Câncer Apesar de todo o avanço científico que caracteriza nosso tempo, ainda há muito mais por saber do que o que já se sabe. Fica ainda muito espaço para a humildade e para a pesquisa. Uma boa demonstração disso é o estudo da remissão espontânea do câncer (também chamado de “neoplasia”); quer dizer, os casos em que o câncer desaparece “sozinho”. Ele “involui”, regride, e a pessoa, simplesmente, sara. O câncer desaparece. O câncer, dito de maneira muito simples, é um grupo de células diferentes, mutações. O fato é que constantemente nosso corpo está produzindo esse tipo de célula “defeituosa”. As células de nosso corpo não são idênticas. Assim como as pessoas. Mas, pequenas variações são toleradas, enquanto algumas variações podem dar problema. Qualquer produção, vez ou outra, produz elementos fora dos padrões, de modo que não se pode mais aproveitar. Para isso há o controle de qualidade. Como numa fábrica, por exemplo, de calças. A produção corre normal, mas de vez em quando, há uma calça com um corte errado ou uma costura ruim. O controle de qualidade identifica essas calças e as joga fora. Assim é também como nosso corpo: células diferentes, que não vão trabalhar direito são procuradas constantemente por um tipo de célula de nossa defesa chamada NK (Natural Killer – em inglês, algo como “matadoras”). Mas, de vez em quando, há uma deficiência no trabalho das células NK e as células diferentes passam a se multiplicar até se tornarem um problema para o corpo. Depois de certo ponto, fica muito difícil controlar o número dessas células, principalmente porque elas vão se espalhando. Apesar disso, a cura espontânea é um fenômeno real. Isso deixa a todos muito intrigados. Um pesquisador, chamado Stoll, em 1977, fez um levantamento dos casos desse tipo nas publicações científicas e coletaram 176 casos, fazendo a observação de que esse número pode ser ainda muito maior. A pergunta seria como isso poderia acontecer. Como o próprio câncer é uma doença que envolve o nosso sistema de defesa, evidentemente, qualquer coisa que afete nosso sistema imunológico vai ter algum impacto sobre a questão. Isso vale, não só para o aparecimento e manifestação do câncer, como para seu agravamento, mas também para sua remissão espontânea. Mais uma vez, demonstrando o tão pouco que entendemos e sabemos... Uma coisa que é comum em muitos dos pacientes que têm esse “desaparecimento” do câncer é uma fé muito poderosa. Essa “fé” pode ser no tratamento, como um caso que ficou famoso no Hospital das Clínicas, onde um homem foi operado e se constatou que não havia mais nada a fazer. Os médicos nada fizeram, apenas cuidaram para que o paciente se restabelecesse da cirurgia e voltasse para casa. Para total surpresa destes médicos, anos depois, uma outra pessoa, também moradora da distante cidadezinha em que vivia o “desenganado” disse que o “fulano de tal” estava ótimo e que tinha sarado completamente depois do tratamento que os médicos tinham feito com ele. Foi pedido para que o “curado” voltasse para exames e ele compareceu muito agradecido pelo “tratamento miraculoso” e foi constatado que realmente, ele estava ótimo. Tudo indica que a crença no tratamento foi o remédio que o curou. Mas, é a fé religiosa parece ser a mais eficiente. Stoll cita o caso de uma freira que tinha um tipo de câncer muito grave. Suas colegas freiras começaram a orar por ela. Ela recuperou-se da cirurgia rapidamente, assim como de seu estado de grande debilidade. Voltou a trabalhar e viveu ainda mais sete anos, tendo vindo a falecer de embolia pulmonar, sem o menor sinal do câncer. Ikemi, uma das maiores autoridades mundiais no assunto, acompanhou cinco casos de câncer em que houve cura espontânea. O único dado em comum destes cinco era o apego à religião: destes, três eram religiosos e dois se tornaram religiosos depois que a neoplasia apareceu. O que parece acontecer é que acontecimentos ou pensamentos que fazem as pessoas se erguerem emocionalmente, faz com que o sistema imunológico reaja muito melhor e consiga dar conta de uma situação muito difícil. Não se deve nunca subestimar o poder de se acreditar em uma coisa. A fé faz com que a gente reúna forças e todo o nosso corpo trabalhe para o que queremos. É comum pessoas em situações extremas, como estar perdidas em geleiras ou coisas assim, suportarem provações consideradas impossíveis. Isso porque simplesmente acreditou que conseguiria. Mas, todas essas coisas parecem assim estranhas e difíceis de se compreender apenas porque cultivamos o hábito de pensar sempre em “corpo e mente” separadamente. Se encararmos tudo como uma coisa só, parece natural que se cremos fortemente em algo e nossas emoções se apóiam em alguma coisa que consideramos digna, todo nosso corpo reage do mesmo modo, cada parte a seu modo. Dizem que Jesus, ao realizar seus milagres, se justificava dizendo que o que havia curado mesmo as pessoas era a sua fé... Ao que tudo indica, o comentário não era apenas uma demonstração de humildade. João Paulo Correia Lima Psicólogo clínico – Diretor Científico da Associação Brasileira de Medicina Psicossomática E-mail [email protected]