CAFEZAL: Amor e Esperança
Casamento Matuto de Dallva Rodrigues
Dois jovens que se rendem ao amor, em meio aos primeiros pés de café, plantados em nosso Ceará.
O Capitão-Mor Manoel José do Monte estaria disposto a tudo por Cecília de Xerez Furna Uchôa, que
também por esperança de dias melhores, e por acreditar na felicidade, enfrenta sua família, e nos fala
de amor, tocando o coração do nobre pai, o PAI DO CAFÉ, de sua mãe, de uma meio irmã, ainda
escrava, e de todos que vierem se deliciar nessa doce, forte e emocionante história.
Personagens:
Capitão-Mor José Xerez Furna Uchôa, o Pai do Café
Cecília de Xerez Furna Uchôa, sua filha
Carlota de Xerez Furna Uchôa, sua esposa
Maria Lua, a escrava, filha bastarda do Capitão
Capitão-Mor Manoel José do Monte, o noivo
Antônio Alves, pai do noivo
Helena, mãe do noivo
Prefeito
Padre
Escravo
Juiz de Paz
Convidados
CENA 1
Ouvem-se gritos ao longe. É o casal, O Capitão-Mor Manoel José do Monte, um nobre sobralense, e Cecília de
Xerez Furna Uchôa, filha de Capitão-Mor José Xerez Furna Uchôa, o Pai do Café, que se aproximam, correndo.
Cecília: - Não! Me deixa!
Manoel: - Então, me escuta! (Ele a derruba no chão, e tenta lhe acalmar.)
Cecília: - Não! Com você eu não fugo! (Se levantando, lhe dá as costas.) Não vou deixar minha família,
assim, desse jeito!
Manoel: - Não tem outro jeito pra nós!... (Romântico. Fala de longe.) Eu te quero tanto bem! Não posso
te perder assim!
Cecília (O Olha, apaixonada): - Você não vai me perder!... Eu te prometo!
Manoel (Enciumado, nervoso): - Como promete se tão te mandando embora?
Cecília: - Só pra eu estudar!
Manoel: - Mas, pra quê estudar? (A abraça forte.) Pra quê ficar longe de mim?... (A encara, quase a
beijando.) Eles estão tentando separar a gente!
Cecília: - NÃO!... Amor, meu pai não sabe de nada! Nem meus irmãos sabem de nada!... Senão... Tu
já estaria morto!
Manoel (Se afasta, triste): - Eu não ia me importar se a gente morresse junto!
Cecília (Chorosa): - Não fala assim, meu amor!
Manoel (Sem olhar pra ela, baixa a cabeça, triste): - Em Portugal você se esquece de mim!
Cecília: - Eu não te esqueço!
Manoel: - Com aqueles almofadinha que tem lá!
Cecília: - Eu vou ficar trancada num colégio!
Manoel: - Mas, eles pulam o muro!
Cecília: - Que muro? Não pense que todo mundo é maluco que nem você!
Silêncio. Os dois se encaram, chorosos.
Manoel: - Que garantia você me dá que volta pra mim?
Cecília (Correndo, o beija, apaixonada): - Esta!... Esta!... Esta!... E te dou uma prova ainda, Capitão-Mor
Manoel José do Monte... (Se afasta, e abre os braços, se entregando.) ME FAÇA TUA!
Manoel (Surpreso, se aproxima e lhe dá um longo beijo. Se afasta, bruscamente): - NÃO!
Cecília: - Você não me quer?
Manoel (Sério, de longe): - Você é tudo que eu mais quero na minha vida! Mas, não assim! Parece mais
maluca que eu!
Cecília: - Você tá com mais medo de quem? Do meu pai ou do teu?
CENA 2
Maria Lua: - CECÍ!!!!
Ouve-se Maria Lua, ao longe. Cecília, se assusta, e manda Manoel sumir dali, rápido. A escrava chega, e ainda vê
ele indo embora.
Maria: - Cecí??? O que houve?
Cecília: - Nada!... Me deixa!
Maria: - Não mente pra mim!
Cecília: - Eu não fiz nada!
