Poder Judiciário TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 5ª REGIÃO Gabinete do Desembargador Federal Geraldo Apoliano nge APELAÇÃO CRIMINAL Nº 7792-CE (2002.81.00.011020-0) RELATÓRIO O DESEMBARGADOR FEDERAL GERALDO APOLIANO (RELATOR): O Ministério Público Federal ofereceu denúncia contra os seguintes Réus, com a seguinte imputação delitiva: a) art. 89 da Lei 8.666/93: Alexandre de Castro Cals Gaspar, Ari Dileno Furtado, Carlos Glauter Gonsalves de Lucena, Davi Bezerra Neto, Francisco Robério Rodrigues Romero, Francisco Vilmar Pinto, Jessé Bezerra de Araújo, Joaquim Neto Bezerra, José Murilo de Carvalho Martins, José Sérgio Teixeira Benevides, Juraci Vieira de Magalhães, Lucíola Marina de Aquino Cabral, Martônio Montalverne Barreto Lima, Pedro Saboya Martins, Pedro Wilton Clares, Petrônio Vasconcelos Leitão, Renato Parente Filho, Rômulo Guilherme Leitão, Rose Mary Freitas Maciel, Stênio Rocha Carvalho Lima, Teodora Ximenes da Silva. b) art. 90 da Lei 8.666/93: Alexandre de Castro Cals Gaspar, Ari Dileno Furtado, Davi Bezerra Neto, Francisco Robério Rodrigues Romero, Francisco Vilmar Pinto, Jessé Bezerra de Araújo, José Cals Gaspar Júnior, José Sérgio Teixeira Benevides, Juraci Vieira de Magalhães. c) art. 91 da Lei 8.666/93: Alexandre de Castro Cals Gaspar, Ari Dileno Furtado, Davi Bezerra Neto, Francisco Robério Rodrigues Romero, Francisco Vilmar Pinto, Francislúcia Macedo Teixeira, Jessé Bezerra de Araújo, José Sérgio Teixeira Benevides, Juraci Vieira de Magalhães. d) art. 92 da Lei 8.666/93: Alexandre de Castro Cals Gaspar, Ari Dileno Furtado, Davi Bezerra Neto, Francisco Robério Rodrigues Romero, Francisco Vilmar Pinto, Jessé Bezerra de Araújo, José Cals Gaspar Júnior, José Sérgio Teixeira Benevides, Juraci Vieira de Magalhães. e) art. 95 da Lei 8.666/93: Alexandre de Castro Cals Gaspar, Ari Dileno Furtado, Davi Bezerra Neto, Francisco Robério Rodrigues Poder Judiciário TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 5ª REGIÃO Gabinete do Desembargador Federal Geraldo Apoliano nge APELAÇÃO CRIMINAL Nº 7792-CE (2002.81.00.011020-0) Romero, Francisco Vilmar Pinto, Jessé Bezerra de Araújo, José Sérgio Teixeira Benevides, Juraci Vieira de Magalhães. f) art. 96, incisos I a III, da Lei 8.666/93: Alexandre de Castro Cals Gaspar, Ari Dileno Furtado, Davi Bezerra Neto, Francisco Robério Rodrigues Romero, Francisco Vilmar Pinto, Jessé Bezerra De Araújo, José Cals Gaspar Júnior, José Sérgio Teixeira Benevides, Juraci Vieira de Magalhães, Rômulo Guilherme Leitão, Rose Mary Freitas Maciel. g) art. 1º, incisos I, XI e XII, do DL 201/67: Juraci Vieira de Magalhães. h) art. 1º, incisos V e VII, §§ 1º e 2º, da Lei 9.613/98: Alexandre de Castro Cals Gaspar, Ari Dileno Furtado, Davi Bezerra Neto, Francisco Robério Rodrigues Romero, Francisco Vilmar Pinto, Jessé Bezerra de Araújo, José Cals Gaspar Júnior, José Sérgio Teixeira Benevides, Juraci Vieira de Magalhães. i) art. 288 do Código Penal: Alexandre de Castro Cals Gaspar, Ari Dileno Furtado, Davi Bezerra Neto, Francisco Robério Rodrigues Romero, Francisco Vilmar Pinto, Jessé Bezerra de Araújo, José Cals Gaspar Júnior, José Sérgio Teixeira Benevides, Juraci Vieira de Magalhães. Com base em documentos por Auditoria do Tribunal de Contas da União, Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI Municipal da Merenda Escolar), Procedimento Administrativo (PR/CE) e Inquérito Policial, a denúncia considerou que houve irregularidades constatadas no convênio firmado entre a Prefeitura Municipal de Fortaleza/CE e o Ministério da Educação, através do FNDE, no valor de R$ 10.824.955,40 (dez milhões, oitocentos e vinte e quatro mil, novecentos e cinquenta e cinco reais e quarenta centavos), destinado ao Programa Nacional de Alimentação Escolar (PNAE), para aquisição de merenda escolar. Na execução do Convênio, foram constatadas, pelo Tribunal de Contas da União, diversas ilegalidades na aplicação dos recursos federais, verificou-se, de imediato, que, do montante repassado à Prefeitura de Fortaleza, Poder Judiciário TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 5ª REGIÃO Gabinete do Desembargador Federal Geraldo Apoliano nge APELAÇÃO CRIMINAL Nº 7792-CE (2002.81.00.011020-0) (63,3%), mais de R$ 6.400.000,00 (seis milhões e quatrocentos mil reais), foram pagos sem a devida licitação, em face da dispensa indevida de procedimento licitatório, da simulação de certame, do patrocínio de interesse privado, da obtenção de vantagem ilícita, da venda superfaturada, da aquisição de mercadoria deteriorada e da entrega de uma mercadoria por outra. Também o procedimento administrativo realizado pela Procuradoria Regional da República, que deu ensejo à ação civil pública de improbidade administrativa constatou que a urgência necessária para a dispensa ou inexigibilidade de licitação não estaria caracterizada; havia discrepância entre cardápio e alimentos adquiridos; os produtos formulados vendidos pelas empresas J&D e Mares evidenciariam simulação, tendo a primeira recebido R$ 260.931,79 e a segunda R$ 1.192.309,90, no período de setembro de 1998 a maio de 1999, sendo curioso que o endereço das mesmas apontassem serem vizinhas, inclusive após mudanças de sedes, imputando aos denunciados a prática dos delitos tipificados acima, na inicial. A sentença julgou procedente em parte o pedido, e incicialmente, declarou extinta a punibilidade pela prescrição em abstrato com relação ao crime previsto no art. 91, da Lei nº 8.666/93, absolveu os Réus José Cals Gaspar Júnior, Alexandre de Castro Carls Gaspar, Davi Bezerra Neto, Francisco Robério Rodrigues Romero, de todas as imputações constantes na Denúncia; Jessé Bezerra de Araújo das imputações do 91, I, da Lei nº 8.666/93 e do art. 1º, V, da Lei nº 9.613/98; Rose Mary Freitas Maciel dos crimes previstos nos arts. 91, I, da Lei nº 8.666/93 e 89, da Lei nº 8.666/93, e José Sérgio Teixeira Benevides e Francisco Vilmar Pinto do crime previsto no art. 92, da Lei nº 8.666/93, e condenou Jessé Bezerra de Araújo pela prática dos delitos dos arts. 89, 90 e 92 da Lei n º 8.666/93, e José Sérgio Teixeira Benevides e Francisco Vilmar Pinto dos crimes descritos nos arts. 89, 90 e 96, I da Lei nº 8.666/93, com a pena assim imputada: 1) Jessé Bezerra de Araújo: 03 (três) anos de detenção, para o crime previsto no art. 89, da Lei nº 8.666/93; Poder Judiciário TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 5ª REGIÃO Gabinete do Desembargador Federal Geraldo Apoliano nge APELAÇÃO CRIMINAL Nº 7792-CE (2002.81.00.011020-0) 02 (dois) anos de detenção, para o crime previsto no art. 90, da Lei nº 8.666/93; 02 (dois) anos de detenção, para o crime previsto no art. 92, da Lei nº 8.666/93. 30 (trinta) dias-multa, sendo 10 (dez) para cada delito, cada um deles no valor de 1/30 (um trigésimo) do salário mínimo vigente à época dos fatos; 2) José Sérgio Teixeira Benevides: 04 (quatro) anos de detenção, para o crime previsto no art. 89, da Lei nº 8.666/93; 03 (três) anos de detenção, para o crime previsto no art. 90, da Lei nº 8.666/93; 04 (quatro) anos de detenção, para o crime previsto no art. 96, I, da Lei nº 8.666/93. 900 (novecentos) dias-multa, sendo 300 (trezentos) para cada delito, cada um deles no valor de 1/10 (um décimo) do salário mínimo vigente à época dos fatos; 3) Francisco Vilmar Pinto: 03 (três) anos de detenção, para o crime previsto no art. 89, da Lei nº 8.666/93; 02 (dois) anos de detenção, para o crime previsto no art. 90, da Lei nº 8.666/93; 03 (três) anos de detenção, para o crime previsto no art. 96, I, da Lei nº 8.666/93. 30 (trinta) dias-multa, sendo 10 (dez) para cada delito, cada um deles no valor de 1/30 (um trigésimo) do salário mínimo vigente à época dos fatos; Apela o Ministério Público Federal, insurgindo-se contra as absolvições de: Poder Judiciário TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 5ª REGIÃO Gabinete do Desembargador Federal Geraldo Apoliano nge APELAÇÃO CRIMINAL Nº 7792-CE (2002.81.00.011020-0) a) Alexandre Castro Cals Gaspar, afirmando que ele, na qualidade de procurador da empresa J&D Comercial Ltda., de propriedade dos irmãos Jessé Bezerra e Davi Bezerra e também da empresa Mares, era na verdade um gestor das empresas, junto com os sócios responsáveis, tendo participado da artificialidade da Tomada de Preço n.º 017/98 quanto à participação da empresa, tendo apresentado, em 21 de setembro de 1998, a proposta da empresa J&D, com um preço de produtos, ao mesmo tempo que apresentou outra proposta com preços menores da outra empresa, a Mares, porém com preços menores, tendo esta sido vitoriosa e, inicialmente, realizado as vendas de mercadorias em 29/9/1998 (NF 02 - apenso 2, fl. 347) e em 27/10/1998 (NF's 248 e 249 - apenso 1, fl. 10), porém, em seguida, partir de outubro de 1998, a J&D, mesmo derrotada na tomada de preços, passou a fornecer produtos alimentícios à Prefeitura Municipal de Fortaleza, com os mesmos valores apresentados pela Mares, sendo ele também responsável pelas vendas da empresa com pagamento antecipado. b) Rose Mary Freitas Maciel, na qualidade de Secretária do Desenvolvimento Social do Município de Fortaleza, cargo assumido em junho de 1999, era a responsável pela contratação das empresas sem o devido procedimento licitatório, e sem a participação dela as empresas J e D. e Mares nunca teriam sido contratadas, posto que ela determinava as compras da merenda escolar com a dispensa do certame. c) Francisco Romero Robério, responsável pela empresa Hortofácil, do Estado do Paraná, utilizou a empresa para depositar e sacar os cheques recebidos das empresas J. e D e Mares, destinado os valores depositados aos Corréus Sérgio Benevides, Francisco Vilmar e Alexandre Gaspar, que, como dinheiro, adquiriram diversos imóveis e móveis, incidindo no crime de lavagem de dinheiro, previsto no art. 1º, § 1º, II, da Lei nº 9.613/98 –fls. 3084/3105. Contrarrazões dos Réus ao recurso do MPF às fls. 3111/3125, 3129/3147 e 3247/3251. Francisco Vilmar Pinto, em sua Apelação, requer, em preliminar, a nulidade do processo, afirmando que o indeferimento indevido das testemunhas de defesa, sem qualquer fundamentação, visto que nenhuma das que ele arrolou Poder Judiciário TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 5ª REGIÃO Gabinete do Desembargador Federal Geraldo Apoliano nge APELAÇÃO CRIMINAL Nº 7792-CE (2002.81.00.011020-0) fora ouvida em juízo, constitui cerceamento de defesa, além de