PANORAMA DE PLH NOS PAÍSES DE LÍNGUA ALEMÃ Língua e identidade na Europa: Um panorama do ensino de PLH nos países de língua alemã Alexandra Magalhães Zeiner Nota sobre a autora Alexandra Magalhães Zeiner é escritora brasileira e ativista cultural em Augsburg, Alemanha. Contato: [email protected] LINCOOL – Língua e Cultura, a revista eletrônica sobre PLH | no 0 | Dezembro de 2015 Brasil em Mente 1 PANORAMA DE PLH NOS PAÍSES DE LÍNGUA ALEMÃ Resumo O presente artigo tem o objetivo de esclarecer o papel do ensino Português em países de língua alemã, dentro do contexto Europeu. Todas as iniciativas citadas apoiam o trabalho da autora na Alemanha. Palavras-chave: Políticas linguísticas na Europa; português como língua de herança; ensino do português na Alemanha, Áustria e Suíҫa; iniciativas complementares. Abstract This article aims to clarify the role of Portuguese teaching in German-speaking countries within the European context. All initiatives mentioned on this article support the author’s work in Germany. Keywords: Language policies in Europe; Portuguese as heritage language; Portuguese teaching in Germany, Austria and Switzerland; complementary initiatives. LINCOOL – Língua e Cultura, a revista eletrônica sobre PLH | no 0 | Dezembro de 2015 Brasil em Mente 2 PANORAMA DE PLH NOS PAÍSES DE LÍNGUA ALEMÃ 3 Agradecimentos Obrigada a todas educadoras da Brasil em Mente, assim como as colegas de curso, espalhadas pelo mundo, na minha opinião, exemplos maravilhosos da força da mulher brasileira em diferentes comunidades no exterior. Minha gratidão às professoras e instituições dos países que falam a língua alemã, citadas no artigo. Foi durante meu trabalho como coordenadora do Projeto Adote um Autor, na Alemanha, que iniciei parcerias com instituições germano-brasileiras, as quais apoiam eventos onde celebramos o Brasil. Dedico esse artigo a todas as mulheres que lutam para ensinar e repassar aos filhos o que temos de melhor no nosso país: nossa língua, arte e cultura. Grata à minha mãe, Francisca de Mesquita Magalhães, por seu belo exemplo como professora de escolas estaduais, no interior e na capital do Ceará. LINCOOL – Língua e Cultura, a revista eletrônica sobre PLH | no 0 | Dezembro de 2015 Brasil em Mente PANORAMA DE PLH NOS PAÍSES DE LÍNGUA ALEMÃ 4 Língua e identidade na Europa: Um panorama do ensino de PLH nos países de língua alemã Diversidade cultural europeia A diversidade linguística e cultural da Europa é considerada muito rica. A intensificação do ensino ao longo da vida e aprendizagem de línguas estrangeiras é um dos meios de comunicação e de intercâmbio entre os cidadãos de diferentes línguas e culturas, além de ser um incentivo à mobilidade e a uma maior abertura, necessária para abraçar todas as diferenças de um continente multicultural. Segundo a visão da União Europeia (UE) sobre o aprendizado de idiomas, existe o conceito geral de que o domínio de diversas línguas deve tornar-se um pré-requisito para seus cidadãos, os quais serão beneficiados profissionalmente e terão melhores oportunidades no mercado de trabalho. A proficiência em diferentes idiomas é um incentivo a capacidade de adaptar-se a trabalhar e viver em ambientes caracterizados por diferentes culturas (Europäische Kommission, 2003). Na Europa, idiomas podem ser considerados como importantes instrumentos para conhecer outras pessoas, por esta razão, pode-se afirmar que o plurilinguismo é um elemento constitutivo da identidade e cidadania europeia. De acordo com o Quadro Comun Europeu de Referência e Portfolio Europeu de Línguas (Fisher, 2001), a iniciativa do projeto “Políticas Linguísticas para uma Europa multilíngue e multicultural” foi apoiada pela União Europeia e pelo Parlamento Europeu e do Conselho, de 17 de Julho de 2000, tendo como principais objetivos: A necessidade de aprender e ensinar línguas estrangeiras, não só dentro do sistema de ensino (do nível pré-escolar até a educação adulta), mas