O REGISTRO DAS ENTIDADES E ORGANIZAÇÕES DE ASSISTÊNCIA SOCIAL NO CONSELHO MUNICIPAL DE ASSISTÊNCIA SOCIAL Esther Luíza Lemos Hein1 Acadêmicas da disciplina Núcleo Temático de Seguridade Social2 RESUMO O presente trabalho tem com objeto de estudo as entidades e organizações de assistência social. Nasceu da aproximação realizada na disciplina de Núcleo Temático de Seguridade Social do Curso de Serviço Social da UNIOESTE – Campus de Toledo, nos anos letivos de 2001 e 2002, através da participação e observação das reuniões do Conselho Municipal de Assistência Social. A fonte de dados foi o estatuto das entidades e organizações de assistência social registradas nos Conselhos Municipais de Assistência Social de Toledo, Marechal Cândido Rondon e Cascavel - PR. Analisou-se os estatutos por município nos seguintes aspectos: quanto à natureza, quanto aos artigos obrigatórios no estatuto e quanto aos destinatários/usuários. Tem como objetivo analisar o significado do registro das entidades e organizações de assistência social no contexto do Sistema Descentralizado e Participativo de Assistência Social. PALAVRAS-CHAVE 1. Conselho Municipal de Assistência Social 2. Entidade privada sem fins lucrativos 3. Direitos Sociais 4. Usuários 1 Docente do Curso de Serviço Social da Unioeste – Campus de Toledo na disciplina de Núcleo Temático de Seguridade Social, Mestre em Serviço Social pela PUCSP. Endereço para contato: Rua da Faculdade, 645, Jardim La Salle, CEP 85.903-000, Toledo – PR, Fone (45) 252-3535, E-mail [email protected] 2 O presente trabalho foi realizado coletivamente no ano letivo de 2002 com as seguintes alunas: Alice Werner, Andréia Strinta dos Santos, Andressa Campeol, Angela Maria Bravo, Antonia Alves, Beatriz Petry, Cristina Begnini, Daline Backes, Daniele Graciane de Souza, Dulciane Regina Rother, Fernanda Morari, Fernanda Testa, Ilda Maria Augusto, Lorien Maria Schtichting da Rocha, Luciane Nara Diel, Marciele Alice Tonn, Marizete de Fátima Rodrigues, Rafaela Brustolim, Rosana de Fátima Couto Leite, Zoilene Capelli Basso. 2 INTRODUÇÃO O interesse pelo presente objeto de estudo nasceu do processo de participação e observação sistemática das reuniões do Conselho Municipal de Assistência Social de Toledo – CMAS, tanto como Conselheira Municipal representando a Unioeste – Campus de Toledo como docente da disciplina de Núcleo Temático de Seguridade Social. No ano de 2001 uma das atividades da disciplina junto aos acadêmicos foi acompanhar as reuniões do CMAS – Toledo. Nestas os alunos puderam observar, a cada reunião, no contexto das pautas, a solicitação das entidades e organizações, os pareceres das comissões Técnica e de Fiscalização e a deliberação do Conselho. Posteriormente buscou-se analisar este processo e compreender seu significado no contexto do Sistema Descentralizado e Participativo de Assistência Social. OBJETIVOS Identificar o universo de entidades e organizações de assistência social que estão registradas nos Conselhos Municipais de Assistência Social de Toledo, Marechal Cândido Rondon e Cascavel. Analisar o significado do registro das entidades e organizações de assistência social no contexto do Sistema Descentralizado e Participativo de Assistência Social. METODOLOGIA O presente objeto de estudo emergiu das atividades realizadas na disciplina do Núcleo Temático de Seguridade Social nos anos letivos de 2001 e 2002, no Curso de Serviço Social na UNIOESTE – Campus de Toledo. Ao longo do ano letivo de 2001 as alunas participaram de reuniões do Conselho Municipal de Assistência Social de Toledo – PR. Na participação como ouvintes, observaram que a cada reunião o tema das entidades e organizações era pautado, ou para solicitar registro junto ao CMAS, ou como Parecer das Comissões Técnica e/ou Fiscalização, ou como deliberação do CMAS quanto ao registro. Observaram também que a solicitação não era proveniente apenas de entidades e organizações de assistência social, houve a solicitação da área de educação. Sendo 3 assim este tema foi problematizado em sala de aula buscando-se uma aproximação sistematizada para compreensão deste fato. Através do estudo da Lei Orgânica de Assistência Social – LOAS, Lei nº 8.742, de 07/12/93, no contexto da disciplina, identificou-se que compete ao Conselho Nacional de Assistência Social, conforme artigo 18, incisos III e IV “fixar normas para a concessão de registro e certificado de entidade de fins filantrópicos às entidades privadas prestadoras de serviços e assessoramento de assistência social; conceder atestado de registro e certificado de entidade de fins filantrópicos, na forma do regulamento a ser fixado, observado o