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Veículo: G1 Data: 31/03/2014 Pág: Online
Novo relatório climático reforça visão de que homem causa aquecimento
Painel da ONU divulgou quinto relatório sobre o clima nesta sexta-feira. IPCC
considera responsabilidade humana 'extremamente provável'.
O Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas, IPCC na sigla em inglês,
divulgou nesta sexta-feira (26) um novo relatório que aumenta o grau de certeza dos
cientistas em relação à responsabilidade do homem no aquecimento global.
Chamado de "Sumário para os Formuladores de Políticas", o texto afirma que há
mais de 95% (extremamente provável) de chance de que o homem tenha causado
mais de metade da elevação média de temperatura registrada entre 1951 e 2010,
que está na faixa entre 0,5 a 1,3 grau - a edição anterior falava em mais de 90%.
O documento apresentado em Estocolmo, na Suécia, em conferência científica
realizada ao longo desta semana, mostra também que o nível dos oceanos
aumentou 19 centímetros entre 1901 e 2010, e que as concentrações atmosféricas
de dióxido de carbono, metano e óxido nitroso aumentaram para "níveis sem
precedentes em pelo menos nos últimos 800 mil anos".
O novo relatório diz ainda que há ao menos 66% de chance de a temperatura global
aumentar pelo menos 2 ºC até 2100 em comparação aos níveis pré-industriais (1850
a 1900), caso a queima de combustíveis fósseis continue no ritmo atual e não sejam
aplicadas quaisquer políticas climáticas já existentes.
Os 259 pesquisadores-autores de várias partes do mundo, incluindo o Brasil,
estimam ainda que, no pior cenário possível de emissões, o nível do mar pode
aumentar 82 centímetros, prejudicando regiões costeiras do planeta, e que o gelo do
Ártico pode retroceder até 94% durante o verão no Hemisfério Norte (veja abaixo
uma tabela com os eventos climáticos possíveis, segundo os cientistas).
Trata-se da primeira parte de um conjunto de dados que servirá de base para as
negociações climáticas internacionais. A última versão saiu em 2007, quando o
estudo rendeu ao painel de especialistas o Prêmio Nobel da Paz. O primeiro capítulo
divulgado nesta sexta, de um total de três, aborda A Base das Ciências Físicas. As
demais partes serão publicadas em 2014.
Aquecimento quase certo
Os cientistas tratam como fato o aumento médio de 0,85 ºC na temperatura global
entre 1880 e 2012 e que é “muito provável” que desde 1950 houve redução de dias
e noites mais frios e aumento de dias e noites mais quentes em todo o planeta.
A temperatura da superfície do oceano teve aumento de 0,11 ºC por década entre
1971 e 2010, e a água marinha está mais ácida, fator que pode prejudicar o
ecossistema.
Um ponto considerado polêmico do documento, o chamado "hiato" da mudança
climática, foi mantido. O trecho explica que houve uma "desaceleração" no aumento
da temperatura global entre 1998 e 2012, com taxa de aquecimento de 0,05 ºC por
década, enquanto que período entre 1951 e 2012, essa taxa era de 0,12 ºC. Para o
IPCC, esta desaceleração sentida não significa uma mudança de curso no
aquecimento do planeta.
Ao avaliar quatro cenários de emissões de gases, o IPCC fez previsões de que até
2100 a temperatura no planeta pode aumentar entre 0,3 ºC e 1,7 ºC (no cenário
mais brando, com menos emissões e políticas climáticas implementadas) e entre 2,6
ºC 4,8 ºC se não houver controle do lançamento de gases-estufa.
O relatório aponta também que é forte a evidência de que as camadas polares e
glaciares do Ártico e Antártica têm perdido massa de gelo e reduzido sua extensão
oceânica.
O texto diz que são “altamente confiáveis” as informações de que a Groenlândia e a
Antártica perderam massa de gelo nas últimas duas décadas e que já há migração
de ecossistema terrestre para áreas onde o frio predominava (e não havia chance de
sobrevivência da maioria dos tipos de vegetais).
