TUTORIA DE ACOMPANHAMENTO
(DOCENTES)
Maria Elisa Chaleta
GPSA
GPSA – Tutoria de Acompanhamento (Docentes) 2
Título: Tutoria de Acompanhamento (Docentes)
Autoras: Maria Elisa Chaleta
Editor: GPSA – Gabinete para a Promoção do Sucesso Académico Universidade de Évora
Depósito Legal: 306898/10
ISBN: 978-989-96656-0-6
GPSA – Tutoria de Acompanhamento (Docentes) 3
Índice
Introdução-------------------------------------------------------------------------------------- 4
I - Fundamentos teóricos------------------------------------------------------------------- 5
1 - Transição, adaptação e sucesso académico-------------------------------- 5
II- Aspectos passíveis de serem explorados no quadro da
tutoria de acompanhamento------------------------------------------------------ 12
Notas------------------------------------------------------------------------------------------ 13
Bibliografia----------------------------------------------------------------------------------- 17
GPSA – Tutoria de Acompanhamento (Docentes) 4
Apresentação
O presente documento pretende constituir-se como uma moldura enquadradora
da experiência a realizar no âmbito da tutoria pelos docentes na Universidade de
Évora, a qual denominaremos de “tutoria de acompanhamento”. Esta tutoria destina-se
aos alunos que vão frequentar o 1º ano dos cursos que compõem a oferta formativa
do ano lectivo de 2009/2010.
São dois os principais objectivos norteadores deste documento: o primeiro visa
apresentar de um modo sintético os principais resultados produzidos pela investigação
neste domínio, i.e, no âmbito da transição dos jovens estudantes do Ensino
Secundário para o Ensino Superior e os factores presentes no seu processo de
adaptação a uma nova realidade educativa. Em simultâneo, pretende-se apresentar os
conceitos que lhe estão subjacentes de modo a que se possa construir uma linguagem
comum que facilite a compreensão do fenómeno que é comum a todas as instituições
de ensino superior; o segundo objectivo visa elencar e operacionalizar os aspectos
mais relevantes presentes no processo de transição e adaptação ao Ensino Superior
de modo a que estes se possam constituir como uma base indicativa para os tutores a
partir da qual, cada um, em função da sua realidade e circunstâncias possa delinear a
sua acção.
Este documento, dado o carácter experimental da implementação da “tutoria de
acompanhamento” assumirá um carácter dinâmico pelo que será actualizado
periodicamente em função de necessidades detectadas ou para incluir sugestões e
propostas decorrentes da sua implementação.
No sentido de ser um instrumento funcional conterá apenas a informação mais
relevante. Progressivamente serão enviados textos complementares para os tutores e
demais docentes que desejem tomar um contacto mais aprofundado com a
investigação produzida neste domínio.
GPSA – Tutoria de Acompanhamento (Docentes) 5
Introdução
Nas últimas décadas assistimos em muitos países a um aumento considerável
de estudantes no ensino superior o que, entre outros factores, determinou uma
progressiva
heterogeneização
da
população
estudantil.
Esta
quantidade
(e
diversidade) nem sempre encontrou devidamente preparadas as instituições de ensino
superior que, por constrangimentos de vária natureza, se viram impossibilitadas de
introduzir com a rapidez desejável as mudanças necessárias. As taxas elevadas de
insucesso académico dos estudantes do 1º ano denotam quer as dificuldades da
transição e da adaptação dos alunos, quer a fraca preparação das instituições para os
receberem (Almeida e Soares, 2000).
Numerosos estudos realizados na última década revelam uma preocupação
crescente com as taxas de insucesso registadas no 1º ano dos cursos sendo claro,
neste momento, que a entrada no ensino superior constitui um momento de transição
importante e merecedor da atenção dos responsáveis. Nestes estudos pode observarse que esta transição envolve factores pessoais, interpessoais e contextuais que
afectam, nem sempre de forma positiva, a qualidade da adaptação, da aprendizagem
e do rendimento académico, podendo ocorrer problemáticas que tendem a prolongarse pelos anos subsequentes. Para além destes aspectos (adaptação, aprendizagem,
rendimento) há também a considerar o facto de o contexto académico no ensino
superior envolver demandas desenvolvimentais e desafios de vária natureza que são
sentidos e experienciados de forma muito diferenciada pelos estudantes, em muitos
casos de forma problemática.