violar o art. 93, IX, da Constituição Federal. No mérito, afirma que, com relação ao crime previsto no art. 89, da Lei nº 8.666/93, imputa a responsabilidade a Sérgio Benevides, que, na qualidade de Deputado Estadual influenciava constantemente no resultado das licitações, e que não recebeu dinheiro para intermediar os contatos entre a Prefeitura de Fortaleza/CE e as empresas fornecedoras de merenda escolar, porque era apenas o representante comercial da empresa J e D Comercial Ltda., restringindo-se apenas a apresentar os alimentos da merenda para degustação de aceitação de produtos e recebia comissões pelo seu trabalho, e não pela prática de ilícitos, ressaltando que não beneficiou terceiros com a sua conduta, afirmando, ainda a impossibilidade de incidir na conduta delituosa do referido artigo, porque não seria servidor público. Com relação ao art. 90, da Lei nº 8.666/93, afirma que, além de a denúncia não narrar a sua participação no referido delito, sendo, portanto, inepta neste ponto, não participou de qualquer esquema formado para vender mercadoria escolar à Prefeitura de Fortaleza/CE, sem licitação, porque não ofereceu vantagem indevida a terceiros ou às empresas com o intuito de fraudar o caráter competitivo do certame. Com relação ao art. 96, I, da Lei nº 8.666/93, a impossibilidade de ser agente ativo do referido delito porque apenas os licitantes podem ser sujeitos ativos do delito em comento, e ele nunca participou do procedimento licitatório da Hortofácil com a Prefeitura de Fortaleza/CE, pois na época o responsável pela empresa era o sócio Ari Dileno e o procurador da empresa era Alexandre Gaspar que determinaram os valores superfaturados, ressaltando que as comissões que recebeu advieram de atividades legítimas e não da prática delitiva – fls. 3164/3186. Recorre José Sérgio Teixeira Benevides, sustentando, em preliminar, a nulidade do processo em face do cerceamento de defesa por conta do indeferimento da oitiva de algumas das testemunhas por ele arroladas. Poder Judiciário TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 5ª REGIÃO Gabinete do Desembargador Federal Geraldo Apoliano nge APELAÇÃO CRIMINAL Nº 7792-CE (2002.81.00.011020-0) No mérito, salienta que não teve qualquer ingerência ou influência nos negócios das empresas com a Prefeitura de Fortaleza/CE, afirmando ausentes as provas de sua participação nos fatos delituosos, porque a prova documental, testemunhal ou os outros denunciados não confirmam sua participação na prática delitiva, atraindo a aplicação do Princípio “ in dubio pro reo” –fls. 3197/3219. Jessé Bezerra de Araújo restringe sua apelação a pedido de redução na dosimetria da pena, requerendo a aplicação da atenuante de confissão espontânea (art. 65, III, “ d” , do Código Penal), por ter ele reconhecido, tanto na esfera policial quanto em Juízo, a prática delitiva, afirmando que a aplicação da Súmula nº 231, do STJ, constitui ilegalidade em contraponto ao disposto no caput do art. 65, do CP, que afirma que as circunstâncias atenuantes nele indicados sempre atenuam a pena, o que indica que tal ocorreria mesmo que ela findasse por ficar abaixo do mínimo legal –fls. 3226/3237 Contrarrazões do MPF às fls. 3253/3672. O opinativo do ilustre representante do Parquet Regional foi no sentido de declarar a extinção da punibilidade pela consumação da prescrição retroativa, nos termos do art.109, IV e 110, § 1º, do CP, com relação ao crime previsto no art. 90, da Lei nº 8.666/93, e no mérito, com relação aos outros delitos, a ausência de nulidade por cerceamento de defesa, salientando que não fora provado pelos Réus recorrentes o efetivo prejuízo pelo indeferimento de testemunhas. Com relação ao Recurso Ministerial, afirma a ausência de provas de autoria delitiva, bem como dos elementos subjetivos dos delitos dos Réus absolvidos, devendo ser mantidas as suas absolvições, opinando pelo desprovimento do recurso ministerial. No tocante aos Recursos dos Réus, requer a manutenção da sentença, que analisou de forma percuciente as provas dos autos, concluindo acertadamente pela prova da autoria e materialidade delitivas com relação aos recorrentes, pelo como pela presença do elemento subjetivo do delito, e, por fim,, sustenta a impossibilidade de se fixar a pena privativa de liberdade abaixo do Poder Judiciário TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 5ª REGIÃO Gabinete do Desembargador Federal Geraldo Apoliano nge APELAÇÃO CRIMINAL Nº 7792-CE (2002.81.00.011020-0) mínimo legal em face da incidência de atenuante genérica, devendo incidir a Súmula nº 231, do STJ –fls. 3275/3310. É o relatório. Ao eminente Revisor Poder Judiciário TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 5ª REGIÃO Gabinete do Desembargador Federal Geraldo Apoliano nge APELAÇÃO CRIMINAL Nº 7792-CE (2002.81.00.011020-0) VOTO O DESEMBARGADOR FEDERAL GERALDO APOLIANO (RELATOR): Aprecio inicialmente o recurso do Ministério Público Federal. Requer o “ Parquet”a condenação de Alexandre Castro Cals Gaspar, procurador da empresa J&D Comercial Ltda. fornecedora de merenda escolar à Prefeitura de Fortaleza/CE nos crimes previstos nos arts. 89, 91, 92, 95 e 96, I, da Lei nº 8.666/93 e no art. art. 1º, § 1º, II, da Lei nº 9.613/98; Rose Mary Freitas Maciel, na qualidade de Secretária do Desenvolvimento Social do Município de Fortaleza, cargo assumido em junho de 1999, como responsável pela contratação das empresas sem o devido procedimento licitatório nos delitos dos arts. 89 e 96, I ,d a Lei nº 8.666/93, e de Francisco Romero Robério, responsável pela empresa Hortofácil, do Estado do Paraná, que teria utilizado a empresa para depositar e sacar os cheques recebidos das outras firmas para os Corréus Sérgio Benevides, Francisco Vilmar e Alexandre Gaspar, adquirirem diversos imóveis e móveis, devendo a conduta dele incidir no art. 1º, § 1º, II, da Lei nº 9.613/98. Todavia, as provas dos autos não indicam a participação dolosa de Alexandre Castro Cals Gaspar, Rose Mary Freitas Maciel e Francisco Romero Robério nos crimes licitatórios ou mesmo de lavagem de dinheiro. A sentença, analisando a autoria delitiva dos crimes imputados pelo MPF aos prefalados Réus, não verificou indícios de autoria e de materialidade delitivas com relação a eles. Com relação a Alexandre de Castro Cals Gaspar, nota-se, da leitura dos autos, que ele era mero da J&D fornecedora de alimentos, sem poder de decidir as táticas assumidas pela empresa, subordinado ao Corréu Jessé Araújo. Ao buscar soluções operacionais para a J&D, inclusive com a parceria com a empresa Hortofácil, ele apenas agiu com a iniciativa esperada de um funcionário comprometido com seu emprego, de onde retirava seu sustento, não se podendo exigir dele outro comportamento de Alexandre Cals Gaspar, Poder Judiciário TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 5ª REGIÃO Gabinete do Desembargador Federal Geraldo Apoliano nge APELAÇÃO CRIMINAL Nº 7792-CE (2002.81.00.011020-0) senão o cumprimento de suas atribuições funcionais, impondo-se sua absolvição com supedâneo no art. 386, VI, do CPP. Também Francisco Robério Rodrigues Romero, que à época dos fatos trabalhava com recolhimento de lixo da Prefeitura de Fortaleza/CE, teve participação pontual, restrita a uma procuração da Hortofácil e a depósitos bancários efetivados em sua conta corrente, em nome da amizade que tinha com Sérgio Benevides, não tendo se beneficiado com o dinheiro do Convênio ou recebido qualquer comissão, desconhecendo a origem do dinheiro que era depositada em sua conta, acreditando apenas que fazia um favor a uma pessoa influente da Prefeitura. Como bem salientou a sentença, “ sem embargo de que o denunciado recebeu cheques emitidos por Jessé Bezerra e pelas empresas J e D e Hortofácil, considerando que ele apresentou justificativas plausíveis sobre os motivos e o destino dos títulos de crédito, ficou frágil a caracterização do liame com as condutas enquadradas na Lei de Licitações” , ressaltando que o fato de emprestar a conta-corrente para trocar três cheques para um amigo não configura prática delitiva, se o Dono da conta corrente desconhecia a referida prática pelos Corréus–fls. 2910. Além disso, nenhuma das testemunhas ouvidas em Juízo indicou Francisco Robério como relacionado a qualquer das empresas fornecedoras de alimentos participantes das licitações fraudulentas, e a procuração dada pela Hortofácil não fora utilizada ou tivera qualquer relevância nos fatos além de sua mera existência. Por fim, salientou a sentença quanto aos crimes de lavagem de dinheiro, que os acusados usaram as comissões recebidas ilegalmente de forma direta, usando o dinheiro para adquirir bens e constituir empresas, faltando o elemento dissimular ou ocultar a origem do dinheiro, sendo a aquisição de bens mero exaurimento da prática delituosa referente ao crimes licitatórios configurando o pós fato impunível, porque os réus fizeram uso direto do proveito econômico propiciado pelos crimes licitatórios praticados anteriormente. Poder Judiciário TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 5ª REGIÃO Gabinete do Desembargador Federal Geraldo Apoliano nge APELAÇÃO CRIMINAL Nº 7792-CE (2002.81.00.011020-0) Quanto ao crime de quadrilha (art. 288, do CP), nota-se que não há entre Francisco Robério a associação permanente para a prática delitiva, visto que ele não tinha associação com Francisco Vilmar, mas apenas com Sérgio Benevides, de quem era amigo, e lhe pedia para depositar cheques em sua conta como um favor pessoal, havendo apenas uma ligação aleatória e restrita e não associação de vontades para cometer delitos. Quanto a Rose Mary Freitas Maciel, sua alegada conduta delitiva teria consistido em que ela, então secretária da Secretária do Desenvolvimento Social do Município de Fortaleza/CE - SDMS, requereu e homologou a dispensa de licitação em dezembro de 1999, resultando na contratação com a Hortafácil. No caso, observo que ela não agiu com dolo de burlar a Lei de Licitações. Quanto interrogada em Juízo afirmou ela que assumiu o cargo em junho de 1999 e realizou processo de dispensa de licitação para compra de merenda escolar naquele ano, tendo dispensado a licitação porque o Governo federal apenas teria repassado os recursos da merenda escolar a partir nos dias 30 de novembro e 1º de dezembro de 99, para não correr o risco de ter de devolver os recursos, deixando os alunos da rede municipal, no período de