
O valor de corte de Te, de 7 s, não varia significativamente com L. Entretanto, o intervalo
médio entre os eventos explosivos, calculados após a agregação dos eventos menores do que 7 s, varia
entre 54,71±26,97 s, para L =0,4, e 87,51±58,64, para L=1,4, passando por 67,01±45,23 s, quando
L=1,0. O valor médio encontrado por HB para z≅10 m e L=1,0 é de cerca de 20 s. A grande variação
entre os valores de TB pode ser atribuída, em parte, ao pequeno conjunto de dados analisados.
Por outro lado, os eventos explosivos ocorrem durante 28,83±6,9 % do tempo, o que é similar
ao valor de 30 % encontrado por HB, para L=1,0.
O número médio de eventos explosivos, a cada 20 min, é de 23,82±11,50, enquanto o número
médio de estruturas coerentes do tipo rampa detectadas usando função intermitência é de 21,39 ±6,16.
Esta diferença pode ser explicada, em parte, pela diferença na altura da medida de temperatura T’ (9,4
m) e na de velocidade longitudinal u’ (11,4 m). Tanto o número de estruturas coerentes do tipo rampa,
quanto o número de eventos explosivos variam com a altura (Krusche, 1997, HB, 1996).
4. Conclusões:
A aplicação do método de Tiederman, para este conjunto de dados, medidos com baixa
freqüência, mostrou que existe uma dependência do tempo médio de intervalo entre eventos TB com o
limiar de seleção L dos eventos explosivos (“bursts”). Para L=1,0, os eventos explosivos ocorrem
durante 30% do tempo.
O número de eventos explosivos detectados usando o método de Tiederman é similar ao
número de estruturas coerentes detectadas através da função intermitência. A diferença entre os dois
pode ser explicada pela diferença da altura de medida da velocidade longitudinal e da temperatura.
Esta última conclusão sugere que o método de Tiederman é adequado para realizar uma análise
das características das estruturas coerentes, no seu momento inicial. Entretanto, será necessário aplicálo a um conjunto maior de dados, medidos com freqüência mais alta, para que se verifique sua
independência com a escolha do limiar de seleção de evento.
5. Agradecimentos:
Ao Dr. Leonardo de Sá, pela sugestão de aplicação deste método, ao Dr. Amauri Pereira de
Oliveira, pelas inúmeras discussões sobre estruturas coerentes e seus métodos de análise, e aos
participantes dos experimentos de Iperó, que possibilitaram a aquisição dos dados aqui analisados.
6. Referências:
Gao et al., 1992, Conditional Analysis of Temperature and Humidity Microfronts and Ejection/Sweep
Motions within and above a Deciduous Forest, Bound.-Layer Meteorol., 59, 35-57.
Hussain, A.K.M.F., 1983, Coherent Structures-Reality and Myth, Phys. Fluids, 9 (4), 682-689.
Högström, U. e H. Bergström, 1996, Organized Turbulence Structures in the Near-Neutral
Atmospheric Surface Layer, J. Atmos. Sci., 53 (17), 2452-2464.
Krusche, N., 1997, Estudo de Estruturas Coerentes na Camada Limite Superficial, em Iperó, SP, Tese
de Doutorado, Departamento de Ciências Atmosféricas do Instituto Astronômico e Geofísico da
Universidade de São Paulo.
Robinson, S., 1991, Coherent Motion in the Turbulent Boundary Layer, Annu. Rev. Fluid Mech., 23,
601-639.
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