No caso particular da Universidade de Évora, o estudo realizado pela PróReitoria para a Política da Qualidade e Inovação com 224 estudantes de 16 unidades
curriculares do 1º ano revelou uma taxa de insucesso de 44, 2% (Vieira & Cristóvão,
2009) valor que se aproxima do insucesso global calculado para a Universidade de
Évora que em 2007 (Vieira & Cristovão, 2007) ultrapassava, para o conjunto dos
alunos, os 50% o que determinou uma penalização financeira à UE de
aproximadamente 3 milhões de euros.
GPSA – Tutoria de Acompanhamento (Docentes) 6
I – Fundamentos Teóricos
Apresentamos em seguida, de forma sintética, os aspectos mais relevantes
produzidos pela investigação no domínio da transição, adaptação e sucesso
académico dos estudantes ao ensino superior com um objectivo de estabelecer e
delimitar o quadro conceptual em que pode ser desenvolvida a tutoria de
acompanhamento aos alunos do 1º ano.
1 - Transição e adaptação
Transição e adaptação ao ensino superior são dois conceitos chave presentes
nos trabalhos de investigação realizados neste domínio nas últimas duas décadas,
tanto no plano nacional como internacional. Apontam o 1º ano na Universidade como
um período crítico, potenciador de crises e/ou desafios desenvolvimentais em que
mais de metade dos estudantes revelam dificuldades. Podemos encontrar estes
conceitos em estudos realizados por múltiplos autores (Almeida, Soares & Ferreira,
2000; Baker, McNeil & Siryk, 1985; Chickering & Reisser, 1993; Creamer, 1990;
Erikson, 1980; Evans, Forney & Dibrito, 1998; Ferreira, Machado, Chaleta, Grácio, &
Correia, 2009; etc.)
A transição do ensino secundário para o ensino superior confronta os jovens
com múltiplos desafios e tarefas complexas num período marcado por mudanças
desenvolvimentais características da fase final da adolescência e inicio da vida adulta.
Os jovens são confrontados nesta transição com tarefas em quatro domínios principais
(Almeida, Soares & Ferreira, 2000):
- Académico: são requeridas novas estratégias, abordagens e ritmos para
aprender, adaptação a novas metodologias de ensino e avaliação e, em simultâneo,
exigência de maior autonomia e auto-regulação no processo de estudo e de
aprendizagem.
- Social: a experiência universitária requer novos padrões de relacionamento
interpessoal com a família, os professores, os colegas, o sexo oposto e as figuras de
autoridade.
GPSA – Tutoria de Acompanhamento (Docentes) 7
- Pessoal: fortalecimento da identidade pessoal, maior conhecimento de si
próprio, maior autonomia na gestão da vida pessoal e, progressivamente, construção
de uma visão pessoal do mundo.
- Vocacional/institucional: desenvolvimento de uma identidade vocacional em
que, de um modo progressivo, se vai desenvolvendo um maior comprometimento com
uma realidade profissional.
a) Variáveis pessoais e desenvolvimento psicossocial
As teorias do desenvolvimento psicossocial do estudante do ensino superior
assinalam como determinante a questão do desenvolvimento da autonomia. Para
Chickering e Reisser (1993) ser autónomo significa que o indivíduo se sente seguro e
estável e apresenta comportamentos bem coordenados com as suas finalidades
pessoais e sociais. A autonomia nesta perspectiva engloba três áreas:
- A independência emocional que se manifesta pela redução da necessidade
de afecto, segurança e aprovação por parte dos outros.
- A autonomia emocional que começa com a separação dos pais e evolui para
alianças com pares e grupos institucionais de referência, prosseguindo gradualmente
para interesses e convicções pessoais.
- A independência instrumental que se refere a competências para realizar
actividades e resolver problemas de modo auto-orientado, sem precisar de apoio e
ajuda permanente.
