PORTAL SUL21 05/03/2012
“Contratos de pedágios não serão prorrogados”, garante Beto Albuquerque
Em 2013 terminam os contratos das concessionárias que administram sete polos de pedágios no Rio Grande do
Sul, cedidos à iniciativa privada desde 1998. São 1,8 mil km de rodovias pedagiadas, dos quais a Univias através das empresas Metrovias, Sulvias e Convias - administra 1000 km.
Apesar das conversas que o governo do Estado vem mantendo com a Univias, o secretário Estadual de
Infraestrutura e Logística, Beto Albuquerque (PSB), garante que não haverá renovação dos contratos conforme prometeu o governador Tarso Genro (PT) durante a campanha eleitoral. "Não existe possibilidade de
se prorrogar os atuais contratos. Se alguém sonhou com isso, perdeu tempo", assegura o socialista.
Nesta entrevista ao Sul21, Beto detalha os estudos para a elaboração de um novo modelo de adminsitração dos
pedágios no Estado, explica como estão sendo conduzidos os editais para novas concessções nas rodoviárias
gaúchas e avalia a situação do Departamento Autônomo de Estradas de Rodagem (Daer), fruto de
investigações por uma força-tarefa dos órgãos públicos no ano passado.
O secretário de Infraestrutura ainda comenta as eleições municipais deste ano em Porto Alegre. Filiado ao PSB
e com uma expressiva votação nas eleições que disputou, Beto e seu partido apoiarão a pré-candidata do
PcdoB, a deputada federal Manuela D'Ávila. "Temos lutado por abrir nosso espaço político nesse campo da
esquerda", considera.
"Vamos avaliar a possibilidade de entregarmos as rodovias federais. Quando acabar os atuais contratos, o
governo federal receberá as BRs de volta e fará com elas o que quiser"
Sul21 - Os contratos dos atuais polos de pedágios terminam em 2013. Quais possibilidades são trabalhadas
pelo governo nessa questão?
Beto - A grande questão que está posta é clara é que não há possibilidade de se prorrogar os atuais contratos.
Se alguém sonhou com isso, perdeu tempo. Esse modelo não deu certo, é caro, não fez obras e não ampliou as
estradas. Não é possível que agora, faltando um ano e meio para acabar os contratos, surja o milagre de as
concessionárias poderem reduzir tarifa e fazer obras. Se a Univias diz isso, imagine o que poderemos conseguir
com uma concorrência.
Sul21 - Como será o estudo de um novo modelo de pedagiamento no Estado?
Beto Albuquerque - Está em curso a licitação de uma consultoria para estudar isso. Mas trabalhamos também
com outra possibilidade. No dia 13 terei uma reunião com o Ministério dos Transportes, o Dnit e o BNDES.
Vamos negociar com a Empresa Brasileira de Projetos (EBP), que tem feito as modelagens dos pedágios
federais. É uma empresa pública de direito privado capitaneada pelo BNDES e vocacionada para construir
engenharias financeiras capazes de produzir negócios. A vantagem da EBP é que ela pode ser contratada sem
licitação, já que não será pago o custo do projeto. Quem pagará é quem vencer a licitação.
Sul21 - Já está decidido se o modelo será elaborado pela EBP ou pela empresa que vencer a licitação?
Beto - Será uma coisa ou outra. Se o governo optar pela EBP, a licitação será encerrada. É possível fazer o
edital para a consultoria, mas não precisamos contratar a empresa. Se o governo perceber que a melhor e
menos onerosa solução for a EBP, a licitação será abandonada.
Sul21 - Hoje, os polos de pedágio reunem rodovias federais e estaduais. O governo cogita assumir apenas as
estradas gaúchas?
Beto - Precisamos avaliar uma coisa muito clara: por qual razão temos que resolver problemas das rodovias
federais? A maior parte dos polos de pedágios do Rio Grande do Sul é composta de rodovias federais. Temos
somente 800 km de rodovias estaduais nesses polos, principalmente no de Gramado e no de Santa Cruz. Em
todos os demais o Estado é coadjuvante, mas é o responsável pela concessão. Vamos avaliar a possibilidade de
entregarmos as rodovias federais. Quando acabar os atuais contratos no ano que vem, o governo federal
receberá as BRs de volta e fará com elas o que quiser. Não precisamos resolver o problema do governo federal.
