UNIVERSIDADE CÂNDIDO MENDES
PRÓ-REITORIA DE DESENVOLVIMENTO
PROJETO A VEZ DO MESTRE
A INFLUÊNCIA DA SUBJETIVIDADE NA CAPACITAÇÃO
PROFISSIONAL
AUTORA: GISELE CATARINA DOS SANTOS RODRIGUES
ORIENTADOR: MARCO ANTÕNIO LAROSA
Rio de Janeiro
Setembro de 2003
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UNIVERSIDADE CÂNDIDO MENDES
CURSO DE PEDAGOGIA EMPRESARIAL
PROJETO VEZ DO MESTRE
A INFLUÊNCIA DA SUBJETIVIDADE NA CAPACITAÇÃO
PROFISSIONAL
OBJETIVOS:
Estabelecer
relações
entre
a
subjetividade
e
a
capacitação profissional, propiciando apresentar uma
visão crítica sobre a forma como a Reeducação é
desenvolvida em grande parte das Corporações com
enfoque apenas objetivo do Homem, desconsiderando
suas dimensões interiores, pessoais que tornam o
Homem um animal diferenciado dos demais.
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AGRADECIMENTOS
A Deus que me deu a capacidade de
observar e analisar o mundo a minha volta,
ao meu Orientador, Professor Marcos Antônio
Larosa pela competência em transmitir ajuda.
Aos Professores do Projeto ”Vez do Mestre”
que
com
suas
magníficas
experiências
profissionais puderam contribuir para uma
reconstrução de minha visão de mundo.
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DEDICATÓRIA
Dedico este trabalho a minha mãe, meu modelo de
mulher guerreira e profissional cujos valores
transmitidos me são como pedras preciosas; ao
meu pai (in memoriam) como exemplo de
sensibilidade
e
altruísmo.
Também
ao
meu
companheiro Fausto que me estimulou a retornar
aos estudos por acreditar em meu potencial. E,
muito especialmente à minha filha por sua
grandeza
e
pureza
de
alma
cuja
ajuda
e
compreensão me foram fundamentais durante esta
jornada.
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RESUMO
Este trabalho tem como objetivo fazer uma análise crítica em relação à
forma pela qual os Profissionais de Recursos Humanos e outros cuja atividade
laboral esteja ligada à condução de Processos de Qualificação Profissional
costumam lidar com a questão da subjetividade. Pretendemos discutir de que
forma a ausência de valorização desta questão interfere no alcance dos
objetivos previamente traçados pelas Organizações.
Serão apresentados conceitos de objetividade e subjetividade para as
ciências e a relação estabelecida entre o sujeito-cognoscente e o objeto
conhecido. Haverá a explanação da maneira pela qual a questão da emoção
participa do processo decisório, derrubando velhos mitos que defendiam que
decisões sábias somente poderiam ser tomadas com a cabeça fria, ou seja,
sem a interferência das emoções.
O tema emoção continuará a ser discutido de uma forma diferente, sendo
apresentadas informações sobre o propósito de sua existência e a confirmação
que este repertório de respostas emocionais possui uma base inata a partir dos
reflexos. A forma como se desenvolvem as emoções secundárias ao
estabelecermos contato com outros da mesma espécie por intermédio da
socialização primária (família).
Em seguida, a capacitação profissional será abordada desde a visão
mecanicista sem se levar em consideração a dimensão subjetiva cuja sede é o
interior, primado das emoções. Abordagens mais recentes poderão contribuir
significativamente para a inclusão desta dimensão.
Por fim, faremos uma breve conclusão apontando para os aspectos
principais avaliados ao longo deste trabalho.
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METODOLOGIA
Este trabalho acadêmico parte da hipótese de que o modus operandi
com que as corporações se propõem a utilizar as tecnologias educacionais, os
recursos de apoio, embasamento teórico para a solução de problemas de
desenvolvimento profissional têm oferecido resultado inexpressivo por não
incluir um aspecto de vital importância em suas práticas, que é a dimensão
subjetiva em seus projetos.
A hipótese levantada é de que ao incluir em Programas Educacionais a
dimensão subjetiva, a probabilidade de a empresa realmente alcançar
comprometimento dos colaboradores com intuito de maximizar a produtividade
será atingida de maneira mais eficaz e duradoura.
A formulação desta hipótese partiu de observações realizadas ao longo
de minha experiência profissional que corroboraram o conhecimento intuitivo já
existente antes da pesquisa, além de ter sido motivada por entender que a
empresa possui um importante papel na sociedade e um forte compromisso de
ajudar a promover melhoria contínua na vida das pessoas que a compõem.
Após uma primeira análise do levantamento bibliográfico, pôde-se
perceber que o tema escolhido é bastante atual e tem sido discutido há algum
tempo por diversos autores e em campos distintos das ciências.
Inicialmente, foi realizada a busca de um livro que serviu como base para
a escolha do tema para, partindo de uma leitura prévia, ser definido o assunto
específico. Em seguida, realizou-se o levantamento bibliográfico na biblioteca
da Universidade Cândido Mendes. Foi utilizada a Internet também como fonte
de leitura e pesquisa de figuras ilustrativas.
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SUMÁRIO
INTRODUÇÃO_________________________________________________8
CAPÍTULO 1__________________________________________________10
Objetividade e Subjetividade nas Ciências_________________________10
CAPÍTULO 2 __________________________________________________12
Bases Neurobiológicas na Tomada de Decisões____________________12
CAPÍTULO 3___________________________________________________17
A Importância das Emoções_____________________________________17
CAPÍTULO 4___________________________________________________25
Capacitação Profissional________________________________________ 25
CONCLUSÃO__________________________________________________37
BIBLIOGRAFIA CONSULTADA___________________________________39
8
INTRODUÇÃO
O presente trabalho tem como objetivo proporcionar uma reflexão crítica
acerca da forma como é tratada a Capacitação Profissional dentro das
Organizações, comumente sofrendo um enfoque objetivo no qual são
considerados como relevantes apenas Conteúdo Programático, Planejamento,
Cronograma, Metodologia utilizada, Recursos Audiovisuais e público a que se
destina.
Sabe-se que uma Organização somente funciona a contento quando
consegue perceber que todo o aparato tecnológico não responde por si só às
demandas do mercado haja vista o fato de que o homem construiu e constrói a
civilização e tudo que ela contém com o objetivo de satisfazer as suas
necessidades. O homem faz pelo e para o homem porque quer criar
necessidades, gerar novas formas de relacionamento, satisfazer desejos e
concretizar sonhos. Assim sendo, devemos lembrar que a dimensão subjetiva
está presente em todos os momentos da vida.
No primeiro capítulo, trataremos de definir o conceito de conhecimento
dentro da perspectiva da epistemologia, estabelecendo a relação entre o sujeito
cognoscente e o objeto a ser conhecido. Em seguida, discutiremos como as
questões da objetividade e subjetividade são tratadas no âmbito empresarial.
