O viés crítico das tirinhas: como trabalhar o cotidiano em quadrinhos Natania Nogueira [email protected] Valéria Fernandes [email protected] As tiras cômicas: origens e atualidades • A tira é uma sequência de imagens. • Atualmente, usamos o termo para definir as tiras curtas publicadas diariamente em jornais. • Historicamente, a “tira” designava qualquer espécie de tira, não havendo limite máximo de quadros, sendo o mínimo de dois. • As tiras dominicais dos Estados Unidos, por exemplo, eram coloridas e podiam ocupar uma página inteira de jornal (formato tabloide). A tira colorida do "Yellow Kid e seu novo fonógrafo", datada de 25 de outubro de 1896. • As Tiras dominicais dos Estados Unidos tiveram sua origem nas daily strips (tiras diárias) em preto e branco, cujo pioneiro foi Clare Briggs (1875 – 1930), com seu personagem A. Piker Clerk, criado em 1904, a pedido do do Jornal Chicago American. • O cartunista Jimmy Swinnerton, em sua tira The Little Bears, introduziu a arte sequencial e personagens recorrentes no jornal do magnata William Randolph Hearst, chamado San Francisco Examiner. • Mas elas não eram exatamente uma novidade. Os primeiros jornais americanos a publicarem tiras diárias apareceram no século XIX, pouco depois da invenção da imprensa colorida. Tira diária de 1913 de Mutt e Jeff de Bud Fisher • As tiras surgiram como formas de divertimento. • Sua publicação era diária, nos jornais norteamericanos. • Podiam ser chamadas simplesmente de comics ou de comic strip, equivalente, em inglês, à tira cômica ou simplesmente tira. • Na década de 1920 surgiram, também, as adventure strips, ou tiras de aventura. Elas representavam fragmentos de seriados, como Ivanhoé e a Ilha do Tesouro. • As adventure strips popularizaram, também personagens como Tarzan (1929), Buck Rogers (1929), Dick Tracy (1931) e Flash Gordon(1934). • O formato tabloide foi substituído, devido, entre outros fatores, ao surgimento de novos artistas e ao aumento das vendas. • As histórias ficariam mais curtas surgindo as daily strip. • As tiras cômicas foram então transferidas dos suplementos dominicais e passaram para as páginas internas dos jornais, sendo reduzidas a dois ou quatro quadrinhos. • Criavam-se as histórias em capítulos, que duravam algumas semanas e estimulavam as vendas. Buck Rogers inaugurou as séries de aventura de ficção espacial. Entre 1929 e 1967 foi traduzida para 18 idiomas e apareceu em 450 jornais. • Um fator importante para que as tirinhas se difundissem por outros países foi a criação de syndicates (agências, empresas distribuidoras de notícias), que surgiram em 1840, nos Estados Unidos. • Eles eram encarregados de contratar desenhistas e espalhar comercialmente as tirinhas para jornais e revistas pelo mundo. • Por volta de 1960, o gênero estava consolidado em vários países. • Na década de 1930, Adolfo Aizen trouxe a ideia para Brasil. • Após passar uma temporada nos EUA, Aizen descobriu como os suplementos aumentavam as vendas de jornais. • Percebeu, também, que um dos grandes responsáveis por este sucesso era o caderno infanto-juvenil, com suas tiras diárias. • Aizen vendeu a ideia dos suplementos (cadernos) diários para João Alberto, proprietário do jornal A Nação. Foi um sucesso imediato. • Os quadrinhos passaram, então, a serem publicadas como suplementos infantis. O primeiro saiu no dia 14 de março, de 1934, com capa ilustrada por J. Carlos. Suplemento Infantil – ilustração de J. Carlos. • No suplemento eram publicados quadrinhos americanos de sucesso, além de personagens nacionais. • O sucesso dos suplementos permanece até hoje, assim como as tiras diárias, presentes nos jornais distribuídos em todo o território nacional. • As tiras de tornaram um ícone da comunicação em massa do nosso tempo. • As tirinhas, aqui no Brasil, encontraram sua formatação atual com a tira Bidu, em 1959, publicada na Folha de São Paulo por Maurício de Souza. • No início dos anos 80, a Folha iniciou a