Temos que resolver os nossos problemas. Esse é um debate que ainda será feito ao longo dos estudos.
Sul21 - A Univias alega que há uma dívida de mais de R$ 1 bilhão por parte do Estado, que historicamente não
teria cumprido determinações do contrato de concessão.
Beto - É difícil uma concessão não ter passivos, até porque há fatores externos que podem gerá-los. Mas tem
gente achando que devemos discutir antes o passivo e depois a licitação. Não, primeiro vem a licitação. Depois,
quem acha que é credor de alguma coisa que vá ao Judiciário resolver. Recebi uma notificação extrajudicial do
grupo Univias que é um desrespeito ao Estado, querendo me impor a obrigação de aceitar os cálculos que o
governo Yeda (Crusius, PSDB, 2007-2010) fez. Por que tenho que aceitar esses cálculos? Só por que são bons
para a Univias? Esse é um assunto que estará em litígio. E litígio a gente faz não nas mesas de negociação,
mas no Judiciário. O que queremos é um novo modelo que empreenda, que construa e que custe menos. O
passivo, ou desequilíbrio, não pode ser a pauta principal, nem usado como chantagem. Até porque ninguém
sabe exatamente se há desequilíbrio e o valor dele. Os números e a metodologia dos cálculos são diversos. De
1997 a 2005, o termo aditivio número 1 que fizemos no governo Olívio Dutra (PT, 1999-2002) zerou todos os
passivos. Se há algum desequilíbrio é de 2005 para cá.
Sul21 - E as empresas têm cumprido com o acordado no contrato de concessão?
Beto - Iremos fazer um inventário patrimonial de todas as rodovias. Veremos como deveriam estar as estradas
de acordo com o programa de concessão. Começarei a apurar os desequilíbrios em favor do Estado. Se for o
caso, depois de discutir desequilíbrios, temos que ver os que estão em benefício do cidadão. Discute-se apenas
o passivo reivindicado pela concessionária.
Sul21 - A Univias tem feito propostas ao governo para continuar com a concessão. A empresa prometeu
rebaixar a tarifa, a taxa de retorno e aumentar os investimentos.
Beto - A decisão da Univias de ofertar uma tarifa bem menor que a atual, incrementar benefícios e quitar
eventuais desequilíbrios para ter apenas 10 anos de renovação significa que o negócio era muito bom. E
significa também para o poder concedente que se isso tudo for colocado em concorrência será possível reduzir
ainda mais as tarifas e agregar mais investimentos, porque poderá ser uma concorrência sobre 20 ou 25 anos
de concessão.
"Ainda precisamos vencer a burocracia e a lentidão na tomada de decisões e na execução de uma obra"
Sul21 - O governo do Estado vinha dialogando com a Univias através da Assessoria Superior do Governador.
Isso foi encarado, inclusive por setores da base aliada e do PT, como uma negociação com a empresa para a
prorrogação dos atuais contratos.
Beto - Eu nunca sentei para conversar com a Univias… Acho que ela não está proibida de propor, mas temos
um compromisso com a sociedade de não renovar os contratos.
Sul21 - Mas, enquanto secretário de Infraestrutura, o senhor não se sentiu desprestigiado ao não ser chamado
para conversar com a Univias sobre um tema que diz respeito à sua área?
Beto - Não tenho disposição de negociar prorrogação de contratos, por isso não me senti preterido. E a decisão
final de qualquer coisa que venha a acontecer é do governador. Não é minha nem do João Vitor (Domingues,
secretário da Assessoria Superior).
"Nosso grande desafio no governo Tarso não é correr atrás de dinheiro para fazer estrada, é atropelar a
burocracia para gastar o recurso que temos"
Sul21 - O Departamento Autônomo de Estradas de Rodagem (Daer) passou por uma força-tarefa dos órgãos
públicos para investigarem irregularidades. Terminada a investigação, que mudanças podem ser feitas no
órgão?