Será apresentado um breve histórico da área de Administração de
Recursos Humanos, informando de quando data seu início segundo relatos de
pesquisadores e que correntes de pensamentos, tais como a Psicologia
Industrial e as Teorias das Organizações, influenciaram o desenvolvimento da
ARH enquanto teoria e prática profissional. Também serão relatadas as
transformações sofridas por esta área a partir das mudanças ocorridas no
contexto sócio-político-econômico.
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Mostraremos ao longo do texto como o dualismo cartesiano mente-corpo
que norteia todas as ações e diretrizes no campo da Capacitação Profissional
deve ser repensado, pois descobertas mais recentes no campo da
neurobiologia vêm possibilitando a criação de um novo cenário que estimula
gerar novos paradigmas para as Ciências Humanas e Sociais.
Neste capítulo será relatado o caso de paciente lesionado no cérebro por
uma barra de ferro que se manteve vivo e as mudanças comportamentais
provenientes desse acidente, trazendo uma visão inovadora da relação entre
razão e emoção como uma percepção direta de estados corporais e formando
um elo entre corpo e consciência.
No capítulo três, explanaremos sobre o conceito de emoção e sua
finalidade de manter a sobrevivência da espécie e a defesa da vida.
Examinaremos aquelas que são inatas e as que são aprendidas através de
socialização.
Ao longo do capítulo quatro, discorreremos sobre as novas tendências
para a capacitação profissional, incluindo a discussão sobre a proposta da
Educação Continuada e desafios concernentes a elas.
Serão discutidas as contribuições que a psicanálise pode fornecer aos
profissionais
de
educação
corporativa
a
partir
do
conhecimento
do
funcionamento do inconsciente e das motivações que são subjacente a toda
conduta humana.
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Capítulo 1
Objetividade x Subjetividade Nas Ciências
A compreensão dos mecanismos que criam o conhecimento humano e o
papel deste na vida sempre ocuparam uma posição de destaque na história do
homem. Há muito filósofos, pensadores e cientistas vêm mobilizando sua
energia para identificar estes processos.
O estudo da mente humana mostrou-se como ponto de partida para
alcançar o entendimento do processo de aquisição de conhecimento. Diversas
concepções foram formuladas, oferecendo uma variedade de respostas sobre a
natureza e a origem do conhecimento.
A etimologia de a palavra conhecer tem origem no termo latino
cognoscere e significa “ter noção, conhecimento, informação, de; saber”
(p.454). Segundo o Dicionário Aurélio, o vocábulo conhecimento apresenta um
conceito filosófico assim esclarecido: “... atributo geral que têm os seres vivos
de reagir ativamente ao meio circundante, na medida de sua organização
biológica e no sentido de sua sobrevivência”. Partindo
desta
definição,
podemos inferir que os seres vivos em geral possuem esta capacidade com a
finalidade de manterem sua vida.
Cada ciência tem o seu objeto de estudo a ser investigado circunscrito
pelas especificidades do fenômeno a que se intenta conhecer. O objeto de
estudo é o assunto, a matéria a ser estudada. Assim, por exemplo, a Biologia
tem como objeto de estudo, os seres vivos e as leis da vida. Já a Psicologia
analisa os fenômenos psíquicos e o comportamento.
É relevante perceber que a investigação parte de uma relação
estabelecida previamente entre o sujeito-cognoscente, e o objeto conhecido.
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Conforme registra Teles em seu livro Introdução à Filosofia, “O sujeito
cognoscente é sujeito apenas enquanto há um objeto que apreender e viceversa, o objeto é objeto de conhecimento apenas enquanto é apreendido pelo
sujeito”.
Esta apreensão se verifica mediante uma construção que o sujeito elabora
a partir dos elementos sensíveis determinados pelo objeto. O conhecimento
resulta primeiramente da atividade do “Eu” sobre elementos mecânicos que o
atingem.
Em
segundo
lugar,
é
uma
elaboração
posterior
sobre
os
remanescentes do conhecimento sensível, tais como: imagens, lembranças,
recordações, idéias, etc. Neste caso, a atividade do sujeito que conhece
principia com o ato de receptividade dos dados sensíveis causados pelos
objetos.
As ciências sempre primaram pela preservação da objetividade dos
fenômenos a serem investigados por parte dos cientistas. O ideal de cientista
bem-sucedido é um sujeito empedernido cujo olhar é isento de envolvimento
emocional sobre seu objeto de estudo, mantendo uma postura de neutralidade.
Contudo, tal olhar nunca é neutro, pois este sujeito que olha é constituído de
uma história própria submetida a uma determinada herança cultural vivendo um
momento político único.
Em se tratando de áreas sociais e humanas é possível identificar de forma
mais clara a presença desta subjetividade. Ainda assim vive-se constantemente
a buscar uma condição objetiva no ambiente empresarial atrelada que estão a
correntes
de
pensamentos
baseadas
nas
concepções
tayloristas
de
administração. Frases tal como - ao entrar na empresa, deixe seus problemas
pessoais do lado de fora - encerram uma atitude considerada positiva pela
organização, porém irreal para a maior parte das pessoas.
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Capítulo 2
Bases Neurobiológicas da Tomada de Decisões
Segundo estudos recentes no campo da neurobiologia que é a ciência
que estuda as estruturas neurais e seu relacionamento com a regulação do
organismo para a sobrevivência, o processo de tomada de decisão/razão está
intimamente ligado aos processos emocionais. Isto significa dizer que os
sistemas cerebrais que regulam um processo se encontram enredados aos
mecanismos do outro e que ambos se interligam com a regulação do corpo.
Esta hipótese tem como um dos principais defensores António Damásio,
cientista responsável pelo centro de estudos neurológicos dos Estados Unidos
que vem desenvolvendo pesquisas a cerca da interdependência entre razão e
emoção.
Tais pesquisas não são conclusivas, mas apontam para a possibilidade
de haver uma verdadeira revolução no pensamento ocidental que privilegia o
dualismo cartesiano. Este último defende a separação entre os mecanismos
mentais e corpóreos, ou ainda, o existir humano depende unicamente do
pensamento e da consciência do pensamento (“Cogito ergo sum”).
As investigações realizadas sobre este assunto foram conduzidas ao
longo de vinte anos de estudos com diversas pessoas que sofriam de distúrbios
neurológicos.
Em seu livro O Erro de Descartes, Damásio relata o caso de um
paciente que sofreu uma lesão cerebral a partir de um acidente com uma barra
de ferro que atravessou a base do crânio, atingindo a parte anterior do cérebro
e saindo pelo topo da cabeça e as conseqüências originadas por este acidente.
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Foram observadas alterações comportamentais significativas, sugerindo
uma mudança na estrutura da personalidade caracterizada por um acentuado
prejuízo em sua conduta social e pessoal, gerando comportamentos tais como
ausência do senso de responsabilidade em relação a si e aos outros,
incapacidade de prever o futuro e planejá-lo dentro de um contexto social de
certa complexidade e incapacidade de organizar de maneira independente sua
própria vida.
