Modelos Baseados no Conceito de Composição Local 285 Exemplo 9.2 Para o sistema n-pentanol (1)/n-hexano (2) as constantes da equação de Wilson são Λ 12 = 0.0700 e Λ 21 = 0.629. Admitindo que a fase vapor é ideal, determine a pressão e a composição do vapor em equilíbrio com uma mistura líquida com 20 mol% de n-pentanol a 30°C. A esta temperatura, p1sat = 431 Pa e p2sat = 24 945 Pa. Resolução: Para o equilíbrio líquido-vapor em que a fase vapor é ideal, y1 p= x1 γ 1 p1sat y2 p= x2 γ 2 p2sat onde os coeficientes de atividade são determinados da equação de Wilson, que retiramos da Tabela 9-1. Por exemplo, para o componente 1: Λ12 Λ 21 ln γ1 =− ln( x1 + x2 Λ12 ) + x2 − x +x Λ 2 12 x2 + x1Λ 21 1 0.0700 0.629 − ln(0.2 + 0.8 × 0.0700) + 0.8 × − ln γ1 = 1.04 = 0.2 + 0.8 × 0.0700 0.8 + 0.2 × 0.629 ln= γ1 1.04 ⇒ = γ1 2.82 Do mesmo modo, para o componente 2, ln = γ 2 0.158 ⇒ = γ 2 1.17 A pressão total (em kPa) é então, p = x1 γ1 p1sat + x2 γ 2 p2sat = (0.2 × 2.82 × 0.431) + (0.8 × 1.17 × 24.945) ≈ 23.6 kPa A composição do vapor vem dada por y1 p = x1 γ1 p1sat x γ psat 0.2 × 2.82 × 0.431 ⇒ y1 =1 1 1 = = 0.010 p 23.6 A equação UNIQUAC (acrónimo do inglês UNIversal QUAsi Chemical) assume que as composições locais resultam de diferenças de tamanho e de energia entre as 286 Capítulo 9 moléculas que formam a mistura, o que corresponde a separar a energia de Gibbs de excesso em duas contribuições: E E E Gm Gm (combinatorial) Gm (residual) = + RT RT RT (9.14) onde o termo combinatorial dá conta das diferenças de tamanhos e formas moleculares, e o termo residual das diferenças de energia. Atendendo à relação entre GE e o coeficiente de atividade, γ, vem igualmente para o coeficiente de atividade do componente i, γi, ln γ i = ln γ i (combinatorial) + ln γ i (residual) (9.15) A Tabela 9-1 apresenta as equações de GE e dos correspondentes coeficientes de atividade do modelo UNIQUAC. O termo combinatorial é determinado pela composição e tem em conta o tamanho e a forma moleculares. Para isso usa dois parâmetros característicos dos componentes puros (estão tabelados): o parâmetro de forma, qi, proporcional à área superficial da molécula i, e o parâmetro ri , que tem em conta o tamanho da molécula. O termo residual dá conta das forças intermoleculares através de dois parâmetros (aij e aji) para cada mistura binária, determinados a partir do ajuste a dados experimentais. Por exemplo, para o acetonitrilo, r1 = 1.87 e q1 = 1.72; para a água, r 2 = 3.19 e q2 = 2.40; e, para a mistura binária acetonitrilo/água a 355 K, os dois parâmetros do termo residual, obtidos por ajuste a dados experimentais de equilíbrio líquido-vapor para a mistura binária, são a 12 = 294.10 K e a21 = 61.92 K. Por outro lado, e como iremos ver no capítulo seguinte, o método UNIQUAC é extensível a soluções de eletrólitos. Modelo UNIFAC: Princípio da Contribuição de Grupos O modelo UNIFAC (acrónimo do inglês UNIversal Functional Activity Coefficient), uma versão simplificada do UNIQUAC, é um modelo de contribuição de grupos considera que cada molécula de uma mistura é constituída por diferentes grupos funcionais (ver Fig. 9-5), tais como CH3 , CH2 , OH, CH2 O, etc. Os parâmetros do modelo UNIFAC são obtidos dos parâmetros de grupo R k e Qk (que estão tabelados) e somando todos os grupos da molécula, isto é, multiplicando o valor de cada parâmetro de grupo pelo número de vezes que cada grupo aparece na molécula, Modelo UNIFAC: Princípio da Contribuição de Grupos r= i ∑ ν(ki ) Rk q= i ν(ki )Qk k ∑ k 287 (9.16) onde ν(ki) é o número de grupos do tipo k na molécula i. Por exemplo, o 2,2,4trimetilpentano é constituído por 8 grupos funcionais: 5 grupos CH 3 , 1 grupo CH2 , 1 grupo CH e 1 grupo C. A vantagem desta divisão é que o número destes grupos funcionais é relativamente pequeno, comparado com o número de componentes distintos. Assim, a interação entre os vários componentes é representada pela contribuição resultante da