distribuição de tirinhas para outros jornais brasileiros. • Na mesma época, Ziraldo passa a dirigir uma agência que distribuía tirinhas para vários jornais, onde empregava vários desenhistas, autores de tirinhas conhecidas como Chiclete com Banana, de Angeli e O Condomínio, de Laerte. A agência foi fechada no início dos anos 90. Algumas possibilidades de uso das tirinhas no ensino de história • As tiras de jornal são gêneros discursivos que podem transformar-se em excelentes aliadas do professor. • Elas permitem não apenas refletir sobre o uso da língua e contribuir na elaboração do discurso do aluno como também permitem ao leitor fazer uma reflexão humorística a respeito dos problemas do cotidiano. • Um aspecto importante sobre o uso das tiras como recurso didático é a presença da linguagem não verbal, que desperte a atenção dos alunos, atraídos por imagens rápidas. • As tiras de jornal podem possibilitar diferentes abordagens interdisciplinares, pois seus autores se expressam de forma humorística ou sarcástica sobre vários temas científicos, históricos, artísticos, filosóficos. • Elas servem para ilustrar e discutir o conteúdo de várias disciplinas, desde história, matemática, geografia, ciências, artes etc. • Para o professor de história, em particular, a tira pode ser utilizada de várias formas, permitindo ao professor desenvolver junto aos alunos uma reflexão sobre o uso da linguagem e ajudá-lo a apropriar-se dos discursos socialmente produzidos, fazendo novas da realidade e proporcionando um exercício de contextualização que lhe permitirá analisar e compreender melhor a dinâmica da história. • As tiras podem ser apresentadas, inclusive, como uma fonte de conhecimento histórico, uma vez que contribuíram para fazer uma reflexão crítica da história, seja nacional ou mundial. • Durante a ditadura militar, as tiras tiveram o seu auge. Nesse período, surgiram várias tiras de teor político que faziam uma leitura crítica daquele momento histórico. • Emergiram, nessa época, vários autores do gênero, como Angeli, com “ Chiclete com Banana”; Laerte, com “Piratas do Tietê”; Luís Fernando Veríssimo, com “ As Cobras”, entre outros. Sugestões de atividades • • • As possibilidades de se trabalhar com quadrinhos, no caso específico das tiras, varia de acordo com o objetivo do professor. Selecionamos algumas sugestões de trabalho que podem ser adaptadas a vários conteúdos, não apenas ao ensino de história. Estas sugestões apenas indicam direções que podem ser seguidas, cabendo ao professor adaptá-las ao seu contexto específico. 1 – Análise de tirinhas como forma de compreender melhor o cotidiano local e global (Adaptado de sugestão de trabalho com quadrinhos da prof. Terezinha Aparecida Lazzaroto) • • • • • Pedir aos alunos que tragam jornais de casa; Recortar algumas tirinhas; Fazer com os alunos um levantamento do nome dos autores e das séries que mais aparecem nos jornais; Verificar se nos jornais analisados há uma produção de autores locais e quais reflexões provocam; Selecionar algumas tiras para analisá-las: quem escreveu, o que escreveu, como escreveu, para quem, por que, quando e onde; • • • • Perceber ainda se esses recursos foram empregados para refletir sobre os problemas que afligem o cotidiano do homem ou para provocar o riso; Reunir os alunos em dupla para que escolham uma dessas histórias pesquisadas; Transformar a história escolhida em uma tirinha, cabendo ao professor precisará determinar as circunstâncias de produção. Criar um espaço para divulgar as produções dos alunos, através de exposições no mural; publicação no jornal da escola, bairro ou cidade, ou criação de outro espaço, a critério do professor. 2 – Edição de tiras (Adaptado da sugestão de trabalho com quadrinhos da prof. Terezinha Aparecida Lazzaroto) • • • • Selecionar algumas tiras do jornal, pedindo que recortem fora as falas dos balões, deixando apenas os desenhos. Em seguida, o professor pode determinar uma palavra com duplo sentido que possa ser utilizada na tira recortada. A seguir, os alunos podem recriar as falas, empregando essa palavra. Novamente, o professor, ao desenvolver a atividade, não poderá esquecer de determinar, com os alunos, as circunstâncias em que serão reescritas as tiras. 