Maria: - Eu não sou trouxa! E te quero bem! Confia na tua... (Engasga e não fala.)
Cecília (A olha, triste.): - Eu gosto dele, Maria Lua! Eu o amo!
Maria: - Não deixa ninguém saber disso!... Não deixa!
Cecília: - Então, o que eu faço? Me diz!... O que eu faço da minha vida?
Maria: - Eu não sei, minha... Querida! A festa vai começar! O Capitão te espera! E sua mãe mandou
eu lhe chamar!
Cecília lhe dá a mão e as duas saem correndo.
CENA 3
A festa começa. Convidados chegam, e o prefeito da cidade de Sobral surge, e discursa.
Prefeito: - Hoje é um grande dia! Vamos, finalmente, inaugurar a nossa tão sonhada Capela de Santo
Antônio, graças à doação do generoso Capitão-Mor José de Xerez Furna Uchôa, de nobre
descendência portuguesa, mas morador das terras brasileiras desde 1550! Um cidadão querido e
respeitado, homem de uma só palavra, caridoso, protetor dos pobres, que tem trabalhado
incansavelmente no serviço público de nossa Sobral!
HOJE, Senhor José de Xerez Furna, na ocasião dessa grande realização, receba nossa homenagem
por todos esses feitos, e ao que mais nos emociona... Por ter, AQUI, na Serra da Meruoca, plantado
a primeira muda, O PRIMEIRO PÉ DE CAFÉ do nosso Ceará. Receba de nosso povo, mais um
nobre título... O de PAI de todos os cafezais de nosso estado!
Aplausos. Recebe das mãos do Prefeito o título simbólico. Mais aplausos.
Nesse momento, surge um escravo que se aproxima, e fala ao ouvido do Capitão. O mesmo não gosta do que houve
e olha a filha, repreendendo-a. Ele a pega pelo braço e saem, juntamente com sua esposa.
CENA 4
A festa continua. Antônio Alves, o pai de Manoel e sua mãe, Helena, se aproximam dele. Pai e filho discutem.
Antônio Alves: - Onde esteve?
Manoel (Sério): - Eu fui ver a Cecília!
Antônio: - Tu não está brincando com teu pai!?
Manoel: - Não, pai!
Antônio: - NÃO QUERO SABER!... Tenho ódio ao pai dela!... A mãe dela!... Os irmãos dela!...
Toda aquela raça de portugueses maldita!
Manoel: - Eu sei, pai! Eu sei!
Antônio!: - Você não vá me fazer a desfeita de correr atrás daquela...
Manoel: - Não fale assim da Cecília!...
Antônio (Interrompe, gritando): - NÃO ADMITO QUE VOCÊ FALE DELA! NÃO! NÃO QUERO
SABER!
Todos da festa se assustam. Começam a sair. Os dois continuam, furiosos.
Antônio: - E escuta: Aprende uma coisa: Você só olha pra aquela lá depois que eu morrer!
Manoel (Respira fundo, e encarando o pai): - EU ESPERO O PAI MORRER!
Antônio: - É bom parafusar bem o caixão. Senão eu levanto, e te dou uma corsa. (Sai furioso.)
Helena (Se aproximando): - Filho, você tá brincando com a sorte!
Manoel: - Como que eu tô brincando com a sorte, se eu perdi ela!
Helena: - Como?
Manoel (Enfim, encara a mãe): - É. Ela vai embora. (Manoel sai por outro lado, desnorteado.)
A mãe, preocupada, sai pro lado que Antônio saiu.
CENA 5
Entram Cecília e a Mãe, Carlota.
Carlota: - E então, filha?! Falou com ele?
Cecília: - Falei, mainha! Brigamos! Ele não acredita que eu vou voltar pra ele!
Carlota: - Mas, ele pode estar certo! Filha, vai que um dia, de repente, você conhece outro, que
agrade seu pai, neh?
Cecília: - Nunca vai ter outro, mainha!
Carlota: - Ah, filha! Isto nunca se sabe! Nunca se sabe!
Silêncio.
