PRÓ-REITORIA DE GRADUAÇÃO TRABALHO DE CONCLUSÃO DE CURSO Direito Crime Organizado e a Segurança Nacional (Facções Criminosas invertendo equações) Autora: Fabíula Alves Bezerra Orientadora: Profª. Drª. Arinda Fernandes FABÍULA ALVES BEZERRA Crime organizado e a Segurança Nacional (Facções criminosas invertendo equações) Monografia apresentada à Banca examinadora da Universidade Católica de Brasília como exigência parcial para obtenção do grau de bacharelado em Direito. Orientação: Profª. Drª. Arinda Fernandes Taguatinga 2009 Bezerra, Fabíula Alves Crime Organizado e a Segurança Nacional – Facções Criminosas invertendo equações/ Fabíula Alves Bezerra. 11 de maio de 2009. Paginação: __ Monografia Universidade Católica de Brasília. Data: 11 de maio de 2009 Orientação: Profª. Drª. Arinda Fernandes CDU Classificação Trabalho de autoria de Fabíula Alves Bezerra, intitulado “Crime Organizado e a Segurança Nacional – Facções Criminosas invertendo equações”, apresentado como requisito parcial para obtenção do grau de bacharelado em Direito, defendida e aprovada, em ____/____/____, pela banca examinadora constituída por: __________________________________________ Orientador: Profª. Drª. Arinda Fernandes Universidade Católica de Brasília __________________________________________ Integrante: Professor Universidade Católica de Brasília __________________________________________ Integrante: Professor Universidade Católica de Brasília Taguatinga 2009 AGRADECIMENTOS A Deus, autor e consumador da minha fé. Tudo que tenho, tudo que sou e o que vier a ser vem de Ti e é teu Senhor. Aos meu pais, por acreditar que cada busca no ponto de ônibus em noites estreladas ou em noites de chuva, que cada investimento na compra de livros, passes estudantis, mensalidades era porque hoje esse sonho se tornaria real. Obrigada porque fizeram de suas vidas a minha e que com muito suor, muita luta, muitas adversidades na vida foi para que eu pudesse ser a pessoa que sou. Não tenho palavras para agradecê-los pelo caráter, humildade, simplicidade e dignidade que conduziram a minha educação. Sempre me orgulhei de vocês e hoje espero estar dando um mínimo retorno diante de tudo o que vocês merecem receber. Vocês acreditaram e hoje eu espero estar fazendo valer a pena. Aos meus seletos amigos pela torcida e por acreditarem que um dia eu chegaria onde estou. Obrigada porque entenderam que todos os “não’s” que proferi quando me convidaram para sair foi para que hoje esse sonho se realizasse. Ao amigo acadêmico Cristiano Alves, companheiro inseparável nos estudos. Obrigada porque todas as vezes que o desespero aproximava-se ali estava você para me dizer: “calma Fabíula, vai dar tudo certo!” (e não é que no fim dava tudo certo mesmo!). Juntos, conseguimos superar os momentos difíceis! Chegamos! Valeu à pena! Adeus ao sofá da biblioteca! À turma de formandos do Campus III, permanecemos juntos até o fim. Hoje somos a primeira turma de formandos do Campus III. Tantas lutas passamos, tantas reivindicações por um local de estudo cada vez melhor, tantas raivas, mas também tantas alegrias. E aqui estamos com nosso trabalho de conclusão de curso pronto. Obrigada pelos 5 anos de convivência, obrigada por terem somado em minha vida, obrigada por terem sido a força quando o desânimo tentou aproximar-se. Carregarei para sempre todos os momentos que passei com vocês em minha vida universitária. A saudade já aperta o peito quando penso que não mais encontrarei com vocês todas as noites para rirmos, conversarmos, tirarmos fotos na hora da aula e principalmente, somar conhecimentos e experiências como profissionais e pessoas. Além de colegas de profissão fiz bons e eternos amigos! À Professora Drª. Arinda Fernandes, especialmente, que desde o início do Curso, com sua experiência, capacidade, conhecimento e inteligência ímpares fez nascer em mim a vontade de conhecer mais sobre a área Penal e especialmente sobre a Criminalidade Organizada, assunto que domina sobremaneira. Obrigada pelo apoio, pela atenção dispensada principalmente nos dois últimos semestres do curso e acima de tudo por não ter se limitado a ser somente professora, porém amiga! Espero que este trabalho seja digno de vocês. “O governo da demagogia não passa disso: o governo do medo.” (Rui Barbosa) “Para o triunfo do mal só é preciso que os bons homens não façam nada”. (Edmund Burke) Tudo que tenho, tudo que sou e o que vier a ser vem de Ti e é teu Senhor. Minha especial dedicatória ao meu Deus forte que sem a Sua graça eu jamais chegaria onde estou, pois Ele me deu os melhores pais que foram meus melhores e primeiros professores, pois me conduziram a uma vida íntegra e honesta para que eu pudesse ser a pessoa que sou hoje. E Ele durante os 5 anos de academia me presenteou com vários mestres, muitos se limitaram a serem somente professores, outros mostraram-se além de educadores, amigos! Em especial a professora Drª. Arinda Fernandes que com um amor de mãe e um profissionalismo sem igual foi uma das responsáveis pela conclusão deste trabalho. RESUMO BEZERRA, Fabíula Alves. Crime Organizado e a Segurança Nacional – Facções Criminosas invertendo equações. 2009, XX pag. Trabalho de conclusão de curso (graduação) – Faculdade de Direito, Universidade Católica de Brasília. Este trabalho discorrerá sobre o Crime Organizado e seu reflexo na Segurança Nacional. Seu objetivo é mostrar o forte impacto que os grupos criminosos estão exercendo na Sociedade Brasileira, a demonstração de poder das facções criminosas em detrimento do poder do Estado diante da Segurança Nacional. Procurou-se trazer à baila os mecanismos, as experiências, a audácia, a inteligência e o poder crescente que tem levado a criação de um Estado Paralelo, além da origem e história do objeto em análise. Para a consecução deste trabalho, apoiou-se em relatos das principais organizações criminosas no Brasil bem como pesquisas do tema por repórteres e estudiosos do assunto. Palavras-chave: Crime Organizado, Segurança Nacional, Estado, Facções Criminosas LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS ABREVIATURAS art. por artigo SIGLAS PCC – Primeiro Comando da Capital CV – Comando Vermelho ONU – Organização das Nações Unidas UNODC - Escritório das Nações Unidas sobre Drogas e Crime LSN – Lei da Segurança Nacional ALN - Aliança Libertadora Nacional CP – Código Penal CJVC – Comando Jovem Vermelho da Criminalidade CRBC – Comando Revolucionário Brasileiro da Criminalidade SUMÁRIO INTRODUÇÃO .................................................................................................................... 