Num estudo realizado recentemente sobre a autonomia dos estudantes que
frequentam o Ensino Superior no Alentejo (Évora, Portalegre e Beja) com uma
amostra de 427 estudantes, recorrendo ao IDA (Inventário de Desenvolvimento da
Autonomia – versão portuguesa do Iowa Development Autonomy Inventory de Hood &
Jackson, 1983) pudemos observar que o grau de autonomia se incrementa com a
idade em termos globais e, em particular, na dimensão de autonomia emocional
(independência emocional dos pais, dos colegas e interdependência). Constatámos
ainda que os estudantes com melhor rendimento académico obtêm resultados mais
elevados no que se refere à gestão do tempo e interdependência. Encontraram-se
ainda diferenças entre rapazes e raparigas já identificadas noutros estudos (White &
Hood, 1989; Pinheiro & Ferreira, 1995; Ferreira, 2003) que indicam que as raparigas
tendem a obter melhor rendimento académico e apresentam mais competências ao
nível da gestão do tempo (Ferreira, Machado, Chaleta, Grácio, & Correia, 2009).
GPSA – Tutoria de Acompanhamento (Docentes) 8
De um modo geral os resultados encontrados apontam para a necessidade das
instituições assumirem o desenvolvimento da autonomia e interdependência como um
objectivo e que encontrem formas de a promover dado que o sucesso académico dos
estudantes passa também pelo seu desenvolvimento pessoal e social. Associado à
maior autonomia dos estudantes encontram-se melhores resultados académicos. Um
dos factores a dar mais atenção diz respeito à autonomia instrumental, nomeadamente
à gestão do tempo, que surge como um factor que influencia o rendimento académico
não apenas neste estudo mas na vasta literatura que aborda a aprendizagem e o
rendimento académico dos alunos. Quando comparámos os resultados obtidos nas
três instituições estudadas (Universidade de Évora, IP de Portalegre e IP de Beja)
encontrámos diferenças significativas ao nível das sub-escalas de interdependência e
da gestão do tempo em particular entre os dois IP (superiores no IP de Portalegre e
inferiores no IP de Beja) o que nos remete para o papel que pode assumir a cultura
das diferentes instituições no desenvolvimento da autonomia dos estudantes que a
frequentam (Ferreira, Machado, Chaleta, Grácio, & Correia, 2009).
b) Aprendizagem e rendimento académico
Muitos foram os estudos realizados sobre a aprendizagem dos estudantes no
ensino superior. Faremos neste caso apenas referência aos estudos sobre as
concepções sobre o que é aprender e a sua influência sobre as abordagens à
aprendizagem, bem como as consequências que estas apresentam ao nível do
rendimento académico dos estudantes neste nível de ensino.
Os estudos iniciados por Marton em 1976 a partir de situações académicas
simuladas e entrevistas transcritas de forma exaustiva e rigorosa, permitiu identificar
categorias de descrição que seguem procedimentos sistemáticos bem definidos e que
resultam numa hierarquização em função do nível de compreensão alcançado pelo
estudante. Estas categorias descrevem diferenças qualitativas no que foi aprendido e
diferenças nas formas de resolução das tarefas. O uso do primeiro tipo de categorias
levou ao desenvolvimento da fenomenografia, que explora o leque de concepções que
as pessoas têm do mundo à sua volta; o segundo tipo de categorias, ou seja, a forma
como os estudantes resolvem a tarefa, levou, por seu lado, à identificação de distintas
e contrastantes abordagens à aprendizagem: profunda e superficial, ou seja, a
tentativa de reconstruir o conhecimento através da compreensão pessoal ou, em
oposição, a tentativa de reprodução de informação associada a intenção de satisfazer
os requisitos percebidos como mais valorizados pelo professor.
GPSA – Tutoria de Acompanhamento (Docentes) 9
Nos estudos realizados sobre as concepções de aprendizagem foram
identificadas seis concepções (Marton, Dall’Alba & Beaty, 1993) cuja existência foi
confirmada, posteriormente, nos estudantes da Universidade de Évora (Grácio, 2003).