interação entre os grupos funcionais que compõem a molécula de cada um dos componentes. Figura 9-5 Método UNIFAC: divisão das moléculas em grupos funcionais. Por exemplo, a anilina, C6H5NH2, é formada por 5 grupos funcionais ACH (onde A indica que a ligação CH faz parte de um anel benzénico) e um grupo ACNH2. Exemplo 9.3 Considere uma mistura líquida, a 1 atm e 25°C, com 1 mol de benzeno e 1 mol de 2,2,4-trimetilpentano. Determine a fração em volume, r, e a fração de área superficial, q, de cada componente da mistura. Resolução: Fazemos a divisão de cada molécula em grupos, obtendo de tabelas os valores de R e de Q de cada grupo funcional que cada molécula contém (por exemplo, usando as tabelas do sítio http://www.aim.env.uea.ac.uk/aim/info/UNIFACgroups.html) e, finalmente, usamos a Eq. (9.16). 288 Capítulo 9 O benzeno (B) é formado por 6 grupos aromáticos CH (designados por ACH), cujos parâmetros são R = 0.5313 e Q = 0.400. Assim, para o benzeno, rB =ν 6 × 0.5313 = 3.1878 ∑ (ki ) Rk = k qB =ν 6 × 0.400 = 2.400 ∑ (ki )Qk = k A estrutura do 2,2,4-trimetilpentano (TMP) é Esta molécula tem 5 grupos CH3 , 1 grupo CH2 , 1 grupo CH, e 1 grupo C. Retirando do mesmo sítio da Internet os valores de R e de Q correspondentes a cada um destes grupos, obtemos: rTMP = 5 × 0.9011 + 0.6744 + 0.4469 + 0.2195 = 5.8463 ∑ ν(ki ) Rk = k qTMP = 5 × 0.848 + 0.540 + 0.228 + 0.0 = 5.008 ∑ ν(ki )Qk = k Se pretendêssemos obter os valores de γi, retirávamos da Tabela 9-1 as definições das respetivas frações, de segmentos, Φ, e de área, θ, para a composição da mistura (x = 0.5): = ΦB = θB xB rB 0.5 × 3.1878 = = 0.353 xB rB + xTMP rTMP 0.5 × 3.1878 + 0.5 × 5.8463 xB q B 0.5 × 2.400 = = 0.324 xB qB + xTMP qTMP 0.5 × 2.400 + 0.5 × 5.008 Do mesmo, obtemos para o TMP, = Φ TMP 0.647 = θTMP 0.676 Com estes dados poderíamos agora obter os coeficientes de atividade de cada componente da mistura, usando a equação de ln γi apresentada na Tabela 9-1. Modelo UNIFAC: Princípio da Contribuição de Grupos 289 Os métodos de contribuição de grupos (em particular o modelo UNIFAC que é preditivo, isto é, não requer ajuste a dados experimentais da mistura) é de grande interesse para misturas, pois é enorme o número de misturas possíveis, mas 50 ou 60 grupos funcionais podem ser suficientes para descrever milhares de misturas diferentes. Embora tenham limitações, os métodos de contribuição de grupos são frequentemente a melhor opção para obter os coeficientes de atividade dos componentes de misturas, necessários para o projeto de processos químicos ou biológicos, onde os dados experimentais sejam escassos. É vasta a potencialidade de aplicação destes métodos, pois foram já utilizados em problemas tão distintos como, por exemplo, o cálculo de solubilidades de antibióticos em mistura de vários solventes, na seleção dos melhores solventes em processos de extração e na determinação de viscosidades de misturas líquidas. Como vimos atrás, na equação UNIQUAC o termo combinatorial é determinado usando os parâmetros ri e qi característicos dos componentes puros e os dois parâmetros do termo residual (aij e aji) são obtidos por ajuste a dados experimentais de cada mistura binária. Contudo, no modelo UNIFAC, ambos os termos (combinatorial e residual) são determinados a partir de métodos de contribuição por grupos, não havendo lugar a qualquer ajuste a resultados experimentais. Assim, vem igualmente para o método UNIFAC, ln γ i = ln γ i (combinatorial) + ln γ i (residual) onde, conforme mostram as equações deste modelo da Tabela 9-1, o termo combinatorial é obtido de uma forma modificada do termo correspondente da equação de UNIQUAC, e o termo residual é determinado de um equação própria. O cálculo dos coeficientes de atividade pelo método UNIFAC é relativamente simples. Como ilustra a Fig. 9-5, a molécula de cada componente é dividida em grupos funcionais, cada um dos quais tem uma contribuição conhecida, disponível em tabelas2. O