12 Capítulo 1 - Crime organizado ....................................................................................... 14 1.1. Conceitos e características ..................................................................14 1.2. Origens do Crime Organizado..............................................................16 1.3. Principais Organizações Criminosas no mundo ................................17 1.3.1. Tríades Chinesa..........................................................................................17 1.3.2. Yakusa Japonesa........................................................................................17 1.3.3. Máfias italianas ...........................................................................................18 1.4. 1.4.1. 1.4.2. 1.4.3. 1.4.4. Principais Organizações Criminosas no Brasil ..................................18 Comando Vermelho (Falange Vermelha)....................................................18 Primeiro Comando da Capital (PCC) ..........................................................23 Terceiro Comando ......................................................................................30 União CV e PCC .........................................................................................31 Capítulo 2 - A Segurança Nacional e a Segurança Pública.......................................... 33 2.1. Segurança Nacional ..............................................................................34 2.2. Segurança Pública ................................................................................36 2.3. Grande impacto causado pelo Crime Organizado na Segurança Nacional ..................................................................................................................38 Capítulo 3 - Principais tipos de delito a que as Organizações Criminosas no Brasil se dedicam ...........................................................................................................................41 3.1. Lavagem de dinheiro.............................................................................41 3.2. Corrupção ..............................................................................................42 3.3. Pirataria ..................................................................................................43 3.4. Tráfico ....................................................................................................44 3.4.1. Tráfico de Seres Humanos .........................................................................44 3.4.2. De drogas e Armas .....................................................................................46 Capítulo 4 - 4.1. 4.1.1. 4.1.2. 4.1.3. 4.1.4. 4.1.5. 4.1.6. Como funcionam as organizações ............................................................ 47 Diversos mecanismos que regem as relações dos criminosos........47 Como se estruturam....................................................................................47 Como são feitos os recrutamentos..............................................................48 Vínculo estabelecido dentro dos grupos criminosos ...................................50 Sob qual lógica operam ..............................................................................50 O sentido de cada ação, de cada gesto......................................................51 Mesmo presos, continuam a exercer comando dentro da organização ......51 Capítulo 5 - Demonstração de poder das facções criminosas em detrimento do poder do Estado ................................................................................................................ 53 5.1. Organizações criminosas se tornam o Estado onde o Estado é ausente 53 5.2. Medidas eficazes para combater o Crime Organizado.......................60 5.2.1. Ações policiais e a inteligência policial........................................................60 5.2.2. Sociedade ...................................................................................................62 Capítulo 6 - O papel da ONU no combate ao Crime Organizado ................................. 64 6.1. Nações Unidas para a Droga e Criminalidade – UNODC ...................64 6.2. Convenção de Palermo.........................................................................64 CONCLUSÃO...................................................................................................................... 68 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS.................................................................................... 71 12 INTRODUÇÃO A presente monografia tem como título "Crime Organizado e a Segurança Nacional"; ao enfatizar a natureza do trabalho, busca-se explanar desde a origem até os dias atuais das facções criminosas, compreendendo as características fundamentais e inerentes ao movimento que esses tipos de organizações têm desenvolvido no Território Nacional. Desta forma, pretende-se abordar além do conceito, origem e as principais organizações, seus objetivos, suas demonstrações de poder e o papel da ONU, da UNODC e da Convenção de Palermo, com propósito de captar, em especial, o poder adquirido por tais grupos criminosos diante da segurança do país. O subtítulo ajuda compreender melhor o propósito do presente trabalho: "facções criminosas invertendo equações”, ao destacar a demonstração do poder das facções criminosas diante da inércia do Poder Público. Dessa forma, no primeiro capítulo buscou-se a conceituação para Crime Organizado, mesmo com muita dificuldade, pois não há um conceito majoritário no atual momento, com