EGRÉGIA COMISSÃO DE SINDICÂNCIA DO INSTITUTO DE COMPUTAÇÃO DA UNIVERSIDADE ESTADUAL DE CAMPINAS – UNICAMP NOME COMPLETO, RAXXXXXX, devidamente matriculado e cursando o 6º período do curso de Engenharia de Computação, da Universidade Estadual de Campinas – UNICAMP, vem expor e requerer o que segue: I- PRELIMINARES Preliminarmente este aluno vem protestar pela forma em que este procedimento sumário vem ocorrendo, não observando os princípios gerais do Direito Administrativo, e principalmente os Direitos e Garantias Fundamentais consagrados pela Constituição Federal, como o direito ao contraditório, a ampla defesa e ao devido processo legal. II – DOS FATOS O aluno cursou no primeiro semestre do corrente ano, a disciplina Projeto e Análise de Algoritmos I (MC448) do referido curso, ministrada pelos senhores professores Sr. Júlio Lopez e Sr. Orlando Lee. Durante o curso do semestre, ocorreu o “rodízio” de professores na disciplina, unindo as turmas constantemente devido a ausência alternada de um dos professores, causando transtornos na relação didático-pedagógica, conforme relatado na avaliação semestral do curso. Desta feita, qualquer material disponibilizado pelos docentes era fundamental para a razoável compreensão do conteúdo, no qual os discentes buscavam avidamente auxilio para seu aprendizado. Na aula imediatamente anterior a prova, o ilustre professor Júlio Lopez informou a todos os alunos que haveria uma lista de exercícios em sua área. Ao procurar a lista, os estudantes depararam com um grande volume de arquivos sem permissão de leitura, alguns até com nomes do tipo “prova*”, e somente alguns arquivos com permissão de leitura, dentre eles o tão comentado arquivo, que para os acadêmicos, até então, parecia uma prova antiga, pois nem continha data. Na ausência da lista prometida pelo professor, os estudantes tomaram a suposta prova encontrada como base para os estudos, e como é usual em quase todas as disciplinas consideradas difíceis, alguns alunos se reúnem em grupos para a resolução dos exercícios. No dia 24 de maio, ao receberem a prova, os alunos verificaram que a mesma era idêntica a disponibilizada pelo docente em sua área, deixando-os em dúvida, se essa não seria uma medida compensatória em face das dificuldades encontradas ao longo do processo de aprendizagem, que já havia sido prejudicado pela alternância de docentes. Ainda assim, diversos fatores levaram os alunos a não comunicar o fato ao professor: a) não havia nada que pudesse ser considerado ilegal, já que o arquivo era público; b) o arquivo poderia ter sido disponibilizado propositalmente pelo professor; c) outros professores aplicam provas iguais a de anos anteriores; d) os alunos não são obrigados a zelar e nem a interferir nos métodos avaliativos escolhidos pelo professor; e) receio de atrapalhar o convívio com o resto da turma, devido à exposição e possível pressão dos colegas. Ainda, na aula seguinte os alunos foram avisados pelo professor de uma suposta "fraude", este relatando que havia encontrado uma impressão da mesma feita por um aluno. Imediatamente após este comunicado, um grupo de alunos foi escolhido para representar a turma e foi até o professor para contar que não apenas um, mas praticamente todos os alunos da disciplina tiveram acesso ao arquivo com a suposta prova, e que não houve nenhuma intenção de burlar ou lubridiar o referido professor. Ficou acertado então, que devido ao equívoco do professor , outra prova seria realizada e o caso seria encerrado. Mas, para surpresa de todo o corpo discente, a representação discente foi informada pelo diretor do Instituto que dez alunos seriam punidos simplesmente pelo fato de “não terem avisado ao professor que haviam visto a prova,” mesmo após os esclarecimentos dos fatos selecionados, o que causou grande decepção e revolta entre os alunos. Mesmo antes de serem informados dos dez escolhidos para receberem uma punição, grande parte dos alunos que tiveram acesso à prova assinaram um termo assumindo o fato de terem visto o arquivo previamente. Os alunos decidiram por entregar os termos assinados ao diretor, sendo que ele não os recebeu, assim os termos foram entregues a coordenadora de Graduação. Esta recusa do diretor reforçou a idéia de punição exemplar, o que ainda causa temor nos alunos. Mesmo após a entrega das cartas, esta comissão agora instaurada decidiu por ignorar o fato de que os outros alunos assumiram também estar na mesma situação, e iniciou a investigação restrita a estes dez alunos. III - DA INEXISTÊNCIA