1- Aumento de conhecimento (ou aprender como incremento do próprio
conhecimento). Aprender é encarado como um acto quantitativo e os estudantes
enfrentam a aprendizagem para adquirirem mais conhecimento (colecção, consumo e
arquivo de partes de conhecimento).
2- Memorização e reprodução. Esta concepção, também considerada em
termos quantitativos, acentua particularmente a forma de aquisição de conhecimento
(memorizar e reproduzir). Distingue-se da anterior por relação com o horizonte
externo, já que remete para posterior reprodução do material aprendido em provas de
avaliação.
3- Aplicação de conhecimento. Para além da aquisição e armazenamento do
conhecimento, o sujeito pressupõe a sua aplicação em função de solicitações
concretas do contexto académico ou de outros contextos.
4- Compreensão. O foco do processo de aprendizagem centra-se no estudante
que analisa criticamente e sob várias perspectivas a realidade, tendo em conta os
argumentos em discussão no material a aprender. A aprendizagem é encarada como
um processo compreensivo que requer conhecimentos anteriormente adquiridos e a
sua integração noutros contextos, mediante processos de comparação e contrastação.
Ocorre a metáfora visual,
dado que,
no discurso dos estudantes, surge
frequentemente a referência a olhar, ver.
5- Ver as coisas de forma diferente. A compreensão expande-se e o estudante
torna-a mais activa para perspectivar a realidade de forma diferenciada; já não se
centra apenas na compreensão de uma ideia, produção de um significado ou
desenvolvimento e construção de algo (como na categoria anterior), mas coloca a
ênfase na arquitectura global do processo de mudança e na alteração da sua própria
forma de pensar (sobre algo ou sobre o mundo que o rodeia).
6- Mudar como pessoa. Esta concepção acrescenta à anterior uma perspectiva
existencial sobre o processo de aprendizagem. A mudança como pessoa emerge da
construção de novas perspectivas dos fenómenos, resultantes de novas formas de
lidar e de trabalhar os materiais de aprendizagem que permite encarar o mundo de
forma diferenciada.
Os resultados obtidos com os estudantes da universidade de Évora (Grácio,
2003) confirmam os resultados obtidos em estudos internacionais e indicam que os
estudantes
apresentam
aprendizagem.
predominantemente
concepções
superficiais
de
GPSA – Tutoria de Acompanhamento (Docentes) 10
Entwistle (1985), interessado nos estudos desenvolvidos por Marton e Pask,
desenvolveu a sua linha de investigação a partir das estratégias e processos que os
estudantes desenvolviam em tarefas quotidianas de aprendizagem. Foram exploradas,
nesse âmbito, a abordagem dos estudantes à aprendizagem e identificadas
claramente a abordagem profunda e a abordagem superficial. Emergia ainda um
terceiro tipo de abordagem, a abordagem estratégica, cujo objectivo se centrava na
obtenção de notas elevadas no curso e implicava por parte do estudante, (a) a
manipulação do sistema de avaliação (por exemplo, causar boa impressão aos
professores, analisar enunciados de exames anteriores e estar atento a pontos chave
ou mesmo questões prováveis) e (b) uma organização mais sistemática do tempo e do
esforço para obter o melhor resultado possível investindo o menor esforço, em
condições de estudo satisfatórias e a partir de materiais de aprendizagem eficazes.
Estas três abordagens foram identificadas a partir da análise qualitativa de entrevistas
e Entwistle (2000a), caracterizou-as da seguinte forma:
Abordagem profunda (procura de significado) - O estudante debruça-se atenta
e criticamente sobre o conteúdo em estudo, com o objectivo de compreender. Procura
relacionar novas ideias com conhecimentos anteriores e transpô-los para a
experiência quotidiana. Examina a lógica da exposição e relaciona a demonstração
com as conclusões. Manifesta interesse activo nos conteúdos do curso.
Abordagem superficial (reprodução rotineira) - O estudante memoriza a
informação necessária com intenção de cumprir os requisitos da tarefa (avaliação).
Considera a tarefa como uma imposição externa e é incapaz de distinguir princípios de
exemplos, centrando-se em elementos isolados, desintegrados, não reflectindo sobre
os objectivos ou as estratégias de aprendizagem.