3 – Interpretando tirinhas* (Adaptado da sugestão de trabalho com quadrinhos da prof. Daniela Braga de Paula) • 1) 2) No laboratório de informática, o professor iniciará a aula pedindo aos alunos que se organizem em duplas. Cada dupla terá à sua disposição um computador conectado à internet e receberá instruções da atividade, quais sejam: Acessar o link: http://clubedamafalda.blogspot.com/ (Acesso em 17/09/09) Procurar a tirinha da Mafalda de número 411. *A proposta de aula envolve o uso de computadores, portanto, ela deverá ocorrer na sala de informática. No entanto, o professor pode adaptar a ideia para s er trabalhada na s ala d e a u la. • Responder o questionário referente a essa tira no programa WORD para, em seguida, anexar e enviar ao e-mail do professor da turma: a) O que chama a atenção de Mafalda no primeiro quadro? b) Conforme vestimentas do homem, vocês podem inferir a profissão dele? c) O que acontece no segundo quadro? d) Por meio da expressão fisionômica de Mafalda, verifica-se que ela ficou triste depois de seguir o homem e ver o que ele fez. Expliquem o motivo da tristeza. e) É possível verificar uma crítica na tira? Se sim a quem ela é dirigida? Comentem. 4 – Oficina de tirinhas (Prof. Natania Nogueira – MG) • A produção de tirinhas é uma excelente atividade que pode ser trabalhada tanto com alunos do ensino fundamental, quanto do ensino médio. • A atividade não apenas desenvolver a capacidade de síntese como também permite ao aluno refletir sobre o tema trabalhado de forma mais criativa. • O professor deve selecionar um tema para trabalhar. O tema deve ser abordado na sala de aula, discutido e analisado. • O professor, então, irá propor a oficina, estabelecendo critérios básicos como: o uso de elementos dos quadrinhos como balões, onomatopeias, linhas cinétricas, desenhos iconográfico (ele deve exigir a presença de pelo menos dois destes elementos na tirinha), assim como o número de quadros e as medidas que cada tira deverá possuir. • A atividade poderá ser individual ou em dupla, ficando a critério do professor. • Caso o professor queira utilizar toda uma aula para a atividade, ele pode solicitar que os alunos criem mais de uma tirinha. • Ao final da aula, as tirinhas serão entregues ao professor. • Na aula seguinte, o professor irá redistribuir os trabalhos, de forma aleatória, mas prestando atenção para que cada aluno receba a tirinha feita por uma colega. • Em seguida, ele irá propor que cada aluno analise a tira que recebeu e identifique nela elementos que estejam de acordo com o tema abordado produzindo um relatório que será anexado à tira e avaliado pelo professor. Dica: visite o site do EDUHQ http://www.cbpf.br/~eduhq/ Exemplo de tirinha feita por aluno que combina história com tema relacionado com o cotidiano – Fonte: EDUHQ Fontes EDUHQ – Oficina de educação através de histórias em quadrinhos. Disponível em: http://www.cbpf.br/~eduhq/, acesso em 02/06/2011. FEIJÓ, Mario. Quadrinhos em ação: um século de história. – São Paulo, Ed. Moderna, 1997. IANNONE, Leila Retroia. O mundo das Histórias em quadrinhos. – São Paulo, ed. Moderna, 1994. JUNIOR, Gonçalo. A Guerra dos Gibis: a formação do mercado editorial brasileiros e a censura aos quadrinhos, 1933 -64. São Paulo, Companhia das Letras, 2004. LAZZAROTTO, Terezinha Aparecida. As tiras de jornal no ensino da língua portuguesa. Capturado em http://www.diaadiaeducacao.pr.gov.br/portals/pde/arquivos/4234.pdf, acesso em 03/07/2011. PAULA, Daniela Braga de. Interpretando tirinhas. Disponível em http://portaldoprofessor.mec.gov.br/fichaTecnicaAula.html?aula=8 115 , acesso em 02/06/2011. 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