CURSO DE MESTRADO EM ENGENHARIA DE PRODUÇÃO DISCIPLINA DE DIREITO ARTIGO: CONFLITOS LEGAIS ASSOCIADOS À PROBLEMÁTICA SÓCIO – AMBIENTAL ORIGINADA COM O EMPREENDIMENTO DA USINA HIDRELÉTRICA DE TUCURUÍ Revisão: 00 Julho – 2001 Professor: Hugo C. Hoeschi Aluno: Alfredo Luiz de Souza SEQUÊNCIA Item Assunto Página 1 Contextualização 3 2 O Caso UHE Tucuruí 5 3 Legislação pertinente 7 4 Conflitos reais e potenciais 8 5 Conclusões 9 6 Fontes de pesquisa 9 2 1 – CONTEXTUALIZAÇÃO # O empreendimento: A Usina Hidrelétrica de Tucuruí, maior usina totalmente brasileira, esta localizada ao sul do estado do Pará, a uma distância de 380 Km da cidade de Belém (capital do estado), e 2000 Km da cidade de Brasília – DF, construída no meio da selva amazônica, apresenta as seguintes características: - Possui doze unidades geradoras hidráulicas instaladas, as quais totalizam 4000 MW de capacidade de geração de energia elétrica; - Após o enchimento ocorrido em 1984, o reservatório da UHT inundou uma área de aproximadamente de 2.800 Km2, anteriormente ocupada por floresta. A extensão do reservatório é de cerca de 200 Km, medidos a partir da barragem até o município de Itupiranga-PA , com a formação nesta área de cerca de 1100 ilhas; - A capacidade de descarga do vertedouro (sistema de comportas utilizado para o controle do nível de água do reservatório ) é de 110.000 m3/s de água ( o maior vertedouro do mundo em volume de descarga ); - A extensão do barramento ( barragem de terra + barragem de concreto) é de 8.100 m; - O início de operação comercial da Usina foi em novembro do ano de 1984. # O momento sócio - político do país quando da construção: Quando da concepção do projeto de construção da UHE Tucuruí, o país e a mais especificamente a região norte, atravessava um momento particular, marcado por fatos que mais tarde poderiam explicar muitas das ocorrências verificadas, fatos como: - O governo federal da época era Militar, com poucas práticas associadas a gestão participativa de projetos e ainda, pouca experiência em divulgação sistematizada de informações sobre empreendimentos do porte da UHE, para a sociedade; - A existência de possíveis ameaças à soberania nacional em relação à região amazônica, é um fator que alguns técnicos apontam como crítico naquele momento do país; - A existência de um projeto nacional desenvolvimentista, conduzido pelo governo militar; - A necessidade de grandes blocos de energia elétrica que pudessem tornar viáveis projetos industriais minero – siderúrgicos na região norte; 3 - A inexistência de infra-estrutura básica (estradas, meios de transporte, educação, saúde, moradias, ...) na região do empreendimento, fato que obrigou o emprendedor a assumir o papel de agência de desenvolvimento na região, levando agregado ao projeto da Usina: a abertura e/ou manutenção estradas e vias públicas, implantação de escolas e hospitais, a implantação de sistemas de comunicação, a implantação de vilas residenciais, entre outras; - A inexistência de legislação ambiental regulamentada, que orientasse o tratamento dos impactos ambientais reais e potenciais associados ao empreendimento, assim como a falta de experiências anteriores do mesmo porte, que agregassem domínio tecnológico em relação às questões sócio- ambientais, também é um fato de grande relevância; - A atividade econômica predominante em toda região era o extrativismo, desempenhada por pequenas comunidades ribeirinhas localizadas em poucos municípios, não havendo disponível na região, mão de obra especializada, assim como fornecedores de bens e serviços; # A situação da legislação ambiental em novembro de 1984: O arcabouço legal existente no país anterior a entrada em operação da UHT, em geral trazia uma visão fragmentada e bastante restrita das questões ambientais, na qual o ser humano não era tratado como parte integrante do meio ambiente, são desta época dispositivos como: - Código das águas – Decreto 24.643/34; - Código de pesca – Decreto 974/38; - Código de caça – Decreto 5894/43; - Código florestal – Lei 4771/65. Em 1981 com a promulgação da Lei de Política Nacional do Meio Ambiente ( Lei 6938/81 ), se inaugura uma nova fase da legislação ambiental brasileira, procurando integrar o homem ao meio ambiente, reconhecendo a indissociabilidade entre o homem e os ecossistemas, e institui entre outros, princípios como: - Racionalização do uso de recursos naturais; - Recuperação de áreas degradadas; - Educação ambiental em todos os níveis da educação formal; - Constituição de um órgão nacional consultivo e deliberativo sobre meio ambiente – CONAMA; 4 - Constituição de um órgão nacional executivo sobre meio ambiente – IBAMA; - Constituição de órgãos seccionais (estaduais) e locais (municipais), executivos