também um incentivo para a aprendizagem de toda a vida; LINCOOL – Língua e Cultura, a revista eletrônica sobre PLH | no 0 | Dezembro de 2015 Brasil em Mente PANORAMA DE PLH NOS PAÍSES DE LÍNGUA ALEMÃ 5 A importância da definição de um quadro europeu comum de referência para a aprendizagem de Línguas; O interesse em torno da criação de um Centro Europeu de Línguas. O português de Portugal Por muitos anos, mas especialmente a partir de 1974 (o ano da Revolução), Portugal procurou implementar diretrizes definidas na área de línguas pelos Projetos Educacionais do Conselho da Europa e da União Europeia (especialmente desde sua entrada na UE). Dentro deste contexto, decisões como a aprendizagem obrigatória de línguas estrangeiras e da diversidade de oferecer novas metodologias, a definição de novos conceitos de formação de professores e/ou a utilização de novos materiais multimídia, são alguns exemplos dessas práticas. Novos programas com foco em línguas e a criação de novos manuais escolares no ensino básico e secundário foram uma das respostas às mudanças que ocorreram nos métodos de aprendizagem de línguas e avaliação (Haarmann, 1983&1993). Em escolas onde existe um grande número de crianças pertencentes a diferentes etnias, projetos pilotos foram desenvolvidos para que exista uma conscientização sobre a importância da língua de herança (LH). Por exemplo, em escolas de Lisboa, para uma melhor integração de alunos de Cabo Verde e Guiné-Bissau, foram organizados cursos de crioulo. Portugal, como membro da UE, adotou as conclusões do Conselho Europeu resumindo-a em um livro intitulado Servicecenter zur europäischen Mehrsprachigkeit [Ensinar e aprender: Rumo à sociedade cognitiva] (EuroComCenter, 2003). Em 2001, no âmbito do Ano Europeu das Línguas, uma Comissão Nacional foi definida em Portugal e composta por entidades de ensino diferentes, com um plano de diversificação de atividades, incluindo línguas estrangeiras e o português a partir de uma dupla perspectiva (língua materna / língua estrangeira) LINCOOL – Língua e Cultura, a revista eletrônica sobre PLH | no 0 | Dezembro de 2015 Brasil em Mente PANORAMA DE PLH NOS PAÍSES DE LÍNGUA ALEMÃ 6 A imigração brasileira para Europa Na atualidade o Brasil contribui decisivamente para a imigração latino-americana em muitos países europeus, mas principalmente em Portugal, Espanha, Itália e Inglaterra (Decsy,1986). Dentre as causas mais comuns para muitos que escolheram este caminho estão uma busca de melhores condições de vida na área de destino e/ou de rejeição a situações de opressão e carência na área de partida. Foi somente nos anos 1980 que artigos, coletâneas e algumas teses foram publicados, enfocando o tema imigração, primeiramente sobre as comunidades brasileiras nos Estados Unidos, seguidos pelos dekasseguis, trabalhadores brasileiros no Japão. Até então os imigrantes em países europeus mereceram uma atenção menor, apesar de existirem alguns trabalhos sobre a situaҫão de imigrantes em Portugal, Itália, Espanha e Inglaterra (Almeida, 2007). Atualmente, considerando a presença crescente de brasileiros em toda Europa, tudo indica que esse será um assunto cada vez mais atrativo para futuros artigos e pesquisas. Estudos sobre o comportamento da imigração latino-americana na Europa sugerem que o perfil brasileiro é o de uma pessoa que não ignora a necessidade de ser competitivo no mundo contemporâneo, mas tende a evitar a confrontação direta nas instâncias em que outros povos podem ser mais assertivos. De alguma forma, esse tipo de comportamento transmite uma mensagem de que o brasileiro não é suficientemente assertivo ou dedicado ao que faz, o que os coloca numa falsa posição em relação, por exemplo, aos alemães, britânicos e italianos na Europa; aos americanos e mexicanos nas Américas; aos chineses e japoneses na Ásia. A consciência dos contrastes dentro de cada dimensão cultural deve ser considerada como um exemplo e uma ferramenta