Abordagem estratégica (organização reflexiva) - O objectivo do estudante é
obter as notas mais altas. Para isso gere o tempo eficazmente e mobiliza um esforço
consistente, assegura-se de que as condições e materiais de estudo são apropriados,
utiliza enunciados anteriores para prever questões e está alerta para os requisitos e
critérios da avaliação.
Entwistle tal como Biggs considera que existem diferenças significativas entre
as abordagens superficial e profunda e a abordagem estratégica (Entwistle) ou de alto
rendimento (Biggs). As duas primeiras descrevem formas de comprometimento dos
alunos com as tarefas académicas (baixa e elevada, respectivamente) e a diferença
entre ambas reside fundamentalmente na intenção do estudante: alcançar a
compreensão pessoal ou satisfazer o que é requerido pelo professor ou avaliação. A
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terceira caracteriza essencialmente a atitude face ao contexto escolar (organização do
espaço e do tempo e atenção às exigências do professor e da avaliação), com vista à
obtenção dos melhores resultados (Tang & Biggs, 1996).
A investigação realizada neste domínio com os estudantes da Universidade de
Évora mostrou que os estudantes utilizam predominantemente abordagens superficiais
para aprender e que embora estas se vão tornando mais profundas à medida que
aumenta a idade e avançam nos cursos estas não se revelam tão profundas como
seria desejável, mas mesmo assim, muitos obtém sucesso académico (Chaleta, 2003).
c) Variáveis associadas ao contexto académico
Algumas variáveis associadas ao contexto académico contribuem para uma
maior compreensão do processo de transição e adaptação académica. Estas
variáveis, consideradas como contextuais do desenvolvimento e do comportamento
humano contribuem para perceber a influência do próprio espaço da instituição na
aprendizagem, adaptação e desenvolvimento psicossocial dos estudantes bem como
do seu rendimento académico (Almeida, Soares & Ferreira, 2000). As próprias
condições físicas, e mais concretamente o ratio de alunos por recursos disponíveis
(materiais e humanos) condicionam a qualidade das relações e a socialização entre os
jovens (comportamentos agressivos e ansiosos), as suas atitudes iniciais de
envolvimento académico (atenção, processamento de informação, interacção,
envolvimento e empenho nas tarefas) e em termos mais globais a sua satisfação
académica. Estas componentes surgem em numerosos estudos como variáveis
susceptíveis de influenciar a adaptação, a integração na estrutura física e social da
Instituição e, em consequência, o seu rendimento académico.
Num estudo realizado na Universidade de Évora (Chaleta, 2003) procurámos
avaliar a percepção dos estudantes sobre o curso que frequentavam recorrendo ao
CPQ - Course Perception Questionnaire (Ramsden & Entwistle, 1981). A percepção
sobre o curso, nos estudantes do 1º ano encontrava-se focalizada, fundamentalmente,
no ensino formal e na carga de trabalho, indicando que estes estudantes
consideravam as aulas mais importantes do que o estudo individual e sentiam grande
pressão para a finalização das tarefas (carga de trabalho demasiado pesada,
programas com demasiados tópicos e demasiados trabalhos escritos que não
permitiam tempo para leituras independentes). Estes estudantes consideravam ter
professores pouco preparados, pouco empenhados e pouco disponíveis para
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auxiliarem os estudantes e, também, que estes tinham poucas atitudes amigáveis e
pouca atenção às suas necessidades. Consideravam que não existia uma definição
clara dos padrões de avaliação nem dos objectivos de estudo, que tinham pouca
liberdade para organizarem o seu trabalho e que as relações académicas e sociais
entre os colegas não eram boas.
Em geral, nos anos iniciais, os estudantes encontram-se mais atentos e
dependentes das exigências do contexto académico tornando-se, progressivamente,
mais autónomos face a esse contexto, mesmo que o percepcionem com
características negativas ou inadequadas.
O insucesso académico entendido de forma abrangente (baixas classificações,
absentismo, disciplinas em atraso, mudanças de curso, abandono, transição de ano) é
um fenómeno complexo e multidimensional que frequentemente se relaciona com o
processo de transição/adaptação à universidade. Para além das competências
académicas os jovens estudantes necessitam também de desenvolver competências
pessoais que lhes permitam lidar com a mudança e com as novas exigências com que
se confrontam na sua vida académica.
