ALUNOS ACTORES Ana Sampaio, Bernardo Chatillon, Catarina Ribeiro, Cátia Tomé, Joana Messias, João André, João Dantas, Jorge Albuquerque, Jorge Neto, Lita Pedreira, Miguel Nunes, Rita Morais, Ruben Dias, Sofia Sá, Susana Pereira ALUNOS DESIGN DE CENA Francisco Silva e Marta Neto ALUNOS DRAMATURGIA Ana Lopes, Ivo Saraiva e Silva, Miguel Curiel ALUNOS PRODUÇÃO Alexandre Gomes Ferreira, Ana Vitorino, Fabio André, Filipa Romeu, Sara Daugbjerg, Sara Garrinhas, Sara Fernandes PROFESSORES RESPONSÁVEIS INTERPRETAÇÃO: Pedro Matos DESIGN DE CENA: José Espada DRAMATURGIA: David Antunes PRODUÇÃO: Marisa F. Falcón CORPO: Howard Sonenklar VOZ: Elsa Braga MÚSICA E ESPAÇO ACÚSTICO: António Neves da Silva GABINETE DE PRODUÇÃO DEPARTAMENTO DE TEATRO Pedro Azevedo, Conceição Alves Costa e Rute Reis MESTRA DO GUARDA-ROUPA Olga Amorim AGRADECIMENTOS À Directora do Museu do Palácio Nacional da Ajuda, Dr.ª Isabel Silveira Godinho, à Dr.ª Maria João Burnay e aos restantes colaboradores do Museu do Palácio Nacional da Ajuda por nos terem acolhido tão bem na sua casa, e ainda à Casa Serras, ao Teatro da Garagem e à Ligações. ROTEIRO DE CENAS E PERSONAGENS NOS ESPAÇOS DO PALÁCIO ANTÍGONA NA AJUDA O Tempo, o Tempo, meu amigo Semeia a destruição por toda a parte, é invencível. Só os deuses têm uma vida eterna e imortal; Tudo o resto tem de perecer… A moral não é constante de amigo para amigo, De cidade para cidade; muda, mais cedo ou mais tarde; A alegria transforma-se em tristeza e esta de novo em alegria * Quando apresentamos a tragédia de Sófocles neste lugar, entramos em estado de espírito dramático. Somos convocados a estar, a um só tempo, em Lisboa e em Tebas, simultaneamente na casa dos Bragança e na casa dos Labdácidas. Em movimento no mesmo lugar. Na sua longa história, o Palácio esteve sempre em construção. Basta olhar do pátio interior em direcção à calçada da Ajuda para o ver, ali mesmo, inacabado. Existe apenas a fachada exterior do que se imaginou que se iria construir, sendo o edifício rompido e atravessado pela estrada, que segue em direcção ao Monsanto. (Por aí entrará em cena o Rei de Tebas, Creonte.) Nas derradeiras cinco décadas da monarquia foi o centro do governo do nosso país. Aqui se reunia o Conselho de Estado e aqui foi a residência oficial da família real portuguesa desde o reinado de D. Luís I até à implantação da República em 1910. Coexistem no interior do museu os aposentos privados com as salas de recepção e das cerimónias de estado. O privado coabita com o público. (Antígona e Ismena encontram-se na sala dos Archeiros. Entretanto, na Sala Grande de Espera, aguarda-se o discurso de inauguração do Rei.). O Palácio Real dos Bragança foi encerrado quando, com um banho de sangue, terminou uma etapa para o país. O governo é coisa dos homens e tão perene como eles. Reaberto como museu, para além de testemunho de uma época e das importantes colecções que integra, o Palácio tem sido, por tradição, lugar para inúmeras cerimónias de Estado. A tomada de posse dos ministros do nosso governo actual teve lugar na Sala dos Embaixadores (Aqui Antígona, com a cidade como testemunha, é condenada pelo rei. Aqui uma irmã perde a sua irmã.). Numa Tebas renascida efemeramente na Ajuda chega um novo ciclo de poder. Rei morto rei posto, surge Creonte, repondo a ordem na cidade. Mas uma só acção de Antígona vai abalar o seu palácio, que também ficará por concluir. SOB A ABÓBADA EXTERIOR EPINÍCIO (Párodo): CORO Bernardo Chatillon, Jorge Neto e Susana Pereira. NA SALA DOS ARCHEIROS 1ºDIÁLOGO DAS IRMÃS (Prólogo): ANTÍGONA Olívia Martins; ISMENA Cátia Tomé. NA SALA DO REPOSTEIRO 1ºDIÁLOGO DAS IRMÃS (Prólogo): ANTÍGONA Joana Messias; ISMENA Catarina Ribeiro. NA SALA GRANDE DE ESPERA CREONTE REVELA A SUA LEI (1º Episódio): CREONTE André Fernandes; CORO Rita Morais e Ruben Dias. ÉDITO QUEBRADO (1º Episódio): os mesmos e GUARDA João Dantas. EM PERCURSO PELO PALÁCIO MUITOS PRODÍGIOS HÁ PORÉM NENHUM MAIOR DO QUE O HOMEM (1º Estásimo): CORO Rita Morais e Ruben Dias. NA SALA DOS EMBAIXADORES O GUARDA DESCREVE A ACÇÃO DE ANTÍGONA (2º Episódio): GUARDA João Dantas, ANTÍGONA Ana Sampaio; CREONTE Miguel Nunes; ISMENA Cátia Tomé; CORO Jorge Albuquerque e Sofia Sá. ANTÍGONA É INTERROGADA POR CREONTE (2º Episódio): os mesmos. 