DE ACUSAÇÃO FORMAL Até o presente momento, os alunos supostamente acusados, sequer receberam qualquer tipo de comunicado formal especificando a acusação que lhes é atribuída, ou qualquer sinalização por parte desta egrégia comissão acerca do dispositivo normativo infringido pelos estudantes. O comunicado que convoca os estudantes para prestar “depoimento” fundamenta-se na acusação de violação do artigo 227 do regimento geral da Universidade, o qual não é tipificado pelo fato descrito pela direção. Tal ausência de acusação contraria os preceitos fundamentais de qualquer processo que realmente busque a verdade absoluta, impossibilitando que os “supostos acusados” possam exercer o seu direito de defesa. A Constituição Federal preceitua em seu artigo 5º , LV, que aos acusados em geral são assegurados o contraditório e a ampla defesa, devendo portanto para tal, conhecer a acusação que lhes é imputada, para assim poder contrariá-la. IV – DA AUSÊNCIA DE PREVISÃO LEGAL DA ACUSAÇÃO Em momento algum, a direção do Instituto, ou esta egrégia comissão fundamentou a acusação em qualquer dispositivo normativo da Universidade, ou da legislação vigente, uma vez que o fato descrito na acusação não corresponde com qualquer dispositivo do artigo 227 do regimento geral. Apenas entendeu o nobre diretor do Instituto, que existiu um desvio ético por parte dos alunos, e que estes deveriam ser punidos pela sua conduta “antiética” e que esta conduzia a uma fraude, que ele mesmo não sabia tipificar em qualquer norma vigente. Portanto, inexistindo previsão legal acerca da acusação formulada, não poderá existir punição. Esta garantia está sacramentada não somente em nossa Constituição Federal, mas principalmente na Declaração Universal dos Direitos Humanos, e garante a segurança jurídica em nossa sociedade. V - DA ACUSAÇÃO DE DESVIO ÉTICO Ora, nobres membros desta comissão! O debate que está sendo pautado aqui não está calcado em qualquer ordenamento jurídico ou normativo em geral, mas sim no plano dos valores éticos que devem permear esta instituição, os quais não podem ser simplesmente reduzidos a um processo disciplinar. Para averiguar se existiu ou não o desvio ético por parte dos alunos é importante debater esta questão em separado, e trazendo para tanto especialistas que poderiam com propriedade fazer uma avaliação acerca do comportamento ético não só dos alunos, mas do corpo docente e diretivo deste instituto no tratamento da questão. Importante ressaltar que o nobre diretor deste instituto havia já sentenciado de próprio punho a punição de quinze dias de suspensão sem sequer ouvir os alunos ou garantir qualquer procedimento de defesa, e que o mesmo só voltou atrás devido à pressão do corpo discente que se indignou diante de tamanha arbitrariedade. Será que neste ato, o diretor agiu eticamente em relação a função e a responsabilidade a que lhe é atribuída pela sociedade brasileira, na direção de um dos mais respeitáveis institutos de computação do país? Portanto nobres julgadores, é importante avançarmos no debate ético para tirarmos algumas conclusões, e que mesmo assim não permitem que qualquer tipo de punição seja aplicada. Segundo um professor estudioso do tema no Instituto de Filosofia e Ciências Humanas (IFCH) da Unicamp, vale lembrar que a questão ética só surge quando a resposta obtida na esfera jurídica for insuficiente ou lacunar, mas é preciso que primeiro a voz do direito seja ouvida. Segundo a definição da Wikipedia (http://pt.wikipedia.org/): “Ética é um ramo da filosofia, e um sub-ramo da Axiologia, que estuda a natureza do que consideramos bem, adequado e moralmente correto. Ética é um termo genérico que designa aquilo que é freqüentemente descrito como a "ciência da moralidade". Em filosofia, o comportamento ético é aquele que é "bom". Esta é uma das três áreas tradicionais de investigação da filosofia, ao lado da metafísica e da lógica. “The goal of a theory of ethics is to determine what is good, both for the individual and for the society as a whole. Philosophers have taken different positions in defining what is good, on how to deal with conflicting priorities of individuals versus the whole, over the universality of ethical principles versus "situation ethics" in which what is right depends upon the circumstances rather than on some general law, and over whether goodness is determined by the results of the action or the means by which results are achieved.' (Jennifer P. Tanabe, Contemplating Unification Thought)”. Tradução da citação: "O objetivo de uma teoria da ética é determinar o que é bom, tanto para o indivíduo como para a sociedade como um todo. Os filósofos adotaram diversas posições na definição do que é bom, sobre como lidar com as prioridades em conflito dos indivíduos vs. o todo, sobre a universalidade dos princípios éticos vs. a "ética de situação", na qual o que está certo depende das circunstâncias e não de uma qualquer lei geral, e sobre se a bondade é determinada pelos resultados da ação ou pelos meios pelos quais os resultados são alcançados."” E é isso que esta nobre comissão deve fazer, perceber a real intenção de cada um dos envolvidos na situação, e verificarmos se existiu alguma conduta antiética, mas que mesmo assim não deve ser passível de punição, mas sim para que seja estabelecido um processo de reflexão acerca dos rumos do Instituto de Computação da UNICAMP. Será que os alunos do instituto, orientados pelo professor da disciplina, ao adentrarem em um espaço permitido, tiveram acesso a um conteúdo previamente comunicado de sua disponibilização, estudam a exaustão o mesmo, e são surpreendidos pela idêntica verificação de aprendizagem por parte do professor devem ser punidos? O que esperar da continuidade da relação pedagógica entre o corpo discente e docente a partir deste grave equívoco? VI- DA AUSÊNCIA DE DOLO E CULPA NO ACESSO AOS ARQUIVOS A) Da obtenção do arquivo: Os alunos não cometeram ato infracionário ao terem obtido acesso ao arquivo com o texto da prova, pois o mesmo estava com permissão de leitura, como consta da própria carta dos docentes Julio C. López Hernández e Orlando Lee ao presidente da comissão diretora de informática do Instituto de Computação da Unicamp, Prof. Dr. Guido Costa Souza de Araújo: "(...) Para esclarecimento, eu havia deixado no diretório principal da minha própria conta os arquivos “tt2.ps” "tt2.pdf", “tl2.ps””, "tl2.pdf" que correspondem à prova. (...) O fato é que as permissões de leitura de meu diretório e desses arquivos possibilitavam a qualquer pessoa com uma conta na rede a acessá-los." Portando não foi violada nenhuma regra por parte dos alunos ao acessar este arquivo, uma vez que era público. Ainda, como já foi exposto, os alunos foram avisados pelo professor na aula que antecedia a avaliação que este deixaria uma lista de exercícios em sua área, local onde se encontrava o arquivo com a prova. B) Da Ausência de culpa ou dolo Como os arquivos foram disponibilizados pelo Sr. professor, e o mesmo anteriormente havia orientado a busca do referido material, não se pode falar em culpa ou dolo por parte dos estudantes. Ainda assim é importante ressaltar o que diz o artigo 56, inciso VIII, do capítulo V da RESOLUÇÃO GR Nº 5, de 17-01-2005 da CGI da UNICAMP: VIII Responsável pela custódia do dado: agente da Unicamp a quem foi delegado a responsabilidade por uma parte dos dados em nome da Unicamp, com o objetivo de garantir a sua integridade e precisão, com as seguintes responsabilidades: (...) b) identificar e documentar a quem é permitido o acesso ao dado e o nível de acesso; c) autorizar acesso aos dados; d) especificar os requisitos de segurança de acesso; e) estabelecer procedimentos para a obtenção de autorização para acesso aos dados; (...) g) garantir através de procedimentos que o dado seja captado e utilizado de forma adequada. Assim fica cristalino para esta egrégia comissão que não dependia dos estudantes o acesso aos arquivos, nem tampouco a liberação do conteúdo de qualquer arquivo de responsabilidade do professor. Importante ressaltar ainda que o próprio relatório apresentado pela acusação comprova que não ocorreu violação dos arquivos do professor. C) Da inexistência de distribuição do contéudo do arquivo A acusação de distribuição do conhecimento prévio do conteúdo da prova não pode ser aplicada aos estudantes, uma vez que apenas o log de acesso ao arquivo em questão, através da verificação do .bash_history (log que armazena os últimos comandos digitados em linha de comando em um terminal), não consiste em matéria de prova suficientes para garantir que existe precisamente um autor da distribuição dos arquivos, e quem poderia ser especificamente. Diversos alunos possuem o costume de corriqueiramente apagarem seus .bash_history, por vários motivos dentre os quais podem ser destacados, por exemplo na “sindicância dos jogos” em 2003, vários alunos tiveram sua privacidade violada tendo seus .bash_history lidos por máquinas ou administradores da rede para verificar e buscar provas contra os alunos. Naquela