disposto no art. 9º desta lei.” Esta competência no âmbito municipal é do Conselho Municipal de Assistência Social, criado em lei específica. Neste sentido o que foi observado no Conselho Municipal de Assistência Social de Toledo se expressa nos demais conselhos municipais. Delimitou-se como área de abrangência o estudo deste processo nos Conselhos Municipais de Toledo, Marechal Cândido Rondon e Cascavel, todos criados no ano de 1995. O critério definido para escolha foi por representarem três municípios de diferentes portes e serem municípios de origem das alunas. A proposta de estudo teve uma dimensão no contexto da formação profissional e também uma dimensão de problematizar junto aos Conselhos este tema. Neste sentido o grupo se propôs a fazer uma Mesa Redonda com a representação dos Conselhos e apresentar os dados levantados. O contato com a presidência dos três conselhos municipais expondo os objetivos do estudo foi feito pela docente da disciplina, solicitando a disponibilização de informações para a coleta de dados. Os três conselhos acolheram a proposta e em 2001 as 18 alunas foram divididas em 3 grupos que foram a campo. O documento coletado foi o Estatuto das entidades registradas nos três CMAS’s. Este material foi tabulado e analisado em grupo. Ao mesmo tempo em sala de aula textos referentes à temática foram estudados. A conclusão desta primeira aproximação coletiva se deu no ano letivo de 2002. No dia 24 de fevereiro de 2003 (final do ano letivo de 2002), o grupo de alunas juntamente com a docente apresentaram os dados aos representantes dos três Conselhos e estes apresentaram como tem realizado o processo de registro das entidades em cada Conselho Municipal através de uma Mesa Redonda aberta ao público interessado. Este 4 evento contou com a participação de 43 pessoas, suscitando o debate sobre a questão e o interesse pelo aprofundamento do estudo. RESULTADOS A base de referência para o estudo do presente objeto foi a Lei Orgânica de Assistência Social – LOAS, Lei nº 8.742, de 07/12/93, que dispõe sobre a organização da assistência social no Brasil e produções existentes que problematizam a temática. Partese da compreensão que a LOAS, para além de uma legislação que deve normatizar relações sociais, carrega em seu conteúdo princípios e diretrizes que caminham na direção da superação de relações sociais que reiteram a subalternidade de seus usuários. Como legislação, traz parâmetros que devem ser observados e uma forma de conceber a operacionalização da Política de Assistência Social em todos os níveis de governo. O artigo 1º define que “A assistência social, direito do cidadão e dever do Estado, é política de seguridade social não contributiva, que provê os mínimos sociais, realizada por meio de um conjunto integrado de ações de iniciativa pública e da sociedade, para garantir o atendimento às necessidades básicas” (BRASIL, 2000). A execução das ações assistenciais podem ser desenvolvidas tanto por iniciativa pública quanto privada. O artigo 3º define que “ Consideram-se entidades e organizações de assistência social aquelas que prestam, sem fins lucrativos, atendimento e assessoramento aos beneficiários abrangidos por esta lei, bem como as que atuam na defesa e garantia de seu direitos.” (BRASIL, 2000). As entidades e organizações de assistência social que desenvolvem ações assistenciais devem ser caracterizadas como sem fins lucrativos. O artigo 6º define que “As ações na área de assistência social serão organizadas em sistema descentralizado e participativo, constituído pelas entidades e organizações de assistência social abrangidas por essa lei, que articule meios, esforços e recursos, e por um conjunto de instâncias deliberativas compostas pelos diversos setores envolvidos na área.” (BRASIL, 2000). O artigo 9º define que “O funcionamento das entidades e organizações de assistência social depende de prévia inscrição no respectivo Conselho Municipal de Assistência Social ou no Conselho de Assistência Social do Distrito Federal conforme o caso.” (BRASIL, 2000). Ainda estabelece no parágrafo 2º e 3º do mesmo artigo que “cabe ao Conselho Municipal de Assistência Social e ao Conselho de Assistência Social do Distrito Federal 5 a fiscalização das entidades referidas no caput na forma prevista em lei ou regulamento; A inscrição da entidade no Conselho Municipal de Assistência Social ou no Conselho de Assistência Social do Distrito Federal, é condição essencial para o encaminhamento de pedido de registro e de certificado de entidade de fins filantrópicos junto ao Conselho Nacional de Assistência Social (CNAS)” (BRASIL, 2000). Diante destes parâmetros