O processo de tomada de decisões que sabemos fazer parte do
raciocínio lógico fora prejudicado consideravelmente, pois havia evidências que
suas
escolhas
eram
inadequadamente
feitas,
apresentando-se
como
desvantajosas, diferentemente da forma como fazia antes do acidente, embora
fossem percebidos indícios de que tanto o aspecto intelectual quanto a
linguagem tivessem sido preservados.
Logo, pôde-se supor pelo quadro apresentado que seu sistema de
valores devia ter sido afetado através do acidente, ou então, embora intacto em
parte, mostrava-se ineficaz para utilização em circunstâncias da realidade.
Foi constatado através de outras pesquisas que, em doentes com lesões
cerebrais cuja capacidade de raciocínio e tomada de decisões sugeria
comprometimento, determinados processos neuropsicológicos dependiam da
inviolabilidade dos sistemas cerebrais responsáveis pelos processos racionais
para funcionar.
Quando as lesões atingem regiões onde se localizam os córtices préfrontais ventromedianos e a amígdala notam-se dificuldades em solucionar
problemas e em lidar com emoções e sentimentos nos pacientes.
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Também no hemisfério direito, há os córtices somatossensoriais que
respondem
pelas
mesmas
dificuldades
mencionadas
anteriormente,
comprometendo os processos de sinalização básica do corpo.
Por último, foram encontradas regiões nos córtices pré-frontais que
envolvem o raciocínio e tomada de decisões num padrão diferente, ora
atingindo operações intelectuais em todas as esferas inclusive na pessoal e
social ora especificamente ligadas à objetos, números, palavras e espaço sem
danificarem os aspectos social e pessoal.
Assim, a partir destas explicações, as suposições que ocorrem são que a
razão, a emoção e os mecanismos de regulação do organismo se encontram
nas mesmas regiões, não se apresentando em ponto específico do cérebro,
mas em diversas localizações com um certo grau de interdependência.
Embasados nestes experimentos, verificou-se que a razão pura, isenta
de componentes emocionais, defendida por teóricos racionalistas parece
improvável de ocorrer em pessoas “normais”, ou seja, aquelas cujos
mecanismos cerebrais estão livres de lesões. Ao contrário, parece haver uma
estreita relação entre a conduta de lesionados pré-frontais com o ideal de
tomada de decisões sugeridas pelos racionalistas.
A razão pura utiliza-se de uma quantidade enorme de avaliações em
termos de vantagens/desvantagens de situações que se apresentam no
cotidiano que requerem a necessidade de se elaborar um rol pormenorizado
das mesmas.
Pode-se citar, como exemplo, a análise de um parceiro para se montar
um negócio.
O indivíduo deverá recorrer a uma série de conhecimentos
anteriores sobre o caráter do sócio, pesquisa sobre a viabilidade ou não do
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negócio, especulação sobre o tempo necessário para se obter vantagens
pecuniárias, etc.
Para tal análise, é necessário que o cérebro se debruce sobre as
experiências passadas, crie imagens mentais a respeito das opções de
respostas e dos resultados correspondentes. Todo este cenário descrito é
constituído por variadas cenas imaginárias que não seguem um fluxo contínuo,
mas que se justapõem de forma rápida uma às outras.
O que deve ser compreendido aqui é que a memória é utilizada para
formação destas imagens, auxiliando para que o processo de tomada de
decisão tenha uma base. Contudo, não podemos nos esquecer que esta
capacidade é limitada, e que determinadas decisões necessitam de uma
rapidez que nem a memória nem o raciocínio lógico conseguem dar conta.
Assim sendo, António Damásio levanta uma hipótese de que existe um
mecanismo que auxilia a evitar desperdício de tempo para aquelas decisões
que precisam ser tomadas em frações de segundos. Sugere que sempre que
há um mau resultado advindo de uma decisão equivocada, por mais fugaz que
seja, o corpo produz uma sensação visceral desagradável. Por ocorrer no
corpo, denominou este fenômeno como estado somático e porque ele marca
uma “imagem” que fica associada ao evento, resolveu chamar-lhe de marcador
somático.
Este mecanismo consiste em reduzir a um número bem pequeno, as
alternativas dentro de um panorama muito amplo, facilmente evocado pelo
cérebro, quando da necessidade de escolha. Sua função básica é servir como
um sinal de alerta para opções que possam ter um resultado negativo,
eliminando-as rapidamente da parte da mente responsável por tecer
considerações mais profundas, justamente utilizando o corpo como indicador.
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Este poderoso mecanismo apresenta-se como um meio de aumentar a
precisão e a eficiência do processo de decisão, sendo que sua ausência as
reduz. Logo, é “... um caso especial do uso de sentimentos gerados a partir de
emoções secundárias”.
Concluindo segundo o cientista, é chegada a hora de reconhecer que o
espírito habita um organismo vivo em que o cérebro e o corpo vivem
intimamente integrados. O neurologista inverte a máxima de Descartes: "existo
(e sinto), logo penso".
Desenho reproduzido para demonstrar áreas importantes do cérebro.
Figura 3b: Diagrama da metade esquerda do cérebro, com a área de
movimento (vermelho) e as áreas sensitivas (azul).Fonte: Cunningham: Manual
de Anatomia Prática ,São Paulo. Atheneu. 1976
17
Capítulo 3
A Importância das Emoções
Como foi visto no Capítulo precedente, o homem não é um ser dotado de
razão pura. Partindo desta premissa, devemos procurar compreender mais
adequadamente a dimensão emocional que está presente em todos os atos
humanos, inclusive no ambiente profissional.
Sabe-se hoje que todo o universo teve a mesma origem, a famosa
explosão chamada Big Bang. Esta origem é a energia condensada, constituída
de estruturas moleculares com as mesmas propriedades. Os elementos
químicos existentes na natureza participam da constituição de todos os seres
vivos e o que provoca a diferença entre as espécies é o grau de complexidade
das estruturas moleculares. O homem também participa desta condição, pois
todos nós temos consciência da nossa dependência da natureza.
A emoção pode ser definida como reações fisiológicas e psicológicas que
influem na percepção, aprendizagem e desempenho segundo Edward Murray
(p.80). O conceito de emoção é muito variado entre os estudiosos, sendo que
alguns a diferenciam do sentimento e outras a percebem como um mesmo
estado. Supomos haver sutis diferenças entre estes estados, sendo a emoção
caracterizada por um estado efêmero e o sentimento possui uma maior
estabilidade em termos de duração.
Em seu início de vida, o ser humano assemelha-se aos animais por
conta de um repertório de comportamentos reflexos que têm a função de
adaptabilidade ao meio ambiente fruto de herança de nossos antepassados ao
longo do processo evolutivo. As emoções básicas do humano estão presentes
nos animais e têm como finalidade a manutenção da sobrevivência e a defesa
da vida.