janeiro a maio de 2000, sem merenda, uma vez que não existia outra fonte de recurso naquele momento. Além disso, restou esclarecido nos autos que ela assumira a Secretaria Municipal de Desenvolvimento Social em junho de 1999, respondendo por três setores (Saúde, Educação e Assistência Social), cujo excesso de trabalho impossibilitava o controle direto de todas as atividades exercidas. Como bem ressaltou a sentença “ do início da gestão de Rose Mary (junho de 1999) até o processo de dispensa de licitação por ela homologado decorreram menos de seis meses, período reduzido para que a então secretária, médica com prática em gerenciamento hospitalar, se inteirasse sobre a realidade que cercava a aquisição de merenda escolar pela Prefeitura de Fortaleza. Ante a exiguidade do tempo, a pouca experiência na Administração Pública e o excesso de trabalho, não havia meios de Rose Mary adotar uma postura mais crítica para romper o paradigma adotado desde a época em que os certames ficavam a cargo Poder Judiciário TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 5ª REGIÃO Gabinete do Desembargador Federal Geraldo Apoliano nge APELAÇÃO CRIMINAL Nº 7792-CE (2002.81.00.011020-0) dos secretários regionais, que sempre realizavam compra de merenda escolar com dispensa de licitação alegando situação de emergência”–fls. 2875. Desta forma, nota-se que diante de tais circunstâncias, seria perfeitamente possível que ela não tivesse conhecimento sobre a existência de recursos em caixa aptos a ensejarem os processos de licitação pertinentes. Da leitura dos autos, nota-se que desde o início da celebração do convênio com o FNDE, inexistiu planejamento sobre a gestão dos recursos repassados, regular e periodicamente, pelo Ministério da Educação, antes da posse no cargo da Apelada, restado comprovada a ausência de dolo dolo de cometer o crime por parte de Rose Mary, que somente ingressou na SMDS em junho de 1999, figurando no processo de dispensa realizado no final daquele ano para suprimento de merenda escolar em 2000. Sobre a absolvição de Alexandre Castro Cals Gaspar, Rose Mary Freitas Maciel e Francisco Romero Robério posicionou-se a douta Procuradoria da República pela manutenção da absolvição, fundamentando-se que “ não se produziram durante a instrução processual provas incontestáveis quer da autoria quer do dolo nas condutas imputadas aos acusados-recorridos, a aplicação do princípio in dubio pro reo no caso ora em apreço é medida, rogata vênia, de direito”–fls. 3293. Desta forma, deve ser negado provimento à Apelação do MPF. No mérito, e com a máxima vênia aos entendimentos dissonantes, penso ser o caso de reconhecer-se a ocorrência da prescrição retroativa dos crimes do art. 90 e 92, da Lei nº 8.666/93, pelas razões postas a seguir. No tocante à condenação dos Apelantes José Sérgio Teixeira Benevides e Francisco Vilmar Pinto às penas de 03 (três) anos de detenção e 02 (dois) anos de detenção pela prática do crime previsto no art. 90, da Lei nº 8.666/93, e do Apelante Jessé Bezerra de Araújo, condenado às penas de 02 anos de detenção, 03 (três) anos de detenção pela prática do crime previsto no art. 90, da Lei nº 8.666/93 e de 02 (dois) anos de detenção, para o crime previsto no art. 92, da Lei nº 8.666/93, é o caso de aplicar-se o disposto no art. 61, do Poder Judiciário TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 5ª REGIÃO Gabinete do Desembargador Federal Geraldo Apoliano nge APELAÇÃO CRIMINAL Nº 7792-CE (2002.81.00.011020-0) Código de Processo Penal -CPP, ou seja, “ em qualquer fase do processo, o juiz, se reconhecer extinta a punibilidade, deverá declará-lo de ofício” . A teor do disposto no artigo 110, e parágrafos, do Código de Penal CP, verbis: “ Art. 110. A prescrição depois de transitar em julgado a sentença condenatória regula-se pela pena aplicada e verifica-se nos prazos fixados no artigo anterior, os quais se aumentam de um terço, se o condenado é reincidente. § 1º A prescrição, depois da sentença condenatória com trânsito em julgado para a acusação, ou depois de improvido seu recurso, regula-se pela pena aplicada. § 2º A prescrição, de que trata o parágrafo anterior, pode ter por termo inicial data anterior à do recebimento da denúncia ou da queixa.” Seguindo-se o entendimento sumulado no colendo Supremo Tribunal Federal –STF (Súmula 146) o prazo prescricional a ser observado após a prolação da decisão, quando transitada em julgado para a Acusação, pois o recurso do Ministério Público Federal não se destina a para majorar a reprimenda dos Réus condenados, estriba-se na pena em concreto que, no caso enfocado, não ultrapassou a 02 (dois) anos; confira-se, verbis: “ Súmula 146 - A prescrição da ação penal regula-se pela pena concretizada na sentença, quando não há recurso da acusação.” Os Apelantes José Sérgio Teixeira Benevides e Francisco Vilmar Pinto foram condenados às penas de 03 (três) anos de detenção e 02 (dois) anos de detenção pela prática do crime previsto no art. 90, da Lei nº 8.666/93. O Apelante Jessé Bezerra de Araújo foi condenado às penas de 02 anos de detenção pela prática do crime previsto no art. 90, da Lei nº 8.666/93 e de 02 (dois) anos de detenção, para o crime previsto no art. 92, da Lei nº 8.666/93. Poder Judiciário TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 5ª REGIÃO Gabinete do Desembargador Federal Geraldo Apoliano nge APELAÇÃO CRIMINAL Nº 7792-CE (2002.81.00.011020-0) Os lapsos temporais a serem considerado são os previstos no art. 109, IV e V, do Código Penal, ou seja, 04 (quatro) anos para a hipótese de o máximo da pena fixada não exceder 04 (quatro) anos de reclusão, e 08 (oito) anos para a hipótese de o máximo da pena fixada não exceder 04 (quatro) anos de reclusão. Entre a data do último fato delituoso referente ao crime do art. 90, da Lei nº 8.666/93 (ano de 1998) e a data do recebimento da denúncia (10.10.2007) com trânsito em julgado da sentença para a Acusação, transcorreram mais de 09 (nove) anos. Com relação ao crime previsto no art. 92, da Lei nº 8.666/93, entre a data do último fato delituoso (ano de 2000) e a data do recebimento da denúncia (10.10.2007) com trânsito em julgado da sentença para a Acusação, transcorreram mais 06 (seis) anos. Ao meu sentir, está concretizada a prescrição pela pena em concreto, uma vez que às penas imputadas aos Apelantes referentes aos crimes previstos nos arts. 90, da Lei nº 8.666/93 e 92, da Lei nº 8.666/93, corresponde os prazos prescricionais de 04 (quatro) anos e 08 (oito) anos, ex vi do disposto no art. 110, do Código Penal, período que foi ultrapassado, considerando-se o lapso temporal compreendido entre a data dos fatos delituosos (ano de 1998 e 2000) e a do recebimento da denúncia (10.10.2007). Destarte, dúvida não resta quanto à incidência da prescrição da pretensão punitiva, que teria mesmo de ser reconhecida, com ou sem requerimento da parte beneficiada, eis que se cuida de matéria de ordem pública, que pode (e deve) ser apreciada, inclusive, ex officio, pelo magistrado. Em face do exposto, declaro extinta a punibilidade, pela consumação da prescrição retroativa, dos Réus José Sérgio Teixeira Benevides e Francisco Vilmar Pinto pela prática do crime previsto no art. 90, da Lei nº 8.666/93, e do Apelante Jessé Bezerra de Araújo, pela prática dos crimes previstos no art. 90 e 92, da Lei nº 8.666/93. Poder Judiciário TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 5ª REGIÃO Gabinete do Desembargador Federal Geraldo Apoliano nge APELAÇÃO CRIMINAL Nº 7792-CE (2002.81.00.011020-0) Resta analisar as Apelações de Jessé Bezerra de Araújo, com relação ao crime previsto no art. 89, da Lei nº 8.666/93; de José Sérgio Teixeira Benevides e Francisco Vilmar Pinto quanto aos delitos previstos nos arts 89, da Lei nº 8.666/93 e 96, I, da Lei nº 8.666/93. Passo ao exame das preliminares suscitadas pelos Réus. Francisco Vilmar Pinto e José Sérgio Teixeira Benevides alegam ter havido cerceamento de defesa devido ao indeferimento da oitiva de algumas testemunhas por eles arroladas. Sobre esta matéria, adoto os mesmos fundamentos da sentença como razões de decidir, uma vez que foi analisada de forma percuciente a preliminar suscitada nas alegações finais e renovada nas Apelações: “ II - 1. c) Do cerceamento de defesa Os advogados dos réus Francisco Vilmar Pinto, Alexandre de Castro Cals Gaspar, José Cals Gaspar Júnior, Francislúcia Macedo Teixeira, Jessé Bezerra de Araújo, Davi Bezerra Neto e José Sérgio Teixeira Benevides aduziram, em caráter preliminar, que houve cerceamento de defesa por conta do indeferimento da oitiva de algumas das testemunhas por eles arroladas. Conquanto a alegação já haver sido apreciada e refutada no decisum de fls. 2525/2533; impende salientar que, ao contrário do que sustentaram os causídicos, a defesa não foi cerceada, conforme passo a demonstrar. O indeferimento de prova vergastado referiu-se à oitiva de testemunhas domiciliadas fora da comarca de Fortaleza, inclusive em outros países, o que demandaria a expedição de cartas precatórias e rogatórias. Instada a manifestar-se sobre a imprescindibilidade da inquirição das testemunhas Antony Cean Tjieanjiem (Roterdã - Holanda) e José Sérgio Rebouças Porto (Amadora Portugal) -fl. 2380 - a defesa permaneceu silente. Poder Judiciário TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 5ª REGIÃO Gabinete do Desembargador Federal Geraldo Apoliano nge APELAÇÃO CRIMINAL Nº 7792-CE (2002.81.00.011020-0) Depois de nova chance para justificar a necessidade de inquirição das testemunhas por rogatórias e precatórias (fl. 2477), os causídicos, apesar de insistirem nos depoimentos, apresentaram justificativas superficiais, evocando, de forma genérica, o princípio da ampla defesa. Na decisão de fls. 2525/2533, à luz de precedente do STF sobre a interpretação da norma contida no art. 222-A do CPP, no sentido de que "é ônus da defesa demonstrar, antecipadamente, a imprescindibilidade da expedição da carta rogatória, sob pena de indeferimento da prova.", de forma a evitar abusos e atrasos indevidos do processo; considerando que, na situação concreta, a defesa não de desincumbiu do ônus argumentativo de demonstrar a necessidade de colheita da prova; deneguei o pedido de oitiva das testemunhas residentes no exterior. Sobre a expedição de cartas precatórias, em face da ausência de resposta quanto à pertinência das testemunhas indicadas pelos denunciados Alexandre de