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São Paulo, sexta-feira, 17 de abril de 2015
Especial
Fotos: Divulgação
Núcleo avalia estereótipos de
população em situação de rua
Ao contrário do que imagina o senso comum, a
população em situação de rua não se restringe
a usuários de drogas e pessoas com problemas
mentais
Giovanna Lukesic Reis/Agência USP de Notícias
T
rata-se de um contingente heterogêneo e
predominantemente masculino, uma vez que
mulheres conseguem mais facilmente se incorporar em casas de família ou recorrer à prostituição.
Esse é um dos resultados de uma pesquisa realizada
pelo Núcleo de Apoio à Pesquisa Centro de Estudos
Rurais e Urbanos (CERU), da Faculdade de Filosofia
Letras e Ciências Humanas da USP, e que orientou
políticas públicas da Prefeitura de São Paulo na área
social. A pesquisa foi coordenada pela pesquisadora
Maria Helena Rocha Antuniassi, uma das diretoras do
CERU, e realizada entre 2009 e 2011, sendo editada
em livro em 2014.
Feita sob demanda para a Secretaria Municipal de
Assistência e Desenvolvimento Social de São Paulo,
à época comandada por Alda Marco Antônio, viceprefeita do governo Kassab (2003-2009), a pesquisa
pretendia conhecer a trajetória da população em situação de rua, especialmente dos albergados — aqueles
que utilizam os serviços de acolhimento da SMADS.
Para tomar conhecimento e compreender quem era
essa população, foram utilizadas técnicas quantitativas
e qualitativas. Em 1991, o número da população em
estado de rua era de 3.392 pessoas; vinte anos depois,
atingia 14.478.
População masculina e
heterogênea
hotéis sociais e chegar a
conclusões que orientaram
a secretária da SMADS em
suas decisões. A principal
delas foi que essa população não se limita a usuários de drogas ou pessoas
com problemas mentais; é, na verdade, heterogênea,
demandando, portanto, abrigos diferenciados que
possam trabalhar com as peculiaridades de cada caso.
Outro ponto importante é a predominância masculina
em situação de rua (84,3%).
população em situação de rua, que abrange de forma
mais específica as pessoas que ainda têm condições
de lutar pela sua cidadania para não cair na total exclusão, que significa o morar na rua. Em dezembro
de 2014, foi lançado o livro Desemprego, Ruptura
Familiar e Solidão: trajetória de vida da população em
situação de rua em São Paulo (Editora Anna Blume),
Segundo Maria Helena, isso ocorre porque as mulhe- que apresenta de forma detalhada as conclusões da
res conseguem com mais facilidade ser incorporadas pesquisa e traz relatos da trajetória de vida de alguns
a casas de família, como
albergados.
agregadas ou empregadas
domésticas, o que não
Segundo a pesquisadora,
ocorre com homens. Além
a publicação, assim como
disso, mulheres com meoutras pesquisas feitas
nos de 50 anos, quando se
pelo CERU, tem o intuito
encontram nessa situação,
de ultrapassar as fronteisão facilmente incorporas do mundo acadêmico e
radas à prostituição, não
socializar conhecimentos.
recorrendo, portanto, aos
Inicialmente uma sociedaabrigos. Em geral, as que
de civil sem fins lucrativos,
ficam na rua apresentam
formada por professores
problemas mentais. Os
do antigo Departamento
homens, por sua vez, ainde Ciências Sociais e lideda carregam o papel de provedor da família, o qual é
rada pela professora emérita Maria Isaura Pereira de
abalado pelo histórico prisional e pelo desemprego.
Queiroz. O CERU foi transformado em NAP em 1992,
Essa quebra de expectativa leva à ruptura familiar,
sendo, portanto, um dos mais antigos.
uma das principais causas do fenômeno.
O CERU baseia muitos de seus estudos em sociólogos
franceses, fazendo deles seu “arcabouço teórico”, como
define Maria Helena. A pesquisa, portanto, buscou
inspiração em estudos socioantropológicos que tratam
da população em situação de rua e procurou olhar tal
fenômeno de forma reflexiva e crítica. O objetivo desse
apoio bibliográfico era utilizar estudos acadêmicos nacionais e internacionais para compreender problemas
sociais vivenciados nas grandes cidades.
Políticas públicas
“Foi uma pesquisa muito interessante e útil porque
A partir de tal método, foi possível identificar certas a secretária pôde repensar situações da organização
características entre aqueles que vivem em abrigos ou e da administração de suas ações relativas a essa população”, comenta Maria
Helena. Com base nas
conclusões acerca das
pessoas em situação de
rua, a então secretária
municipal da SMADS,
Alda Marco Antônio,
editou uma portaria e o
prefeito Haddad implementou o Programa de
Metas da Prefeitura, que
propõe a superação da extrema pobreza na cidade
de São Paulo.
Contingente da população de rua é predominantemente masculino.
Além disso, a SMADS abandonou o termo
“população de rua” e
incorporou o conceito de
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