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Já os humanos são capazes de fazer a passagem da emoção puramente
reflexa (resposta imediata a um estímulo) para um outro estado reflexivo no
contato com outros humanos. Este fenômeno ocorre quando da inserção da
linguagem que faz parte da ordem do simbólico e que permite ao homem
representar as coisas ao seu redor, sonhar, imaginar, fantasiar.
3.1- Emoções Primárias e Emoções Secundárias
Já se sabe que tanto os animais quanto os seres humanos reagem a
estímulos ambientais com o intuito de preservação e que estas reações cuja
base é neurofisiológica são as emoções. Sabe-se também que nem todas as
emoções que o homem vivencia é experimentado pelos animais.
As emoções podem ser classificadas em: primárias e secundárias. As
primárias
correspondem
às
reações
espontâneas
que
parecem
pré-
programadas, já alojadas em alguma parte do cérebro que, diante de um
estímulo com determinadas características ameaçadoras, são disparadas.
O sistema límbico é um dos responsáveis por desencadear as reações
emocionais em conjunto com a região interna do cérebro chamado de
paleocórtex e considerado em termos evolucionário um cérebro arcaico.
Este sistema possui um órgão denominado amígdala que processa e
detecta as características externas ameaçadoras e através do seu sistema
neuronal responde a estas informações produzindo no corpo a emoção de
medo, alterando o processamento cognitivo de forma que haja uma
correspondência entre o estado e a reação padronizada.
A ira é um outro exemplo de emoção primária que funciona como
evitação da dor ou forma de alcançar um objetivo impedido por fatores
19
externos, principalmente em se tratando de animais. No humano, segundo
Sigmund Freud a energia agressiva é uma resposta do organismo à frustração,
podendo se manifestar de forma destrutiva ou não.
O processo de desencadeamento das emoções primárias compõe um
processo básico e servem como apoio para o desenvolvimento das emoções
secundárias que utiliza mecanismos de maior complexidade envolvendo tanto o
sistema límbico, mas também os córtices pré-frontais e somatossensoriais.
Abaixo, a representação gráfica do processo de emoções primárias:
1.a. O perímetro negro representa o cérebro e o tronco cerebral. Depois de um
estímulo ter ativado a amígdala (A), seguem-se várias respostas: internas (assinaladas
RI); musculares; viscerais (sinais autônomos); e para os núcleos neurotransmissores e
hipotálamo (H). Não incluo no diagrama diversas outras estruturas cerebrais
necessárias à implementação dessa enorme série de respostas. Por exemplo, as
respostas musculares por meio das quais exprimimos emoções, digamos, com a
postura do corpo, utilizam provavelmente estruturas nos gânglios basais (a saber, o
chamado striatum ventral). Extraído do livro O Erro de Descartes (Damásio,p.162)
20
A natureza das emoções secundárias está relacionada ao processo de
maturação. Em outras palavras, não nascem com o indivíduo, porém são
aprendidas ao se estabelecer o contato com outras pessoas.
É nas relações sociais que se desenvolvem, por isso partem sempre de
experiências vividas anteriormente que formaram imagens mentais, provocando
mudanças no estado do corpo, envolvendo sistemas viscerais, musculaturas
esqueléticas e glândulas endócrinas (pituitária e supra-renais). Também o
sistema imunológico sofre influências em seu funcionamento e todo o quadro
afeta a homeostase.
O conjunto de emoções experimentado pelo adulto se origina da
combinação
de
elementos
como
intensidade,
agradabilidade/desagradabilidade e aproximação/evitação. Isto significa
dizer que estas dimensões combinadas de todas as formas possíveis
desencadeiam as diferentes emoções que sentimos, porém a partir de oito
emoções consideradas básicas, a saber: ira, alegria, surpresa, pesar, repulsa,
medo, pressentimento e consentimento.
Parafraseando Damásio, “... emoção é a combinação de um processo
avaliatório mental, simples ou complexo, com respostas dispositivas a esse
processo, em sua maioria dirigida ao corpo propriamente dito, resultando num
estado emocional do corpo, mas também dirigidas ao próprio cérebro (núcleos
neurotransmissores no tronco cerebral), resultando em alterações mentais
adicionais”. (p.168/169).
3.2 Resultados do Efeito da Emoção sobre a Conduta Humana
Há controvérsias sobre os efeitos da emoção. Alguns teóricos defendem
a idéia de que as emoções provocam um efeito negativo sobre o
21
comportamento, desorganizando-o, gerando desempenho inadequado para a
realização de algumas tarefas. A ansiedade, por exemplo, comum de se
observar em pessoas que vão se submeter a algum tipo de avaliação, testagem
pode provocar um fracasso no resultado desta.
Alguns experimentos foram desenvolvidos em dois grupos de crianças:
algumas que se mostravam mais propensas à sentirem ansiedade em dias de
prova e outras que se mostravam mais tranqüilas. Embora o nível intelectual
dos dois grupos fosse equivalente, o primeiro tendeu a ter resultados mais
baixos e o segundo resultados mais satisfatórios.
A despeito destes experimentos, alguns teóricos contrapõem-se a esta
idéia,
considerando
que
“...
as
emoções
organizam
e
dirigem
o
comportamento...” (p.103). Robert Leeper apresenta um exemplo que confirma
esta hipótese. Cita que, ao regressar de viagem, uma família descobre que
existe um piromaníaco que já fez vários estragos em outras casas da
comunidade tem rondado a vizinhança.
Esta informação cria ansiedade em um primeiro momento em todos os
membros da família, mas a partir daí, inicia-se um sistema de ações que
objetivam evitar tal tragédia em sua própria casa. Primeiro percebem o perigo
iminente, provocando uma reação de defesa através da aquisição de um
sistema de alarmes. Depois, passam a verificar se as portas e janelas estão
bem trancadas. Este exemplo nos mostra como as emoções podem promover
atitudes favoráveis neste caso a segurança familiar, corroborando a hipótese de
que servem a um propósito de organização.
Supomos que, as emoções funcionam para organizar o comportamento,
e não para desorganizá-lo, pois o organismo procura sempre manter o estado
22
de homeostase com vistas à continuidade da sobrevivência de acordo com os
biologistas.
3.3 Formação do Eu: O Amor Como Fonte Propulsora
Anteriormente foi feita a distinção entre a emoção e sentimento. Em toda
a história da humanidade, podemos perceber a importância do sentimento
denominada amor, em especial para aqueles afeitos às leituras clássicas que
propagam o amor como um dos mais nobres sentimentos. Também
encontramos experiências no campo da Psicologia que confirmam a
importância do amor como condição sine qua non para a continuidade da vida.
Alguns estudos revelam que a sobrevivência de um bebê não depende
apenas de cuidados especiais no que tange à alimentação, higiene, segurança
etc. A formação psíquica depende do estabelecimento de relações afetivas com
a progenitora.
Aliás, a formação adequada do eu está diretamente baseada na
solidificação das relações afetivas com a mãe. O amor impulsiona à
constituição da personalidade.
Esta é uma das maiores diferenças entre o homem e os animais. Como
disse Milton de Oliveira, “A primeira diferença entre o homem e os animais se
estabelece nessa relação primária: a emoção orgânica dá origens às relações
de afeto e transforma-se no amor”.