legais, compreende-se que está em questão a efetivação da Política de Assistência Social num contexto marcado pela reestruturação produtiva, pela ideologia neoliberal e pela Reforma do Estado, ou no dizer de BEHRING (2002), Contra-Reforma do Estado no Brasil. Política esta prevista legalmente como estratégia de enfrentamento da “questão social” e como garantidora de direitos sociais: “A assistência social realiza-se de forma integrada às políticas setoriais, visando ao enfrentamento da pobreza, à garantia dos mínimos sociais, ao provimento de condições para atender contingências sociais e à universalização dos direitos sociais.” (LOAS, art. 2º, parágrafo único). A contradição posta pela realidade concreta no país leva VIEIRA afirmar que “A política social acha-se no terceiro período de existência no Brasil, depois de 1988, que chamo de política social sem direitos sociais.” (1997, p. 68). È neste contexto marcado pelo movimento de interesses contraditórios e antagônicos próprio da sociedade capitalista na particularidade brasileira, que se situa a luta pela efetivação da Política de Assistência Social como Política de Seguridade Social, direito do cidadão e dever do Estado. "É, portanto, sob o ângulo de interesses diversos, que a questão social da assistência se apresenta, manifestando-se como estratégia de dupla face em que a Assistência como mecanismo de estabilização das relações sociais é a ótica da ação estatal; e, como forma concreta de acesso a bens, recursos, serviços e a um espaço de reconhecimento de seus direitos e de sua cidadania social, é em contrapartida o que buscam os usuários." (YAZBEK, 1995, p. 9). Como espaço público de deliberação, representativo dos diversos segmentos e setores da área em cada nível de governo, os Conselhos de Assistência Social foram criados. O relato dos representantes na Mesa Redonda sobre “O registro das entidades e organizações de assistência social nos Conselhos Municipais de Assistência Social de Toledo, Marechal Cândido Rondon e Cascavel” evidenciou que estes três Conselhos tem desenvolvido esta competência, apresentando graus diferenciados de complexidade e encaminhamento deste tema. 6 Quanto ao universo das entidades e organizações de assistência social registradas, analisou-se os estatutos por município nos seguintes aspectos: quanto à natureza, quanto aos artigos obrigatórios no estatuto e quanto aos destinatários/usuários. O número total de entidades e organizações de assistência registradas nos CMAS’s no ano de 2001 foi de 65, estando assim subdivididas: CMAS de Toledo 23, CMAS de Marechal Cândido Rondon 8, CMAS de Cascavel 34. A seguir tem-se os dados gerais dos aspectos analisados nos estatutos. 1. Quanto à natureza A análise dos estatutos quanto à natureza evidenciou a diversidade de termos utilizados para identificar a pessoa jurídica de direito privado sem fins lucrativos que caracterizam as entidades e organizações registradas nos CMAS’s. O termo mais encontrado foi “Sociedade civil sem fins lucrativos” em 33.9% dos estatutos. Em alguns estatutos não existe referência expressa ao termo sem fins lucrativos mas refere-se a entidade filantrópica ou beneficente. Para identificar sua natureza encontrou-se o termo sociedade civil, sociedade civil de direito privado, entidade civil de direito privado, associação de direito privado, termos semelhantes que evidenciam sua constituição. Todos os 65 estatutos fazem referência a alguma destas formas. 2. Quanto aos destinatários/usuários A análise geral evidenciou a composição apresentada na tabela abaixo: Tabela 01 – Porcentagem dos destinatários das entidades e organizações de assistência social registradas nos Conselhos Municipais de Toledo, Marechal Cândido Rondon e Cascavel Destinatários % Crianças e adolescentes 23,1 Pessoa Portadora de Deficiência 13,8 Pessoa Idosa 9,2 Maternidade 1,5 Família 6,2 Vários Destinatários 32,4 Outros 13,8 Total 100 7 O estudo pode evidenciar que a maioria das entidades e organizações de assistência social registradas nos CMAS’s possui mais de um destinatário específico, isto representa 32,4%. Entre eles incluem-se a maternidade, criança e adolescente, pessoas idosas e família. O maior número de entidades e organizações de assistência social com atendimento específico destina-se às crianças e aos adolescentes, com 23,1%. Os três municípios possuem entidades voltadas para a atenção à pessoa portadora de deficiência porém sem a cobertura dos tipos de deficiência. 