suas principais características e uma breve explanação de algumas das principais organizações criminosas no mundo. Em seguida discorreremos sobre as principais organizações criminosas no Brasil, com breves relatórios de suas práticas criminais em vários períodos de tempo, destacando suas principais barbáries, seus objetivos, estratégias para suas ações e mais uma vez, mostrando a problemática do presente trabalho, que reside no controle cada vez maior desses grupos em relação a Segurança Pública e Nacional. No segundo capítulo, buscou-se delinear o papel da Segurança Nacional e Segurança Pública, sendo esta direito inalienável e um bem comum de toda população. Tal segurança, prestada pelo Estado, por ter em suas mãos o poder coercitivo, porém observa-se que o problema de segurança saiu do campo exclusivo do Estado e passou a ser problema da comunidade como um todo. É abordado no mesmo capítulo a Doutrina Política formulada pela Escola Superior de Guerra com seu objetivo primordial. E em suas subdivisões também dispõe da abordagem do grande impacto causado pelo Crime Organizado na Segurança Nacional. 13 O terceiro capítulo aborda-se os principais tipos de delito a que as Organizações Criminosas no Brasil se dedicam, ressaltando que além dos citados neste trabalho, existem inúmeros outros. Já o quarto capítulo visa mostrar como as facções criminosas se estruturam, sob qual lógica operam, como são feitos os recrutamentos, o vinculo estabelecido entre cada membro, e o principal do dado capítulo mostrar como que uma vez presos continuam a exercer o comando dentro da organização. No quinto capítulo, e mais uma vez mostrando a delimitação do tema desta monografia que é a demonstração de poder das facções criminosas em detrimento do poder do Estado diante da Segurança Nacional, mostra-se o poder das mesmas diante de um Estado ausente, criando assim um Estado paralelo. Esse demonstrativo é feito com trechos de entrevistas, ações desses grupos que agem de forma audaciosa e sem nenhum temor do que possa ser causado. E como o Estado tem, em suas diversas formas de poder, atuado para enfrentar o fenômeno da criminalidade organizada diante de grupos cada vez mais estruturados e organizados. Faz-se também uma breve abordagem às práticas ilícitas dos representantes do povo e agentes estatais que se corrompem frente a grupos que subestimam o poder do Estado. Busca também mostrar as principais medidas que podem ser tomadas pelas ações policiais e a inteligência policial, a sociedade diante das Políticas Públicas que mostram equívocos de gestão que podem e já estão causando desastrosas conseqüências à Administração Pública. Por fim, no último capítulo faz-se referência ao papel da ONU seguido do Escritório da UNODC e da Convenção de Palermo fontes essenciais no controle e combate ao Crime Organizado. O objetivo da presente monografia não é esgotar o tema e nem abranger todas as suas formas, mas apresentar de forma objetiva o problema que tem crescido assustadoramente e atemorizado a Sociedade Brasileira. 14 Capítulo 1 - Crime organizado 1.1. Conceitos e características O conceito de crime organizado ainda não é majoritário. Não há um consenso em torno do que venha ser organização criminosa. OLIVEIRA FILHO (2002, p. 99), sobre o tema, entende que: Em princípio, crime organizado é o crime com características de societas sceleris ou empresariais, que atinge duramente a sociedade bem como o seu sistema financeiro [...] é uma prática adotada por homens e mulheres organizados que, em grande parte, têm no seu comando insuspeitos personagens públicos, os quais podem ser encontrados até em jornais, 1 revistas e televisão, como inatacáveis cidadãos. A Organização das Nações Unidas (ONU), na sua Convenção sobre o Crime Organizado Transnacional denominada Convenção de Palermo, que entrou em vigor internacionalmente em 29 de Setembro de 2003 e nacionalmente em 29 de Janeiro de 2004, ratificada pelo Brasil com o Decreto nº. 5.015, de 12 de março de 2004, em seu artigo 2º conceitua Crime Organizado da seguinte maneira: Grupo Criminoso Organizado” – grupo estruturado de três ou mais pessoas, existente há algum tempo, e atuando concertadamente com o propósito de cometer uma ou mais infrações graves ou enunciadas na presente convenção, com a intenção de obter, direta ou indiretamente, um benefício 2 econômico ou outro benefício material. A Lei nº. 9.034 de 3 de maio de 1995 alterada pela Lei nº. 10.217 de 11 de abril de 2001 “dispõe sobre a utilização de meios operacionais para a prevenção e repressão de ações praticadas por organizações criminosas”3. Nosso ordenamento jurídico define o que venha ser associação criminosa (ex.: art. 2º da Lei nº. 2.889/56) e quadrilha ou bando (art. 288 Código Penal Brasileiro). Tal Lei em seu artigo 1º explicita que: “Esta lei define e regula meios de prova e procedimentos 1 OLIVEIRA FILHO, Edemundo Dias. O Vácuo do poder e o crime organizado: Brasil, início do século XXI. Goiânia: AB, 2002. p. 99 2 Decreto 5.015 de 12 de março de 2004. Promulga a Convenção das Nações Unidas contra o Crime Organizado Transnacional. Disponível em <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato20042006/2004/decreto/d5015.htm> Acesso em 15 janeiro 2009. 3 Lei 9.034 de 3 de maio de 1995. Dispõe sobre a utilização de meios operacionais para a prevenção e repressão de ações praticadas por organizações criminosas. Disponível em < http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Leis/L9034.htm > Acesso em 15 janeiro 2009. 