Castro Cals Gaspar e José Cals Gaspar; sopesando que, de acordo com o desenrolar da instrução probatória, as testemunhas restringiram-se a depor sobre a conduta social dos ditos acusados, concluí que a realização das diligências requeridas, além de dispendiosa, seria improfícua para a elucidação dos fatos. Motivo pelo qual, com esteio no art. 400, § 1º, do CPP, indeferi o pleito da defesa. Da mesma forma, indeferi as testemunhas Maíza Monteiro Marques e Osiany Macedo Andrade, arroladas pela ré Francisclúcia Macedo Teixeira, haja vista que não houve manifestação sobre a imprescindibilidade da oitiva delas e que outras cinco testemunhas da referida denunciada seriam inquiridas posteriormente neste Juízo. Em relação às testemunhas indicadas por José Sérgio Teixeira Benevides (fl. 2095) e por Francisco Vilmar Pinto (fl. 2097), sem embargo da argumentação da defesa, entendi que não restou comprovada a existência de qualquer liame entre as pessoas listadas às fls. 2095 e 2097 e os fatos descritos na denúncia, que as credenciasse a figurar como testemunhas e justificasse a pertinência de suas oitivas. Sendo assim, do mesmo modo respeitada a ampla defesa, uma vez que foram oferecidas duas oportunidades para ser justificada a Poder Judiciário TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 5ª REGIÃO Gabinete do Desembargador Federal Geraldo Apoliano nge APELAÇÃO CRIMINAL Nº 7792-CE (2002.81.00.011020-0) necessidade de inquirição das testemunhas, entendi que a expedição das cartas precatórias seria medida meramente protelatória, que atentaria contra a razoável duração do processo e a prestação judiciária efetiva, motivo pelo qual, com supedâneo no art. 400, § 1º, CPP, indeferi o envio das precatórias. Destaco que as garantias processuais de alguém que se vê processado criminalmente devem ser respeitadas. Entretanto, é bom que se diga que uma coisa é o sagrado uso desses direitos; outra, totalmente diferente, é o seu abuso2. Não se afigura legítimo, portanto, utilizar importantes direitos para finalidade diversa, apenas com o propósito de alongar demasiadamente o processo. O direito de defesa tem seus limites para possibilitar o atendimento de outros princípios conflitantes. Não é um direito absoluto, intocável. A sua mera invocação não pode servir de chave para sustentar qualquer diligência requerida pelo pólo passivo. O seu abuso não pode ocultar o outro lado dos direitos fundamentais, consistente no direito da comunidade em ter um processo sem dilações indevidas, principalmente naqueles em que o objeto envolve patrimônio público, com prescrição a se aproximar, caso presente. Pelo exposto, indefiro a preliminar alegada pela defesa”–fls. 2837/2840. Com relação ao mérito, e no tocante ao crime previsto no art. 89, da Lei nº 8.666/93, Francisco Vilmar Pinto tenta imputar a conduta delitiva ao Corréu José Sérgio Teixeira Benevides, que, na qualidade de Deputado Estadual à época dos fatos, teria exercido influência para a contratação das empresas fornecedoras de merenda escolar sem licitação e que a dispensa do procedimento licitatório ocorrera devidamente autorizado pela Procuradoria Jurídica Municipal. Adoto como razões de decidir todos os fundamentos da sentença condenatória, que analisou de forma percuciente toda a matéria: Poder Judiciário TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 5ª REGIÃO Gabinete do Desembargador Federal Geraldo Apoliano nge APELAÇÃO CRIMINAL Nº 7792-CE (2002.81.00.011020-0) “ O art. 89 da Lei 8.666/93 qual estabelece: Art. 89. Dispensar ou inexigir licitação fora das hipóteses previstas em lei, ou deixar de observar as formalidades pertinentes à dispensa ou à inexigibilidade: Pena - detenção, de 3 (três) a 5 (cinco) anos e multa. Parágrafo único. Na mesma pena incorre aquele que, tendo comprovadamente concorrido para a consumação da ilegalidade, beneficiou-se da dispensa ou inexigibilidade ilegal, para celebrar contrato com o Poder Público. O tipo objetivo apresenta-se em duas vertentes comissivas, "dispensar" ou "inexigir" fora das hipóteses previstas em lei; e de uma omissiva, "deixar de observar as formalidades". O bem jurídico tutelado pela norma é a regularidade e a lisura do procedimento licitatório, sobretudo quanto aos princípios da competitividade e da isonomia, assim como o patrimônio público e a moralidade administrativa3. Cuida-se a previsão do caput de crime próprio, a ser praticado por servidor público a quem incumbe efetivar o processo licitatório exigido pela norma administrativa. O elemento subjetivo do tipo é o dolo genérico. É delito formal, que independe da contratação com o Estado. Por outro lado, como exceção à teoria monista em concurso de pessoas, a forma descrita no parágrafo único aplica-se a particular que tenha concorrido e se beneficiado com a perpetração do delito. Nesse caso, o elemento subjetivo é o dolo específico, cujo elemento especial do injusto é a finalidade de firmar contrato com o Poder Público. Nessa segunda situação, portanto, o crime é material, consumando-se com a celebração do contrato. Na espécie em julgamento, o MPF sustentou, sobretudo em alegações finais, que a Prefeitura de Fortaleza dispensou, indevidamente, os procedimentos licitatórios quando da utilização de recursos disponibilizados pelo Ministério da Educação. Poder Judiciário TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 5ª REGIÃO Gabinete do Desembargador Federal Geraldo Apoliano nge APELAÇÃO CRIMINAL Nº 7792-CE (2002.81.00.011020-0) Fazendo atenta leitura do relatório de auditoria TC 005.016/2001 (fls. 25/62 do apenso 5), observo que, não obstante os secretários municipais haverem justificado a dispensa de licitação em face de suposta situação de emergência por conta de atraso de repasse do governo federal, os analistas do TCU concluíram que, ao contrário das argumentações oferecidas, os depósitos federais eram regulares, afirmando, ademais, que houve falta de planejamento por parte da administração pública. Além disso, os auditores constataram que a emergência alegada para a dispensa de licitação não correspondeu ao tempo levado para a entrega da mercadoria. Para elucidar os fatos, destaco os seguintes pontos da análise do TCU: 11. Examinando-se as ordens de créditos do Governo Federal para o Programa Nacional da Merenda Escolar, no Município de Fortaleza, conforme documentos anexados às fls. 152/173, verifica-se que há regularidade no repasse de tais recursos, não procedendo as justificativas apresentadas, que têm como objetivo transferir a culpa para o Governo Federal. 11.1 Ademais, a alegada emergência não foi caracterizada nas aquisições com dispensa de licitação, pois a lei exige que seja caracterizada urgência de atendimento de situação que possa ocasionar prejuízo ou comprometer a segurança de pessoas, obras, serviços, equipamentos e outros bens públicos ou particulares, e somente para os bens necessários ao atendimento da situação emergencial ou calamitosa. 11.2 A dispensa de licitação, que por lei, deveria ser exceção, virou regra, não obstante este programa estar em funcionamento desde 1994, com repasses regulares de recursos, o que demonstra além de falta de planejamento, infringência à Lei n.º 8.666/93. 11.3 É absolutamente inaceitável que no período auditado, 1998-2000, quando foram repassados recursos da ordem de R$ 10.824.955,40 (valores nominais), em média, 63,3% das aquisições foram realizadas por dispensa de licitação, o que representa R$ 6.467.070,00. 11.4 é importante registrar que a emergência alegada para a aquisição de gêneros alimentícios não corresponde a igual urgência para a entrega da mercadoria. O exemplo está na dispensa de licitação na qual a J&D vendeu R$ 218.291,43 de alimentos, recebeu o pagamento em abril de 1999 e somente sete meses depois, em novembro de 1999, a mercadoria foi integralmente entregue. Adicione-se a esse elemento o fato de ter Poder Judiciário TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 5ª REGIÃO Gabinete do Desembargador Federal Geraldo Apoliano nge APELAÇÃO CRIMINAL Nº 7792-CE (2002.81.00.011020-0) havido superfaturamento e, mais, não entrega integral de parte da mercadoria paga com recursos da merenda escolar, como já foi devidamente registrado nos itens 4 e 5 da presente instrução. 11.5 Outro exemplo bastante contundente, também da empresa J&D, são as NF's 51, 52, 57, e 58 que foram integralmente pagas em dezembro de 1998, no valor de R$ 216.483,43. Entretanto, a entrega ocorreu apenas em novembro de 1999, quase um ano após o recebimento do valor, consubstanciando-se a prática de pagar antecipadamente, contrariando o art. 62 da Lei nº 4.320/64. A disponibilidade de recursos financeiros em conta bancária da Prefeitura para compra da merenda escolar destinada ao suprimento de 2000 foi comprovada tanto documentalmente, com a cópia dos extratos bancários em que foram depositados os valores do FNDE (fls. 586/595 volume 3), como pelo depoimento do então Secretário Municipal de Finanças, Aloísio Barbosa de Carvalho Neto (fls. 583/585). Como destacou o TCU (fl. 53, item 25.2, do apenso 5), havia saldo em conta remanescente de repasses anteriores, em montante satisfatório para dar aporte às devidas licitações. Nesta senda, se os repasses de verbas eram regulares e previsíveis; se havia dinheiro em conta corrente apto a ensejar o devido processo licitatório; e se a entrega da mercadoria adquirida com recursos federais demorou meses, após o indevido pagamento antecipado, para ser entregue à Prefeitura Municipal de Fortaleza, concluo que realmente inexistiu situação de urgência a embasar dispensa de licitação. Aliás, como bem colocou a Procuradora do Município Maria Carneiro Sanford, a prática de dispensa de licitações era corriqueira entre os secretários regionais. Ainda no ano de 1998, no parecer n.