3. Quanto aos artigos obrigatórios no Estatuto A legislação específica da área estabelecia que os estatutos devem conter disposições que determinem que a entidade: a) “aplica suas receitas, rendas, rendimentos e o eventual resultado operacional integralmente no território nacional e na manutenção e no desenvolvimento de objetivos institucionais; b) aplica as subvenções e doações recebidas nas finalidades a que estejam vinculdas; c) não distribui resultados, dividendos, bonificações, participações ou parcela do seu patrimônio, sob nenhuma forma; d) não percebem seus diretores, conselheiros, sócios, instituidores, benfeitores ou equivalentes, remuneração, vantagens ou benefícios, direta ou indiretamente, por qualquer forma ou título, em razão das competências, funções ou atividades que lhes sejam atribuídas pelos respectivos atos constitutivos; e) destina, em seus atos constitutivos, em caso de dissolução ou extinção, o eventual patrimônio remanescente será destinado a uma entidade congênere devidamente registrada no Conselho Nacional de Assistencial Social – CNAS ou a uma entidade pública.” (Resolução nº 177, CNAS, 2000) Após análise pode-se evidenciar que 54, 7% dos estatutos possuem os quatro artigos obrigatórios. O restante dos estatutos apresenta a falta de algum item. O item que mais falta mencionar foi o item 01. A análise destes documentos para fins de registro no CMAS é feita via comissão ou secretaria executiva do CMAS. Por ocasião da Mesa Redonda este aspecto foi ponderado manifestando-se a necessidade de maior relevância na análise do CMAS. 8 CONCLUSÕES O presente estudo significou uma primeira aproximação coletiva ao universo das entidades e organizações de assistência social e competências dos Conselhos Municipais de Assistência Social realizada numa atividade da disciplina de Núcleo Temático de Seguridade Social no ano letivo de 2001 e 2002. O processo de aproximação e estudo coletivo trouxe às consciências novas perguntas e necessidade de mais estudos na área. Na relação dinâmica do conhecimento e realidade social, buscou-se delimitar nas condições objetivas de tempo e recursos, um aspecto específico mas que possui em si a complexidade de diferentes determinações ao longo da história. A experiência de efetivar esta atribuição é nova para os Conselhos, como é recente a experiência dos Conselhos Municipais. A aproximação das entidades e organizações de assistência social se deu através de seus estatutos. Fica a demanda por conhecer a execução das ações assistenciais desenvolvidas, a qualidade dos serviços prestados, como garantem os princípios e diretrizes da LOAS, como constituem a rede de proteção social, como relacionam-se com o governo... Enfim, são inúmeras as questões que a aproximação ao objeto de estudo suscitou e indicam a necessidade de continuidade e aprofundamento de pesquisas. A LOAS ao estabelecer que as ações assistenciais podem ser desenvolvidas tanto por iniciativa pública quanto privada abre possibilidades para que tendências liberais, neoliberais e anti-democráticas dêem a direção do processo. Ao mesmo tempo, expressa como diretriz em seu artigo 4º a “primazia da responsabilidade do Estado na condução da política de assistência social em cada esfera de Governo” (BRASIL, 2000). As entidades e organizações de assistência social fazem parte do Sistema Descentralizado e Participativo de Assistência Social. Logo, antes da política de assistência social prescindir da ação governamental, exige cada vez mais sua intervenção. Uma ação governamental democrática, na perspectiva de garantia de direitos, de rompimento com a cultura patrimonialista e fortalecimento do espaço público dos Conselhos Municipais de Assistência Social. É neste contexto que as ações da sociedade civil devem ser fortalecidas e as entidades e organizações de assistência social devem ter sua inserção. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS 9 BEHRING, Elaine Rossetti. A Contra-Reforma do Estado no Brasil. Rio de Janeiro : UFRJ, Tese de Doutorado, 2002. BRASIL. Lei Orgânica da Assistência Social – LOAS. Lei nº 8.742, de 07 de dezembro de 1993. Dispõe sobre a organização da assistência social e dá outras providências. Brasília : Câmara dos Deputados : Centro de Documentação e Informação, 2000. FALEIROS, Vicente de P. Entidades de assistência Social. Relatório Final de consultoria ao Conselho Nacional de Assistência Social sobre regulamentação dos artigos 3º e 9º da LOAS. Brasília, 08 de maio de 1997, mimeo. VIEIRA, Evaldo Amaro. As políticas sociais e os direitos sociais no Brasil: avanços e retrocessos. Revista Serviço Social e Sociedade, nº 53. São Paulo : Cortez, março, 1997. YAZBEK, Maria Carmelita. A política social brasileira nos anos 90: a refilantropização da questão social. Cadernos ABONG. São Paulo : ABONG, outubro, 1995.