Beto - A força-tarefa foi muito importante para que não se cometam injustiças generalizadas. Em qualquer área
do serviço público pode haver problemas, mas eles precisam ser identificados, para que não paire a ideia de
que a instituição está contaminada. O Daer é um órgão que construiu a estrutura viária do Estado e tem
técnicos muito bons. Mas também tem seus vícios históricos. Foi desmontado ao longo dos anos em termos de
estrutura e pessoal. A força-tarefa nos ajudou a inventariar uma série de problemas que estamos corrigindo e
apurando responsabilidades. Já está em licitação a contratação de uma consultoria que vai ajudar a organizar a
gestão de processos e pessoas no Daer. Não há hoje uma gestão rápida e ágil no Daer. E estamos colocando
relógio biométrico para controlar a presença. Isso irá valorizar quem trabalha corretamente e faz com que a
instituição seja respeitada. Também fizemos concurso para reforçar a capacidade fiscalizatória do Daer e iremos
incorporar 25 novos engenheiros. A prioridade é reforçar as equipes de fiscalização, onde há muita deficiência.
Sul21 - Essas mudanças são necessárias para melhorar o funcionamento do Daer?
Beto - Ainda precisamos vencer a burocracia e a lentidão na tomada de decisões e na execução de uma obra.
Nosso grande desafio no governo Tarso não é correr atrás de dinheiro para fazer estrada, é de atropelar a
burocracia para gastar o recurso que temos. Temos R$ 2,6 bilhões para construir acessos municipais,
interligações regionais, restaurar, duplicar e manter rodovias. É preciso atropelar a burocracia, a lerdeza e a
falta de planejamento para poder executar o orçamento.
Sul21 - O senhor defendia a criação de uma agência pública para assumir algumas funções do Daer.
Beto - Passamos a trabalhar com mais clareza sobre isso, é um assunto que voltarei a conversar com o
governador. A proposta que iremos formular ao governo é a criação de uma empresa pública de direito privado
para administrar os pedágios comunitários, estações rodoviárias, linhas de ônibus e controladores de
velocidade. Isso fará com que os engenheiros e os profissionais qualificados do Daer se foquem no seu papel
precípuo, que é construir e manter estradas. Uma companhia como essa pode operar com um quadro de
pessoal enxuto e vencer a burocracia.
Sul21 - O dinheiro arrecadado pelos pedágios comunitários, administrados pelo Daer, hoje vai para o caixa
único do Estado. Como o governo pretende redirecionar esses recursos?
Beto - O pedágio comunitário não consegue dar o resultado que poderia graças à burocracia que está
incrustrada no funcionamento do Daer. Com a criação dessa companhia, o dinheiro passará longe do caixa
único. Será possível alavancar financiamentos para fazer investimentos nos pedágios comunitários dando os
recebíveis das praças como garantias. Será possível sair dessa burocracia infernal, em que demora oito meses
para poder contratar uma empresa para pintar ou roçar uma estrada. Sinto vergonha quando passo por um
pedágio comunitário e vejo deficiência na sinalização ou capina alta. O cidadão está pagando e deveria ter uma
estrada de primeira qualidade. A gestão disso precisa mudar e para isso é fundamental termos uma outra
estrutura.
Sul21 - Como surgiu a decisão do governo de fazer licitação para a administração das rodoviárias no Estado?
Beto - Na força-tarefa do Daer, verificamos que o órgão sofre muitas decisões judiciais por conta das estações
rodoviárias. Fizemos um levantamento e percebemos que das 325 rodoviárias do Estado, 280 estão com a
concessão vencida. Temos 78 estações com sentenças transitadas em julgado na Justiça. Algumas, inclusive,
com decisão do STF. O Estado estava ignorando totalmente essa realidade. O governo Yeda fez uma licitação
para as rodoviárias dos pequenos municípios. Achamos que não só os pequenos têm que respeitar a lei das
licitações e das concessões, os grandes também. Até o final de março a Central de Compras do Estado vai
receber os 280 editais de todas as rodoviárias. Desde que iniciamos o processo, já foram mais de 40 licitados.
Não estamos contra ninguém, não é uma briga com os concessionários. O fato é que esse é um sistema que
tem que ser trazido de volta à legalidade. Concessão só se legitima por licitação.
Sul21 - Isso inclui a rodoviária de Porto Alegre?