º 1142/98 PGM, cuja cópia repousa às fls. 395/397, Maria Carneiro Sanford chamou a atenção para o fato de que sempre era alegada situação de emergência para dispensar os processos licitatórios. Em suas palavras: Pelo documento de fls. 09-PGM, o qual consta os valores depositados pelo convênio, anexado pela Sra. Ednólia Moreira Braga - Coordenadora do Distrito de Educação da SER V, podemos verificar que todas as Secretarias desde as primeiras compras as fazem por dispensa de licitação. Alegando a mesma emergência? (grifo no original). (...) Poder Judiciário TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 5ª REGIÃO Gabinete do Desembargador Federal Geraldo Apoliano nge APELAÇÃO CRIMINAL Nº 7792-CE (2002.81.00.011020-0) Mais uma vez chamamos atenção que a emergência para dispensa de licitação é aquela baseada em fatos imprevisíveis pela Administração Pública. Não se pode querer argüir imprevisibilidade de uma obrigação oriunda de convênio, pactuado pelo Município de Fortaleza, o qual foi dado publicidade e ciência a cada Secretário Municipal, que destas verbas se utilizam há muito. (grifei). Pelo exposto, tenho que, em termos gerais, as dispensas de licitação efetivadas pela PMF para compra de merenda escolar com recursos federais durante o período auditado pelo TCU (de 1998 a 2000) foram irregulares, subsumindo o fato ao tipo do art. 89 da Lei 8.666/93. b) autoria O MPF, ao afirmar que houve dispensa indevida de licitação no âmbito da Prefeitura Municipal de Fortaleza, apontou como autoridade responsável a Sra. Rose Mary Freitas Maciel e como co-autores e favorecidos, José Sérgio Teixeira Benevides, Francisco Vilmar Pinto, Francisco Robério Romero, Jessé Bezerra de Araújo e Alexandre de Castro Cals Gaspar. b.1) Quanto à autoria de José Sérgio Teixeira Benevides, Francisco Vilmar Pinto, Francisco Robério Romero, Jessé Bezerra de Araújo e Alexandre de Castro Cals Gaspar. Na denúncia, o MPF asseverou que, a partir de fevereiro de 1999, chancelados por pareceres da Procuradoria Geral do Município, instaurados a pedidos das Secretarias Executivas das Regionais, foram dispensadas licitações para compra de merenda escolar em benefício da empresa J&D Comercial Ltda., Hortafácil Indústria e Comércio Ltda., dentre outras. Entre as compras realizadas sem licitação nos anos de 1998 a 2000, o TCU especificou as seguintes aquisições irregulares da J&D e Hortafácil (fls. 5 e 6 do apenso 1): Data Empresa Poder Judiciário TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 5ª REGIÃO Gabinete do Desembargador Federal Geraldo Apoliano nge APELAÇÃO CRIMINAL Nº 7792-CE (2002.81.00.011020-0) Nota Fiscal Valor R$ 29/4/1999 J&D Comercial Ltda. 149 R$ 218.291,43 3/5/1999 J&D Comercial Ltda. 165 R$ 34.495,99 24/1/2000 Hortafácil Ltda. R$ 610.010,00 Às fls. 349/350 do apenso 2 constam a nota de empenho n.º 24-000647/00 e a nota fiscal da J&D n.º 149, emitidos no valor de R$ 218.291,43, referentes ao contrato efetivado mediante dispensa de licitação embasada no parecer n.º 26/1999-PGA, da lavra do Procurador Geral Adjunto Pedro Saboya Martins (fls. 538/540 do volume 3). Fazendo a leitura do referido parecer, observo que o pressuposto para o pedido de dispensa divergiu daqueles que alegavam, meramente, situação de emergência. No caso específico, houve uma tomada de preço anterior (TP 019/98), promovida pela Regional VI, em que vários itens tiveram seus valores considerados excessivos, motivo pelo qual as propostas foram desclassificadas. Somente depois da realização do certame anterior (TP 019/98), é que sobreveio a urgência e, por consequência, a necessidade de contratação direta. A fim de instruir o processo de dispensa de licitação por preços excessivos (n.º 364/99 - PGM - fls. 538/540 do volume 3), a Regional VI colheu propostas, divididas em grupos diferenciados: O primeiro grupo, correspondente aos sete (07) itens do Grupo F do certame citado, recebeu cotação por parte de três empresas, quais sejam: a) J&D Comercial Ltda. (Valor R$ 218.291,43); b) Merconorte (Valor R$ 233.603,01); e, c) GS (Valor R$ 229.534,79). Destes, o valor e os itens da primeira empresa nominada encontra-se dentro dos limites máximos estabelecidos pela Secretaria no certame tratado. (grifei). Poder Judiciário TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 5ª REGIÃO Gabinete do Desembargador Federal Geraldo Apoliano nge APELAÇÃO CRIMINAL Nº 7792-CE (2002.81.00.011020-0) Sopesando o permissivo legal para a contratação direta de itens cotados com preços excessivos por participantes de certame licitatório prévio (art. 24, VII, da Lei 8.666/934); considerando que os preços apresentados no pedido de dispensa estavam abaixo do que os propostos na TP 19/98, e estabelecidos dentro dos limites que a própria Administração impôs como máximos na TP 019/98, como ressaltou o Procurador, concluo que a dispensa em comento foi juridicamente regular. Dessa forma, não houve ilícito penal quando da contratação direta de R$ 218.291,43 com a empresa J&D Comercial Ltda. Por outro lado, o crime do art. 89 da Lei 8.666/93 restou caracterizado quando da compra realizada à J&D no valor de R$ 34.495,99, registrada na nota fiscal n.º 165 (fl. 307 - apenso 2) correspondente ao processo n.º 303/99 (conforme empenho n.º 220228/00 - fl. 306 - apenso 2). Na hipótese (processo 303/99 - PGM), o pedido de dispensa formulado em fevereiro de 1999 pela então Secretária Teodora Ximenes da Silveira, com parecer n.º 08/1999 - PGA, teve por fundamento o repasse tardio de verbas federais e a exiguidade do tempo para realizar licitação. Porém, a nota fiscal correspondente foi faturada somente em 3/5/1999, para entrega futura (fl. 307 - apenso 2). Além desse considerável atraso na entrega da mercadoria comprada sem licitação, o que contraria a alegada situação de emergência, havia recursos financeiros no caixa da prefeitura suficientes para dar aporte à realização de certame, como sustentado no tópico anterior. Da mesma forma, por se embasar o parecer n.º 45/99 - PADJ (fls. 524/528 do volume 3) - (processo n.º 00761/99 - PGM) em pressuposto falso (atraso no repasse de recursos e urgência) também foi ilícita a contratação direta da Hortafácil Ind. e Com. de Alimentos Ltda., de propriedade do acusado Ari Dileno Furtado (processo suspenso - art. 366, CPP), pelo valor de R$ 610.010,00, celebrada no contrato de fornecimento n.º 001/2000 (fls. 377/382 do volume 2). Poder Judiciário TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 5ª REGIÃO Gabinete do Desembargador Federal Geraldo Apoliano nge APELAÇÃO CRIMINAL Nº 7792-CE (2002.81.00.011020-0) Sobre esse evento específico, impende consignar as declarações de Francisco Vilmar sobre a prova da autoria do referido evento delituoso (fls. 306/307): (...) QUE no início do ano de 1999, o interrogado foi procurado, no município de Boa Viagem/CE, pelo deputado SÉRGIO BENEVIDES que afirmou que estava com um grande problema com seu sogro, prefeito JURACI MAGALHÃES, tendo em vista que JESSÉ BEZERRA não havia efetuado a entrega de R$ 400.000,00 referentes aos produtos destinados à merenda escolar já pagos pela PMF; QUE, com certeza o deputado SERGIO BENEVIDES interferia nos processos licitatórios para que fossem direcionados para os produtos da empresa J&D COML. LTDA.; (...) QUE para resolver o problema da não entrega dos R$ 400.000,00 (quatrocentos mil reais) à PMF, ALEXANDRE GASPAR celebrou um contrato com a empresa HORTAFÁCIL, a qual se comprometeu a entregar parte da mercadoria que a empresa J&D LTDA. estava devendo à PMF, na condição de sair vencedora nos próximos pleitos licitatórios para fornecimento de merenda escolar; QUE em janeiro de 2000, com a intermediação de ALEXANDRE GASPAR e SÉRGIO BENEVIDES, a empresa HORTOFÁCIL conseguiu vender, com dispensa de licitação, à PMF, aproximadamente R$ 600.000,00 (seiscentos mil reais) em produtos destinados à Merenda Escolar dos alunos da rede municipal (...); (grifei). Quanto à incriminação de Sérgio Benevides em virtude do recebimento de vantagem ilegal por conta das dispensas ilícitas, é relevante observar a compra, com um cheque da empresa J&D, de um ônibus, conforme demonstra o depoimento de Magda Roberta Busgaib Socorro (fls. 2278/2279): QUE a depoente possui em empresa de eventos, Stop Promoções; QUE entre os anos de 1998 a 2000, fez uma negociação com Sérgio Benevides, consistente na venda de um ônibus; QUE na época, a empresa da depoente era a MW Promoções e Eventos Ltda.; QUE em face do tempo, a depoente não recorda o valor da venda, mas acredita que tenha sido em torno de R$ 35.000,00, sendo que existiam parcelas financiadas pela depoente que o comprador assumiu; QUE a negociação foi feita diretamente com Sérgio Benevides; QUE o contrato da depoente com Sérgio foi feito de forma verbal; QUE o financiamento foi passado para o nome de Sérgio Benevides; QUE não fez a transferência do veículo, pois o financiamento estava no nome de uma outra pessoa; QUE Poder Judiciário TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 5ª REGIÃO Gabinete do Desembargador Federal Geraldo Apoliano nge APELAÇÃO CRIMINAL Nº 7792-CE (2002.81.00.011020-0) então, a depoente acredita que a transferência foi feita pela pessoa no nome da qual estava o financiamento; QUE confirma o recebimento de dois cheques da empresa J&D; QUE lembra que o pagamento do ônibus foi realizado em duas parcelas; QUE Sérgio disse à depoente que fosse à empresa J&D para receber os cheques em pagamento do ônibus; QUE a depoente foi à empresa J&D e lá recebeu os cheques do Sr. Jessé, o qual a depoente já conhecia, pois ele era gerente de um banco (BIC); QUE Jessé disse que a empresa J&D era de sua propriedade; QUE Sérgio Benevides tinha uma banda, Som Folia, e estava comprando o ônibus para a banda; QUE o ônibus era próprio para viagem (...) Na mesma trilha, a aquisição da empresa América se deu diretamente por José Sérgio Teixeira Benevides, Francisco Vilmar Pinto e Francisco Robério, sendo quitada por meio de cheques (da J&D e da Hortafácil) depositados na conta bancária de Francisco Robério. Sendo assim, frente a esse conjunto probatório, no que se refere aos contratos de R$ 34.495,99 com a J&D, e de R$ 610.010,00 com a Hortafácil, houve sim o delito de dispensa indevida de licitação, pelo que respondem: a) Jessé Bezerra de Araújo, enquanto proprietário de pessoa jurídica beneficiada (J&D), o qual admitiu que pagava comissões para que fosse viabilizada a oferta de seus produtos à PMF (fls. 251/255 - volume I); b) Francisco Vilmar Pinto, agente intermediador que confessou o esquema formado para vender merenda escolar à PMF; e c) José Sérgio Teixeira Benevides, genro do Prefeito à época, vereador de influência decisiva nos procedimentos das dispensas (conforme relatou Francisco Vilmar), e que recebeu dinheiro das empresas J&D e Hortafácil, como ficou demonstrado.”