de trabalho adicional para o ensino do português brasileiro na Europa. O primeiro beneficiado pelo uso dessa ferramenta deve ser o próprio professor, que talvez tenha a necessidade de redefinir estereótipos em relação à cultura brasileira (Reis Batista, 2009). Na verdade, muitos desses conceitos foram provavelmente construídos durante sua educação formal no Brasil ou após o contato com outras culturas, LINCOOL – Língua e Cultura, a revista eletrônica sobre PLH | no 0 | Dezembro de 2015 Brasil em Mente PANORAMA DE PLH NOS PAÍSES DE LÍNGUA ALEMÃ 7 caso tenham finalizado sua formaҫão no exterior. Somente após uma avaliação desse tipo de experiência o profissional deve conscientizar-se de que não lhe cabe transmitir um juízo de valor a respeito do caráter mutável da cultura brasileira em relação às culturas de alguns dos seus alunos, que podem se apresentar menos socialmente hierarquizadas. Provavelmente um professor de português como língua de herança ou como segunda língua precise lidar com eventuais comentários e conceitos negativos de famílias que ainda não tenham superado o estágio do choque cultural. Em muitos aspectos específicos da cultura brasileira esse fato ainda representa razão suficiente para frustrações e irritações. Mesmo assim, caberá ao orientador, especialmente nesses casos, usar esses exemplos de forma positiva e transformadora, a fim de propiciar aos seus estudantes uma integração menos sofrida e mais consciente. O ensino do português nos países de língua alemã Nos países germânicos, tradicionalmente, somente no ginasial estuda-se um ou mais idiomas de uma forma mais didática. O ginásio é uma escola secundária vocacionada para a preparação dos alunos para acederem a uma universidade, tendo sua origem na Reforma Protestante ocorrida no século XVI. O primeiro sistema de escolas a ministrar um ensino ginasial surgiu na Saxônia em 1528. No sistema educativo germânico, os ginásios destinam-se aos alunos com maior vocação acadêmica. Estes alunos, são “filtrados” à saída do ensino primário, por volta dos 10 a 13 anos, e somente aos melhores será permitido aceder ao ginásio. Tradicionalmente, o ginásio foca-se nas humanidades e nos estudos clássicos, com o seu currículo a incluir normalmente o ensino do latim e do grego antigo (Frohne, 1992). Outras modalidades do ensino ginasial incluem as línguas modernas, as ciências, a economia e as tecnologias. Alguns outros países – a maioria deles no Leste Europeu – introduziram o ginásio nos seus sistemas educativos, mas com caraterísticas diferentes dos ginásios germânicos. Estes ginásios não correspondem a um ramo do ensino secundário, mas sim a um nível de ensino LINCOOL – Língua e Cultura, a revista eletrônica sobre PLH | no 0 | Dezembro de 2015 Brasil em Mente PANORAMA DE PLH NOS PAÍSES DE LÍNGUA ALEMÃ 8 (Finkenstaedt & Schröder, 1992). Normalmente, o ginásio constitui a primeira etapa do ensino secundário (equivalente aproximadamente aos segundos ciclos do ensino fundamental do Brasil e do ensino básico de Portugal). Apresento, a seguir, alguns exemplos de iniciativas, particulares e governamentais, que visam estimular o ensino do “português brasileiro” para filhos de imigrantes nos países de língua alemã. Ressalto que os exemplos citados têm como objetivo principal conscientizar comunidades sobre a importância de manter viva nossa arte e cultura através do nosso idioma. Ensino de língua portuguesa nas escolas públicas de Viena Na Áustria, português também se aprende na escola A minha pátria é a língua portuguesa (Fernando Pessoa) Lic. Daniella Ringhofer Lic. Mestr. Tatiana Mazza da Silva-Surer O governo austríaco propicia às crianças e jovens entre seis e dezoito anos o ensino de língua materna ou língua de herança. Vinte e quatro línguas fazem parte do programa e mais de 32 mil alunos em todo o território austríaco frequentam as aulas. Somente em Viena são quase 18 mil alunos. Dentre as línguas oferecidas, temos a