CIDADANIA
A história da minha vida
SESI lança livro com biografia de alunos da terceira idade
FOTOS: DIVULGAÇÃO
“Meus avós Saturnino Ferreira da Silva e Alexandrina Benta
da Silva nasceram na Bahia, na cidade de Livramento, e tiveram diversos filhos. O mais velho, Manoel Ferreira da Silva,
apelidado de Manezinho, com 16 anos ajudava o pai no engenho, fazendo rapadura para sobreviver. Certo dia ele acabou
de almoçar e fez um buraco na pilha de bagaço de cana,
deitando-se para descansar e dormir. O pai chamava, gritava,
mas ele não ouvia e quando acordou o pai bateu tanto que
ele ficou todo marcado.
No dia seguinte, dez ou doze baianos iam para o Estado
de São Paulo em busca de trabalho, levando uma mochila
com um embornal de paçoca de jabá, queijo e rapadura.
Caminharam o dia todo e já estavam chegando à beira de
um rio, onde iam passar a noite, quando apareceu Manezinho, que os seguira escondido. Um deles disse: ‘Você não
pode seguir conosco, pois só tem 16 anos’, mas quando
Manezinho mostrou todos os hematomas do corpo, eles o
levaram e dividiram os alimentos com ele.”
No alto, a capa do livro. Acima os autores, a primeira à esquerda, Egidia, é a autora do texto
que abre esta página
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Relatos da infância de seus
pais e da chegada da família ao
Brasil ou ao Estado de São Paulo, como este contado por Egídia Benta Martins, integram o
livro A história da minha vida, ao
lado de outras histórias da vida,
aventuras da juventude, dificuldades, tristezas e alegrias dos
14 alunos da turma da Terceira
Idade da Unidade do SESI de São
José do Rio Preto, interior de São
Paulo. Os textos autobiográficos
dos alunos foram ilustrados com
fotos de seus pais, avós, filhos,
netos e bisnetos.
DESAFIOS
Durante os três meses de
elaboração dos textos, os autores, com idade entre 60 e 78
anos, procuraram resumir em
algumas laudas suas principais recordações. O desafio de
passar histórias da vida para o
computador foi lançado no segundo trimestre de 2004 pela
monitora de informática educacional Gabriela de Fátima de
Arruda Cruz.
“Para o processo de aprendizado se tornar mais prazeroso, a monitora decidiu adotar
um método diferenciado, propondo exercícios por meio dos
quais os alunos relatavam passagens e experiências de suas
vidas, inclusive trazendo fotos
para enriquecer os relatos”, explica Maria de Fátima Cassetari
Mimessi, diretora da unidade.
O trabalho encantou os autores e seus familiares, e em
especial a Superintendência do
SESI paulista que, no final do
ano passado providenciou a edição do livro. O lançamento, com
noite de autógrafos, foi realizado
em fevereiro de 2005.
“Eles desafiaram o que seria
algo muito distante, o mundo da
informática, com todos os seus
teclados, mouses e a memória
para construir esse relato”, diz
a diretora. “Com esse trabalho
o SESI alcança seus objetivos
de valorização e resgate da
auto-estima das pessoas da
melhor idade”, acrescenta.
A coragem do pai Manezinho em busca de uma
nova vida em São Paulo
serviu de inspiração para
Egídia Benta Martins, de 71
anos. “Tem um ditado que
diz que, na vida, temos de
ter um filho, plantar uma
árvore e escrever um livro.
Eu estou feliz porque só faltava escrever o livro”, comemora ela.
Aos 61 anos, Maria
Inêz Tecla Cervato Oznich
se emociona sempre que
lembra de algum episódio
de sua vida. “A família
vem na lembrança e sempre me recordo de estar
sentada no colo dos meus
avós ouvindo as histórias
que contavam entre uma
canção de ninar e outra”,
afirma. O que ela nunca se
esquece, no entanto, é que
só descobriu ter Tecla em
seu nome quando começou
a escrever. “Não sabia que
tinha Tecla no nome e na
ocasião descobri que meu
pai me deu esse nome porque nasci no dia de Santa
Tecla”, recorda-se.
Ver sua biografia transformada em livro foi uma
das maiores emoções experimentadas pela dona de casa
Neli Duarte de Paula, de 67
anos. “Outras experiências da
vida, como ter um filho, são
emocionantes, mas não são
tão surpreendentes como escrever um livro aos 67 anos,
uma coisa que você não espera”, explica. “Foi tão especial
que, quando vi o livro editado, chorei”, acrescenta.
Dos 14 autores, o único homem é Waldemar Ruiz Romero,
corretor de imóveis aposentado, que entre suas recordações
de infância guarda a história de
seu pai, pintor, que nos anos 30
No alto, Egidia: só faltava escrever um livro. Acima,
Romero, o único homem do grupo
trabalhou na pintura do edifício
Martinelli, um dos mais altos
de São Paulo. “... Agora, aos 73
anos, na era da informática, não
poderia deixar de aprender a lidar com o computador... Para nós
da Terceira Idade é uma glória
realizar esta e outras atividades,
uma satisfação muito grande...”,
escreveu Romero. Ele é um dos
autores mais empolgados, relata
em 16 páginas as perdas de amigos e parentes, seu casamento,
suas viagens pelo Brasil e para
o exterior e suas atividades na
terceira idade.
Com 3 mil exemplares, A
história da minha vida já está
sendo distribuído para entidades que trabalham com idosos
e bibliotecas públicas.
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