“O mais importante é que o gelo fora da região antártica continua com ritmo
acelerado de derretimento e, principalmente, as geleiras não polares (encontradas
em montanhas) continuam a reduzir rapidamente e a contribuir para o aumento do
nível do mar”, explicou o glaciologista brasileiro Jefferson Simões, um dos revisores
da parte que aborda as massas de gelo do planeta.
“Agora nós temos muito mais dados e um detalhamento maior, que possibilita que
as previsões sejam corrigidas”, complementa.
Maior emissão de gases
Um dos dados apresentados pelo IPCC aponta que foi registrado um aumento de
43% na forçante radiativa entre 1985 e 2011.
A forçante radiativa é um índice que estima impactos climáticos causados pelo
desequilíbrio entre as radiações solares absorvidas pela Terra e o calor devolvido
pelo planeta à atmosfera, aquecendo-a. Essa troca de energia equilibrada garante
uma temperatura global estável.
No entanto, uma maior emissão de gases e aerossóis pelo homem por conta de
queimadas, desmatamento e queima de combustíveis fósseis (principalmente CO2)
tem elevado a forçante e, consequentemente, retido uma maior quantidade de calor
no planeta.
Segundo Paulo Artaxo, físico da Universidade de São Paulo e um dos coautores do
capítulo divulgado, o aumento representa a elevação das concentrações de gases
de efeito estufa “que continuam a subir rapidamente”.
Mares mais altos
De acordo com o IPCC, é muito provável que o nível do mar aumente no século 21
em todos os cenários de emissões estudados pelos cientistas. A elevação seria
causada pelo aumento do degelo na região da Antártica e do Ártico.
No cenário mais brando, em que há corte de emissões e políticas climáticas, o nível
do mar pode subir entre 26 centímetros e 55 centímetros até 2100. Já no pior
cenário, com altas emissões de gases-estufa e não cumprimento de regras para a
redução delas, o nível do mar aumentaria entre 45 centímetros e 82 centímetros.
O IPCC faz a previsão também de que 95% da totalidade do oceano tem
probabilidade alta de aumentar o seu nível e que 70% das regiões costeiras do
planeta sofrerão com o avanço do mar.
“É importante salientar que algumas regiões do globo podem ter aumento maior que
este e outras regiões aumentos menores, pois este valor é uma média global”,
afirma Artaxo.
Esperamos um grande impacto deste relatório nos formuladores de políticas"
José Marengo, pesquisador do Inpe e editor do relatório do IPCC
Credibilidade em xeque
Vazamento de e-mails com conversas entre autores, debatendo possíveis exageros
presentes no relatório, ou até mesmo erros cometidos, como a conclusão de que as
geleiras nas montanhas do Himalaia derretiam mais rápido do que as outras do
mundo e "poderiam desaparecer até 2035, ou antes” – dado que o IPCC considerou
um “lamentável erro” – levantou um debate sobre a credibilidade da instituição.
O fato alimentou a opinião de céticos em relação às mudanças climáticas. Mas, para
cientistas brasileiros envolvidos na elaboração do documento e ouvidos pelo G1,
foram problemas pontuais que não diminuíram a “confiabilidade científica” do painel.
"Houve uma mudança na forma de trabalhar, os capítulos foram enviados para
revisão internacional. Esperamos um grande impacto deste relatório nos
formuladores de políticas", afirma José Marengo, pesquisador do Centro de Ciência
do Sistema Terrestre, ligado ao Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe).
O pesquisador, que é um dos editores do capítulo divulgado, duvida que a
confiabilidade científica do texto do IPCC tenha diminuído. "O fato de que há críticos
por aí não significa que está errado ou cheio de problemas", disse.
“A credibilidade não é colocada em dúvida por causa de questões menores perto de
milhares de aspectos acertados no relatório. Sempre é possível que pequenos
deslizes ocorram em qualquer tipo de trabalho, mas isso não tira o brilho de uma
extensa análise feita por milhares de cientistas”, afirmou Paulo Artaxo.
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