língua portuguesa desde 2010 nas escolas ginasiais (AHS e NMS) e desde 2011 nas escolas primárias (Volksschulen). LINCOOL – Língua e Cultura, a revista eletrônica sobre PLH | no 0 | Dezembro de 2015 Brasil em Mente PANORAMA DE PLH NOS PAÍSES DE LÍNGUA ALEMÃ 9 As aulas se dão em escolas públicas de Viena e são gratuitas. Para os alunos de AHS e NMS, faz-se a divisão entre as variantes brasileira e europeia/africana e também quanto ao nível de fluência e compreensão dos alunos. Para os alunos das escolas primárias, até o presente momento, a divisão dos alunos acompanha os anos escolares, mas, a partir do ano letivo 2014-2015, houve uma proposta de usar como critério de divisão a desenvoltura do aluno na língua em questão Todo aluno, seja de escola pública ou privada, filho de falante nativo de língua portuguesa, pode participar das aulas. Tal participação será inserida no boletim e no histórico escolar, com ou sem nota, de acordo com a escolha de cada um. Vale ressaltar que o aluno não precisa ser fluente na língua portuguesa para poder frequentá-las. Nas aulas de português como língua materna, são trabalhados temas de cultura geral do país, exercícios de escrita, gramática, compreensão textual e auditiva e a fala. Dentro das possibilidades, são trabalhados jogos, filmes, passeios e demais atividades lúdicas. Para os alunos da Volksschule, há aulas às segundas-feiras às 15 horas na escola Neustiftgasse no sétimo distrito ou às quintas-feiras às 15 horas na escola Schönngasse no segundo distrito. Para os alunos dos segmentos subsequentes, as aulas acontecem às sextasfeiras à tarde ou aos sábados pela manhã na escola Akademisches Gymnasium, na Beethovenplatz no primeiro distrito. Para todos os alunos a partir do quinto ano ginasial há também a possibilidade de inclusão da matéria “Português como Segunda Língua Viva”. Para tanto, o aluno necessita realizar uma prova externa (Externistenprüfung). Para maiores Informações para o ano letivo 2015-2016, contatar: Prof. Lic. Mestr. Tatiana Mazza da Silva-Surer (alunos de Volksschulen): [email protected] / Tel: +43 (0) 6804459364 Prof. Lic. Daniella Ringhofer: (alunos de AHS, NMS, HTL e Berufschulen de Viena ou redondezas): [email protected] / Tel: +43 (0) 6769610866 LINCOOL – Língua e Cultura, a revista eletrônica sobre PLH | no 0 | Dezembro de 2015 Brasil em Mente PANORAMA DE PLH NOS PAÍSES DE LÍNGUA ALEMÃ 10 Linguarte de Munique Camila Lira Linguarte e.V. é uma associação cultural sem fins lucrativos criada em 2003 por pais e professores da comunidade brasileira de Munique com o objetivo geral de promover a língua portuguesa e a cultura do Brasil. Dentro deste escopo, a Linguarte concentra-se, primeiramente, em atividades que possibilitem a educação e o ensino de português aos filhos de falantes de língua portuguesa. Embora falemos do Brasil em especial, não se diferenciam alunos falantes de outras variantes do português. Essas atividades abrangem conteúdos específicos do currículo brasileiro do ponto de vista do ensino do idioma no exterior, projetos culturais voltados para um ou mais temas específicos da cultura brasileira, projetos interdisciplinares que colocam os alunos em contato com representantes (p.ex. músicos, pesquisadores etc.) da comunidade brasileira em Munique e região. Atualmente 25 crianças aprendem português na Linguarte, divididas em cinco grupos, organizados não só por sua faixa etária como também por seus conhecimentos linguísticos. No quadro de professores da Linguarte atualmente estão três professoras contratadas para o ensino de PLH. Até o presente momento oferecemos três cursos quinzenais, aos sábados e por um período de três horas com pausa de trinta minutos; e dois cursos semanais, LINCOOL – Língua e Cultura, a revista eletrônica sobre PLH | no 0 | Dezembro de 2015 Brasil em Mente PANORAMA DE PLH NOS PAÍSES DE LÍNGUA ALEMÃ 11 com aulas de 90 min. Os cursos são oferecidos desta forma por conta da necessidade