15 investigatórios que versem sobre ilícitos decorrentes de ações praticadas por quadrilha ou bando ou organizações ou associações criminosas de qualquer tipo”.4 Observa-se que a Lei de 1995 cita somente quadrilha ou bando, cuja definição encontra-se no art. 288 do Código Penal. E a Lei de 2001 que veio alterar os artigos 1º e 2º, além de citar “quadrilha” e “bando” fala-se em organizações criminosas, porém não define o que venha a ser organização criminosa, ou seja, não está tipificado na lei o seu significado, logo se observa que não há em nosso ordenamento jurídico uma definição do que seja Crime Organizado. Para que uma organização criminosa funcione, há geralmente, alguém com poder corroborando para que a mesma continue a operar, observa-se então, uma ligação entre o crime organizado e a máquina do Estado. Para a maioria dos autores são cinco principais características do crime organizado que o diferencia do crime comum. São elas: hierarquia, previsão de lucros; divisão do trabalho, planejamento empresarial, simbiose com o Estado. Outras características interessantes são as circunstâncias que normalmente ele nasce, ou na cadeia, a partir de um grupo de presos, ou pela união de pequenas quadrilhas, criando um conselho, ou através de afinidades, laços de sangue que unem grupos de determinadas regiões, ou pela união de grupos interessados em manter monopólios de certas mercadorias. [...] porque o crime organizado no Brasil é uma realidade terrível. Atinge todas as estruturas da sociedade, da comunidade mais simples, onde se instala o traficante, aos poderes da República. Passe pela polícia, a justiça e a política. A atividade ilegal está globalizada e o país é um mercado 5 privilegiado no tabuleiro do crime organizado. Para a ciência criminológica as principais características do Crime organizado são: Hierarquia estrutural, planejamento empresarial, claro objetivo de lucros, uso de meios tecnológicos avançados, recrutamento de pessoas, divisão funcional de atividades, conexão estrutural ou funcional com o poder público e/ou com o poder político, oferta de prestações sociais, divisão territorial das atividades, alto poder de intimidação, alta capacitação para a fraude, 4 o o o Lei 10.217 de 11 de abril de 2001. Altera os arts. 1 e 2 da Lei n 9.034, de 3 de maio de 1995, que dispõe sobre a utilização de meios operacionais para a prevenção e repressão de ações praticadas por organizações criminosas. Disponível em <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Leis/LEIS_2001/L10217.htm > Acesso em 15 janeiro 2009. 5 AMORIM, Carlos. CV-PCC: a irmandade do crime. 5ª Edição. Rio de Janeiro: Record, 2004. p. 16 16 conexão local, regional, nacional ou internacional com outras organizações 6 etc. O crescimento do crime organizado já é aceito em todo o mundo. Uma vez que o dinheiro que esse tipo de comércio gera precisa ser legitimado pela lavagem e incorporação no sistema financeiro internacional. O bandido que controla a boca de fumo ou o que a gerencia, é somente o ponto inicial. No oculto o que é traficado por esse simples encarregado é levado à escala mundial para ser legitimado e mais ainda, pode-se obter depois de alguns dias, muito além do que foi investido. 1.2. Origens do Crime Organizado O crime organizado não é um fenômeno recente. No cenário internacional podemos encontrá-lo nos grupos de contrabandistas na Europa, nas atividades dos piratas e corsários, nas grandes redes de receptação na Inglaterra do século XVIII. No Brasil, o movimento conhecido como cangaço, no sertão nordestino, entre o final do século XIX e o começo do século XX, a atuação do coronelismo são antecedentes da criminalidade organizada na Republica Federativa do Brasil. Outras organizações mais recentes surgiram no Rio de Janeiro nas décadas de 70 e 80 como o Comando Vermelho, Terceiro Comando entre outros. Em São Paulo, em meados da década de 90, surgiu no presídio, dito de segurança máxima, anexo à Casa de Custódia e Tratamento de Taubaté, o Primeiro Comando da Capital. 6 GOMES, Luiz Flávio. Crime organizado: que se entende por isso depois da Lei nº 10.217/01? (Apontamentos sobre a perda de eficácia de grande parte da Lei 9.034/95). Jus Navigandi, Teresina, ano 6, n. 56, abr. 2002. Disponível em: <http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=2919>. Acesso em: 30 dezembro 2008. 17 1.3. Principais Organizações Criminosas no mundo 1.3.1. Tríades Chinesa Tiveram origem no ano de 1644, como movimento popular para expulsar os invasores do império Ming. Com a declaração de Hong Cong como colônia Britânica em 1842, seus membros migraram para essa colônia e posteriormente para Taiwan, onde não encontraram dificuldades para incentivar os camponeses para o cultivo da papoula e exploração do ópio. E 1880, quando a Companhia Britânica das Índias Orientais decidiu engajar a população chinesa para a produção do ópio, até então trazido da Índia e pago com produtos chineses, 20 milhões de chineses se dedicavam ao seu cultivo. Um século mais tarde, quando foi proibido o comércio do ópio em todas as suas formas, as Tríades passaram a explorar solitariamente o controle do próspero mercado negro da heroína. 1.3.2. Yakusa Japonesa A organização criminosa nos tempos do Japão Feudal e se desenvolveu nas sombras do Estado para a exploração de diversas atividades ilícitas (cassinos, prostíbulos, turismo pornográfico, trafico de mulheres, drogas e armas, lavagem de dinheiro) e também legalizadas (casas noturnas, agências de teatro, cinemas e publicidade, eventos esportivos). Seus membros também passaram à pratica das chamadas “chantagem corporativas”, adquirindo ações de empresas, exigindo lucros exorbitantes, sob pena de revelarem os segredos aos concorrentes. 18 1.3.3. Máfias italianas Teve início como movimento de resistência contra o Rei de Nápoles, que em 1812 baixou um decreto que abalou a secular estrutura agrária da Sicília, reduzindo os privilégios feudais e limitando os poderes dos príncipes. Em 1865, com o desaparecimento da realeza e a unificação forçada da Itália, seus membros passaram a resistir contras as forças invasoras, na luta pela independência da região, o que lhes possibilitou angariar a simpatia popular pela atitude patriótica. E a partir da segunda metade do século XX passaram a dedicar-se a prática de atividades criminosas. 1.4. Principais Organizações Criminosas no Brasil O marco inicial do Crime Organizado no Brasil é a fundação do Comando Vermelho ou Caldeirão do Diabo no presídio da Ilha Grande. 