Mas, o leitor poderia perguntar: O que isso tem a ver com a Capacitação
Profissional? A resposta fornecida é: tudo. Não devemos nos esquecer que esta
dimensão emocional nos acompanha durante toda nossa jornada na terra,
portanto deve ser respeitada por qualquer área do saber.
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3.4 – Emoções: Fraquezas da Alma
O ideal iluminista da razão pura atende à manutenção e perpetuação do
status quo. Sabe-se que a cultura ocidental valoriza em termos profissionais, as
atividades tecnológicas ligadas às ciências exatas que produzem formas muito
eficientes de auxiliar as empresas a obterem cada vez mais lucro.
No Brasil, a oferta de empregos nestas áreas é bem mais profícua do
que em profissões das áreas humanas. A remuneração e benefícios também
são muito mais atraentes. As indústrias se modernizam adquirindo maquinário
sofisticado que substitui a força humana, produzindo em alta escala e
dificultando o acesso da grande maioria desqualificada ao mercado de trabalho.
Se retornarmos ao passado, encontraremos indícios da desvalorização
das emoções há muito sedimentada e transmitida de geração a geração.
Verificamos em um extenso número de publicações que vão desde a Bíblia até
os livros de administração, a propagação desta linha de pensamento.
De acordo com as concepções religiosas, as emoções são fraquezas da
alma, perturbações mentais, pois se o homem foi criado à imagem e
semelhança de Deus, que é a perfeição, como poderia tal criatura perfeita
carregar atributos tão inferiores?
Sendo assim, o homem superior não poderia ser dominado pelas
paixões, até por serem da ordem corpórea, portanto inferior. A idealização
completa do homem é ter o absoluto controle das emoções, atingindo o máximo
de maturidade. As reações espontâneas são substituídas pelas artificiais.
No campo da administração, a Teoria X surge como um modelo que
preconiza a continuidade desta idéia de forma bastante evidente, considerando
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que o homem somente produz se as variáveis de controle estiverem atuantes.
O ambiente de trabalho necessário para tal controle é aquele da submissão a
uma rígida hierarquia. A figura do chefe é daquele que tem o poder centralizado
em suas mãos, tendo como principal atribuição dar as ordens e checar se as
mesmas são realizadas dentro de regras pré-estabelecidas independentemente
de consulta ao indivíduo ou grupo responsável pelo cumprimento das mesmas.
O “subordinado” é visto como uma peça que faz mover a máquina
administrativa e não são levadas em conta as condições para produção, a
motivação para desenvolver certas atividades, as aptidões e habilidades. A
ideologia desta teoria é que o homem não aprecia o trabalho e que, só o faz
mediante uma gestão “mão-de-ferro”. Neste ambiente repressor interessa
apenas aos administradores atingir os objetivos máximos de produtividade,
relegando a segundo plano o fator humano.
A partir de Freud com a descoberta das moções inconscientes, não mais
se pode negar a impossibilidade de os sujeitos humanos manterem o controle
total de suas ações. Grande parte dos acontecimentos é determinada por
motivações que se situam em um lugar que está além de nossa compreensão.
O homem é marcado por ser desejante, logo por ser faltoso. Nossas
escolhas afetivas, profissionais, em qualquer campo da vida constituem uma
eterna busca da completude. Segundo Freud, o processo de humanização do
homem só ocorre devido a esta condição.
A fundação da cultura caracteriza-se pelo fato de o homem em sendo
desejante, buscar gratificações que são impedidas de serem realizadas por esta
mesma cultura. Em outras palavras, o homem precisa recalcar sua libido,
sublimando-a para poder se relacionar socialmente e construir tudo o que a
civilização contém.
25
Capítulo 4
CAPACITAÇÃO PROFISSIONAL
Quando se fala em Capacitação Profissional, geralmente a imagem que
formamos é a de uma sala-de-aula repleta de pessoas, uma série de recursos
visuais e audiovisuais e uma figura central que encarna a função de transmitir
informações sobre o assunto em pauta.
Ainda hoje é de se notar que a Educação nas Empresas reproduz o
modelo
tradicional
que
é
utilizado
durante
o
período
de
formação
escolar/acadêmica, embora alguns profissionais da Educação já adotem novas
metodologias mais sofisticadas dentro das Organizações. Contudo, esta não é
a realidade da maior parte das Empresas, principalmente as nacionais já que
treinar pessoas demanda investimento financeiro, sendo visto como um custo
adicional e desnecessário.
A Era da Informação traz consigo a necessidade de atualização
constante de todos, por esta razão existem tantos teóricos das mais variadas
áreas do saber, preocupados em criar estratégias para colaborarem com a
aprendizagem na empresa. Assim, nascem iniciativas tais como as “learning
organizations” de Peter Drucker, considerado o guru atual da administração de
empresas.
A rapidez com que acontecem as mudanças provoca como reação em
cadeia uma forte necessidade de estar informado e é por este motivo que o
espaço empresarial deve transformar-se em um espaço de aprendizagem
contínua. Existem inúmeros motivos que podemos citar para que tal fato ocorra;
um dos mais importantes é que quando se aprende dentro das organizações, a
possibilidade de reunir a teoria e a prática em ações mais eficazes torna-se
bastante
clara,
pois
devemos
considerá-las
como
metades
que
se
26
complementam. Uma outra razão para a empresa se tornar um espaço contínuo
de aprendizagem refere-se à produtividade, pois como proclama Idalberto
Chiavenato “... para que sejam produtivos, os empregados devem sentir que o
trabalho é adequado às suas capacidades...”
Sabe-se, porém, que por maior investimento realizado ao longo de sua
carreira que o profissional tenha realizado, sempre existem aspectos a serem
desenvolvidos. Em alguns casos, o empregado possui alto nível de
especialização, de qualidade técnica, mas faltam-lhe recursos para relacionarse com as pessoas. Neste exemplo, deverão ser desenvolvidas novas atitudes
perante o grupo, incentivando o colaborador ao trabalho em equipe,
conscientizando-o de que as novas demandas de mercado já não mais
admitem o trabalho isolado e individual.
Na Educação Continuada, a proposta é ampliar o universo da
aprendizagem com o propósito de abarcar a totalidade da organização sendo
esta vista como “... um sistema que convive com outros sistemas numa rede de
conexões”.
Eis aí mais um motivo para considerar fundamental tornar a
organização uma entidade que aprende.
Todo o processo de ensino/aprendizagem em uma empresa deve atingir
a globalidade do fenômeno humano, abandonando modelos mecanicistas e
reducionistas voltados para um único foco. Por esta razão, a educação
empresarial deverá atingir quatro aspectos, a saber: o comportamento, a
cognição, a afetividade e as atitudes. Assim, capacitar é a palavra de ordem.