apresentada pelas famílias. As turmas são geralmente formadas por irmãos e o curso aos sábados proporciona aos pais a facilidade de levar seus filhos ao mesmo local, o que durante a semana, devido aos diferentes compromissos de seus filhos, se tornaria impossível. Estes grupos são denominados Português Alfabetização I, Português Alfabetização III e Português Avante III. Durante a semana temos duas turmas de Alfabetização I. A Linguarte e.V utiliza diversos materiais didáticos. Nas turmas de alunos mais novos (grupos de recreação e alfabetização) não há a adoção de livro didático, mas cabe ao professor selecionar materiais como também preparar materiais para o que necessita. Vê-se que há a necessidade de se adaptar os materiais que estão no mercado (sejam livros específicos para o ensino de PLH como também material de ensino no Brasil ou em Portugal) para a turma com que se irá trabalhar, pois é sabido que cada turma é diferente da outra e tem necessidades diferentes também. A Linguarte tem ainda livros didáticos para o ensino de português como língua materna do ensino fundamental, que também servem como material de pesquisa de atividades para o professor. Em sua maioria, o material é adaptado levando em conta o objetivo pedagógico e a faixa etária do aluno. Neste caso, um mesmo texto pode ser trabalhado de diversas formas em diferentes grupos. É o caso, por exemplo, do trabalho com vocabulário. Enquanto a turma de alunos mais novos aprende o vocabulário usado em sala de aula através de jogo da memória e atividade de fixação como “ligar a figura ao seu nome”, os mais velhos podem, além do jogo, trabalhar em duplas e anotar o nome de tudo que se usa/ tem em sala de aula. Tenho notado que ainda há muito que fazer para o ensino de PLH não só em Munique como na Alemanha como um todo, em especial na conscientização da família e no apoio do governo brasileiro. LINCOOL – Língua e Cultura, a revista eletrônica sobre PLH | no 0 | Dezembro de 2015 Brasil em Mente PANORAMA DE PLH NOS PAÍSES DE LÍNGUA ALEMÃ 12 Uma escola de português com diferentes sotaques em Berlim A Escola Europeia (Europa-Schule) Berlin Neues Tor surgiu de uma iniciativa de pais e acabou se transformando numa das escolas preferidas na capital alemã. O pré-requisito não é a nacionalidade, mas se a criança fala como idioma principal o português ou o alemão. As crianças fazem um teste, onde procura identificar-se qual é a língua principal. Se for o português, ele será alfabetizada em português, caso contrário, em alemão. A partir do segundo ano, inicia-se a alfabetização na segunda língua. Um dos objetivos da escola é que as crianças sejam alfabetizadas nas duas línguas. A escola trabalha dentro dos padrões das escolas europeias no país: metade das matérias é lecionada em português, outra metade em alemão. A Neues Tor oferece educação bilíngue desde o pré-primário até a sexta série, quando termina em Berlim o ensino fundamental. LINCOOL – Língua e Cultura, a revista eletrônica sobre PLH | no 0 | Dezembro de 2015 Brasil em Mente PANORAMA DE PLH NOS PAÍSES DE LÍNGUA ALEMÃ 13 Elisa Deppe, depoimento de uma professora particular “Meu nome é Elisa, sou professora primária. Vivo há dezoito anos na Alemanha e há três anos e meio dou aulas particulares de português para três crianças. Quando iniciei o trabalho, as crianças não sabiam ler ou escrever (suas idades eram seis, cinco e quatro anos). Procurei material especifico para esse trabalho, mas infelizmente nada encontrei. Na verdade, eu gostaria de ter uma sequência de trabalho, ou seja, onde iniciar e como prosseguir. Assim, comecei a criar eu mesma um material. Trabalho em uma escola na minha cidade e pedi ajuda de material visual para a professora de inglês, com quem obtive auxílio de cópias de um material educativo, adaptando-o para o português. Mais tarde encontrei um livro de português para estrangeiros para crianças, mas somente com o português de Portugal. Juntando esse