–fls. 2859/2876. Afirma Francisco Vilmar Pinto, com relação ao art. 96, I, da Lei nº 8.666/93, a impossibilidade de ser agente ativo do referido delito, porque tal qualidade deve ser atribuída apenas aos licitantes, o que não seria seu caso, porque ele nunca participou do procedimento licitatório da Hortofácil com a Prefeitura de Fortaleza/CE, pois na época o responsável pela empresa era o sócio Ari Dileno e o procurador da empresa era Alexandre Gaspar que determinaram os valores superfaturados, ressaltando que as comissões que recebeu advieram de atividades legítimas e não da prática delitiva – fls. 3164/3186. Poder Judiciário TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 5ª REGIÃO Gabinete do Desembargador Federal Geraldo Apoliano nge APELAÇÃO CRIMINAL Nº 7792-CE (2002.81.00.011020-0) Dispõe o art. 96, I, da Lei nº 8.666/93. “ Art. 96. Fraudar, em prejuízo da Fazenda Pública, licitação instaurada para aquisição ou venda de bens ou mercadorias, ou contrato dela decorrente: I –elevando arbitrariamente os preços; Pena –detenção, de 3 (três) a 6 (seis) anos, e multa.” O art. 96 da referida Lei trouxe cinco formas de se fraudar uma licitação ou a execução dos contratos, visando com a criminalização das condutas proteger o erário da elevação arbitraria de preços, ou da maior onerosidade da proposta ou da execução do contrato. Note-se que, além de evitar prejuízo à Fazenda Pública, a norma legal ainda busca proteger os destinatários das aquisições ou contratações realizadas pelo Poder Público, como por exemplo, os alunos que consumirão os gêneros alimentícios que compõe a merenda escolar, quando entregues deterioradas ou com prazo de validade vencido. A norma possui mais de um interesse a ser protegido, o da Administração Pública, considerando-se o patrimônio público, o interesse da Fazenda Pública principalmente, mas também, de forma subsidiária ou indireta, a integridade física das pessoas que se beneficiarão com os produtos ou serviços contratados. Em se tratando de fraude à licitação, é certo que fraudar implica na prática de atos comissivos, mediante artifícios, ardil, expedientes que buscam dissimular a lisura do procedimento licitatório ou a execução do contrato firmado com a Administração Pública. Na forma descrita no inc. I, do art. 96, da Lei nº 8.666/93, o licitante, sem justa causa, eleva o preço dos seus bens ou mercadorias oferecidas ao Poder Público, causando, com tal prática, prejuízo ao erário público. Para alguns autores, os crimes previstos no art. 96, da Lei nº 8.666/93 são crimes próprios, tendo como sujeito ativo o participante ou vencedor Poder Judiciário TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 5ª REGIÃO Gabinete do Desembargador Federal Geraldo Apoliano nge APELAÇÃO CRIMINAL Nº 7792-CE (2002.81.00.011020-0) da licitação pública, respectivamente, a pessoa física, que participa de licitação instaurada e a pessoa física que mantém ajuste com a Administração Pública. Todavia, há entendimento divergente na doutrina no sentido de que se trata de crime comum ou próprio. Outros autores entendem que se trata de crime comum, pois poderá ser praticado por qualquer pessoa que consiga utilizarse das vias de execução previstas neste art. 96 para o fim de fraudar o contrato ou a licitação. No caso, entendo que a conduta descrita no inciso I, do art. 96, da Lei nº 8.666/93, poderá ser praticada por qualquer outra pessoa, além do licitante e do contratado, que haja intermediado ou participado do ato de entrega da mercadoria ou da alteração desta, o que implica no reconhecimento de que, nestas ações, o verbo do tipo penal permite concluir que se trata de crime comum, uma vez que qualquer pessoa poderá praticar estas ações. Ressalte-se, ainda, que não há impedimento a que haja concurso de agentes no âmbito da prática prevista no art. 96, inciso I, da Lei nº 8.666/93, bastando que seja provado o dolo do co-autor ou partícipe em colaborar para a prática do ato incriminado. No caso, com relação ao crime do art. 96, I, da Lei nº 8.666/93, Francisco Vilmar reconheceu, em depoimento às fls. 306/307, que recebeu, na sede da empresa J e D Ltda, um cheque em valor entre R$ 77.000,00 e R$ 80.000,00, para ser entregue ao Deputado, então vereador à época dos fatos, Sérgio Benevides, correspondente à comissão deste pela contratação da referida empresa sem licitação e com produtos superfaturados. Jessé Bezerra de Araújo, proprietário de pessoa jurídica beneficiada (J&D), confirmou o depoimento de Francisco Vilmar, afirmando que pagava comissões para que fosse viabilizada a oferta de seus produtos à Prefeitura Municipal de Fortaleza/CE - fls. 251/255. O mesmo ocorreu com relação à firma Hortofácil, tendo ainda confessado Francisco Vilmar que o Deputado Sérgio Benevides e ele mesmo receberam comissões com o dinheiro referente à merenda escolar –fls. 306/307. Poder Judiciário TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 5ª REGIÃO Gabinete do Desembargador Federal Geraldo Apoliano nge APELAÇÃO CRIMINAL Nº 7792-CE (2002.81.00.011020-0) Desta forma, cai por terra a argumentação do Réu de que as comissões que recebeu advieram de atividades legítimas e não da prática delitiva, restando consumado o delito previsto no art. 96, I, da Lei nº 8.666/93. Por fim, ressalta Sérgio Benevides a inexistência de provas de sua participação nos delitos. Todavia, as provas dos autos encontram-se em sentido contrário ao alegado pelo Apelante. A participação do Sérgio Benevides foi decisiva nos delitos. Na qualidade de Deputado Estadual, e por ser genro do Prefeito de Fortaleza à época dos fatos, pôde influenciar os procedimentos licitatórios para favorecer as empresas, especialmente a Hortofácil, mediante a intermediação de Francisco Vilmar, entre outros, que mediante o pagamento de “ comissões” . Há que se ressaltar a prova dos autos, no sentido de existência clara de um liame entre Sérgio Benevides, Francisco Vilmar Pinto e a empresa Hortofácil, beneficiada com a elevação artificial de preços, fato verificado com a entrega de cheque da empresa PMF, também fornecedora de merenda escolar superfaturada, à Hortofácil, para a entrega dos cheques a Francisco Robério, parente de Sérgio Benevides, para a aquisição de empresa e terrenos em Dunas/CE. Ressalte-se que Francisco Vilmar Pinto não nega o recebimento das comissões, para si e para Sérgio Benevides, afirmando terem sido elas legítimas, como pagamento a seus serviços. Note-se que, caso os negócios fossem efetivamente legítimos, seria desnecessário que os cheques fossem depositados na conta de terceira pessoa e apenas em seguida destinados às compras de empresas e pagamentos dos Réus, o que indica o intuito de ocultar a origem do dinheiro. Desta forma, resta devidamente comprovada a materialidade e a autoria delitivas dos crimes previstos nos arts. 89 e 96, inciso I, da Lei nº Poder Judiciário TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 5ª REGIÃO Gabinete do Desembargador Federal Geraldo Apoliano nge APELAÇÃO CRIMINAL Nº 7792-CE (2002.81.00.011020-0) 8.666/93, com relação a Sérgio Benevides, Francisco Vilmar Pinto e do art. 89, da Lei nº 8.666/93 para Jessé Bezerra de Araújo. Passo à análise da dosimetria das penas. O crime do art. 89, da Lei nº 8.666/93 prevê como pena a detenção de 03 (três) a 05 (cinco) anos. O delito do art. do art. 96, I, da mesma Lei prevê como penalidade a detenção, de 03 (três) a 06 (seis) anos. Com o só propósito de que não sobrepairem dúvidas acerca das asserções relacionadas à dosimetria da pena (aí incluída a exasperação da penabase privativa de liberdade), analiso os requisitos do art. 59, do CP, conforme descritos na sentença condenatória. Com relação a Sérgio Benevides, a r. sentença, em atenção às circunstâncias judiciais previstas no art. 59, do CP, fixou as penas-bases dos crimes dos arts. 89 e 96, I da Lei nº 8.666/93 em 01 (um) ano acima do mínimo legal (quatro anos), por as haver valorado negativamente. O Apelante, no que toca à conduta social e consequências do delito granjeou conceito desfavorável relativo às circunstâncias judiciais, o que autoriza a fixação da pena-base em quantum acima do mínimo legal, conforme já decidiu o egrégio Superior Tribunal de Justiça (HC 25341/SP –T5 –Rel. Min. Gilson Dipp –DJ 22/04/2003 –p. 245). No caso, a conduta social foi considerada desfavorável porque o Réu agiu, utilizando-se da condição de Deputado, democraticamente eleito com o mandato de proteger e representar o patrimônio público, para a obtenção de vantagem indevida para si e para terceiros. As consequências do crime também foram graves, porque causaram ao patrimônio público prejuízos de valor elevado, cerca de R$ 644.505,00 (seiscentos e quarenta e quatro mil e quinhentos e cinco reais). Embora o cálculo da pena-base não seja necessariamente uma operação de aritmética entre o máximo e o mínimo legal, pode o juiz, de modo justificado, atribuir maior peso a determinadas circunstâncias diante das peculiaridades do caso. Poder Judiciário TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 5ª REGIÃO Gabinete do Desembargador Federal Geraldo Apoliano nge APELAÇÃO CRIMINAL Nº 7792-CE (2002.81.00.011020-0) Assim acordou a Quinta Turma do STJ: “ LATROCÍNIO. PENA-BASE. CIRCUNSTÂNCIAS JUDICIAIS. VALORAÇÃO NEGATIVADA CULPABILIDADE, DA PERSONALIDADE, DAS CIRCUNSTÂNCIAS E DAS CONSEQUÊNCIAS DO CRIME. EXASPERAÇÃO DA REPRIMENDA. ACIMA DO MÍNIMOLEGAL JUSTIFICADA. 1. Havendo suficiente fundamentação quanto à negatividade da culpabilidade do agente, de sua personalidade e das circunstâncias e consequências do delito, pois extrapolaram aquelas próprias do tipo penal violado, é lícito a majoração da penabase acima do mínimo legal. 2. A ponderação das circunstâncias do art. 59 do Código Penal não é uma operação aritmética, em que se dá pesos absolutos a cada uma delas, a serem extraídas de cálculo matemático levando-se em conta as penas máxima e mínima cominadas ao delito cometido pelo agente, mas sim um exercício de discricionariedade vinculada. 