e fiscalizadores sobre meio ambiente – Secretarias; - Zoneamento e criação de espaços territoriais protegidos – áreas de preservação; - Licenciamento de atividades efetiva ou potencialmente poluidoras – licença ambiental. O processo de licenciamento ambiental, mecanismo de avaliação e controle dos impactos reais e potenciais de um determinado empreendimento, constituído a partir da Lei de Política Nacional do Meio Ambiente sómente se tornou operacional a partir da Lei 7804/89 e do Decreto Federal 99.274/90, que estabelecem: “ ... toda empresa poluidora deve ser submetida à autorização do poder público para funcionar, mediante a apresentação de uma Avaliação de Impactos Ambientais, para obtenção de uma Licença Ambiental.” Fica evidente, que somado aos aspectos sócio – políticos do momento de entrada em operação da Usina, a falta de regulamentação de legislação específica já no ano de 1984, pode ter potencializado o grande número de ocorrências relacionadas à problemática sócio – ambiental associada ao empreendimento. 2 – O CASO UHE TUCURUÍ # 1984 – Início da operação comercial da Usina: A ausência de regulamentação, levou a Empresa a investir fortemente em estudos próprios de impactos ambientais, que se iniciaram durante o período de construção, principalmente focando os aspectos específicos dos ecossistemas atingidos, contudo, ainda não se constituindo um EIA (Estudos de Impactos Ambientais) ou um RIMA (Relatório de Impactos Ambientais) nos moldes das resoluções CONAMA 01/86, 06/87 e 237/97. Por meio de contratação de instituições e/ou profissionais de renome internacional, foram elaborados estudos, pesquisas e programas orientados a: - Resgate de animais da área do reservatório e posterior soltura em áreas particulares da empresa, de preservação da fauna regional (resolução CONAMA 10 e 11/87); - Criação de um banco de germoplasma, formado por espécies vegetais recolhidos da região antes do enchimento do reservatório, possibilitando além da preservação, a produção de sementes e mudas para projetos de recuperação de áreas (resolução CONAMA 10 e 11/87); 5 - Produção de informações / conhecimentos técnicos específicos sobre: a fauna, flora, ictiofauna, linminologia, geologia, arqueologia; - Implementação de programas permanentes de: controle linminológico, fiscalização ambiental em parceria com o IBAMA e a Polícia Militar e educação ambiental dirigida. # 1998 – Licenciamento ambiental da Usina: A partir dos artigos 22, 23 e 24 da CF, que definem as competências de quem legisla sobre as questões ambientais, e da resolução CONAMA 237/97, que detalha os procedimentos para a obtenção da licença ambiental, complementadas pela legislação ambiental estadual, a empresa protocolou junto a Secretaria Estadual de Ciência, Tecnologia e Meio Ambiente do Estado do Pará – SECTAM, a solicitação da LO – Licença Ambiental de Operação para a UHE Tucuruí, concedida por um período de um ano com auditorias semestrais, condicionada a continuidade por parte da empresa do desenvolvimento dos programas de mitigação de impactos e de preservação dos ecossistemas atingidos. A L.O. da UHE Tucuruí já foi renovada a partir daí por duas vezes, nas quais o andamento dos programa de preservação e de mitigação foi avaliado, assim como a adequabilidade dos mesmos às questões prioritárias atualizadas, na visão da SECTAM. # 2000 – Migração para um Sistema de Gestão Ambiental: Os ecossistemas atingidos pelo empreendimento passaram por uma dinâmica de grandes transformações a partir do ano de 1984, quando do enchimento do reservatório, a velocidade e o número de mudanças foram elevados, e estão registrados nos dados dos vários programas de monitoração implementados. Após os dez primeiros anos de operação da Usina, um novo ponto de estabilidade dos ecossistemas já pode ser observado com a redução expressiva na velocidade e na quantidade das mudanças. O aprendizado acumulado pelas equipes da UHE Tucuruí durante o período de dezesseis anos de desenvolvimento de programas destinados a preservação e a mitigação, possibilitou o desenvolvimento de competências básicas associadas ao controle dos impactos ambientais originados por processo de geração hidráulica de energia elétrica, não tendo recebido neste período nenhuma autuação, mesmo depois do licenciamento ambiental, a empresa estabeleceu um novo desafio, o de integrar os vários esforços e grande número de programas em um sistema coordenado de gestão ambiental, que racionalize recursos e eficientize os resultados, orientado pela norma ISO 14.000. 