material didático criei uma “linha de orientação” para minhas aulas. Utilizando um material de Portugal, pedi para as crianças criarem seu livro particular, para escrever e ver as figuras, sem haver a necessidade de utilizar cópias coloridas. Não utilizei o livro completo como material didático e, para algumas lições, modifiquei a sequência e a metodologia. Fiz cópias de diferentes materiais encontrados em variados websites, geralmente direcionados a atividades para crianças, ou específicos para professores de português. Adaptei algumas páginas de trabalhos de escoteiros, as quais, traduzidas e improvisadas, transformaram-se em materiais para minhas aulas. Utilizei também um material auxiliar para LINCOOL – Língua e Cultura, a revista eletrônica sobre PLH | no 0 | Dezembro de 2015 Brasil em Mente PANORAMA DE PLH NOS PAÍSES DE LÍNGUA ALEMÃ 14 brincadeiras, como bolas, bonecos, utensílios para cozinha e de outras partes da casa, panos coloridos, massinha de modelar, pinturas com tinta de dedos, tinta guache ou outras tinturas e colagens de figuras, teatro de bonecos etc. Utilizo recursos como a mímica e também exercícios de educação física, exemplificando partes do corpo e também nomeando movimento (verbos e adjetivos). Desenvolvo algumas brincadeiras infantis, como esconde-esconde, brincadeiras de roda, além de brincadeiras com uso de palavras e números, como bingo, charadas ou labirintos. Para a memorização e treino da escrita utilizo jogos da memória, pinturas com desenhos sobre o tema do momento e também jogos de bingo (memorização dos números). Procuro ter sempre uma história curta para a leitura no final da aula. Principalmente para a adaptarão auditiva do texto e uso correto da gramática. Minhas aulas têm sempre o mesmo ritmo, ou seja, inicio e termino sempre da mesma maneira. Inicialmente fazemos uma roda onde começamos com uma música infantil, pois através das canções utilizamos a gramática e palavras novas. Depois, inicio o conteúdo do dia, sempre procurando alterar entre a parte escrita e brincadeiras, movimentos, novamente a escrita, finalizando com uma roda, onde sentamos no chão e podemos ouvir uma história ou fazer uma brincadeira para relaxar. Procuro variar o ritmo em dias especiais, como final de férias, quando fazemos um piquenique ou preparamos um presente para os pais, ou mesmo cozinhando algo. Procuro fazer também no início e no final das férias uma aula de revisão relembrando os temas vistos. Infelizmente os pais nem sempre se comunicam com as crianças em português, tornando lento o progresso do meu trabalho. Acredito que se houvesse uma conscientização das famílias, nosso idioma seria mais apreciado dentro de casa. Meu objetivo principal é que as crianças falem frases completas, e estamos na fase onde o vocabulário está avançado, mas iniciando o uso da gramática. Creio que trabalhando com encenações e repetirão, conseguirei alcançar meu objetivo.” LINCOOL – Língua e Cultura, a revista eletrônica sobre PLH | no 0 | Dezembro de 2015 Brasil em Mente PANORAMA DE PLH NOS PAÍSES DE LÍNGUA ALEMÃ 15 A importância de ensinar aos filhos a língua do país de origem Em Liechtenstein, há uma instituição que promove a cultura brasileira. Aqui, algumas breves palavras de sua presidente: “A Casa Brasil Liechtenstein tem o desejo de expandir seus projetos com muitos outros brasileiros no exterior formando uma grande ‘Casa de Brasileiros no Exterior’. Venha você também participar da Casa Brasil com a gente.” Denise da Cruz Campitelli – Presidente da Casa Brasil. A continuação, apresento o depoimento de Andrea Frommelt, professora, pedagoga e coordenadora dos cursos de português da Casa Brasil-Liechtenstein: “Dois anos atrás participei do curso de formação continuada de professores em Zurique, chamado ‘Português como Língua de Herança’, por indicação de uma amiga, hoje presidente da Casa Brasil, Denise da Cruz Campitelli. O termo ‘língua de herança’ me marcou muito, pois é