Estes aspectos não podem continuar omissos ou a ser ignorados no contexto
da Universidade (de qualquer universidade) pois o cruzar dos portões da instituição
não se revela como um momento mágico capaz de dotar os estudantes das
competências que lhe vão ser requeridas, da autonomia e da auto-regulação
necessárias à sua aprendizagem, desenvolvimento e sucesso académico. Fazê-lo
significa ignorar as dificuldades de mais de metade dos estudantes que recebemos em
cada ano lectivo.
Nos cadernos nº 7 e nº 10 da PRPQI da UE (Vieira & Cristovão, 2007; 2009)
podemos observar dados sobre o insucesso académico na Universidade de Évora e
referências a estudos realizados em que um dos factores referidos como relevante
consiste precisamente na transição/adaptação à Universidade.
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II – Aspectos passíveis de serem explorados no quadro da tutoria de
acompanhamento
Tomando como referência os dois momentos de contacto pessoal de cada tutor
com os estudantes ao longo do semestre, propostos no Despacho 36/2011 e tendo em
conta os pressupostos anteriormente apresentados, propõem-se em seguida um
conjunto de itens que podem ser explorados no sentido de facilitar o processo de
transição, adaptação e criação de condições para obtenção de sucesso académico
dos estudantes que ingressam este ano no 1º ano dos cursos da universidade de
Évora.
A tutoria de acompanhamento pelos docentes terá um valor inestimável para os
estudantes se o tutor for percepcionado como uma referência institucional para o aluno
proporcionando-lhe maior segurança no momento em que realiza uma transição
complexa a vários níveis. Este acompanhamento no decurso dos semestres pode
constituir-se como um factor securizante para o processo de adaptação e
consequentemente para a obtenção de sucesso académico.
Não se pretende que os tutores resolvam todas as problemáticas que os
estudantes lhe apresentem mas que nas situações em que existam as identifiquem e
as encaminhem para o Director de Curso que, por sua vez, contará com o apoio do
GPSA (Gabinete para a Promoção do Sucesso Académico) para encontrar as
soluções mais adequadas a cada situação.
Conscientes dos limites de vária natureza com que se podem confrontar os
tutores para darem resposta aos estudantes, muitos destes aspectos serão abordados
na formação de que se serão alvo todos os alunos do 1º ano no decurso do mês de
Outubro. A brochura que se encontra em desenvolvimento para dar suporte a esta
formação será posteriormente distribuída às direcções de curso e aos tutores de modo
a que exista um conhecimento partilhado de toda a intervenção que se encontra
programada e que se realizará no decurso do 1º semestre.
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- 1º momento de contacto – Adaptação (Setembro/Outubro)
Considera-se recomendável que todos os estudantes conheçam o seu tutor
durante este período. Neste primeiro momento seria importante averiguar como se
está a processar a sua transição e adaptação tendo em conta os seguintes aspectos:
- Modo como está a sentir a mudança (transição do ensino secundário para o ensino
superior), dificuldades encontradas e (des)conforto relacionados essa mudança.
- Averiguar sobre a sua organização semanal, mais concretamente estabelecimento
de horários que incluam para além do tempo de aulas, tempo de estudo, tempo para
realizar trabalhos, pesquisas e também o dedicado às demais tarefas de vida.
- Averiguar a forma como estão a gerir o tempo em função das várias tarefas que lhe
estarão a ser requeridas pelas várias unidades curriculares.
- Averiguar se regulam a sua motivação e os seus comportamentos no sentido de
responderem às tarefas que lhe são requeridas (se fixaram objectivos exequíveis e se
mobilizam os comportamentos adequados).
- Outros aspectos considerados importantes para responder adequadamente às
exigências do curso que frequenta.
- 2º momento de contacto – Sucesso Académico (Janeiro/ Fevereiro)
- Verificar os aspectos focados no 1º momento de contacto
- Indagar sobre o sucesso académico.
- Indagar sobre o grau de satisfação com o curso e condições para a realização das
tarefas académicas.