1.4.1. Comando Vermelho (Falange Vermelha) O tiroteio da rua Altinópolis revelou pela primeira vez ao grande público a existência do Comando Vermelho. O ano era 1981. E o comando Vermelho foi a primeira forma de organização do criminoso comum no Brasil, foi a primeira forma de 7 organização. O Comando Vermelho é a maior e mais importante das organizações do crime. É através deste grupo que as armas de guerra chegam ao Brasil. Fuzis, metralhadoras, granadas, foguetes são algumas das armas que os profissionais do crime usam para enfrentar seus rivais. As grades têm ferrugens das décadas. O Cândido Mendes tem segredos: mortes violentas, estupros, 7 AMORIM, Carlos. CV-PCC: a irmandade do crime. 5ª Edição. Rio de Janeiro: Record, 2004. p. 14 19 o preso contra o preso, a guarda contra todos. Porque essa é uma cadeia de muitos horrores. É a mais podre do sistema carcerário do estado do Rio. A multidão de presidiários está condenada a penas tão longas que seria preciso inventar um novo calendário para somar todas elas. Os piores criminosos do Rio estão trancados nas quatros galerias que formam o presídio. A partir de 1960, a Ilha Grande se transforma num depósito para os mais perigosos. Vira prisão de segurança máxima. De um lado, milionárias casas de veraneio; do outro, o Caldeirão do Diabo. O presídio é como 8 uma mancha de tinta num tapete persa. Willian da Silva Lima, o Professor, fundador da organização. O Caldeirão do Diabo (Cândido Mendes), berço do Comando Vermelho, presídio da Ilha Grande, na baía de Angra dos Reis, não existe mais. Veio abaixo, por dinamites, em 1995. A galeria D do Presídio era o território da Falange Zona Norte, a Falange Jacaré como também era conhecida. Lá habitavam os homens mais perigosos de toda a penitenciária. Homens que eram temidos pelos demais, que tinham maiores privilégios por imporem o medo em toda aquela população carcerária, ou seja, eram eles, a Falange Zona Norte que mandavam nos corredores da Ilha Grande. A audácia e a imaginação desses bandidos iam longe. Liam livros como “A guerrilha vista por dentro”, reportagem de um repórter inglês que relatava a guerrilha no Vietnã. Para se ter idéia, durante os governos militares no Brasil, tal livro teve sua produção reduzida por instruir a luta armada, abordar técnicas de ações militares do vietcongue, fabricação caseira de pólvora, fabricação de munições, sistema de túneis para fugas e etc. O que um livro desses fazia na mão de bandidos tão perigosos e condenados há anos de prisão? Livros também como “O pequeno manual do guerrilheiro urbano (uma bíblia da luta armada), “Revolução na revolução?” era outra publicação predileta. Outro livro fundamental para a formação de grupos armados foi a “Guerra de guerrilhas” de Che Guevara, livro este que percorreu pelo presídio a dentro como cópias clandestinas. Na galeria B, também conhecida como Galeria da Lei de Segurança Nacional, ou “fundão”, estavam os presos comuns condenados por crimes previstos na LSN. 8 AMORIM, Carlos. CV-PCC: a irmandade do crime. 5ª Edição. Rio de Janeiro: Record, 2004. p. 50/51 20 Na verdade a Ilha Grande era organizada, pelos próprios detentos, em seis grupos. Cada um dos grupos tinha seus próprios regimentos, regras a serem seguidas, enfim, tinham seus códigos internos e de condutas. “De uma certa forma, todos os condenados têm um tipo qualquer de filiação aos grupos que controlam a vida e a morte dentro das celas”.9 A Falange Zona Sul comanda a maior parte da Galeria C do presídio. É responsável pelo jogo e o tráfico de drogas. A Falange da Coréia é dona da Galeria C, seu poder é dividido com os da Falange Zona Sul. Território dividido, poder dividido, mesmo assim este grupo tem comando no tráfico de influência junto aos agentes. Práticas de violência sexuais e táticas para roubar outros presos são algumas das características desse grupo. Mais tarde esses dois grupos se unem e formam o Terceiro Comando. Outro grupo é o “Independentes” ou “Neutros”. Os homens dessa falange são uma força de apoio da Falange Jacaré. A Falange Zona Norte também conhecida como Falange Jacaré é a que comanda, ou seja, todos os presos são submetidos às suas regras. As demais falanges mantêm uma relação de respeito e colaboração a ela segundo todas as suas regras. É a Falange LSN (o “fundão”), embrião do Comando Vermelho, que é a inimiga da Falange Jacaré. Esta é a mais influente. Administra o pedágio da Galeria D. Para se traficar drogas e armas somente com sua autorização. Ela que faz a seleção dos novatos, os que querem entrar para a falange. O que determina se o preso poderá se tornar membro é a sua folha penal, quanto mais crimes cometidos – assaltos violentos, tráfico, roubos, mortes - maior chance o bandido tem de entrar para o grupo. Ou serve para ser soldado, com todas essas características, ou não serve para nada, ou serve para “virar moça”. Os que cometem estupros contra meninas (fora de um assalto ou sequestro), crimes passionais não passam pela seleção. Os presos políticos tinham em mente a diferença deles para os presos comuns. Tanto é que quando foram transferidos para a Galeria B, de cara, já fizeram a exigência de manterem-se isolados dos demais presos. Isso com uma estratégia, tentar criar dentro da cadeia um grupo diferenciado com as estruturas de militância 9 AMORIM, Carlos. CV-PCC: a irmandade do crime. 