Actualidades em Rastreios
RASTREIOS Oncológicos em Cuidados de Saúde Primários
• Neoplasia Mama
Dr. Victor Pereira
Muito se tem escrito e falado sobre rastreio do cancro de mama feminino. Talvez por
ser a neoplasia mais frequente da mulher e talvez por existir método de benefício
comprovado na identificação das lesões, com impacto na sobrevida global. A chamada
Prevenção Primária – criação de hábitos de vida que possam baixar a incidência – não
está documentada no caso dos cancros de mama. Algumas drogas, como o Tamoxifeno
e os Inibidores da Aromatase, têm aplicação na prevenção dos cancros de mama em
mulheres portadoras de mutações familiares (BRCA1 e 2). No entanto, para a
esmagadora maioria da população resta-nos a Prevenção Secundária, que corresponde
à procura das lesões antes que se tornem clinicamente identificáveis.
O “porquê” do rastreio prende-se com estudos que demonstraram uma redução de
35% da mortalidade em mulheres entre os 50 e os 69 anos. Estudos mais recentes
parecem demonstrar que este benefício se poderá estender até aos 74 anos.
O “como” do rastreio de massas do cancro de mama resume-se
à Mamografia. Desde 1913, quando Albert Salomon, Cirurgião da
Surgical Clinic of Berlin University, utilizou pela primeira vez Raios X
para estudar a mama, muito se tem avançado neste campo, até à
chegada da mamografia digital. Hoje em dia, a Mamografia
identifica, potencialmente, 90% das neoplasias da mama o que
lhe confere uma alta sensibilidade, associada a uma
especificidade de 90-95%.
De forma a se determinar se um exame é eficaz na detecção de lesões e se este pode
ser aplicado em massas populacionais, deve ter determinados requisitos, como sejam
a fácil acessibilidade ao exame, simplicidade na execução, boas sensibilidade e
especificidade, além de que deve ser de custo baixo. Outros exames têm sido
estudados com a ideia do rastreio do cancro de mama, como a cintigrafia mamária
mas não superam a mamografia nos pontos atrás descritos, apesar de uma boa
especificidade e sensibilidade. A Tomosíntese mamária está em desenvolvimento
como exame mamográfico, mas revela-se um exame caro. A lavagem ductal, método
que consiste em recolher líquido ductal após instilação de soro para o interior dos
ductos, pareceu promissor na detecção precoce das neoplasias, mas o seu benefício
não está demonstrado como arma de rastreio. Continuam estudos nas mulheres de
risco acrescido. A RMN mamária c/ gadolíneo revela maiores especificidades e
sensibilidade para neoplasias invasivas, mas é um exame pouco disponível, de
execução demorada e de custo muito mais elevado. No entanto, parece ter ganho um
campo de actuação no rastreio de mulheres jovens com BRCAs positivos.
Abandonados da noção de rastreio estão a ecografia mamária e o auto-exame, este
último durante tantos anos aconselhado às pacientes e que finalmente se encontra
desaconselhado pela ansiedade que gera, pelos estudos desnecessários que gera e
porque, finalmente se compreendeu, um nódulo palpável já não faz parte da noção de
rastreio acima apresentada. O auto-exame continuará a ter alguma lógica, mas não
poderá ser apresentado como era, devendo desmistificar-se a noção prévia de que se
ganharia vidas com ele.
O “quando” do rastreio do cancro de mama não é consensual. Governos aconselham
rastreio dos 40 aos 69 anos, outros dos 50 aos 69 anos, outros dos 40 aos 74 e outros,
consoante a região do país, assim as idades. O intervalo mais consensual parece ser o
dos 50 aos 69 anos. O mesmo se pode dizer em relação à periodicidade dos exames.
Alguns aconselham de 2 em 2 anos, outros de 3 em 3 anos, e outros mesmo
anualmente. O intervalo mais consensual parece ser o dos 2 anos.
Portugal tem vivido diversos rastreios regionais, desde 1990, quando foi
implementado o primeiro rastreio em Portugal na região centro do país, uma boa
parte deles com premissas diferentes de idades e intervalos entre exames. Irá iniciarse na zona norte do país, um rastreio de massas em 2010, para o qual foram
disponibilizados 19,3 milhões de euros, a gastar num prazo de 5 anos. Em Portugal, a
neoplasia da mama atinge 1 em cada 12 mulheres, correspondente a cerca de 4000
novos casos/ano e é a principal causa de mortalidade feminina entre os 35 e os 55
anos.
Não nos esqueçamos, no entanto, que Portugal está inserido na Comunidade Europeia,
que abrange cerca de 500.000.000 de habitantes. Nesta comunidade morrem cerca de
90.000 mulheres por ano por cancro de mama. Em Abril de 2010, o Parlamento
Europeu solicitou aos seus Estados-membro que introduzam o rastreio mamográfico a
nível nacional, sendo esta implementação, alvo de relatório por parte dos Estadosmembro, de 2 em 2 anos. Foi também exortada a necessidade da criação de um
protocolo de certificação de centros especializados em cancro de mama, até 2011.
Talvez por aqui caminhemos de uma forma mais organizada na prevenção para o
cancro de mama.
Enquanto não se descobrirem drogas que reduzam mais substancialmente o risco de
cancro de mama, temos que continuar a nossa senda pelo rastreio mamário, com a
noção de que este salva uma vida humana em cada 500 mulheres rastreadas.
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Victor Pereira