Beto - Sim, queremos modernizar e ampliar a rodoviária. Queremos investimentos, estacionamento e espaço
abrigado da chuva para pegar taxi. Queremos que o cidadão possa ir da rodoviária ao Trensurb sem tomar
banho de chuva, queremos um bicicletário e uma rodoviária que já pense em se integrar ao futuro metrô. Isso
significa muitos investimentos, não é uma licitação restrita apenas à empresa que venderá passagens e licitará
encomendas. Vamos licitar todo o complexo e as lojas com os investimentos e com as atribuições precípuas de
uma estação rodoviária. A Capital do Rio Grande do Sul, que terá Copa do Mundo, não pode continuar com um
nível de baixos investimentos que temos na rodoviária. Hoje a Veppo administra a venda de passagens, o
despacho de encomendas e também o condomínio. O prédio e as lojas da rodoviária são do Daer, que aluga os
espaços. Na proposta que estamos fazendo, tudo será um negócio comercial. Iremos licitar tudo, mediante um
projeto de engenharia e investimentos, e em cima disso é que faremos a disputa. A empresa vencedora irá
ganhar venda de passagens, encomendas e toda a estrutura para fundar a viabilidade econômica do negócio.
Sul21 - E como está a construção dos acessos asfálticos nos municípios? A promessa do governo é zerar esse
déficit.
Beto - Já terminamos 14 e teremos outros 60 em andamentos esse ano. Ainda faltarão 30 e iremos correr de
forma obstinada para zerar. É uma dívida antiga que o Rio Grande do Sul tem com essas comunidades, que a
vida inteira amassam barro, comem poeira e têm o transporte escolar, o transporte de saúde e o escoamento
da produção encarecido pela falta de um acesso asfáltico. Temos dificuldades porque os contratos são antigos,
com mais de 15 anos e com uma série de imperfeições. Então na hora de executar a obra, há problemas. Todos
os contratos foram feitos no governo (Antônio) Britto (1995-1998), em cima de projeto básico, e nenhum
previa o trevo na estrada principal da cidade, nem sinalização. Esses contratos têm me branqueado os cabelos
e criado uma série de burocracias.
"Ainda está muito longe (a eleição para o Senado em 2014). Por enquanto, tenho que ser um bom secretário.
Qualquer projeto passa pela obrigação de fazer um bom governo (no RS)"
Sul21 - Falando um pouco sobre política, como o senhor avalia o quadro das eleições este ano em Porto Alegre?
O seu apoio irá para a pré-candidata do PcdoB, Manuela D'Ávila?
Beto - Temos mantido uma aliança estratégica com o PcdoB em nível estadual que tem dado resultado para
ambos. Temos lutado por abrir nosso espaço político nesse campo da esquerda. E a tendência em Porto Alegre
é continuarmos juntos, como estivemos há quatro anos, agora mais fortalecidos politicamente e com novos
aliados. Acho que o PSD e o PPL podem estar conosco. Iremos trabalhar muito para que também o PTB esteja
junto. Poderemos fazer um enfrentamento eleitoral vitorioso e inovar em soluções para assuntos que se
arrastam em Porto Alegre.
Sul21 - O PSB é aliado de primeira mão do PCdoB. O partido trabalha com a possibilidade de indicar o vice na
chapa com a Manuela?
Beto - Nem provocamos essa discussão no PSB para que não sejamos obstáculo para a atração de novos
partidos. Pode ser natural, mas não precipitamos esse debate porque queremos atrair outras forças políticas
para fortalecer a candidatura da Manuela.
Sul21 - A última eleição no diretório estadual do PSB foi acirrada. Deputados e lideranças se dividiram e houve
muitos ataques ao senhor. Esse episódio já está superado?
Beto - Na política, aprendi que antes de falar é bom pensar. Teve muito companheiro que falou sem pensar e
isso não agregou crescimento ao partido. Não tenho mágoas disso. Foram cometidas muitas injustiças no calor
do debate. A gente perdoa, mas a gente não esquece. Eu não ousaria dizer que o PSB é uma coisa só no Rio
Grande do Sul. Temos grupos políticos que se respeitam e discutem. Não temos tendências como o PT, mas
não somos uma coisa só.
Sul21 - Em 2014 o senhor deseja concorrer ao Senado?
Beto - Ainda está muito longe. Por enquanto tenho que ser um bom secretário de Infraestrutura. Temos que
começar a pensar em 2014 depois de outubro deste ano, com o mapa político do Estado mais definido.
Qualquer projeto que me envolva ou não passa pela obrigação que temos de fazer um bom governo.
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