Os Farmacêuticos são e têm sido solução
de muitos problemas do Sistema de Saúde
N
os últimos meses temos assistido à quase diabolização dos farmacêuticos e da sua actividade
na farmácia. É estranho que, tendo na área da saúde diversas autoridades reguladoras – a
Entidade Reguladora da Saúde e o INFARMED – seja uma entidade nomeada pelo ministro da
Economia a constantemente opinar sobre um sector que, em termos organizativos e regulamentares,
está, em todos os países, integrado na área da saúde.
Bastonário
Este facto contradiz todas as tendências que se registam nos países desenvolvidos, que, em consonância
com recomendações da OMS e do Conselho da Europa, procuram valorizar o farmacêutico como profissional de saúde e a farmácia como parte integrante do Sistema de Saúde, apostando em soluções
inovadoras que afastam cada vez mais a componente comercial. Aliás, as directivas comunitárias sobre
e d i t o r i a l
ensino farmacêutico, revistas e consolidadas em 2005, têm a orientação clara de formar profissionais
revista ordem dos farmacêuticos
de saúde e não “retalhistas”, como alguns, certamente por ignorância, tentam reduzir a profissão.
Dominante na Europa, o modelo de farmácia orientado para a Saúde Pública visa satisfazer os consumidores e os doentes e privilegia a equidade no acesso e a qualidade do serviço prestado.
Por outro lado, esquece-se igualmente que o mercado da saúde, em particular o do medicamento, é, em
todos os países desenvolvidos, fortemente regulado pelo Estado, que é o seu principal financiador.
A título de exemplo, convém referir que mais de 90 por cento dos medicamentos são de prescrição médica
obrigatória, sem livre escolha do consumidor, e que o seu custo é fortemente suportado pelos contribuintes.
A regulação da saúde e dos medicamentos não pode, por isso, ser igual à regulação de produtos e serviços
de mercados que funcionam de forma diferente, como são o caso das “utilidades” (energia, telecomunicações e transportes) e “comodidades” (bens alimentares, produtos de mercearia, entre outros).
É assim pouco crível que a sacralização da concorrência no sector da saúde possa produzir quaisquer
efeitos positivos que se tenham verificado noutros mercados e, com segurança, não produzirá melhorias de
eficiência no sistema, nem ganhos em termos sociais ou económicos para o cidadão. Aliás, quem o afirma
são prestigiados economistas, como Michael Porter e Mossiallos, em diversos textos de referência na
Economia da Saúde. Inclusive nos poucos países com legislação mais liberal, como é o caso do Reino Unido,
foi o próprio Parlamento a travar tentativas de maior liberalização, consciente das problemáticas anteriormente causadas.
No mesmo registo, as recentes experiências de liberalização na Noruega e Islândia demonstram, através
de estudos independentes, que não foram atingidos os objectivos de diminuição dos preços e da despesa
do Estado, assim como não melhorou a acessibilidade às farmácias. Pelo contrário, aprofundaram-se as
assimetrias regionais, diminuiu o número de farmacêuticos por farmácias e mais grave será o facto de
passarem a existir assinaláveis diferenças de preços consoante a localização geográfica das populações.
A Ordem dos Farmacêuticos, conforme publicamente divulgou com a sua Declaração de Princípios, reafirma
a defesa do modelo de farmácia como espaço de saúde. Esta deverá continuar a ser a referência para
a farmácia portuguesa. É o que, de resto, acontece na maioria dos países europeus, ao contrário dos
países em vias de desenvolvimento que não têm sistemas de saúde organizados ou dos países desenvolvidos, caso dos Estados Unidos da América, onde os gastos mais elevados em saúde em função do
PIB se traduzem em preços dos medicamentos mais caros para os doentes e em indicadores de saúde
muito piores que em Portugal.
A Ordem dos Farmacêuticos reafirma a sua disponibilidade para encontrar com o Ministério da Saúde
soluções para os problemas que possam existir com a cobertura farmacêutica no nosso país, a exemplo
do que, após a criação, em 1998, de um grupo de trabalho com o INFARMED e a Associação Nacional
dos Municípios, levou, com serenidade e sustentabilidade técnica, à abertura de mais de duas centenas
de novas farmácias.
As propostas da Autoridade da Concorrência, em rigor, apenas propõem mais umas dezenas de farmácias
para todo o país e entregarão o sector a dois ou três grupos económicos, limitando irremediavelmente
a intervenção soberana do Estado português.
Confiamos, assim, no bom senso do Governo, pois os farmacêuticos portugueses concordam com as grandes
orientações estratégicas para o Sistema de Saúde inscritas no Programa do Governo, em particular as
que salientam a prevenção, educação e promoção da saúde e a reorientação para os cuidados primários.
Os farmacêuticos, como profissionais de saúde, continuarão a ser solução para muitos dos problemas que
o nosso sistema de saúde enfrenta, na certeza de que os portugueses desejam verdadeiramente continuar
a usufruir de farmácias orientadas para lhes prestar um excelente serviço através de profissionais de
saúde qualificados, competentes e responsáveis.
Aranda da Silva
Bastonário da Ordem dos Farmacêuticos
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