5ª Edição. Rio de Janeiro: Record, 2004. p. 70 21 que trouxeram como experiência. Queriam deixar claro que eram presos políticos e não bandidos comuns como o regime militar insistia em apresentá-los. Suas exigências foram atendidas pelo Departamento do Sistema Penitenciário e a direção do Instituto Penal Cândido Mendes, logo, a Galeria B foi divida por um portão de ferro. De um lado os presos políticos, de outro os presos comuns (condenados pela LSN) que viam neles os “bacanas”, que na linguagem do crime significa “vítima em potencial”. Houve muitas trocas de experiências entre esses dois tipos de prisioneiros. Enquanto esperavam o tempo passar trocavam diversas experiências. E foram os presos comuns que mais se beneficiaram com esse convívio. Conviviam dia e noite com representantes do Movimento Revolucionário 8 de outubro (MR-8), da Aliança Libertadora Nacional (ALN), da Vanguarda Popular Revolucionária (VPR) e da VARPalmares. Todos eles tinham para contar diversas táticas e operações que envolviam uma excelente estrutura e muitos recursos para irem desde seqüestros de diplomatas até assaltos em residências milionárias. “Presos comuns traficavam drogas. Presos políticos traficavam informações”10. Ensinaram também aos integrantes do Comando Vermelho que todo dinheiro que vierem a obter deveriam ser aplicado para render alguns juros, fazendo o dinheiro circular bem como investir nas ações da bolsa. Os integrantes do CV não improvisam armas. Usam granadas ou foguetes importados ou roubados das Forças Armadas. As metralhadoras não são as comuns, mas as adquiridas junto aos barões da cocaína colombiana e que circulam naturalmente nas bocas-de-fumo e nas quadrilhas de assaltantes de bancos. “Nivelando o militante e o bandido, o sistema cometeu um grave erro. O encontro dos integrantes das organizações revolucionárias com o criminoso comum rendeu um fruto perigoso: o Comando vermelho.”11 Para o Comando Vermelho o bom bandido deveria seguir um manual de procedimento que a polícia intitulou como “As doze regras do bom bandido”. Seguindo esses passos o bandido solto seria considerado um “bom bandido” 1. 2. 10 11 Não delatar; Não confiar em ninguém; AMORIM, Carlos. CV-PCC: a irmandade do crime. 5ª Edição. Rio de Janeiro: Record, 2004. p. 75 AMORIM, Carlos. CV-PCC: a irmandade do crime. 5ª Edição. Rio de Janeiro: Record, 2004. p. 58 22 3. Trazer sempre consigo uma arma limpa, carregada, sem demonstrar volume, mas com facilidade de saque é munição sobressalente; 4. Lembrar-se sempre de que a polícia é organização, e nunca subestimá-la; 5. Respeitar mulher, criança e indefesos, mas abrir mão desse respeito quando sua vida ou liberdade estiverem em jogo; 6. Estar sempre que possível documentado (mesmo com documento falso) e com dinheiro; 7. Não trazer consigo retratos ou endereços suspeitos, bem como não usar objetos com seu nome gravado; 8. Andar sempre bem apresentável, com barba feita. Evitar falar gíria. Evitar andar a pé. Não freqüentar lugares suspeitos. Não andar em companhia de “chave-de-cadeia” (uma referência a gente vaidosa, que sempre fala demais e compromete os outros); 9. Saber dirigir autos, motos etc. Conhecer alguma coisa de arrombamento, falsificação e noções de enfermagem; 10. Lembrar-se sempre que roubar 100 e 100 milhões resulta na mesma coisa (cadeia, condenação). 11. Estar sempre em contato com o criminalista; 12 12. Não usar tatuagem em hipótese alguma; O CV adotou tais regras para que o bandido inexperiente, depois de assaltar, roubar, estuprar não saia comentando tudo o que fez, pois os informantes da polícia estão a espionar e os policiais sabem os crimes que determinados bando cometem. O Manual transcrito acima é parecidíssimo com os manuais da guerrilha que tiveram ampla circulação pela Galeria LSN da Ilha Grande, onde surgiu o Comando Vermelho. São regras aparentemente simples, porém eficientíssimas, as quais seguidas à risca levaram os assaltantes, bem vestidos e elegantes a assaltarem o BANERJ em poucos minutos, pois ninguém ao menos suspeitou que se trataria de um assalto quando o bando adentrou ao banco muito bem vestido e jóias das mais finas. Algumas regras podem ser descumpridas. No caso acima a polícia conseguiu prender dois dos bandidos e estes, delataram seus companheiros. Resultado: os delatores foram enforcados! A ousadia não acaba. Os que ficaram soltos se juntaram a mais bandidos e a policiais e reergueram o grupo. Mesmo com algumas traições há aqueles que não abrem a boca. São torturados, espancados, queimados, mas nada falam. Passam por diversas situações como essas, porém não perdem a pose, a honra e mesmo presos ou interrogados mantêm fortes e audaciosos. Antonio Branco, um dos que liderou a tentativa de fuga em massa de trezentos detentos no Conjunto Penitenciário da Frei Caneca em 1974, conseguiu nesse ato fugir do presídio, mas foi cercado na rua, seu carro foi metralhado. Um tiro acertou sua perna 12 AMORIM, Carlos. CV-PCC: a irmandade do crime. 5ª Edição. Rio de Janeiro: Record, 2004. p. 166 23 e o outro de raspão na cabeça. Foi submetido a depor na delegacia e lá, mesmo com todos os ferimentos foi obrigado, pelos policiais a subir até o segundo andar do prédio. Não permitiu que nenhum dos policiais o ajudasse. Ao chegar ao presídio, pediu um copo com água, os policiais disseram que não havia necessidade. Um dos repórteres que ali estava comprou uma garrafa de água mineral e desafiando a segurança entregou ao preso. Antonio Branco pegou a garrafa, olhou bem nos olhos do repórter e disse: “Você é muito corajoso. Agora não preciso dessa água. Bebi a sua 13 coragem”. O bandido ferido devolveu a garrafa intacta. Presos, eles se identificam com outro nome, mentem a idade, queimam os dedos para provocar inchação e com isso impedir o reconhecimento por impressões digitais. 1.4.2. Primeiro Comando da Capital (PCC) Além de patrocinar rebeliões e resgates de presos, o Primeiro Comando da Capital também atua em roubos a bancos e a carros de transporte de valores, extorsões de familiares de pessoas presas, extorsão mediante seqüestro e tráfico ilícito de substâncias entorpecentes, com conexões internacionais. Para a hegemonia de seu poder, seus membros não poupam esforços para assassinar membros de facções rivais, fora e dentro dos 14 estabelecimentos prisionais. O Primeiro Comando da Capital foi fundado em março de 1993, dentro da Casa de Custódia e Tratamento de Taubaté – Piranhão – presídio de segurança máxima, por um grupo de 8 detentos. Dois de seus fundadores eram os chefões da facção: César Augusto Roriz da Silva, o Cesinha, e José Márcio Felício, o Geléia, Geleião ou Gê. A facção passou quase 3 anos trabalhando às escondidas dentro do presídio. O massacre ocorrido em 1992 na Casa de Detenção foi um dos fatores que levou esse grupo a fundar a organização. Mas este não foi o principal fator. A idéia era criar uma espécie de sindicato que defendesse os direitos do preso, que unidos, com representantes em todas as cadeias e presídios teriam mais facilidade para negociar, para reivindicar seus direitos, seja pela má qualidade dos locais, má 13 AMORIM, Carlos. CV-PCC: a irmandade do crime. 