- Reflectir com os estudantes sobre as causas do seu insucesso nos casos em que a
situação se verifique e elaborar com eles planos de recuperação ou, em casos em que
tal se justifique, encaminhar os estudantes para o GPSA onde podem encontrar
suporte educacional para as suas dificuldades.
GPSA – Tutoria de Acompanhamento (Docentes) 15
Notas:
1 - Sobre a “tutoria de acompanhamento”
Independentemente da forma que assuma, a tutoria tem sempre
subjacente a acção de um sujeito com um maior nível de desenvolvimento e
mais competente cognitivamente sobre um menos desenvolvido e competente
em determinado domínio.
A tutoria “de acompanhamento” que se propõe inspira-se no modelo
sociocognitivo desenvolvido a partir dos contributos de Vygotsky, no sentido
descrito anteriormente e numa das componentes presentes nos modelos
tutoriais de Oxford e Cambridge que incluem no seu modelo pedagógico uma
GPSA – Tutoria de Acompanhamento (Docentes) 16
importante componente direccionada para a interacção pessoal e social entre
tutores e estudantes.
The tutor is not a teacher in the sense that it is her or his role to impart
information. Rather, the tutor’s role is to encourage her students
creatively to engage with the knowledge they have encountered,
constructing and re-constructing their own understanding. By
demonstrating in this way the methods of the scholar, the best tutors
enable their students to achieve their own scholarly independence.
Whilst good tutorial teaching has many elements in common with other
forms of university teaching, what makes it unique is its element of
personal interaction. Every tutorial is a unique series of complex
transactions, deriving their particularity from students’ and tutors’ own
knowledge and experience, their capacities to learn from and to inform
the other, and the nature and quality of the relationship that they enjoy.
(A model for tutorial teaching - University of Oxford: Institute
for the Advancement of University Learning)
O ideal será, futuramente, associar a esta componente, insuficiente de
per si para responder aos desafios e exigências colocados pela transição para
o ensino superior, o ensino tutorial como modelo pedagógico que integre
também a componente mais académica e centrada em abordagens profundas
ao conhecimento, no desenvolvimento da autonomia e na auto-regulação dos
estudantes. Há que reconhecer, no entanto, que tal requer uma completa e
complexa reorganização das instituições de ensino superior, o que não se
prevê possível num curto espaço temporal.
2 - Sobre o quadro teórico de referência
A investigação sobre a aprendizagem dos estudantes, no ensino superior,
seguiu várias pistas e caminhos diferentes. De entre elas, duas perspectivas
metodológicas se salientaram: a primeira, mais relacionada com investigações no
âmbito da psicologia da aprendizagem (e ensino), para investigar como aprendem e
estudam os alunos; a segunda, mais ligada à psicologia cognitiva, para identificar
estratégias de aprendizagem que os investigadores esperam que os estudantes
utilizem no seu trabalho académico (Entwistle & Marton, 1989). A partir destas
perspectivas surge uma terceira, que os autores consideram ateórica e eclética, e que,
neste sentido, recorre convenientemente aos conceitos produzidos pelas anteriores,
desenhando-se a partir das experiências de aprendizagem descritas pelos estudantes.
GPSA – Tutoria de Acompanhamento (Docentes) 17
A terceira perspectiva, que referimos anteriormente, e na qual se enquadra o
trabalho que estamos a delinear para enquadrar a transição, adaptação e sucesso
académico dos Estudantes do 1º ano da Universidade de Évora enquadra-se no
modelo genericamente designado por Biggs (1993) como modelos SAL (Students
Approaches to Learning) e tem como preocupação central estudar a aprendizagem na
perspectiva do estudante e nos contextos em que esta ocorre (procurando a sua
validade ecológica).
Embora conscientes de que outros modelos podem ser chamados a esta
discussão a opção por este modelo teórico de cariz essencialmente fenomenográfico
resulta da experiência de investigação acumulada ao longo de mais de uma década e
do facto dos seus principais resultados traduzirem a realidade dos estudantes da
universidade de Évora.
Bibliografia
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Maria Elisa Chaleta - Estudar na Universidade de Évora