Cecília se enche de coragem e encara a mãe.
Cecília: - EU QUIS ME DÁ PRA ELE!
Carlota: - O quê? Não fala uma coisa dessa! Não pensa uma coisa dessa que teu pai te mata!
Cecília: - Eu não quero mais ir pra colégio nenhum, não! ME AJUDA, MAINHA!
Carlota: - Eu não posso fazer nada, minha filha! Não posso fazer nada!
Cecília chora abraçada com a mãe.
CENA 6
O pai entra com o mesmo escravo que se aproximou na festa.
Capitão: - Cecília!...
Ela enxuga as lágrimas, e tenta se recompor. Fica nervosa com a chegada do pai.
Cecília: - Sim, painho!
Capitão: - Me diga o que aquele lá... O Capitão-Mor Manoel José do Monte conversava com você,
em meio aos nossos cafezais, hoje pela manhã.
Cecília (Mais nervosa ainda): - Eu não vi nenhum... (Engasga, olhando para o escravo.) Eu não falei com
ninguém!...
Capitão (Sério, sem acreditar na filha, ordena): - Tu acaba logo o enxoval dessa menina, Carlota! Semana
que vem ela embarca para Portugal.
Cecília (Se desespera): - E se eu não quiser ir, painho!?
Capitão: - Tu não tem querer!... Ou então... Por via das dúvidas... Mando capar aquele...
Cecília: - NÃO, PAINHO!...
Capitão (Furioso): - ENTÃO, NÃO MINTA MAIS PRA MIM!
Maria Lua que, de longe, assistia a discussão, intercede.
Maria Lua: - MAS, ELA O AMA, CAPITÃO!...
Todos a olham, confusos. Carlota, enfurecida, parte para cima dela.
Carlota: - O que você está fazendo aqui??? Esse é um assunto de FAMÍLIA! Saia já daqui, sua...
BASTARDA!
Maria Lua (Chorosa, baixa a cabeça): - Me perdoem! (Vai saindo.)
Cecília: - Não, Maria! Fique!... (Se aproxima dela.) Ela tem razão! (Encara o pai, que continua firme.) EU O
AMO, MEU PAI!
Carlota (Intercede): - Esquece esse homem, Cecília! Pelo amor de Deus! Pro teu bem, até! Ou você tá
querendo que aconteça uma desgraça!
Cecília: - Não, mainha! Não quero isso!
Carlota: - Então, esquece isso! Tu és bela! Um dia vai aparecer alguém que vai se apaixonar por
você de verdade! E aí, você vai se casar... Sem discussão, sem briga, sem desgraça!
Cecília: - Mas, se eu não gostar desse alguém?
Carlota: - Ah... A gente aprende a gostar, filha! Depois que casa, a gente aprende!
Cecília (Amargurada): - Foi assim com a senhora, mainha?... (Encara o pai agora) E o senhor, painho... O
Senhor é tão nobre e exímio, amava mainha quando casou com ela?
Capitão: - Não fale bobagem! É claro que a amava!
Cecília: - E também amava a mãe de Maria Lua?
Carlota (Nervosa): - Cecília... Isso não vem ao caso! Não é assunto de família!
Cecília: - É sim, mainha! É sim, painho! Por que eu só estou pedindo UMA coisa! Só estou pedindo
para ser feliz! Por que eu acredito no amor que sinto, e no amor que Manoel sente por mim! E eu sei
que o senhor entende isso! Sei o quanto o senhor amou a mãe de Maria Lua...
Carlota (Revoltada): - CECÍLIA... EU NÃO ADMITO ISSO!
Cecília (Firme): - TANTO QUANTO AMOU MAINHA, NÃO FOI?
Silêncio.
Cecília (Vai se aproximando do Pai): - O Senhor... ME AMA? (Olha Maria Lua.) E ama sua filha escrava?!!
O pai, em fúria, dá um tapa em sua cara, que chora compulsivamente. Silêncio. O Capitão está visivelmente
emocionado, e arrependido. Olha a filha chorando, e olha também para Carlota, que não acredita no que vê.