3. Agravo regimental a que se nega provimento.” (STJ - AgRg no REsp: 1171265 MT 2009/0236583-2, Relator: Ministro JORGE MUSSI, Data de Julgamento: 16/10/2012, T5 - QUINTA TURMA, Data de Publicação: DJe 24/10/2012) Desta forma, está justificado o aumento da pena-base em 01 (um) ano de detenção, para Sérgio Benevides, totalizando a pena dele em 04 (quatro) anos de detenção, para o crime previsto no art. 89, da Lei nº 8.666/93 e 04 (quatro) anos de detenção, para o crime previsto no art. 96, I, da Lei nº 8.666/93, a qual torno definitiva, à míngua de agravantes e atenuantes e causas de aumento ou de diminuição de pena. Reduzo a pena para 600 (seiscentos) dias-multa, mantido o valor de 300 (trezentos) para cada delito, cada um deles no valor de 1/10 (um décimo) do salário mínimo vigente à época dos fatos. Com relação a Francisco Vilmar Pinto, a r. sentença, em atenção às circunstâncias judiciais previstas no art. 59, do CP, fixou as penas-bases dos Poder Judiciário TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 5ª REGIÃO Gabinete do Desembargador Federal Geraldo Apoliano nge APELAÇÃO CRIMINAL Nº 7792-CE (2002.81.00.011020-0) crimes dos arts. 89 e 96, I da Lei nº 8.666/93 no mínimo legal, em face da valoração positiva dos requisitos do art. 59, do CP. Desta forma, mantenho as penas conforme fixadas na sentença, sendo 03 (três) anos de detenção, para o crime previsto no art. 89, da Lei nº 8.666/93 e 03 (três) anos de detenção, para o crime previsto no art. 96, I, da Lei nº 8.666/93, a qual torno definitivas. Por fim, com relação à pena de multa, mantenho-a em 20 (vinte) dias-multa, sendo 10 (dez) para cada delito, cada um deles no valor de 1/30 (um trigésimo) do salário mínimo vigente à época dos fatos. Com relação a Jessé Bezerra de Araújo, persiste apenas a inconformidade quanto ao delito previsto no art. 89, da Lei nº 8.666/93, em face da extinção da punibilidade pela declaração da prescrição retroativa com relação aos crimes previstos nos arts. 90 e 92, da Lei nº 8.666/93; Requer o Apelante a redução da pena, em face da presença da atenuante da confissão espontânea, prevista no art. 65, III, “ d” , do Código Penal. Todavia, verifico que Jessé bezerra já teve a pena fixada no mínimo legal de 03 (três) anos de detenção, previsto no art. 89, da Lei nº 8.666/93. As penas privativas de liberdade devem ser aplicadas conforme previstas em lei, sendo permitida a redução abaixo do mínimo legal apenas na hipótese de incidência de causas de diminuição da pena, na terceira fase da dosimetria da pena, não sendo possível a pretendida redução na aplicação das circunstâncias atenuantes. Sobre o assunto assim estabelece o Verbete 231, da jurisprudência sumulada do Superior Tribunal de Justiça: Súmula nº 321, do STJ “ A incidência de circunstância atenuante não pode conduzir a redução da pena abaixo do mínimo legal” . Desta forma, mantenho a pena de Jessé Bezerra da Silva em 03 (três) anos de detenção, pela prática do crime previsto no art. 89, da Lei nº Poder Judiciário TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 5ª REGIÃO Gabinete do Desembargador Federal Geraldo Apoliano nge APELAÇÃO CRIMINAL Nº 7792-CE (2002.81.00.011020-0) 8.666/93, a qual torno definitiva, bem como a pena de multa de 10 (dez) diasmulta, cada um deles no valor de 1/30 (um trigésimo) do salário mínimo vigente à época dos fatos. Em face do disposto no art. 44, do CP, substituo a pena privativa de liberdade de Jessé Bezerra da Silva por duas penas restritivas de direitos, a serem indicadas pelo Juízo das Execuções Penais. Ante o exposto, declaro, de ofício, a extinção da punibilidade da pena privativa de liberdade dos Réus quanto ao crime previsto no art. 90, da Lei 8.666/93, e apenas com relação a Jessé bezerra da Silva, a extinção da punibilidade do crime descrito nos arts. 90 e 92, da Lei nº 8.666/93, em face da consumação da prescrição retroativa (pela pena em concreto), nos termos dos arts. 110, §§ 1º e 2º, c/c art. 109, inciso IV e V, todos do Código Penal e nego provimento às Apelações, concedendo habeas corpus de ofício apenas para substituir a pena privativa de liberdade de Jessé Bezerra da Silva por duas penas restritivas de direitos. É como voto. Poder Judiciário TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 5ª REGIÃO Gabinete do Desembargador Federal Geraldo Apoliano nge APELAÇÃO CRIMINAL Nº 7792-CE (2002.81.00.011020-0) APTE ADV/PROC APTE ADV/PROC APTE ADV/PROC APTE APDO ADV/PROC APDO ADV/PROC APDO ADV/PROC RELATOR : JOSÉ SÉRGIO TEIXEIRA BENEVIDES : ANTONIO DELANO SOARES CRUZ E OUTROS : FRANCISCO VILMAR PINTO : JOSE RENATO FERREIRA TORRANO E OUTRO : JESSÉ BEZERRA DE ARAÚJO : ANTONIO DELANO SOARES CRUZ E OUTROS : MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL : FRANCISCO ROBÉRIO RODRIGUES ROMERO : ERNANDO UCHOA SOBRINHO E OUTROS : ROSE MARY FREITAS MACIEL : MARIA SANDILEUZA ALVES MENDES : ALEXANDRE DE CASTRO CALS GASPAR : ANTONIO DELANO SOARES CRUZ E OUTROS : DESEMBARGADOR FEDERAL GERALDO APOLIANO EMENTA PENAL. PROCESSUAL PENAL. CRIMES LICITATÓRIOS. ARTS. 89, 90, 92 E 96, I DA LEI Nº 8.666/93. RECURSO DO MINISTÉRIO PÚBLICO VISANDO A CONDENAÇÃO DOS RÉUS ABSOLVIDOS NA SENTENÇA. AUSÊNCIA DE PROVA DA AUTORIA DELITIVA. DESPROVIMENTO. CERCEAMENTO DE DEFESA PELO INDEFERIMENTO DE OITIVA DE TESTEMUNHA NÃO CONFIGURADO. AUSÊNCIA DE NULIDADE. DECLARAÇÃO DE OFÍCIO DA EXTINÇÃO DA PUNIBILIDADE PELA PRESCRIÇÃO RETROATIVA DAS PENAS PRIVATIVAS DE LIBERDADE ARBITRADAS PELA PRÁTICA DOS CRIMES PREVISTOS NOS ARTS. 90 E 92, DA LEI Nº 8.666/93. CONVÊNIO COM O MINISTÉRIO DA EDUCAÇÃO. MERENDA ESCOLAR. DISPENSA INDEVIDA DE LICITAÇÃO, VALORES SUPERIORES AOS DO MERCADO. MATERIALIDADE E AUTORIA PROVADAS COM RELAÇÃO AOS ARTS. 89 E 96, I, DA LEI Nº 8.666/93. DOSIMETRIA DA PENA. DUAS CIRCUNSTÂNCIAS JUDICIAIS DO ART. 59, DO CP DESFAVORÁVEIS A DOIS DOS RÉUS. PENA BASE FIXADA ACIMA DO MÍNIMO LEGAL. POSSIBILIDADE. RÉU QUE TEVE A PENA FIXADA NO MÍNIMO LEGAL. Poder Judiciário TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 5ª REGIÃO Gabinete do Desembargador Federal Geraldo Apoliano nge APELAÇÃO CRIMINAL Nº 7792-CE (2002.81.00.011020-0) IMPOSSIBILIDADE DE REDUÇAÕ DA PENA ABAIXO DO MÍNIMO. APLICAÇÃO DA SÚMULA Nº 231, DO STJ. APELAÇÃO DOS RÉUS E DO MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL. IMPROVIDAS 1. Fatos que envolvem o fornecimento de merenda escolar ao Município de Fortaleza/CE, com a utilização indevida de verbas públicas do Ministério da Educação, que ocorreu com a dispensa indevida de licitação fora das hipóteses legais, bem como fraude e superfaturamento dos gêneros alimentícios, imputando a Denúncia aos Réus os crimes tipificados nos arts. 89, 90, 91, 92 e 96, da Lei nº 8.666/93, 288, do Código Penal e 1º, § 1º, II, da Lei nº 9.613/98. 2. Sentença que julgou procedente em parte o pedido, para, inicialmente, absolver os Réus José Cals Gaspar Júnior, Alexandre de Castro Carls Gaspar, Davi Bezerra Neto, Francisco Robério Rodrigues Romero de todas as imputações; Jessé Bezerra de Araújo das condutas típicas descritas no 91, I, da Lei nº 8.666/93 e do art. 1º, V, da Lei nº 9.613/98; e Rose Mary Freitas Maciel dos crimes previstos nos arts. 91, I, da Lei nº 8.666/93 e 89, da Lei nº 8.666/93), e José Sérgio Teixeira Benevides e Francisco Vilmar Pinto do delito previsto no art. 92, da Lei nº 8.666/93, e condenar Jessé Bezerra de Araújo pela prática dos delitos dos arts. 89, 90 e 92 da Lei n º 8.666/93, e José Sérgio Teixeira Benevides e Francisco Vilmar Pinto dos crimes descritos nos arts. 89, 90 e 96, I da Lei nº 8.666/93. 3. Recurso do Ministério Público Federal que requer a condenação de Alexandre Castro Cals Gaspar, procurador da empresa J&D Comercial Ltda. fornecedora de merenda escolar à Prefeitura de Fortaleza/CE nos crimes previstos nos arts. 89, 91, 92, 95 e 96, I, da Lei nº 8.666/93 e no art. art. 1º, § 1º, II, da Lei nº 9.613/98; Rose Mary Freitas Maciel, na qualidade de Secretária do Desenvolvimento Social do Município de Fortaleza, cargo assumido em junho de 1999, como responsável pela contratação das empresas sem o devido procedimento licitatório nos delitos dos arts. 89 e 96, I ,d a Lei nº 8.666/93, e de Francisco Romero Robério, responsável pela empresa Hortofácil, do Estado do Paraná, que teria utilizado a empresa para depositar e sacar os cheques recebidos das outras firmas para os Corréus Sérgio Benevides, Francisco Vilmar e Poder Judiciário TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 5ª REGIÃO Gabinete do Desembargador Federal Geraldo Apoliano nge APELAÇÃO CRIMINAL Nº 7792-CE (2002.81.00.011020-0) Alexandre Gaspar, adquirirem diversos imóveis e móveis, requerendo a condenação deles nos crimes previstos no art. 1º, § 1º, II, da Lei nº 9.613/98. 4. Provas dos autos que não indicam a participação dolosa de Alexandre Castro Cals Gaspar, Rose Mary Freitas Maciel e Francisco Robério nos crimes licitatórios ou de lavagem de dinheiro. 5. Alexandre de Castro Cals Gaspar era mero empregado da J&D fornecedora de alimentos, sem poder de decidir as táticas assumidas pela empresa, subordinado ao Corréu Jessé Araújo, tendo agido no intuito de buscar soluções operacionais para a J&D, ao buscar uma parceria com a empresa Hortofácil para a entrega de suprimentos para a merenda escolar, restringindo-se a cumprir suas atribuições funcionais, sem participação nos procedimentos licitatórios. 6. Francisco Robério Rodrigues Romero, que à época dos fatos trabalhava com recolhimento de lixo da Prefeitura de Fortaleza/CE, teve participação pontual, restrita a uma procuração da Hortofácil e a depósitos bancários efetivados em sua conta corrente, em nome da amizade que tinha com Sérgio Benevides, não tendo se beneficiado com o dinheiro do Convênio ou recebido qualquer comissão, desconhecendo a origem do dinheiro que era depositada em sua conta, acreditando apenas que fazia um favor a uma pessoa influente da Prefeitura e a procuração dada pela Hortofácil não fora utilizada ou tivera qualquer relevância nos fatos além de sua mera existência. 7. Rose Mary Freitas Maciel assumiu a Secretaria Municipal de Desenvolvimento Social em junho de 1999, respondendo por três setores (Saúde, Educação e Assistência Social), cujo excesso de trabalho impossibilitava o controle direto de todas as atividades exercidas, não tendo agido com dolo de burlar a Lei de Licitações ao homologou a dispensa de licitação em dezembro de 1999, resultando na contratação com a Hortafácil, pois visava apenas aproveitar os recursos liberados pelo Governo Federal nos dias 30 de novembro e 1º de dezembro de 99, para não correr o risco de ter de devolver os recursos, deixando os alunos da rede municipal, no período de janeiro a maio de 2000, sem merenda, uma vez que não Poder Judiciário TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 5ª REGIÃO Gabinete do Desembargador Federal Geraldo Apoliano nge APELAÇÃO CRIMINAL Nº 7792-CE (2002.81.00.011020-0) existia outra fonte financeira para a merenda, dando continuidade à política de dispensa de licitação que ela encontrou quando assumiu o cargo. 