exatamente assim que vejo que temos que passar para os nossos filhos o idioma de nosso país de origem, como uma herança. Sempre tive a preocupação de conversar com meu filho em português pelo fato de muitas vezes presenciar mães falando em uma língua que não as aproximava efetivamente dos filhos, por tentarem falar a língua do país em que moravam. É claro que isso não impede que a mãe ou o pai fale em outro idioma com seu filho, se domina a língua dos pais e sente que isso também traz a união afetiva entre seu filho. Eu e minha amiga Denise da Cruz observamos que um curso só de língua portuguesa seria pouco para manter unido o interesse de uma associação num país tão pequeno. A partir daí a estratégia era abrir a associação com o curso de português, mas com a ideia de uma LINCOOL – Língua e Cultura, a revista eletrônica sobre PLH | no 0 | Dezembro de 2015 Brasil em Mente PANORAMA DE PLH NOS PAÍSES DE LÍNGUA ALEMÃ 16 associação mais abrangente com outros interesses, como projetos de eventos culturais dentre outros que pudessem atrair mais brasileiros também da Áustria e Suíça para dentro da associação no Liechtenstein. Criamos, assim, a Casa Brasil Liechtenstein, nome dado pela Presidente Denise da Cruz e por Athius da Cruz Mendes, responsável pelo departamento contábil e marketing, o terceiro fundador. Hoje temos a Casa Brasil Cursos, que inicia este ano letivo de 2014-2015 com: Aulas de português Palestra de ARDUINO Iniciação Aulas às redes sociais de alongamento. E como é aprendida a língua portuguesa no Principado do Liechtenstein? O português é ensinado com muita criatividade, com o propósito de despertar nos nossos alunos o desejo de estarem sempre nas aulas. Como professora e coordenadora do projeto Cursos de Português, procuro sempre preparar as aulas de forma dinâmica, induzindo o aluno a participar de todo o processo de aprendizado. Atendemos na escola crianças em idades de quatro a doze anos, sendo que o nível de conhecimento da língua portuguesa é variado, pois uns falam muito bem e outros não falam quase nada. É por esse motivo que nas aulas de português procuro explorar muito a conversação e trabalho com rimas, parlendas, músicas folclóricas, dança, ritmo, datas comemorativas brasileiras, literatura infantil do Brasil, culinária infantil com receitas brasileiras, apresentações de teatro e uma vasta gama de atividades para que o nível de escrita, fala e leitura dos alunos aumente de forma bem divertida e descontraída. Porque a criança deve falar português? Se a criança domina bem uma língua, será mais fácil aprender bem uma segunda ou terceira língua. Para conhecer melhor suas origens. LINCOOL – Língua e Cultura, a revista eletrônica sobre PLH | no 0 | Dezembro de 2015 Brasil em Mente PANORAMA DE PLH NOS PAÍSES DE LÍNGUA ALEMÃ Para uma Para seu Se um A 17 melhor comunicação. futuro profissional. dia os pais retornarem ao país de origem. língua portuguesa está entre as dez línguas mais faladas do mundo. Para que possa ler e escrever em português. Para se orgulhar da língua e país de origem de seus pais. O ensino de PLH vem ganhando uma crescente atenção de profissionais e pesquisadores da área pela importância de se manter a língua como uma herança passada de pais para filhos e de filhos para seus filhos e assim sucessivamente, de geração a geração. Ensinar à criança nossa língua (idioma), cultura, costumes e valores contribuirá em muito na sua formação intelectual, segurança, identidade e integração social. Não devemos, seja na posição de pais, professores ou ativistas em algum grupo ou associação brasileira, deixar de dar o incentivo a esta outra geração brasileira, que nasceu e está nascendo fora do Brasil, para ensinar nosso idioma como uma língua de herança”. Sendo ensinada com paixão, esta língua nunca será esquecida, mas sim valorizada por aqueles que a aprenderam e aprenderão. Não tire de seu filho essa “herança” que, de alguma forma, no futuro poderá ser