UNIÃO EUROPÉIAO QUE ESTÁ ACONTECENDO? PORQUE ESTÁ ACONTECENDO? Maria Teresa de Carcomo Lobo Muitos me perguntam porque deixei de escrever no Blog ,quando o mesmo havia merecido elogiosa referência do Centro Europeu Jacques Delors. Respondo. Inicialmente, fiquei aguardando a aprovação e a ratificação do Tratado de Lisboa , depois do impacto do “não” da França e dos Países Baixos , para conhecer, em definitivo, o desenho da sua estrutura institucional e o perfilamento das suas finalidades. Em suma, para conhecer a normatividade e o instrumental operativo da nova União Européia, na legítima convicção de que o ideal de Jean Monnet e dos Founding Fathers seria preservado , melhor , seria potencializado no contexto de um mundo complexo, marcado por contrastes e desafios. Mundo este que teria na União Européia o modelo de unir sem unificar ,de competir sem destruir ,de avançar sem recuar. Dizia Jacques Delors – o até hoje imbatível Presidente da Comissão Européia pela sua competência e pelo seu “empenhamento europeu” -- que a essência do contrato europeu assenta (ou assentava?) na solidariedade que une, na competitividade que estimula e na cooperação que reforça. Muito embora o processo da integração européia tenha sofrido várias crises ao longo dos anos, de que citarei a da “cadeira vazia”, o “não” inicial da Dinamarca ao Tratado de Amsterdã e o da Irlanda ao Tratado de Maastricht, o certo é que de todas estas crises , a União Européia saía mais forte, mais consciente da justeza e da validade do processo da integração . Torço por que , uma vez mais, seja este o final da crise . Entre as razões que me parecem estar no âmago da atual conjuntura européia , cito , em primeiro lugar , o Tratado de Lisboa , instituindo dois Tratados : o Tratado da União Européia –TUE e o Tratado para o Funcionamento da União Européia –TFUE , que não alcançou , a meu ver, a finalidade básica de ser a viga mestra do Edifício Europeu. A existência de dois Tratados, com estruturas institucionais complexas, “pesadas”, desgastadas pela supressão no seu texto do princípio do primado do direito comunitário, contribuiu em grande parte para a “perda de velocidade” da União, burocratizando-a além dos limites permissíveis. A supressão daquele princípio , que constitui a base existencial da ordem jurídica comunitária, que viabiliza a realização do mercado único, da moeda única, numa palavra , da Europa como Entidade própria, é absolutamente incompreensível . Igualmente preocupante no âmbito da União Européia -- justamente considerada a expressão jurídica da globalização – é a supressão dos seus símbolos –a Bandeira, o Hino e o Lema . A “perda de velocidade“, o enfraquecimento da dinâmica e o esbatimento do “empenhamento europeu” são, a meu sentir, os fatores que estão na base da situação atual, pelo total descumprimento do rigoroso normativo instituído no Tratado da Comunidade Européia relativamente à política econômica e monetária , com expressa previsão das medidas a adotar – até em termos de “alerta precoce” - . Descumprimento de que são responsáveis aqueles Estados Membros, que se encontram a braços com um forte desequilíbrio orçamental e um forte endividamento público , em frontal testilha com o Tratado e o Pacto de Estabilidade e Crescimento. Responsáveis igualmente , o Conselho da União Européia e , sobretudo, a Comissão Européia, no seu papel institucional de Guardiã da Ordem Jurídica Comunitária , para cuja efetivação não lhe faltam meios, designadamente, no âmbito da ação de descumprimento. Cabe perguntar: que fim levou a Estratégia de Lisboa no seu “desideratum” de tornar a economia européia, em 2010, a mais competitiva a nível mundial ? Que fim levou o redesenho dessa Estratégia cujo enfoque consistia , precisamente, na adoção de uma ajustada política de emprego? Que foi feito do artigo 10 do TCE , reiterado no TFUE, instituído desde o Tratado de Roma como peça chave do processo de integração , com relação aos deveres cometidos aos Estados Membros de fidelização, de colaboração, de cooperação e de não obstaculização à realização dos objetivos inscritos no Tratado ? Este cenário deprimente suscitou-me ,inicialmente, surpresa . Como pôde a situação atingir tal ponto de quase ruptura com o ideal europeu de Monnet, Schuman, Adenauer, De Gasperi e de tantos outros que viam na Europa o ideal da união dos povos com respeito à sua história ,às suas tradições, ao seu patrimônio cultural ? Depois , indignação. Como se permitiram Estados Membros agir com tamanho grau de irresponsabilidade e como se permitiram o Conselho e a Comissão não atuar no momento próprio , tomando as medidas corretivas e – até punitivas- , previstas no Tratado, tendo em vista o tamanho da crise a nível das economias desenvolvidas? Agora, uma incipiente esperança. Esperança na guinada certa para o rumo certo da União Européia. Membro do Instituto dos Advogados Brasileiros. Juíza Federal Jubilada. * O texto publicado não reflete necessariamente o posicionamento do IAB