Mas, antes de falar, encara Maria Lua, que também chora. Suspira fundo, baixa a cabeça, e encara Cecília.
Capitão (Fala firme, mais triste): - Pronto! Seja feita tua vontade, filha! Pode desfazer as malas! E
vamos cuidar desse casório!
Cecília sorri. Abraça o pai, fortemente.
Carlota, sorri. Mas, ainda se sente desnorteada pelas palavras proferidas pela filha.
Cecília também abraça Maria Lua.
Sai o Capitão e escravo. Carlota assiste, indignada, a conversa das duas.
Cecília: - Por tudo que tem feito por mim... Quero que seja a madrinha de meu casamento!
Maria Lua: - Mas... Mas... Eu sou apenas...
Cecília: - VOCÊ É MINHA IRMÃ!
Maria Lua chora, emocionada. As três saem.
CENA 7
Manoel entra correndo. Sua mãe vem logo atrás, aos prantos.
Helena: - Não, meu filho! Não faça isso!
Manoel: - Minha mãe! Eu já decidi!
Helena: - Mas, seu pai se mata, Manoel!
Manoel: - Minha mãe... Não deixe! Não deixe ele fazer uma loucura dessas!... Agora... eu tenho que
ir!... Cecília me espera! (Beija a mão dela e sai.)
Helena (Aos prantos): - MANOEL!!! (Sai, correndo pelo outro lado.)
CENA 8
Música: Flor do Cafezal.
FESTA. Os convidados começam a chegar. O Padre e o Juiz já se encontram lá. O Capitão e sua esposa também
esperam a chegada da filha. O noivo chega angustiado.
Carlota (Para Manoel): - Onde estão seus pais, Manoel?!
Manoel (Constrangido): - Eles não virão, Dona Carlota. Não aceitam minha união com Cecília.
Capitão (Interpele, enfurecido): - Mas, isso é uma afronta! Não sei onde eu estava com a cabeça quando
eu permiti esse casório.
Manoel (Provocativo): - Eu também gostaria de saber, Capitão!
Carlota: - Isso não lhe diz respeito, rapaz!
Manoel: - Mas, HOJE... Eu passo a fazer parte dessa família!
Antônio (Entra, gritando, acompanhado da esposa): - EU NÃO ADMITO!...
Manoel: - Meu pai!... Eu sei, meu pai! Mas... Mas... Eu a quero mais que tudo na minha vida, meu
pai! E... E... Também não quero que o Senhor morra, meu pai!
Helena: - Escute seu pai, Manoel!
Antônio (Encara o Capitão): - Esse Senhor... Sempre foi muito zeloso com seus títulos de nobreza... A
ponto de não querer como genros pessoas da elite sobralense como o MEU filho Capitão-Mor
Manoel José do Monte. Não sei o que aconteceu para que o nobre Senhor tenha mudado de idéia...
Mas... EU NÃO ADMITO que você, meu filho... Se case sem minha benção!...
Todos sorriem aliviados. Cecília e Maria Lua, que tinham chegado durante a discussão também vibram.
Antônio: - Me dê aqui um abraço, filho!
Manoel corre e abraça o pai. E volta rápido até a sua noiva. Padre inicia a cerimônia.
Padre: - Enfim... Vamos dar início a nossa celebração que une POR AMOR E ESPERANÇA esse
jovem casal. Cecília de Xerez Furna Uchôa, aceita como seu legítimo esposo o Capitão-Mor
Manoel José do Monte?
Cecília (Sorrindo): - Aceito sim!
Padre: - Capitão-Mor Manoel José do Monte, aceita Cecília de Xerez Furna Uchôa como sua
legítima esposa?
Manoel (Apaixonado): - É tudo o que eu mais quero!
Padre: - Então... Em nome de Deus! Eu vos declaro, marido e mulher!
Noivos trocam alianças e assinam livro com Juiz de Paz. Longo e apaixonado beijo.
Maria Lua recebe das mãos de seu pai a faixa de Rainha.
FESTA!!!
Fim.
Com carinho para a Filhos do Sertão.
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