cobrada de você. Vivemos em um mundo onde quanto mais línguas aprendemos, mais somos valorizados. Valorizemos nossa língua, vamos passar essa herança.” O caso particular da Suíça Desde o início dos anos 2000, uma nova onda imigratória brasileira se somou aos portugueses, que chegaram há várias décadas, para converter-se na terceira nacionalidade mais importante dentro do grupo de 1,5 milhão de estrangeiros que vivem na Suíça, atrás apenas dos italianos e sérvios. Os portugueses são atualmente o segundo grupo da UE em número que mais chega à Suíça procurando um emprego, depois dos alemães e antes dos franceses. Vale ressaltar que a Confederação Helvética (nome oficial do país) não faz parte da Comunidade Europeia (Coulmas, 1991). LINCOOL – Língua e Cultura, a revista eletrônica sobre PLH | no 0 | Dezembro de 2015 Brasil em Mente PANORAMA DE PLH NOS PAÍSES DE LÍNGUA ALEMÃ 18 Estabelecer cursos para melhorar a integração da população estrangeira em pequenos povoados não é uma tarefa simples, mas na Suíça atual se fala bastante sobre integração, e o governo sabe da importância que ela tem para todos. Cursos foram criados para mães com filhos em idade pré-escolar, pois o bom desempenho das crianças bilíngues nas escolas suíças é reconhecido por todos. Trata-se de um conhecimento valioso para toda família, pois é importante que as crianças aprendam o idioma dos pais antes de frequentar a escola local. No entanto, o ensino do português continental é diferenciado do ensino do português brasileiro, pois as regras do sistema de educação suíҫo exigem esta separarão. Geralmente os cursos são ofertados por instituições particulares (brasileiras e portuguesas), com taxas variadas de inscrições, uma forma de atrair as famílias. Minha opinião, baseada em viagens e contatos com alguns profissionais de diferentes regiões na Suíça, confirma o conceito geral: mesmo sendo conservador em diferentes aspectos sociais, o país está se esforçando para integrar melhor os estrangeiros. Existem vários projetos em andamento, como os chamados “mediadores culturais”. O verdadeiro desafio é atrair a atenção dos pais para que suas crianças frequentem os cursos, além de fazer com que as famílias de baixo nível de educação, que geralmente não estão acostumadas a sentar em bancos escolares, as inscrevam nestas ofertas. Acredito que a partir deste trabalho inicial, um pequeno levantamento baseado em minha experiência pessoal como escritora brasileira na Alemanha, futuras pesquisas sobre o tema apresentado sejam necessárias para a condução e/ou criação de um plano piloto onde diferentes profissionais – independentes ou vinculados a associações europeias ou não governamentais – trabalhem e pesquisem explorando o PLH, para assim dar continuidade e divulgar em conjunto a língua portuguesa na Europa, divulgada através da arte e cultura brasileira nas diferentes comunidades brasileiras no exterior. LINCOOL – Língua e Cultura, a revista eletrônica sobre PLH | no 0 | Dezembro de 2015 Brasil em Mente PANORAMA DE PLH NOS PAÍSES DE LÍNGUA ALEMÃ 19 Referências bibliográficas Almeida, A.C. (2007). A cabeça do brasileiro. Rio de Janeiro: Record, 2007. Coulmas, F. (1991). A Language Policy for the European Community, Prospects and Quandaries. Amsterdam/Berlin. Decsy, G. (1986). 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LINCOOL – Língua e Cultura, a revista eletrônica sobre PLH | no 0 | Dezembro de 2015 Brasil em Mente PANORAMA DE PLH NOS PAÍSES DE LÍNGUA ALEMÃ Anexo I: Informações sobre a Creche Curumim da Imbradiva em Frankfurt LINCOOL – Língua e Cultura, a revista eletrônica sobre PLH | no 0 | Dezembro de 2015 Brasil em Mente 21 PANORAMA DE PLH NOS PAÍSES DE LÍNGUA ALEMÃ LINCOOL – Língua e Cultura, a revista eletrônica sobre PLH | no 0 | Dezembro de 2015 Brasil em Mente 22 PANORAMA DE PLH NOS PAÍSES DE LÍNGUA ALEMÃ LINCOOL – Língua e Cultura, a revista eletrônica sobre PLH | no 0 | Dezembro de 2015 Brasil em Mente 23