MELHORISTA: "ESPÉCIE EM EXTINÇÃO"?
Arlete Tavares de Melo e Maria Elisa A.G. Zagatto Paterniani
(Texto traduzido e adaptado de – Stephanie Fehr, “An endangered species”, Germination,
Winnipeg, v. 10 n.3, p. 13-14)
Existem dois lados no desenvolvimento de variedades: o trabalho de laboratório e o
trabalho de campo, e parece que este último está morrendo. O treinamento em
melhoramento clássico ou de campo é essencial para adquirir o conhecimento e a
habilidade para fazer seleção de plantas em um programa de melhoramento. A biologia
molecular e a bioquímica são ferramentas importantes para o melhorista, no entanto, a
habilidade na seleção de plantas somente é obtida com a prática do dia-a-dia.
O melhoramento de plantas “é tanto arte quanto ciência”, diz Bert Innes, Presidente do
Eagle Group, consultoria de Melhoramento Vegetal, localizada no Canadá. Se você tem
uma casa de vegetação com 10 mil plantas e está procurando algo diferente entre um
grande número de plantas, precisa de muita experiência para selecionar.
Um dos problemas que Innes vê no Canadá é o aumento do número de estudantes
direcionando-se para a “nova” ciência de Biologia Molecular e ignorando o Melhoramento
clássico como profissão. Para complicar a situação, aqueles estudantes que desejam
ingressar na área do melhoramento de plantas, frequentemente, deparam-se com poucos
melhoristas experientes para treiná-los. "Como conseqüência, atualmente, poucas pessoas
com experiência prática estão sendo contratadas”. Além disso, com a redução do número de
melhoristas nas Universidades, torna-se difícil também ter mais estudantes nessa área.
A América do Norte não é a única região em que os melhoristas são "espécies em
extinção". Petr Kosina, Coordenador de Treinamento do CIMMYT (Centro Internacional
de Desenvolvimento de Milho e Trigo), diz que o número de melhoristas clássicos está
diminuindo no mundo inteiro. “O número está decrescendo especialmente no setor público
que, freqüente e infelizmente, não oferece condições comparáveis às do setor privado!”, diz
Kosina. “Obviamente, a situação não é a mesma em todas as regiões do mundo, mas, com
certeza, muitos países desenvolvidos e em desenvolvimento enfrentam esse problema”.
Ainda é difícil para Estados Unidos, Europa e, mesmo para os centros internacionais, como
o CIMMYT, encontrar melhoristas realmente competentes e experientes. Embora não
exista uma razão principal, essa falta de melhoristas clássicos não é bom sinal para a
agricultura. Embora a biotecnologia seja muito útil para o desenvolvimento de
características benéficas, se não houver o mecanismo de transferência utilizado pelos
melhoristas clássicos, os agricultores não verão esses benefícios em suas lavouras. “Se
poucas pessoas se dedicarem ao melhoramento clássico, não podemos esperar aumento
intenso da produção (quanto à produtividade e qualidade) no futuro”, diz Kosina. “As
conseqüências atingiriam inclusive os resultados do melhoramento molecular porque,
gostemos ou não, a última etapa do desenvolvimento molecular de cultivares acontece no
campo – as plantas devem ser testadas, adaptadas”.
Se os agricultores dos países desenvolvidos deixarem de ter variedades melhoradas, os
países em desenvolvimento sofrerão um duro golpe. “Nesses países, onde a população
ainda cresce exponencialmente, as conseqüências poderão ser desastrosas – e muito mais se
o cenário de mudanças climáticas no mundo piorar”, diz Kosina.
Sem o melhoramento de plantas, a história também poderá ser diferente. Considere a
Revolução Verde. “Os cursos de treinamento prático do CIMMYT sobre melhoramento de
milho e especialmente de trigo tornaram-se famosos durante seus 40 anos de história e
praticamente formaram a base da Revolução Verde”, diz Kosina. “Norman Borlaug (o pai
da Revolução Verde) sempre disse que sem o treinamento de melhoristas no campo, a
Revolução Verde não teria acontecido”.
Segundo Kosina, a FAO concluiu um extenso levantamento, no contexto global, sobre o
fortalecimento nacional do melhoramento de plantas e sobre a capacidade da biotecnologia
nesse setor, que mostrou uma demanda clara pelo aumento de treinamento prático de
melhoristas, especialmente em países em desenvolvimento. “Espero que o resultado desse
levantamento seja aplicado extensivamente no futuro próximo, dando suporte a iniciativas
que visem patrocinar o aumento da capacidade na área de melhoramento de plantas”, diz.
Se há uma coisa clara, é a necessidade real de treinamento de melhoristas. Tanto o setor
público quanto o privado reconhecem o problema e ambos precisam trabalhar juntos para
viabilizá-lo. E já existe um trabalho em andamento. A Universidade da Califórnia, em
Davis, criou a Academia de Melhoramento de Plantas através do seu Centro de
Biotecnologia de Sementes, voltado ao ensino das Bases do Melhoramento de Plantas para
profissionais que já estão trabalhando com melhoristas.
Números em queda
Há alguns fatores envolvidos na diminuição do número de
melhoristas:
 Retração do número de melhoristas em cursos de
capacitação;
 Queda das matrículas em disciplinas de melhoramento;
 Oportunidades adicionais, como a biotecnologia;
 Falta de recursos;
 Atividade que exige compromisso de longo prazo.
Há outras idéias para treinar melhoristas. Van Deynze aponta o modelo da América do Sul,
onde alunos de graduação estudam em uma universidade durante um semestre, fazendo
disciplinas específicas e depois vão para outra universidade para cursar outro tópico Ele
acredita que esse modelo poderia ser estendido para uma cooperação entre a universidade e
o setor privado. “Agora está começando a ficar claro que alguma coisa precisa ser feita”,
diz Van Deynze. “No futuro, isso precisará ser alcançado por meio de um esforço
integrado, senão, creio que estaremos com problemas”.
Como qualquer espécie em extinção, demandará um tempo para que a população de
melhoristas cresça novamente. Está claro que a biotecnologia e o melhoramento são ambos
importantes, mas será um grande prejuízo para a agricultura se uma área for mais forte que
outra. Essas duas atividades devem caminhar lado a lado; no final, tudo se resume na
introdução de novas características no germoplasma – o que não pode ser feito sem os
melhoristas de campo.
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