DA ACADEMIA Á RUA: RESSIGNIFICAÇÃO DO OLHAR DA TERAPIA
OCUPACIONAL SOBRE A POPULAÇÃO EM SITUAÇÃO DE RUA
Beatriz Caroline Soares Chaves¹; Abida Amoglia Rodrigues¹; Camila Rodrigues
Veloso¹; Carla Raisa Silva Lima¹; Rita de Cássia Gaspar da Silva²
¹Discentes de Terapia Ocupacional; ²Mestre em Motricidade Humana
[email protected]
Universidade do Estado do Pará (UEPA)
Introdução: No Brasil, diversas expressões são utilizadas para designar pessoas que
vivem nas ruas. “Mendigos”, “vagabundos”, “trecheiros”, “sofredores de rua” e
“população de rua”, dentre outras, são termos das diferentes representações que existem
na sociedade brasileira sobre esses indivíduos, bem como na conjuntura social,
econômica e política dos períodos históricos em que tem sido empregadas. O Ministério
do Desenvolvimento Social e Combate à Fome (MDS) utiliza a expressão “população
em situação de rua”, para referir-se a pessoas nessa situação (ROSA, 2005 apud
ALMEIDA et al., 2011). Desta forma, entende-se o termo “população em situação de
rua” como um grupo populacional heterogêneo, composto por pessoas com diferentes
realidades, tendo em comum à condição de pobreza absoluta, com vínculos familiares
interrompidos ou fragilizados e falta de habitação convencional regular, sendo
compelidas a utilizar a rua como espaço de moradia e sustento, por caráter temporário
ou permanente. Também é considerado em situação de rua aquele que pernoita em
albergues, tendas ou abrigos (BRASIL, 2009). Partindo de uma perspectiva vinculada a
integração do sujeito às atividades rotineiras inerentes ao homem moderno, tais como as
práticas laborais e participação social, o indivíduo que se encontra em situação de rua,
transformou-se em um ser enquadrado na desprivilegiada categoria de exclusão social
(ALMEIDA et al., 2011). No âmbito assistencial, no qual propõe-se a interligação das
variáveis saúde, socialização e educação, é que os Terapeutas Ocupacionais integraram
tais discussões, criando novas estratégias interdisciplinares e bases epistemológicas que
permitam o olhar do indivíduo como um ser essencialmente ocupacional (LOPES et al.,
2011). Almeida et al.(2011) refere que a Terapia Ocupacional social, atuando com
contingentes da população que vivem diferentes processos de vulnerabilidade das redes
de relação e dissolução de vínculos sociais, deve propor que as noções de cidadania e de
produção de identidades sejam guias da interpretação das demandas e da elaboração de
projetos de intervenção. A Terapia Ocupacional se refere à ciência que estuda a
atividade humana e utiliza um conjunto articulado e contínuo de ações e serviços
individuais e coletivos, a fim de prevenir e tratar dificuldades físicas e/ou psicossociais
que interfiram no desenvolvimento e na independência do cliente em relação às
atividades de vida diária, trabalho e lazer. Encontra-se intimamente ligada à área social,
de saúde e educação, favorecendo a inter-relação de tais fatores, a fim de que todo
indivíduo seja visto em toda a sua totalidade e complexidade (COSTA, 2012). Deste
modo, considera-se que a Terapia Ocupacional ao atuar com indivíduos em condição de
dissolução de vínculos sociais, como a população em situação de rua, deve propor em
suas intervenções a realização de vivências que objetivem o alcance da autonomia e
participação social de tais indivíduos, proporcionando-lhes o estabelecimento de uma
visão de cidadãos constituídos de direitos e deveres, desvinculando-os totalmente da
condição de invisibilidade e passividade social (BARROS et al., 2002), tal como será
proposto por meio do presente estudo. Desta forma, mesmo sendo a vida na rua o ponto
mais extremo de trajetórias de desvinculação do trabalho, da família, da moradia e do
mercado, acontecem, nessa condição, movimentos de reconstrução de laços, de
formação de grupos de pertencimento, bem como estratégias grupais de sobrevivência
Anais do III Congresso de Educação em Saúde da Amazônia (COESA), Universidade Federal do Pará - 12 a 14 de
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que se apoia em criar uma rede de organizações que colaboram, direta ou indiretamente,
a essas estratégias (ALMEIDA et al., 2011). Objetivos: Propõe-se por meio deste
estudo, socializar e discutir a percepção de acadêmicas de Terapia Ocupacional acerca
das contribuições de uma experiência junto à população em situação de rua para seu o
aperfeiçoamento pessoal e profissional. Descrição da experiência: Trata-se de um