Capacitar
significa
tornar
competente,
ou
seja,
desenvolver
as
habilidades, atitudes e comportamentos adequados a um desempenho eficaz
no ambiente de trabalho. É importante esclarecer que o termo capacitação está
sendo utilizado com igual sentido à palavra treinamento e educação, pois
27
aquela apresenta conotação pejorativa segundo alguns autores que a associam
ao significado de adestramento, comumente usado para animais.
De acordo com Idalberto Chiavenato, o treinamento (capacitação) pode
ser entendido como “um processo educacional de curto prazo aplicado de
maneira sistemática e organizada, através do qual as pessoas aprendem
conhecimentos, atitudes e habilidades em função de objetivos definidos”
(p.294).
Pode-se verificar que este processo tem em vista a otimização do
potencial humano na busca da excelência por resultados, ou seja, a
maximização da produtividade deve ser alcançada através das práticas
implantadas pelo órgão de Recursos Humanos. Contudo, deve-se notar que a
responsabilidade pelo desenvolvimento educacional dos profissionais é de toda
a organização em especial a alta administração deve se envolver e apoiar, pois,
do contrário, atingir os resultados esperados se tornará impossível.
Em algumas corporações, educar é um elemento utilizado na gestão de
negócios, favorecendo a possibilidade de aumento de lucro. Esta nova
mentalidade é adotada por empresas cuja visão é de vanguarda, pois elas
sabem que a competição acirrada para conquistar novos mercados traz como
conseqüência uma nova ordem que é a da qualidade de produtos e serviços
oferecidos e isto só é conseguido com profissionais qualificados, felizes e
satisfeitos.
Em seu livro Gestão de Pessoas, Idalberto Chiavenato determina alguns
aspectos fundamentais da moderna gestão de pessoas. Acentua ele:
“As pessoas como seres humanos: dotados de personalidades próprias,
profundamente diferentes entre si, com uma história particular e diferenciada,
possuem doses de conhecimentos, destrezas e capacidade indispensáveis à
28
adequada gestão dos recursos organizacionais. Pessoas como pessoas e não
como meros recursos da organização”.
É fundamental ressaltar que são as pessoas que dinamizam a empresa,
utilizando-se de sua energia para transformá-la através de sua capacidade
criativa e inteligente que busca soluções para as mais expressivas dificuldades
enfrentadas no cenário atual de alto grau de competitividade.
Vale lembrar a idéia defendida pela Teoria Hedonista de que o homem
busca o prazer e evita o sofrimento. Esta formulação pode ser estendida para
todas
as
realizações
humanas
incluindo
o
ambiente
organizacional,
principalmente se pensarmos que grande parte do nosso cotidiano está voltada
para as atividades laborais com pessoas que não integram nosso núcleo mais
íntimo, a família. Logo, este ambiente deve proporcionar felicidade e
possibilidade de realização dos projetos.
Embora, o trabalho seja uma fonte importante de identidade pessoal, os
seres humanos são muito mais do que simples seres produtivos. As demais
dimensões da vida podem facilitar ou dificultar a excelência de resultados. A
visão sistêmica de empresa também tem que ser adotada para o homem,
considerando-o em sua totalidade existencial. Afinal, o homem é um ser
‘’biopsicossocial‘’.
Baseados nesta visão globalizante, o indivíduo em si é um sistema
propriamente dito; um microcosmo dentro de um macrocosmo. Saímos do
nosso ambiente natural onde era necessário usar a força física para dominar as
intempéries da natureza em direção à construção da civilização onde é
necessário usar a energia da libido canalizando-a para os aspectos cognitivos,
emocionais e comportamentais.
29
4.1. Sociedade do Ter e Implicações na Educação Corporativa
Desde os primórdios da história humana, como forma de defender-se de
ameaças advindas do exterior, o homem uniu-se a outros da mesma espécie
criando sua tribo para caçarem o alimento, protegerem a sua família, lutarem
contra animais selvagens em conjunto.
O sentido de cooperação e a noção de trabalho em equipe nascem
dessas
experiências
como
conseqüência
natural
da
necessidade
de
sobrevivência, fundando-se também aquilo que denominamos de cultura. A
criação de lanças para abater animais gigantescos reflete o início das
atividades laborais e de sua organização.
Com o passar do tempo e o aumento dos grupamentos humanos, houve
a necessidade de identificar no seio destes, um indivíduo que fosse o
responsável por vigiar as normas e regras que regulavam o funcionamento das
tribos. Surgem os primeiros líderes.
Assim, à medida do crescimento populacional, outras ferramentas mais
potentes para garantir a subsistência foram sendo inventadas originando a
divisão do trabalho. Desta forma, as sociedades foram se sofisticando e por
conseqüência foram desenvolvendo novos hábitos de consumo e fundando
outras espécies de relacionamento interpessoal baseadas nos escambos.
Em um outro período, os escambos foram substituídos pelo papel-moeda
que passou a representar uma nova ordem estabelecida. Inaugurou-se a Era da
Industrialização e o advento do capital tornou-se uma conquista a ser realizada
custasse o que custasse. Eis o marco inicial da constituição das sociedades
modernas voltadas para o consumo exacerbado de produtos e serviços.
30
A base das sociedades atuais com raras exceções tem como pilar de sua
existência o modo TER de viver. Nas sociedades capitalistas a questão dos
altos ganhos perpassa por questões relativas à ética e à moral. As pessoas são
valorizadas a partir de uma análise das aquisições materiais, das propriedades
privadas e dos bens.
Pessoas muito ricas se dão ao luxo de comprar ilhas e praias, tornandoas propriedade particular, impedindo aqueles que não participam do seu meio
social de usufruir as belezas naturais e punindo quem ouse ingressar nestas
paragens.
Acostumamo-nos a olhar como espectadores para o mundo a nossa
volta, considerando perfeitamente natural as desigualdades sócio-econômicas e
os tratamentos opressores e sub-humanos com que as elites e os donos do
poder habitualmente lidam com classes menos favorecidas.
No âmbito das organizações parece que as normas e regulamentos de
relacionamento remetem à questão do poder cujo significado da palavra é a de
possuir. Sendo assim, as rígidas hierarquias e centralização do poder de
decisão nas mãos da minoria reproduzem fielmente as condições em que vive
grande parte da população diante do Poder Público.
Parafraseando Bárbara Towley em seu texto “Conhecimento e Poder nas
Organizações”, a área de Recursos Humanos apresenta “... uma preocupação
com a manutenção do sistema, característica da perspectiva funcionalista. Ao
refletir sobre preocupações como a eficiência, remanescente da teoria clássica
de administração, a ARH não passa de um mecanismo por meio do qual a
realização dos objetivos e a sobrevivência de organizações podem ser
promovidas...” (Davel e Vergara, p.118).
31
Os colaboradores são então percebidos como objetos que servem ao
propósito de satisfazer ao prazer desta minoria. Por esta razão, quanto menos
pensar, mais facilmente se conduz os grupos a agirem em favor deste prazer
sem que percebam com clareza o jugo sob o qual estão.