5ª Edição. Rio de Janeiro: Record, 2004. p. 171 SILVA, Eduardo Araújo da. Crime organizado: procedimento probatório. São Paulo: Atlas, 2003. p. 26 14 24 alimentação, lentidão nos julgamentos dos processos, forma indigna de que eram tratados. Queriam simplesmente algo que falassem por eles. Mesmo tendo como lema “A Liberdade, a Justiça e a Paz”, observa-se um outro lado, o lado violento, matando os traidores e obrigando os seus filiados a pagar “mensalidades” para fortalecer o caixa da facção e o que fosse arrecadado serviria para patrocinar novas fugas e resgates. E o mais assustador, o PCC já estava do lado de fora das muralhas. Bandidos fiéis que saíram dos presídios continuavam fiéis ao comando, como determina o Estatuto. 01 – Lealdade, respeito e solidariedade acima de tudo ao Partido. 02 – A luta pela liberdade, justiça e paz. 03 – A união na luta contra as injustiças e a opressão dentro da prisão. 04 – Contribuição daqueles que estão em liberdade com os irmãos dentro da prisão, através de advogados, dinheiro, ajuda aos familiares e ação de resgate. 05 – O respeito e a solidariedade a todos os membros do Partido, para que não haja conflitos internos, porque aquele que causar conflito interno dentro do Partido, tentando dividir a irmandade, será excluído e repudiado do Partido. 06 – Jamais usar o Partido para resolver problemas pessoas contra pessoas de fora porque o ideal do Partido está acima de conflitos pessoais. Mas o Partido estará sempre leal e solidário a todos os seus integrantes para que não venham a sofrer nenhuma desigualdade ou injustiça em conflitos externos. 07 – Aquele que estiver em liberdade, “bem estruturado”, mas esquecer de contribuir com os irmãos que estão na cadeia, será condenado à morte, sem perdão. 08 – Os integrantes do Partido têm que dar bom exemplo a ser seguido e por isso o Partido não admite que haja: assalto, estupro e extorsão dentro do sistema. 09 – O Partido não admite mentiras, traição, inveja, cobiça, calúnia, egoísmo, interesse pessoal, mas sim, a verdade, a fidelidade, a hombridade, solidariedade ao interesse comum ao bem de todos, porque somos um por todos e todos por um. 10 – Todo integrante terá que respeitar a ordem e a disciplina do Partido. Cada um vai receber de acordo com aquilo que fez por merecer. A opinião de todos será ouvida e respeitada, mas a decisão final será dos fundadores do Partido. 11 – O Primeiro Comando da Capital – P.C.C., fundado no ano de 1993, numa luta descomunal e incansável contra a opressão e as injustiças do Campo de Concentração “ANEXO” da Casa de Custódia de Taubaté, tem como lema absoluto “a Liberdade, a Justiça e a Paz”. 12 – O Partido não admite rivalidades internas, disputa do poder na liderança do Comando, pois cada integrante do Comando sabe a função que lhe compete de acordo com sua capacidade para exerce-la. 13 – Temos que permanecer unidos e organizados para evitarmos que ocorra novamente um massacre semelhante ou pior ao ocorrido na Casa de Detenção em 2 de outubro de 1992, quando 111 presos foram covardemente assassinados, massacre este que jamais será esquecido na consciência da sociedade brasileira. Porque nós do Comando vamos sacudir o sistema e fazer essas autoridades mudarem a prática carcerária desumana, cheia de injustiça, opressão, torturas, massacres nas prisões. 14 – A prioridade do Comando no momento é pressionar o Governo do estado a desativar aquele Campo de Concentração “ANEXO” à Casa de 25 Custódia e Tratamento de Taubaté de onde surgiram a semente e as raízes do Comando, no meio de tantas lutas inglórias e tantos sofrimentos atrozes. 15 – Partindo do Comando Central da Capital, o QG do Estado, as diretrizes de ações organizadas e simultâneas em todos os Estabelecimentos Penais do Estado numa guerra sem tréguas, sem fronteiras, até a vitória final. 16 – O importante de tudo é que ninguém nos deterá nessa luta porque a semente do Comando se espalhou em todo o Sistema Penitenciário do Estado e conseguimos nos estruturar também do lado de fora, com muitos sacrifícios e perdas, mas nos consolidamos a nível estadual e a longo prazo nos consolidaremos também a nível nacional. Conhecemos nossa força e a força de nossos inimigos poderosos, mas estamos preparados, unidos, e 15 um povo unido jamais será vencido. Estudos mostram que em 1997, 4 anos depois da sua fundação, a facção já contava com 8 mil homens e segundo a CPI dos presídios em 2006 esse número pode ter superado 10 mil integrantes. A primeira ação do PCC aconteceu em 1994, nesse ano a facção ainda se mantinha na clandestinidade se preparando, se fortalecendo e se estruturando. O primeiro movimento foi uma rebelião no presídio de Tremembé. Alguns líderes do comando estavam presos no Piranhão e queriam sair de lá, mas por ser mais difícil criar uma rebelião interna, acharam melhor colocar nas mãos de José Eduardo de Moura (o Bandejão) a responsabilidade de criar um motim dentro do presídio de Tremembé exigindo que os companheiros do Piranhão fossem transferidos para outras cadeias. O governo cedeu e transferiu os detentos, se subordinando a lista feita por eles dos que deveriam partir para novos presídios e assim iam, os seus integrantes, levando suas leis e fazendo germinar, crescer e se espalhar como semente, como costumam dizer. O PCC crescia de uma forma tão assustadora, cada dia com mais alguém querendo se filiar à facção, e logo os chefões perceberam que tinham de organizar a coisa. Através de um “Organograma do PCC” determinava as responsabilidades de cada um. Os chefões no topo, abaixo vinham os subchefes (que tinham por obrigação receber as ordens dos chefões e retransmiti-las aos pilotos), depois os pilotos (espécie de chefes de departamento, que cuidam de uma determinada cadeia e passam aos soldados as ordens recebidas da subchefia) e por último, os soldados (que executam as ordens). O mesmo esquema era seguido fora da prisão, por bandidos que saíram, mas mantinham-se fiéis à facção. Era tanta gente se filiando que o organograma já era maior do que muitas empresas de grande porte. 