para serem pesados todos os dia por enfermeiros e pessoal auxiliar. No preciso momento em que a morte fosse declarada, deviam ser novamente pesados. Desta forma, o clínico chegou à conclusão definitiva de que a alma existe e pesa em média 21 gramas. Alguém me quer dizer para o que é que Mefistófeles havia de querer ao seu serviço uma alminha esquelética, adejando permanentemente à sua volta? Já quanto à questão da alma sou muito mais flexível: não teria problema algum em vender a minha se, como se diz hoje, o contrato fosse transparente e as condições propostas excelentemente boas. O facto da ausência de comprador leva-me a três possibilidades: a) a alma não existe; b) o demónio (que como se sabe é legião) não existe; c) a minha alma não tem qualquer valor comercial ou espiritual. Mas andando, andando, passemos ao mito de D. João, também caro aos românticos, havendo mesmo quem tivesse querido juntá-los no mesmo tablado, como em D. João e Fausto de Cristian Dietrich Grabbe. É natural, o assunto de D. João é também largamente o da alma e, pelo menos a partir de Molière, mesmo o da sua natureza e existência. Uma das mais belas peças, senão a mais extraordinária, do teatro romântico espanhol, é Don Juan Tenorio de José Zorrilla, também ela longuíssima, também ela em duas partes e onde o protagonista é salvo dos infernos pelo amor de uma mulher. Quanto a Goethe conhecia bem os seus clássicos e a cena do Jardim não é sem recordar o Acto II, cena II de D. João e o diálogo de D. João e Charlotte com evidência para o pormenor das mãos: É tão feia e tão rude, a minha mão / Fi, Monsieur, eles sont noires come je ne sais quoi. O pobre Esganarelo, de joelhos no chão, gritando pelo salário que nunca receberá: mes gages, mes gages, junto a um alçapão donde saem fumo e chamas de teatro, não está longe de Mefistófeles, na Segunda Parte da obra, quando este lamenta; tanto trabalho em vão, tudo perdido, vendo a sua conquista arrebatada pelos Anjos. Não passava afinal de um pobre diabo, como lhe chama o Dr. na cena do contrato, e foi enganado por um Senhor que, jardinando as suas cruzes plantadas, não hesita em fazer batota. JVL Alunos Turma A: Actores: Ana Rita Neves; Carolina Matias; David Cabecinha; Francisco Arraiol; Joana Bernardo; José Redondo; Mafalda Matos; Maria Mexia; Miguel Vidal; Nuno Nolasco; Paula Moreira; Ricardo Néstor; Rita Aveiro; Sofia Vitória; Teresa Machado; Tiago Lameiras; Vanessa Casanova; Vera Barreto Dramaturgia: Marta Nunes Direcção do Ateliê: Pedro Matos e José Valentim Lemos Professores de Apoio: Elsa Braga (Voz) e Howard Sonenklar (Corpo) Interpretação à guitarra: Sofia Vitória Iluminação e Direcção de Cena: Mónica Sousa e Carla Castro Coordenação de luz: José Valentim Lemos Programa de: Pedro Azevedo e José Valentim Lemos Agradecimentos: Queremos agradecer, eu e o Pedro, a Mónica Sousa e Carla Castro, que se disponibilizaram a trabalhar connosco neste período final de trabalho e sem a participação das quais o objectivo não poderia ser verdadeiramente conseguido. Aliás, recordo que já no ano anterior tínhamos tido a participação, importantíssima, de vários alunos de Produção. Temos pena de não termos podido contar com alunos de Design de Cena, mas estamos convencidos que o envolvimento destes, mais aprofundado, no 2.º semestre do 1.º ano, seria da maior utilidade. Agradecemos também, colectivamente, a todos aqueles, pais, colegas e amigos que cederam ou emprestaram roupa ou adereços para o exercício, bem como à Mestra Olga Amorim. Já vai longa a lista e terminamos como sempre com um agradecimento especial à Rute Reis, incansável, e a Pedro Azevedo, que como sempre aturou todas as manias e respondeu a todos os prazos. FAUSTO 1 a partir da Primeira Parte de Fausto de Goethe na tradução de João Barrento, Relógio D’Água, 2007; versão de José Valentim Lemos, Marta Nunes, Pedro Matos, e dos alunos de interpretação CENAS E PERSONAGENS TEATRO* (Prelúdio no teatro): DIRECTORA Vera Barreto; POETA Teresa Machado; ACTRIZ Ana Rita Neves. CÉU* (Prólogo no céu): SENHOR Maria Mexia; MEFISTÓFELES Nuno Nolasco. NOITE (Noite): FAUSTO José