estudo descritivo de abordagem qualitativa referente à experiência vivenciada por
acadêmicas na disciplina Prática Social e Comunitária III no 5º semestre de Terapia
Ocupacional da Universidade do Estado do Pará, abrangendo uma análise qualitativa
dos dados advindos da observação não estruturada/assistemática das intervenções
realizadas no Centro de Referência Especializado para a População em Situação de Rua
(Centro Pop) - Belém. Foram realizados atendimentos grupais semanais durante o
período de Março a Maio de 2014, totalizando o número de 07 encontros, onde foram
propostas atividades de socialização, culturais, expressivas, corporais, lúdicas e de
convivência, sendo estas relacionadas a temas do cotidiano destes indivíduos. Tais
intervenções ocorreram às quartas-feiras, com duração média de 45 minutos junto ao
um grupo composto por aproximadamente 35 usuários, caracterizando um grupo
heterogêneo, aberto e rotativo. Resultados: Por muito tempo acreditou-se que a equipe
de saúde era provedora de todo o conhecimento e a única a contribuir em um processo
de intervenções. Contudo, ao longo das atividades realizadas, junto à população em
situação de rua foi possível promover a criação de vias saudáveis de comunicação entre
usuários e acadêmicas, propícias a troca recíproca de idéias e experiências. Neste
sentido, percebeu-se que a prática proporcionou às acadêmicas o maior conhecimento
acerca das principais e reais demandas da presente população, de maneira que os
comportamentos e vivências expostas pelos usuários desencadearam a desmistificação
de paradigmas sociais pré-estabelecidos, bem como favoreceu um olhar holístico e
humanizado da clientela assistida. O agradecimento social a estes sujeitos representa um
importante resultado alcançado, uma vez que foi alcançado um crescimento como seres
humanos, pautado pelo respeito mútuo e aguçamento da sensibilidade, envolvimento
interpessoal e o conhecimento. Deste modo, a soberania científica, comumente imposta
pelos profissionais, foi anulada pelo compartilhamento de saberes, transformando a ação
terapêutica em um trabalho humanizado que transpõe as barreiras da técnica.
Conclusão: Assim, considerando o processo teórico/prático fundamental na formação
do perfil do profissional, torna-se necessário o incentivo às práticas durante a formação
acadêmica, bem como a realização de pesquisas voltadas para a compreensão das
problemáticas e dinâmicas sociais que cerceiam o cotidiano desta população. Cabe, aos
discentes estarem receptivos e sensíveis às fragilidades e experiências apresentadas pela
clientela e dispostos ao envolvimento na atuação, buscando, assim, proporcionar
melhoria na qualidade de vida dos indivíduos em situação de rua, mostrando a
importância do engajamento para que haja a transformação em suas vidas e do
enriquecimento pessoal e profissional dos acadêmicos.
Referências:
ALMEIDA, M.C. et al.Terapia ocupacional e pessoas em situação de rua: criando
oportunidades e tensionando fronteiras. Cadernos de Terapia Ocupacional UFSCar,
São Carlos, v. 19, n. 3, p. 351-360, 2011.
BARROS, D.D. et al. Terapia Ocupacional Social. Rev. Ter. Ocup. Univ. São Paulo,
v. 13, n. 3, p. 95-103, set./dez. 2002.
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novembro de 2014. ISSN 2359-084X.
BRASIL, Presidência da República. Decreto nº 7.053 de 23 de Dezembro de 2009.
Disponível
em:
<http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_Ato20072010/2009/Decreto/D7053.htm>. Acesso em 19 abril 2014.
COSTA, Samira Lima. Terapia Ocupacional Social: dilemas e possibilidades da atuação
junto a Povos e Comunidades Tradicionais. Cadernos de Terapia Ocupacional
UFSCar, São Carlos, v. 20, n. 1, p. 43-54, 2012. Disponível em:
<http://www.cadernosdeterapiaocupacional.ufscar.br/index.php/cadernos/article/view/5
47/361>. Acesso em 21 abril 2014.
LOPES, R.E. et al. Oficinas de atividades com jovens da escola pública: tecnologias
sociais
entre
educação
e
terapia
ocupacional.
Interface
(Botucatu) vol.15 no.36 Botucatu Jan./Mar. 2011.
Disponível
em:
<http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S141432832011000100021&lang=pt>. Acesso em: 05 setembro 2014.
Anais do III Congresso de Educação em Saúde da Amazônia (COESA), Universidade Federal do Pará - 12 a 14 de
novembro de 2014. ISSN 2359-084X.
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Ressignificação do olhar da terapia ocupacional sobre a população