8. Apelações de Jessé Bezerra de Araújo, condenado pela prática dos delitos dos arts. 89, 90 e 92 da Lei n º 8.666/93, e José Sérgio Teixeira Benevides e Francisco Vilmar Pinto, condenados pelos crimes descritos nos arts. 89, 90 e 96, I da Lei nº 8.666/93, sustentando a nulidade da sentença pelo cerceamento de defesa em face do indeferimento da oitiva de testemunhas por eles indicados, pela ausência de provas da autoria do crime previsto no art. 89, da Lei nº 8.666/93 e da impossibilidade de prática do crime previsto no art. 96, I, do CP, porque seria crime próprio, restrito ao licitante ou contratante, e eles seriam meros intermediários entre as empresas e a prefeitura, conduta perfeitamente legítima. 9. Apelantes José Sérgio Teixeira Benevides e Francisco Vilmar Pinto condenados, na sentença, às penas de 03 (três) anos de detenção e 02 (dois) anos de detenção pela prática do crime previsto no art. 90, da Lei nº 8.666/93 e Jessé Bezerra de Araújo às penas de 02 anos de detenção pela prática do crime previsto no art. 90, da Lei nº 8.666/93 e de 02 (dois) anos de detenção, para o crime previsto no art. 92, da Lei nº 8.666/93. 10. Os lapsos temporais a serem considerado são os previstos no art. 109, IV e V, do Código Penal, ou seja, 04 (quatro) anos para a hipótese de o máximo da pena fixada não exceder 04 (quatro) anos de reclusão, e 08 (oito) anos para a hipótese de o máximo da pena fixada não exceder 04 (quatro) anos de reclusão. 11. Entre a data do último fato delituoso referente ao crime do art. 90, da Lei nº 8.666/93 (ano de 1998) e a data do recebimento da denúncia (10.10.2007) com trânsito em julgado da sentença para a Acusação, transcorreram mais de 09 (nove) anos. Com relação ao crime previsto no art. 92, da Lei nº 8.666/93, entre a data do último fato delituoso (ano de 2000) e a data do recebimento da denúncia (10.10.2007) com trânsito em julgado da sentença para a Acusação, transcorreram mais de 06 (seis) anos. 12. Prescrição concretizada pela pena em concreto, uma vez que, às penas imputadas aos Apelantes com relação aos arts. 90 e 92, Poder Judiciário TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 5ª REGIÃO Gabinete do Desembargador Federal Geraldo Apoliano nge APELAÇÃO CRIMINAL Nº 7792-CE (2002.81.00.011020-0) da Lei nº 8.666/93, correspondem os prazo prescricionais de 08 (oito) e 04 (quatro) anos, ex vi do disposto no art. 110, do Código Penal, período que foi ultrapassado, considerando-se o intervalo entre a data dos fatos delituosos (1998 e 2000) e a do recebimento da denúncia (10.10.2007). Extinção da punibilidade que se declara apenas para as penas dos crimes do art. 90 e 92, da Lei nº 8.666/93. 13. Cerceamento ao direito de defesa não configurado pelo indeferimento do pedido de oitiva de testemunha e de substituição da mesma, porquanto cabe ao Juiz decidir pela conveniência e necessidade das diligências previstas no art. 499 (hoje art. 402), CPP, devendo desconsiderá-las quando entender que são meramente procrastinatórias. 14. Provas da materialidade e da autoria delitiva, com relação ao crime previsto no art. 89, da Lei nº 8.666/93. No período auditado em que ocorreram os fatos (1998-2000), foram repassados recursos da ordem de R$ 10.824.955,40 (valores nominais), sendo que, em média, 63,3% das aquisições foram realizadas por dispensa de licitação, o que representa R$ 6.467.070,00. 15. Entre as condutas, destaca-se a dispensa de licitação na qual a empresa J&D vendeu R$ 218.291,43 de alimentos, cujo representaten era Jessé Araújo, recebeu o pagamento em abril de 1999 e somente sete meses depois, em novembro de 1999, a mercadoria foi integralmente entregue. Adicione-se a esse elemento o fato de ter havido superfaturamento e, mais, não entrega integral de parte da mercadoria paga com recursos da merenda escolar, bem como as NF's 51, 52, 57, e 58 que foram integralmente pagas em dezembro de 1998, no valor de R$ 216.483,43, tendo a entrega ocorrido apenas em novembro de 1999, quase um ano após o recebimento do valor, consubstanciando-se a prática de pagar antecipadamente, contrariando o art. 62 da Lei nº 4.320/64. 16. Provas de que Francisco Vilmar e Sérgio Benevides, então Deputado e parente do Prefeito de Fortaleza/CE à época dos fatos, receberam cheques em valor entre R$ 77.000,00 e R$ 80.000,00, correspondente à comissão por eles terer servido de intermediários entre as empresas fornecedoras de gêneros alimentícios para a Poder Judiciário TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 5ª REGIÃO Gabinete do Desembargador Federal Geraldo Apoliano nge APELAÇÃO CRIMINAL Nº 7792-CE (2002.81.00.011020-0) merenda escolar e a Prefeitura de Fortaleza-CE, favorecendo empresas sem licitação e com produtos superfaturados. Corréu Jessé Bezerra de Araújo, proprietário de pessoa jurídica beneficiada (J&D), que afirmou pagar comissões para que fosse viabilizada a oferta de seus produtos à Prefeitura Municipal de Fortaleza/CE. 17. A conduta delitiva descrita no inciso I, do art. 96, da Lei nº 8.666/93, pode ser praticada por qualquer outra pessoa, além do licitante e do contratado, que haja intermediado ou participado do ato de entrega da mercadoria ou da alteração desta, o que implica no reconhecimento de que, nestas ações, o verbo do tipo penal permite concluir que se trata de crime comum. Além dsso, ausente qualquer impedimento a que haja concurso de agentes no âmbito da prática prevista no art. 96, inciso I, da Lei nº 8.666/93, bastando que seja provado o dolo do co-autor ou partícipe em colaborar para a prática do ato incriminado. 18. Com relação a Sérgio Benevides, a r. sentença, em atenção às circunstâncias judiciais previstas no art. 59, do CP, fixou as penasbases dos crimes dos arts. 89 e 96, I da Lei nº 8.666/93 em 01 (um) ano acima do mínimo legal (quatro anos), por as haver valorado negativamente. O Apelante, no que toca à conduta social e consequências do delito granjeou conceito desfavorável relativo às circunstâncias judiciais, o que autoriza a fixação da pena-base em quantum acima do mínimo legal, conforme já decidiu o egrégio Superior Tribunal de Justiça (HC 25341/SP –T5 –Rel. Min. Gilson Dipp –DJ 22/04/2003 –p. 245). 19. Embora o cálculo da pena-base não seja necessariamente uma operação de aritmética entre o máximo e o mínimo legal, pode o juiz, de modo justificado, atribuir maior peso a determinadas circunstâncias diante das peculiaridades do caso. Precedentes do STJ. 20. Manutenção das penas de Sérgio Benevides em 04 (quatro) anos de detenção, para o crime previsto no art. 89, da Lei nº 8.666/93 e 04 (quatro) anos de detenção, para o delito disposto no art. 96, I, da Lei nº 8.666/93 tornada definitiva à míngua de agravantes e atenuantes e causas de aumento ou de diminuição de pena e da pena de multa em 600 (seiscentos) dias-multa, mantido o Poder Judiciário TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 5ª REGIÃO Gabinete do Desembargador Federal Geraldo Apoliano nge APELAÇÃO CRIMINAL Nº 7792-CE (2002.81.00.011020-0) valor de 300 (trezentos) para cada delito, cada um deles no valor de 1/10 (um décimo) do salário mínimo vigente à época dos fatos. 21. Francisco Vilmar Pinto teve as penas-bases dos crimes dos arts. 89 e 96, I da Lei nº 8.666/93 no mínimo legal, em face da valoração positiva dos requisitos do art. 59, do CP. Manutenção da condenação em 03 (três) anos de detenção, para o crime previsto no art. 89, da Lei nº 8.666/93 e 03 (três) anos de detenção, para o delito previsto no art. 96, I, da Lei nº 8.666/93, e da pena de multa em 20 (vinte) dias-multa, sendo 10 (dez) para cada delito, cada um deles no valor de 1/30 (um trigésimo) do salário mínimo vigente à época dos fatos. 22. Para Jessé Bezerra de Araújo, persiste apenas a condenação ao mínimo legal de 03 (três) anos de detenção, pela prática do crime previsto no art. 89, da Lei nº 8.666/93, em face da extinção da punibilidade pela declaração da prescrição retroativa com relação aos crimes previstos nos arts. 90 e 92, da Lei nº 8.666/93. Apelante que requereu a redução da pena, em face da presença da atenuante da confissão espontânea, prevista no art. 65, III, “ d” , do Código Penal. Aplicação da Súmula nº 321, do STJ “ A incidência de circunstância atenuante não pode conduzir a redução da pena abaixo do mínimo legal” . Manutenção da pena privativa de liberdade e de multa de 10 (dez) dias-multa, cada um deles no valor de 1/30 (um trigésimo) do salário mínimo vigente à época dos fatos. 23. Substituição da pena privativa de liberdade de Jessé Bezerra da Silva por duas penas restritivas de direitos, a serem indicadas pelo Juízo das Execuções Penais, nos termos do art. 44, do Código Penal. 24. Declaração, de ofício, da extinção da punibilidade da pena privativa de liberdade dos Réus quanto ao crime previsto no art. 90, da Lei 8.666/93, e apenas com relação a Jessé Bezerra da Silva, a extinção da punibilidade do crime dos crimes do art. 90 e 92, da Lei nº 8.666/93, em face da consumação da prescrição retroativa (pela pena em concreto), nos termos dos arts. 110, §§ 1º e 2º, c/c art. 109, inciso IV e V, todos do Código Penal . 24. Apelações do MPF e dos Réus improvidas. Concessão de “ habeas corpus”de ofício apenas para substituir a pena privativa de Poder Judiciário TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 5ª REGIÃO Gabinete do Desembargador Federal Geraldo Apoliano nge APELAÇÃO CRIMINAL Nº 7792-CE (2002.81.00.011020-0) liberdade de Jessé Bezerra da Silva por duas penas restritivas de direitos. ACÓRDÃO Vistos, relatados e discutidos os presentes autos, em que são partes as acima identificadas. Decide a Terceira Turma do Tribunal Regional Federal da 5ª Região, por unanimidade, declarar, de ofício, da extinção da punibilidade da pena privativa de liberdade dos Réus quanto ao crime previsto no art. 90, da Lei 8.666/93, e apenas com relação a Jessé Bezerra da Silva e a extinção da punibilidade do crime dos crimes do art. 90 e 92, da Lei nº 8.666/93, e negar provimento à Apelação do MPF e dos Réus, concedendo “ habeas corpus”de ofício apenas para substituir a pena privativa de liberdade de Jessé Bezerra da Silva por duas penas restritivas de direitos, nos termos do relatório, voto do Desembargador Relator e notas taquigráficas constantes nos autos, que passam a integrar o presente julgado. Recife (PE), 24 de abril de 2014. Desembargador Federal Geraldo Apoliano Relator