6 3 – EXEMPLOS DE LEGISLAÇÃO ESPECÍFICA LIGADA À UHE Respaldados pela Constituição federal de 1988, e também por lei de caráter nacional, os estados e municípios passam a elaborar dispositivos legais específicos e complementares. Além das resoluções do CONAMA já mencionadas, algumas leis merecem destaque por estarem regulando questões ligadas diretamente ao processo de produção hidráulica de energia elétrica, como: Ano 1934 1965 Lei Dec. 24643 Lei 4771 • • 1966 Dec. 58824 • 1967 1981 1981 Lei 5197 Lei 6938 Lei 6902 • • • 1988 CF • • 1989 Port. 1522 • 1990 Dec. 98914 • 1991 1992 Lei 2057 Port. 37-N • • 1997 1998 Lei 9433 MP1736-31 • • 1998 Lei 9605 • Assunto Institui o Código de Águas Define o Código Florestal Brasileiro, alterado pela Lei 7803/89 Estabelece os princípios de proteção da populações indígenas Dispõe sobre proteção de fauna silvestre Define a Política Nacional do Meio Ambiente Dispõe sobre a criação de ares de preservação ambiental, regulamentada pelo decreto 99.274/90 Define competência dos legisladores ambientais Ratifica os princípios da Política Nacional do Meio Ambiente Lista as espécies de fauna brasileira ameaçada de extinção Dispõe sobre a criação de reservas particulares do patrimônio natural Institui o novo estatuto do índio Lista as espécies de flora brasileira ameaçada de extinção Define a Política Nacional de Recursos Hídricos Dispõe sobre a conversão de áreas florestais em áreas agrícolas Define a lei de Crimes Ambientais 4 – CARACTERIZAÇÃO DE CONFLITOS REAIS E POTENCIAIS ASSOCIADOS A UHE A grande dimensão da área de influência do empreendimento, associado a diversidade de áreas de interesses envolvidos no processo de geração hidráulica de grande porte, propicia um terreno fértil para o surgimento de conflitos reais e potenciais das mais diversas ordens, como observado no seminário de jurisprudências criminais do setor elétrico a partir de pesquisas no STJ e em outros tribunais, e dos exemplos a seguir: 7 Reclamante - FIEPA - CREA-PA - Associações populares - ONG´s - Sindicatos - Associações populares - Associações populares - População ribeirinha - ELETRONORTE Reclamado - ELETRONORTE Alegação - Interrupção da navegabilidade do rio Tocantins pelo barramento da UHE - ELETRONORTE - Indenizações devidas, por erros ocorridos em processos indenizatórios passados - ELETRONORTE - Indenizações devidas por danos causados a benfeitorias, quando da elevação intempestiva das águas - Associações populares - População ribeirinha - IBAMA - Reintegração de posse de áreas de segurança da UHE ou de proteção ambiental, ocupadas sem permissão - Terceiros - - Clientes - ELETRONORTE - - ELETRONORTE - Indenização por danos a equipamentos de clientes, causados por ocorrências no fornecimento da energia elétrica Cobrança indevida do m3 de madeira submersa extraída, devido a utilização de pauta errada. Existência de passivo social devido a população carente atingida de alguma forma pelo empreendimento - ONG´s Sindicatos Associações populares - ELETRONORTE - - Empresários regionais da madeira Movimentos sociais: sem terra, sem luz, atingidos por barragens ONG´s Sindicatos Associações populares Colônias de pescadores Associações populares Prefeituras da área de influência - ELETRONORTE - Delegação indevida de competências para Empresa de Economia Mista, com o fim de fiscalização ambiental Danos ao patrimônio de empresa de economia mista - ELETRONORTE Regularização fundiária dos ocupantes sem permissão de terras e ilhas de propriedade de empresa de economia mista - IBAMA Necessidade de controle e redução do esforço de pesca do lago da UHE que começa a saturar a produção do pescado - ELETRONORTE Indenizações na forma de apoio, material e equipamentos a municípios carentes do entorno do empreendimento 8 5 – CONCLUSÕES - Questões próprias ligadas a dimensão do projeto da UHE Tucuruí, e à grande extensão de sua área de influência, dificulta sobremaneira a monitoração e o controle de todos os ecossistemas que precisam ser preservados e recuperados; - A falta de clareza (ou entendimento acessível) na redação de muitos dispositivos legais, a diversidade de dispositivos e instâncias que podem legislar sobre questões sócio – ambientais, são fatores que favorecem muito a transformação de conflitos potenciais em conflitos reais; - A falta de exemplos freqüentes e divulgados de aplicação das leis e correspondente punição de infratores que tenham cometido crimes ambientais, associados a escassez de recursos para fiscalização, autuação e controle, são fatores que reduzem a credibilidade na efetividade da legislação ambiental existente. 6 – FONTES DE PESQUISA - Apostila de Legislação Ambiental da Prof. Maria Laura Barreto, do curso de Mestrado em Gestão Ambiental da UNAMA; - Livro Curso de Direito Ambiental Brasileiro, autor: Celso Antonio Pacheco Fiorillo, Ed. Saraiva; - Sites: http://digesto.net, http://dji.com.br; - Constituição Federal de 1988. 9