época, alguns grupos de alunos se reuniram e achando aquele ato invasivo e contra o direito de privacidade, ensinaram métodos para encriptar dados e excluir todo o conteúdo do .bash_history, impedindo tal violação de privacidade. Logo, vários alunos não possuem log de sistema e podem ter pego a prova e a busca dos logs não os encontrou, além disto existem outros modos de navegar pelas áreas em modo gráfico que não guardam logs tais como utilizar o Windows Explorer, Konqueror ou Nautilus sendo assim não há vias de nos mostrar como responsáveis pela distribuição da prova, que poderia ter sido feita por qualquer pessoa com acesso a rede de computadores do Instituto de Computação. Associado a isso, grande parte dos alunos assumiram, ao entregarem uma carta de declaração, terem visto previamente a prova, seja em formato digital, seja em formato impresso, o que generaliza o acesso ao arquivo a todos. VII- DA NULIDADE DAS PROVAS DA ACUSAÇÃO A Constituição Federal preceitua em seu artigo 5o , a inviolabilidade da intimidade, a vida privada, o sigilo de correspondência, de dados, salvo, em último caso, por ordem judicial. No mesmo sentido o artigo 4º, inciso V do capítulo I, da resolução GR Nº 5, de 17-01-2005 determina: Artigo 4º - A Unicamp caracteriza como não ético e inaceitável e considera como motivo de ação disciplinar prevista em seus estatutos qualquer atividade através da qual um indivíduo: V. Sem autorização, invade a privacidade de indivíduos ou entidades que são autores, criadores, usuários ou responsáveis pelos recursos computacionais. E o artigo 54 do capítulo IV da mesma resolução: Artigo 54 - As mensagens eletrônicas ou arquivos de computador somente serão acessados com a permissão do remetente ou destinatário da mensagem ou do dono do arquivo, salvo por ordem judicial. A acusação foi baseada fundamentalmente nas provas produzidas pela abertura e leitura de arquivos pessoais sem permissão de leitura, e que a direção deste instituto determinou a abertura e leitura dos mesmos, contrariando disposição normativa expressa da Universidade e da Constituição Federal. Desta feita, a direção do instituto baseou sua acusação em provas produzidas de forma ilícita, prejudicando toda e qualquer agurmentação baseada nas mesmas. Para ser válido, o ato processual deve ser praticado de conformidade com o paradigma legal. Não sendo, torna-se, evidentemente atípico, e quando a atipicidade sofre sançao da ineficácia, o ato se diz nulo. A Constituição Federal, em seu artigo 5o, LVI, determina que serão inadmissíveis no processo, as provas obtidas por meios ilícitos. Portanto as provas referidas não devem, e não podem ser levadas em consideração por essa egrégia comissão, sendo assim nula a acusação da diretoria do Instituto. VII- DOS DANOS IRREPARÁVEIS DA PUNIÇÃO ARBITRÁRIA E ILEGAL Mesmo com tudo o que já foi explicitado, das disposições contrárias a Constituição Federal, os Direitos e Garantias Individuais sendo transigidos, da nulidade das provas apresentadas pela acusação e da inexistência de qualquer desvio de conduta ética, esta egrégia comissão venha decidir pela punição dos estudantes, é importante ressaltar as consequências e os danos irreparáveis da absurda e arbitrária punição: a) Do prejuízo para currículo acadêmico Caso os acadêmicos sejam punidos, ressaltando a injustiça que será cometida, os mesmos poderão sofrer restrições em futuras participações em processo seletivos de iniciação científica, pós-graduação e na busca por uma colocação no mercado profissional, uma vez que tal absurda punição constará no histórico escolar do acadêmico. b) Da reparação de danos causados por eventual punição arbitrária Caso a hipotética, e absurda punição seja determinada, é importante ressaltar que pelos motivos de direito e de fato que já foram expostos, e de acordo com o artigo 5o, X, da Constituição Federal, qualquer punição arbitrária será passivel de ação de indenização e de reparação de danos morais e materiais, contra quem proferiu determinada sanção. VIII- DOS PEDIDOS 1) Que a presente sindicância seja declarada nula, isentando de responsabilidade qualquer acadêmico das acusações infundadas. 2) Que desde já solicita todos os meios de prova admitidos em direito, e principalmente pelo depoimento do Sr.Professor Julio Lopez 3) A apresentação posterior do rol de testemunhas 4) E que por fim sejam deferidos todos os pedidos e que efetivamente seja feita a verdadeira JUSTIÇA! Termos em que, Pede deferimento Campinas, 12 de agosto de 2005 Nome Completo