2º DIÁLOGO DAS IRMÃS (2º Episódio): os mesmos. FELIZ QUEM PASSA A VIDA SEM PROVAR A DESGRAÇA (2º Estásimo): CORO Jorge Albuquerque e Sofia Sá. PAI TIRANO (3º Episódio): CREONTE Bernardo Chatillon; HÉMON Jorge Neto; CORO Catarina Ribeiro, Cátia Tomé, Lita Martins e Joana Messias. NA ANTIGA CAPELA EROS (3º Estásimo): CORO Catarina Ribeiro, Cátia Tomé, Olívia Martins e Joana Messias. CORTEJO FÚNEBRE E NUPCIAL (4º Episódio): ANTÍGONA Susana. EMPAREDADOS (4º Estásimo): CORO André Fernandes e João Dantas. TIRÉSIAS (5º Episódio): CREONTE Ruben Dias; TIRÉSIAS Rita Morais; CORO Ana Sampaio e Miguel Nunes. MUDANÇA DA RESOLUÇÃO (5º Episódio): os mesmos. MENSAGEIRA (ANJO) (Êxodo): MENSAGEIRA Sofia Sá; CREONTE Miguel Nunes; CORO Ana Sampaio e Miguel Nunes. LAMENTAÇÃO DE CREONTE (Êxodo): os mesmos. sentar, não só aos colegas mais próximos, mas a toda a comunidade escolar, não apenas um relato das nossas experiências, mas a abordagem de um texto fundador. A responsabilidade cresceu, a vontade apurou-se e a Escola sentimo-la cada vez mais nossa, também. Para isso, muito contribuíram as aulas em que as improvisações dos actores descobriram novos espaços, invadindo os comuns e estimulando outras comunicações. Também os nossos encontros, para além do contexto lectivo, mas partindo dele, foram ajudando a amizade a desenhar esboços, tracejados sem barreiras. Amor também temos, e em linhas direitas, bem definidas. Segredos? É inevitável. Ainda assim, aceitamos e respeitamos as nossas diferenças pessoais e trabalhamos para o bem comum deste colectivo. Deste colectivo nosso, e a partir de Antígona, no Palácio da Ajuda, também do colectivo Escola Superior de Teatro e Cinema! ANA LOPES IVO SARAIVA E SILVA MIGUEL CURIEL Com a sala de aula às costas, namorámos duas heranças vivas nesta Oficina Comum: Antígona e O Museu do Palácio Nacional da Ajuda. Quisemos participar enquanto fazedores de teatro num diálogo civilizacional. São sempre sábias as palavras do Coro na peça hoje representada. Manifestam uma compreensão profunda dos homens e dos seus assuntos. Mas sobretudo toca-nos uma certa reverência solidária com que encaram os nossos limites, como revelam o nosso mistério. Para dramatizar o coro do 1º Estásimo, o tal do Muitos prodígios há porém nenhum maior que o homem, optámos por dizê-lo, vezes e vezes sem conta, deixando-o ecoar enquanto o público percorre um trajecto que atravessa o museu. Dentro e fora de cena procurámos, todos, que o nosso trabalho ressoasse no interior das paredes de uma casa que tão gentilmente nos recebeu e marcou. Entre ti e Tebas o céu está límpido; mas o Tempo Tem muitos dias e noites para percorrer No seu curso incontável… Surgirá uma ruptura e a ponta da espada Acabará com a harmonia deste dia. … Se isto não acontecer, Zeus não é Zeus, e Apolo não é verdadeiro! * * Fala de Édipo, em Édipo em Colono de Sófocles. Ajuda, 25 de Janeiro 2010 PEDRO MATOS O ESPAÇO DO TEMPO A unidade curricular “Oficina Comum”, inscrita no primeiro semestre do primeiro ano do Curso de Licenciatura em Teatro da Escola Superior de Teatro e Cinema (ESTC), culmina com a apresentação de um exercício teatral baseado na leitura, análise, e (re)interpretação de texto(s) dramáticos da Antiguidade Grega - berço do teatro e civilização ocidentais. A revisitação destes temas históricos à luz da nossa contemporaneidade ocorre, de forma que julgamos pertinente, em articulação com vários museus da capital - sobretudo aqueles que resultam do protocolo celebrado em 2005 entre a ESTC e o Instituto Português de Museus para este efeito. Desta forma, o Museu Nacional de Arqueologia, Museu Colecção Berardo, Museu Nacional do Teatro, Museu Nacional do Traje, Museu Nacional de Arte Antiga, Museu do Chiado, Museu Colecção Berardo, Museu dos Coches e o Museu da Cidade já foram palco de apresentações de versões cénicas de “As Bacantes”, “Agamémnon”, “As Erínias”, “Sete contra Tebas”, “Prometeu” , “Electra”, entre outros. Os objectivos pedagógicos destes exercícios inscrevem-se no espírito de uma iniciação à prática teatral, aqui entendida não só como actividade artística mas principalmente como experiência de uma ética colectiva de trabalho que, desejavelmente, possa ultrapassar os limites da sala de aula e advir cidadania. Desta vez, é nas instalações do soberbo Museu do Palácio Nacional da Ajuda que se intersectam imaginários e expectativas; no exterior do edifício, a arquitectura neoclássica parece acolher naturalmente as