Redondo. WAGNER (Noite): FAUSTO José Redondo; WAGNER Sofia Vitória. SUÍDICIO* (Noite): FAUSTO David Cabecinha CIDADE* (Diante das portas da cidade): FAUSTO Paula Moreira; WAGNER Sofia Vitória; VELHO CAMPONÊS Miguel Vidal. CONTRATO I (Gabinete de trabalho): FAUSTO Paula Moreira; MEFISTÓFELES Tiago Lameiras. CONTRATO II (Gabinete de trabalho): FAUSTO José Redondo; MEFISTÓFELES Tiago Lameiras. BRUXA* (Cozinha da bruxa): BRUXA Rita Aveiro; FAUSTO José Redondo; MEFISTÓFELES Tiago Lameiras; MACACOS Ana Rita Neves, Joana Bernardo, Teresa Machado, Vera Barreto. INTERVALO ENCONTRO (Rua): FAUSTO Francisco Arraiol; MARGARIDA Vanessa Casanova; MEFISTÓFELES Nuno Nolasco. ENGANO (A casa da vizinha): MARTA Carolina Matias; MEFISTÓFELES Nuno Nolasco; MARGARIDA Vanessa Casanova. JARDIM* (Jardim e caramanchão): FAUSTO Francisco Arraiol; MARGARIDA Vanessa Casanova; MARTA Carolina Matias; MEFISTÓFELES Nuno Nolasco. CAVERNA* (Floresta e caverna): FAUSTO Ricardo Néstor; MEFISTÓFELES Miguel Vidal. AMIGO* (O quarto de Margarida): MARGARIDA Mafalda Matos. FÉ (O jardim de Marta): FAUSTO Ricardo Néstor; MARGARIDA Mafalda Matos; MEFISTÓFELES Miguel Vidal.. FONTE (Na fonte): LISA Rita Aveiro. P rocurámos auxiliar o aluno a envolver-se com este texto maior do teatro ocidental e a estabelecer uma relação que, ao longo do tempo, no percurso entre texto e palco, o pudesse levar ao essencial através da experiência. O primeiro passo foi o do mergulho: querer perceber, querer descrever, querer ler o Fausto. Começámos por estabelecer com a turma, através de aproximações progressivas, uma cartografia da obra para perceber a sua estrutura, personagens, cenas, linhas de força e linguagem, Reunimos um património de compreensão e, sobretudo, de intuição sobre a peça, comum ao colectivo. A partir dessa base, a improvisação sobre as personagens e as situações do texto foi o principal meio para descobrir e construir as cenas, revelando as suas possibilidades cénicas e testando o seu alcance. No final do processo de trabalho estabeleceu-se a unidade do exercício agora apresentado e os actores fixaram e praticaram a partitura física, vocal e textual. Pedro Matos DIA DA IRA (Catedral): MARGARIDA Maria Mexia. CÁRCERE* (Cárcere): FAUSTO David Cabecinha; MARGARIDA Joana Bernardo DA DRAMATURGIA Este trabalho teve, do ponto de vista da intervenção sobre o texto de forma a criar uma versão que fosse útil e adequada ao que se pretendia desta turma, um aspecto muito particular. Em todas as cenas escolhidas no primeiro momento, e que aparecem acima referenciadas por um asterisco, os actores apresentaram eles próprios, para o seu personagem, e apenas para o seu personagem, uma versão de trabalho. De alguma forma, podiam construir um texto/personagem à sua medida. Queria também salientar o muito bom trabalho da aluna de Dramaturgia Marta Nunes que apresentou uma proposta de versão para todo o texto muito clara e consistente. Como é evidente nem todas as sugestões foram utilizadas, mas o processo foi extremamente dinâmico e permitiu-me a mim, em conjunto com Pedro Matos, chegar a uma versão final que representa, ao fim ao cabo, um trabalho global. José Valentim Lemos N o fim do século XV nasceu em terras alemãs um indivíduo chamado Fausto, cuja existência é comprovada por figuras credíveis e que se declarava doutor em várias ciências, mágico, médico, necromante e etc. Correu de vila em vila com sorte diversa mas geralmente temido e ganhou foros de lenda com o arreigado boato de que vendera a alma ao diabo. Ao que se sabe acabou de forma obscura mas tornou-se personagem de teatro. Goethe agarrou no tema e dedicou-lhe uma vida quase inteira. Sem o seu Fausto e o sucesso popular que a peça, sobretudo a Primeira Parte, ganhou, seria hoje conhecido sobretudo de intelectuais, estudiosos e literatos. Quanto ao seu Fausto, vende a alma ao diabo, mas não vende só a alma, vende também o corpinho: Aqui ao teu serviço quero ficar (...) Quando lá nos encontrarmos/tu o mesmo me farás. Um extravagante e certamente extremista religioso médico americano fez a seguinte experiência: escolheu em grupo de doentes terminais