Manter o estado de consciência ingênua nos empregados é uma das
principais missões latentes do setor de Treinamento e Desenvolvimento que
deve atender prioritariamente às necessidades corporativas em que muitas das
vezes poderá ser conflitante com a dos personagens principais.
Através da promoção de diversas atividades “educativas”, por exemplo, é
possível fazer uma triagem das informações que devem chegar às várias
equipes. Em empresas cujos índices de profissionais não-alfabetizados ou
semi-alfabetizados é significativo, trazendo prejuízos à consecução dos
objetivos corporativos, costuma-se criar salas e contratar professores para
orientarem destes trabalhadores.
Aparentemente é uma iniciativa que deveria ser aplaudida se não fosse o
fato de que o objetivo magno de contribuição social fica relegado a um segundo
plano em favor da possibilidade de manter por mais horas estes trabalhadores
como reféns de sua própria ignorância. Deduz-se que a educação na empresa
poderá atender a determinados propósitos que fogem a sua função máxima que
é desenvolver a consciência crítica.
É importante ressaltar que a observação acima mencionada não diz
respeito a todas as empresas, mas reflete a realidade de um número bastante
significativo. Ainda na escola, principalmente no Brasil, massifica-se os
conteúdos programáticos sem que haja uma averiguação da real necessidade
de transmissão das informações e desconsiderando as características
peculiares tais como aptidões, habilidades e preferências por determinada
matéria.
32
4.2. Funções da Educação
De acordo com Querolim (p.21) como “... instrumento capaz de mediar as
relações do homem com o mundo, a educação possui algumas funções”.
Examinaremos cada uma cuidadosamente:
Função Redentora
Fundamenta-se no fato de que a sociedade é constituída de diversos
indivíduos que devem conviver harmonicamente integrada para que haja um
bom funcionamento da mesma. A função da educação é alcançar este objetivo.
Denomina-se redentora por estar atrelada à origem do processo
educacional cujos primórdios como um saber organizado está diretamente
ligado à educação cristã. Comênio, autor de “Didática Magna: Tratado da arte
de ensinar tudo a todos”, sugere que a educação tem como objetivo redimir o
homem ensinando-o como viver verdadeiramente, portanto a vê como um ato
de amor.
Suas ações compreendem desenvolver valores éticos nos cidadãos para
servir de modelo para tomada de decisões, podendo ser entendido seu papel
latente como um aparelho repressor.
Função Reprodutora
Esta corrente de pensamento defende a idéia de que a educação é parte
integral da sociedade, por isso a função é reproduzir a organização social no
interior da escola. Coloca-se ao dispor dos interesses das ideologias
dominantes.
33
Este modelo não consiste em construir uma fórmula, mas uma forma que
saiam padronizadas, oferecendo respostas iguais em condições iguais. As
pessoas pensam que pensam. É um mecanismo de dominação. Através da
escola, o aluno aprende a reproduzir os modelos autoritários.
Traz como resultado o que foi discutido anteriormente e é a prática mais
comum encontrada nos espaços escolares. Não pretende atingir objetivos que
trariam mais felicidade para todos, apenas intenciona reproduzir fielmente o
sistema.
Esta proposta envolve os professores em sua teia, levando-os a
tornarem-se agentes do sistema que eles repoduzem.
Função Transformadora
Esta tem como propósito criar alicerces para servir como um mediador
de um projeto social que possui determinantes e condicionantes, ou seja, uma
influência mútua na relação que estabelece com outras instâncias, podendo
estar a serviço de processos democráticos de condução da sociedade.
Luta pela transformação social e toma este objetivo como seu papel
principal, atingindo aspectos políticos, sociais e econômicos. Demonstra ter um
caráter conservador e de vanguarda.
Dos modelos apresentados, pode-se ter uma visão mais ampla de que a
vida das pessoas pode ser manipulada. O mecanismo da educação é um dos
mais poderosos instrumentos capazes de realmente contribuir para o
crescimento do país como nação.
34
Os profissionais da educação precisam rever seus conceitos a fim de
perceber até que pontos não estão reproduzindo em sala paradigmas que
ferem seus valores.
4.3. Contribuições da Psicanálise para a Educação
Freud, o fundador da Psicanálise, possuía um interesse especial em
educação, podendo ser percebido na sua obra. Sugeria que seu papel é “...
fortalecer as barreiras no tocante ao fluxo das pulsões sexuais, estabelecendo
repugnância, sentimentos de vergonha e as exigências dos ideais estéticos e
morais”. (p.39/40).
A meta da educação é colaborar com o controle dos impulsos sexuais,
restringindo-os na infância, pois a permanência levaria o impulso a um ponto
incontrolável, podendo torná-lo inútil depois. Na realidade, a educação tem uma
faceta conflitiva, haja vista ser a mediadora entre os impulsos sexuais e o
comportamento social.
O mestre de Viena é favorável a idéia de que o educador deve se
familiarizar com os conceitos da psicanálise com o objetivo de tentar abolir os
impulsos considerados indesejáveis pela sociedade, posto que estes esforços
constituem um modo de colaborar para o surgimento de futuras neuroses ao
invés de adequá-la ao mundo.
Sua proposta para educadores é que atentem para a sublimação e
deixem de lado a repressão. Propõe que a psicanálise pode evidenciar que os
instintos associais e perversos na criança não deveriam ser submetidos à
repressão e sim desviado de seus objetivos originais para outros mais valiosos,
caracterizando o processo de sublimação ao qual foi referido anteriormente.
35
A esta altura, o leitor pode estar se perguntando porque levantamos
estas reflexões sobre a educação infantil se estamos tratando da educação
empresarial.
Sabemos que o inconsciente, ou seja, aquela dimensão psíquica a que
não temos acesso fácil ao seu conteúdo está presente na vida de crianças e
adultos dirigindo a conduta e manisfestando-se em todas as ocasiões.
Sendo assim, os responsáveis por capacitar profissionais deveriam ter
conhecimentos ainda que rudimentares a respeito da constituição do aparelho
anímico, mecanismos de defesa do ego e conceitos básicos que auxiliam a
trazer à tona motivações intrínsecas ao educando que poderão dificultar sua
compreensão da proposta pedagógica.
Estes conhecimentos favorecem a leitura do imaginário que poderão
auxiliar na consecução de uma proposta que faça jus às necessidades da
empresa em questão.
Atualmente,
alguns
pedagogos
empresariais
já
utilizam
alguns
conhecimentos oriundos da contribuição da psicanálise como é o caso da
Culturanálise cuja proposta é através da realização de pesquisa junto aos
colaboradores da empresa, buscar indícios através da análise das respostas
literalmente transcritas tanto dos problemas manifestos conscientemente
quanto daqueles que participam do imaginário organizacional.
Desta forma, o projeto educacional proposto através destas análises
poderá atender às demandas da dimensão subjetiva, do interdito, do proibido.
36
4.4. Objetividade e Subjetividade nas Organizações
As empresas são criadas para gerarem um capital cada vez maior que se
bem investido, retorna multiplicado para os acionistas. Os conhecimentos
descobertos são todos aplicados para um aumento cada vez maior da eficácia
organizacional.