cálculo envolve então a soma das contribuições de cada grupo funcional, tal como foi ilustrado no Ex. 9.3. Se a mistura tiver muitos componentes diferentes ou se as moléculas tiverem um grande número de grupos funcionais, os cálculos tornam-se morosos. No entanto, estão disponíveis programas de computador que facilitam grandemente estes cálculos. Por exemplo, um sistema com 50 grupos funcionais tem 2450 parâmetros de interação, o que torna indispensável o uso de meios computacionais. A Fig. 9-6 compara os resultados experimentais com as previsões do método UNIFAC para os coeficientes de atividade da água e do etanol numa mistura 2 Uma lista com as contribuições dos grupos funcionais está disponível em, por exemplo, http://www.aim.env.uea.ac.uk/aim/info/UNIFACgroups.html. 290 Capítulo 9 Figura 9-6 Coeficientes de atividade do etanol e da água em misturas etanol/água a 1 atm e 25°C: comparação dos valores calculados pelo método UNIFAC com os resultados experimentais. etanol/água a 1 atm, uma mistura que apresenta grandes desvios à idealidade3. O modelo UNIFAC prevê geralmente bons resultados (dados de equilíbrio de fases — líquido-vapor, líquido-líquido e sólido-líquido — assim como de propriedades como entalpias de excesso, capacidades caloríficas, etc.) e é, talvez, o método mais generalizado de tratar a não idealidade de misturas líquidas aquosas e não aquosas com componentes de muitos tipos diferentes (polares, não polares, polímeros, etc.). Os modelos UNIQUAC e UNIFAC são certamente os modelos mais abrangentes na previsão de coeficientes de atividade e, contrariamente a outros métodos, estes dois modelos preveem resultados satisfatórios entrando em conta com a não idealidade devida ao tamanho, à forma e, também, aos efeitos energéticos moleculares. Coeficientes de Atividade a Diluição Infinita Os parâmetros das equações de coeficientes de atividade são independentes da composição e determinam-se através de medidas de equilíbrio líquido-vapor. Também se podem obter através de medidas experimentais (ebuliometria diferencial ou 3 Em http://www.ddbst.com/en/online/Online_UNIFAC_Form.php está disponível um programa online para o cálculo de coeficientes de atividade segundo o método UNIFAC para algumas misturas. Coeficientes de Atividade a Diluição Infinita 291 cromatografia em fase gasosa) de coeficientes de atividade a diluição infinita, γ∞. Estes coeficientes representam a não idealidade máxima de um componente em solução, pois referem-se ao limite de diluição em que temos uma molécula de um componente que está rodeada unicamente por moléculas do outro componente. Definimos coeficiente de atividade a diluição infinita do componente 1 de uma mistura binária como γ1∞= lim γ1 x1 → 0 (9.17) Por exemplo, usando as equações de Wilson e fazendo o limite quando x 1 → 0, obtemos, ln γ1∞ = − ln Λ12 + 1 − Λ 21 ln γ ∞ 2 = − ln Λ 21 + 1 − Λ12 Dispondo de medidas experimentais de γ 1∞ e de γ ∞ 2 , determinamos imediatamente as constantes de Wilson, Λ 12 e Λ 21 , características das interações entre os componentes 1 e 2 em solução. Como estas constantes são independentes da composição, podemos usá-las no cálculo de coeficientes de atividade a outras composições. Exemplo 9.4 Para uma mistura líquida binária a 300 K, γ1∞ = 1.875 e γ ∞ 2 = 1.200. Sabendo que, para a mesma temperatura, p1sat = 800 mmHg e psat 2 = 1000 mmHg, estime a composição do vapor que a 300 K está em equilíbrio com uma mistura líquida equimolar. Use as equações de Margules de 3 sufixos. Resolução: Vamos admitir que a fase gasosa se comporta como perfeita. Para o equilíbrio líquido-vapor, y1 p= x1 γ 1 p1sat É, pois, necessário conhecer os coeficientes de atividade de cada componente para a composição da mistura líquida, x 1 = x 2 = 0.5. Para isso, usamos a informação fornecida para obter os parâmetros A e B da equação de Margules. Aplicando a definição de γ ∞ [Eq. (9.17)] à equação de Margules (Tabela 9-1), obtemos