primeiras falas de “Antígona”e ocorre-nos que a fachada inacabada poderia quase ser a scenae frons de um teatro romano (inspirado, por sua vez, no teatro grego...). Também não pudemos ficar indiferentes ao forte simbolismo do edifício na sua tradicional relação com o poder - tornava-o um palco maior para convocarmos Antígona e melhor compreendermos a dimensão desta apaixonante personagem que nos antecipa e ultrapassa... A nossa Antígona não podia deixar de desenrolar-se neste palácio (morada do seu tio, o rei Creonte), numa operação que, em determinada altura, formulámos como “sobreposição do Palácio de Tebas e do Palácio da Ajuda”. Este foi o mote para a generalidade das opções de implantação cénica e de intervenção e selecção plásticas; paralelamente, as opções de design de cena procuraram acompanhar e servir duas outras tendências dramatúrgicas particulares surgidas ao longo do nosso processo de trabalho: a fragmentação do coro em personagens e a progressiva onirização dos acontecimentos. Assim como os actores se apropriam das palavras, existe uma apropriação do espaço a realizar: procurámos ser mais do que os inquilinos temporários que de facto somos, procuramos merecer ambas as heranças, as de Antígona e as do Museu do Palácio Nacional da Ajuda. JOSÉ ESPADA O TEXTO E O CONTEXTO “Quanto mais vale prudência do que riqueza?” Antígona (v. 1050) Da Grécia Antiga chegaram até nós delicados pedaços de histórias de famílias e cidades, guerras e paz, heróis e legados. Antígona, de Sófocles, é um desses legados, e o tragediógrafo, também cidadão activo na polis de Péricles, é pioneiro ao apresentar uma mulher como protagonista. Reportando-nos a 442 a.C., ano (mais consensual) de apresentação da peça, e pensando na condição da mulher na altura, este dado reveste-se de acrescido valor simbólico, ainda que a nós, hoje, nos pareça coisa de pouca monta. Na verdade, porém, as questões, para as quais Antígona remete, vão bem para além deste detalhe... A peça tem início no rescaldo da guerra dos sete generais Argivos contra as sete portas de Tebas, mantendo-se incólume a cidade. No entanto, os quatro filhos da relação incestuosa de Édipo e Jocasta seguem a tradição da família real a que pertencem e motivam uma nova onda de desgraças. Os dois irmãos morrem em fratricídio, numa das portas daquela cidade. Creonte assume o poder e decide que só Etéocles merece as devidas honras fúnebres, Polinices, que morrera na qualidade de invasor, deveria ficar insepulto e sujeito à voragem de aves e cães. É vontade dos deuses, no entanto, que qualquer cadáver deva ser devidamente preparado e honrado para percorrer o caminho até ao Hades, o reino dos mortos. Antígona decide, por isso, quebrar o édito proclamado e dar sepultura ao irmão. Apanhada em flagrante, é levada à presença de Creonte e confessa o crime sem mostrar arrependimento, antes se vangloriando desta nobre acção. De pronto, Creonte decide pela sua condenação, não à morte, por se prever divina maldição para a cidade, mas ao emparedamento. Antígona não hesita em optar pelas leis dos deuses, pois como ela diz a Creonte: “Não foi um escravo que morreu, foi um irmão”. Creonte, representando o poder da cidade, age em conformidade com o édito estabelecido, evitando que a sua autoridade fosse posta em causa, se agisse de outra forma face à acção da sua sobrinha. O Coro acompanha todo o enredo e comenta o que vai acontecendo, mas, a certa altura, mais do que um cuidadoso súbdito conselheiro de Creonte, assume-se como amplificador da voz de Tirésias, a visão que vem lembrar a prudência, mais concretamente, a phronesis, a sabedoria prática, a capacidade para actualizar o saber decidir e agir, numa circunstância especialmente difícil e diferente. Ou seja, as posteriores consequências dos erros de Creonte seriam evitáveis se ele possuísse a tal competência fronética, mas aos heróis trágicos não é dado possuir tal faculdade. No entanto, se os que regem as leis, hoje, ouvissem Sófocles, decerto trágicos erros evitariam... No contexto da Oficina Comum, começámos por nos conhecer enquanto grupo, fomos convidados a procurar o teatro no seu estado mais puro, olhando a cidade. Depois trocámos esta experiência com a outra metade da turma e assim assinalámos o início de uma nova etapa. Cada ramo do curso assumiu as respectivas funções para o trabalho que agora vimos apre-