Nas prateleiras das livrarias são lançadas a cada ano, várias publicações
que se tornam best-seller, propondo fórmulas de sucesso organizacional.
Marketing, propaganda, administração e economia são saberes voltados para o
mesmo objetivo: lucro máximo.
Vive-se uma época de grande apelo ao exterior estimulada pelo mercado
de bens e serviços que são produzidos com a finalidade de atingir a pessoas de
diversas faixas etárias para o consumo desenfreado.
Se pararmos para fazer uma reflexão, descobriremos que a maioria
dos produtos que compramos são dispensáveis a nossa subsistência, porque
as propagandas se apropriam de conhecimentos sobre o comportamento
humano para induzirem a aquisição desenfreada e desmedida de produtos e
serviços que mal temos tempo de aproveitar.
Este é o momento do show -business, de efeitos especiais onde o ter
parece tornar o lugar do ser. Somos treinados desde a infância a olhar apenas
para a aparência das pessoas. Os cabelos bem cuidados, as roupas de griffes
famosas, o automóvel importado são os instrumentos de medida usados para
definir os bem-sucedidos e felizes no cenário contemporâneo.
A classe de pessoas que, por alguma razão, não conseguem obter tais
dádivas é olhada por nós com menosprezo. Não nos damos nem ao luxo de
37
observar por detrás das aparências, esquecendo-nos que também fazem parte
da comunidade humana com anseios, necessidades como as nossas. Somos
levados de roldão neste turbilhão de acontecimentos.
Apenas quando se enfrenta algum problema grave que mobiliza a
necessidade de reajustamento da própria vida, o indivíduo consegue se dar
conta que deve reconsiderar certos aspectos da vida, até então negligenciados.
Esta perspectiva abrange a noção de interioridade, revitalizando o desejo de um
encontro mais verdadeiro consigo mesmo e com o outro.
É emergente a redescoberta da mais bela relação entre os humanos.
Devemos abandonar o relacionamento Eu-Objeto para iniciarmos o encontro
do Eu-Tu onde ninguém subjuga ninguém aos seus caprichos, mas vê no outro
a sua própria imagem refletida. É o encontro de seres humanos.
A instância ser da vida está vinculada aos sentimentos. Solidariedade,
compaixão, amor, respeito, consideração são alguns sentimentos que temos
esquecido dentro das gavetas e até mesmo, deixado de experimentar presos
que estamos a determinadas trivialidades.
A partir do momento que os profissionais de Educação dentro do
contexto organizacional reverem suas posições de forma crítica, repensando a
que modelos estão dispostos a atender e reconsiderando seu papel como
agente de mudança, além de considerar a dimensão subjetiva em seus projetos
de trabalho, uma nova ordem poderá ser estabelecida de modo mais justo para
todos os envolvidos na empresa. Poderemos ter pessoas felizes realmente.
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CONCLUSÃO
O imperativo das mudanças no desenvolvimento das capacidades
humanas é uma realidade do mundo contemporâneo. Estudos recentes
apontam para novos ditames no contexto organizacional.
À medida que avançam a tecnologia e informática, as ciências se
desenvolvem também como um reflexo da modernidade, pois novos
equipamentos auxiliam a caminhar por novos rumos até então inimagináveis de
existirem.
A religião e a ciência sempre defenderam pontos de vista opostos,
gerando mal-estar entre os representantes de cada categoria. Nos novos
tempos, a ordem é evitar interpretações dicotômicas e posturas rígidas,
fechadas, já que sempre podemos aprender e desenvolver novas atitudes
perante a vida. Temos que manter a humildade a todo custo, pois a cada nova
hipótese levantada, existe sempre uma forma de refutá-la.
A visão cartesiana corpo/mente e demais correntes filosóficas e
abordagens da teoria das organizações perpetuam uma imagem dualista que
não respeita o ser completo, holístico e é esta a razão principal de o homem
conviver com realidades opostas em sua existência, não conseguindo
responder às desgraças humanas de jeito que elas não mais precisem existir.
Robôs que executam tarefas nas indústrias convivem lado a lado com
adultos desqualificados que perdem seus empregos, submetendo-se a
trabalharem na economia informal para evitar a fome. Logo, pedagogos
empresariais podem contribuir para minimizar sofrimentos como este através de
um trabalho onde seja incluída a dimensão subjetiva que caracteriza o homem
como humano.
39
BIBLIOGRAFIA
CHIAVENATO, Idalberto. Gestão de Pessoas: o novo papel dos Recursos
Humanos. Rio de Janeiro: Editora Campus, 1999.
DAMÁSIO, António R. O Erro de Descartes - Emoção, Razão e o Cérebro
Humano. São Paulo: Editora Companhia das Letras, 1996.
DAVEL, Eduardo e VERGARA, Sylvia Constant. Gestão com Pessoas e
Subjetividade. São Paulo: Editora Atlas, 2001.
MURRAY, Edward J. Motivação e Emoção. Rio de Janeiro: Editora Guanabara,
1986.
OLIVEIRA, Milton de. Energia Emocional. São Paulo: Makron Books, 2000.
CHANLAT, J.F. O Indivíduo na Organização: dimensões esquecidas. São
Paulo: Atlas, 1992 a. v.1.
DAVEL, E.P.B; VASCONCELOS, J.G. “Recursos” humanos e subjetividade.
Petrópolis: Vozes, 2000.
40
ÍNDICE
Sumário
7
CAPÍTULO 1
Objetividade e Subjetividade nas Ciências
CAPÍTULO 2
10
12
Bases Neurobiológicas na Tomada de Decisões
CAPÍTULO 3
A Importância das Emoções
3.1 - Emoções Primárias e Emoções Secundárias
3.2 – Resultados do Efeito da Emoção sobre a
17
18
20
Conduta Humana
3.3 – Formação do Eu: O Amor como Fonte Propulsora
3.4 – Emoções: Fraquezas da Alma
22
23
CAPÍTULO 4
Capacitação Profissional
25
4.1. Sociedade do TER e implicações na empresa
29
4.2. Funções da Educação
32
4.3.Contribuições da Psicanálise na educação
34
36
4.4. Objetividade e Subjetividade na Organização
Conclusão
38
39
Bibliografia Consultada
41
FOLHA DE AVALIAÇÃO
UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES
PROJETO A VEZ DO MESTRE
Pós-Graduação “Lato Sensu”
Título da Monografia: A INFLUÊNCIA DA SUBJETIVIDADE NA CAPACITAÇÃO
PROFISSIONAL
Data da Entrega: 30/09/2003
Avaliação:
________________________________________________________________
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________________________________________________________________
________________________________________________________________
________________________________________________________________
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________________________________________________________________
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_____________________________________.
Avaliado por: _________________________________. Grau: ________.
____________________, ____ de ________________ de ______.
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universidade cândido mendes pró-reitoria de desenvolvimento