15 SOUZA, Fátima. PCC, a facção. Rio de Janeiro: Record, 2007. p. 11 26 Em 15 de agosto de 1999 o PCC invade uma delegacia na Zona Sul de São Paulo em busca de resgate de presos. Com autoridade, diante de um Estado inerte, batem, humilham as forças policiais que ali se encontravam. Foi então que o governo, diante da situação de ver um grupo bater em uma delegada que ordena uma investigação, por parte da polícia, sobre o PCC. A investigação mais uma vez aponta para um esquema bem organizado, com poder e autoridade, porém o Governo ainda não admitia que a facção fosse forte, grande e violenta e ainda continuava fazendo vistas grossas diante do problema, achando que fosse somente um “grupinho” de presos revoltados dentro das cadeias. Até que em 2001, sem saída, mas com a mesma visão de ser o PCC um comando sem expressão, formado por poucos e que não iria sobreviver por muito tempo, rendeu-se e disse ter descoberto que o Primeiro Comando da Capital existia e para dar uma satisfação a sociedade anunciou a transferência dos líderes da organização para diversos presídios em diversos estados, não sabendo que só estava colaborando para disseminar a facção por todo o País. Dentro dos seus novos presídios os líderes não tinham nenhuma dificuldade em manter contato com os detentos de São Paulo – através de celulares que também não eram difíceis de conseguir -, e se propagando no seu novo ambiente sua força, seus ideais fazendo a cabeça de presos de diversas regiões do Brasil a fora. Nem todos queriam se filiar ao PCC, mas tal recusa poderia levar à morte. Foi então que surgiram diversos grupos em oposição ao PCC. Grupos como o CDL (que surgiu em 1996, na Penitenciária I de Avaré), o CRBC (limitado à Penitenciária de Guarulhos), Seita Satânica (na Casa de Detenção de São Paulo). Esta última, depois de diversas reuniões entre seus líderes e os do PCC, resolveram fazer um pacto de paz, cada um ficaria na sua e não se enfrentariam. Em 2002 surgiu o CJVC – Comando Jovem Vermelho da Criminalidade, na Penitenciária de Presidente Prudente, sendo um tipo de filial do PCC, com chefes próprios, porém subordinados às decisões do PCC. O maior inimigo do PCC é a CRBC. O ódio pelo inimigo era explícito, pois não concordavam de o PCC querer assumir o comando do tráfico de drogas nas cadeias e nem com a obrigação de pagar mensalidades para os líderes. Seu estatuto dizia que onde o CRBC estivesse não poderia existir integrantes do PCC, logo não era permitida a entrada no presídio comandado pelo CRBC de sentenciados filiados ao PCC. Ao contrário do PCC, esse grupo é contra rebeliões nos presídios, batendo 27 mais uma vez de frente com o Primeiro Comando que vê nas rebeliões uma forma de protesto. O PCC dominava os presídios e distribuía medo aos detentos que não se filiassem ao seu partido e aos funcionários que ali trabalhavam. Fugas se tornaram constante, seja pelas portas da frente dos presídios, mostrando seu atrevimento, seja por túneis cavados no chão de celas de presídios dito de segurança máxima. Audácia, ousadia e atrevimento são marcas registradas desse grupo. Em 1997 foram encontrados, dentro da Penitenciária do Estado, quinze quilos de cocaína pertencente ao PCC. Na horta do mesmo presídio havia uma plantação de maconha bem cuidada pelos detentos jardineiros. Em 1998, dois bandidos fugiram pela porta da frente da Casa de Detenção (hoje explodida), vestidos com fardas da Polícia Militar. Em 1999, 146 presos fugiram de um presídio em Campinas deixando para trás somente alguns chinelos e acreditem, pela porta da frente, depois de suas celas terem sido abertas misteriosamente. A audácia foi tanta que um deles ainda telefonou para a cadeia para agradecer a “cortesia e a hospitalidade”. O governo continuava não acreditando numa organização tão bem organizada. Dentro da cadeia, era ela que comandava. Do lado de fora também. Seguindo o que diz o Estatuto da Organização o dinheiro adquirido em assaltos e seqüestros servia, também, para ajudar familiares de presos que estavam sem emprego e que precisavam sustentar seus filhos, fretar ônibus para os familiares de detentos visitá-los nas cadeias, pagar funcionários e policiais corruptos, mas o maior emprego da grana que possuíam era para fugas, resgates e na compra de armas e drogas. A força do PCC se espalhou por todo o estado de São Paulo, dominando bocas de fumo do interior paulista, expandindo seu poder por delegacias e distritos, já que presídios superlotados transferiam presos condenados para lá e lá o comando se encarregava de conseguir mais e mais adeptos. Foi em dezembro de 2000, que o PCC fez a primeira rebelião da história do presídio de Segurança Máxima – o Piranhão, deixando um saldo de nove mortos, três deles decapitados. Em Ribeirão Preto, interior de São Paulo, outra rebelião ocorreu. Dessa vez até corações fritos! A crueldade dos membros do PCC é sem limites. Conta a repórter Fátima Souza que numa madrugada recebeu uma ligação de um deles contando que tinha acabado de matar três inimigos e arrancado seus corações. Um 28 deles estava sendo frito e temperado com sal no fogão da cadeia para ser comido pelos detentos do Primeiro Comando. E o incrível, no outro dia o mesmo homem que comandou tão macabra operação, ligou para a mesma repórter para dizer que subornou um carcereiro para que ele permitisse que ele tivesse um cachorrinho. Ele queria a ajuda da repórter para sugerir um nome para o animal. “Um homem que arranca corações e em seguida os frita tem a sensibilidade para amar um animal. Que surpreendente é a raça humana, pensei”.16 E a pergunta que não quer calar: Onde estariam os policiais, os carcereiros, enfim, os responsáveis pelo controle desses presos enquanto a cozinha era usada pelos bandidos, enquanto inimigos eram mortos, carcereiros subordinados? Em 18 de fevereiro de 2001 o PCC lideraria a maior rebelião da história do Estado de São Paulo. Presos, Cesinha e Gê, de dentro da Penitenciária de Piraguá, no Paraná, pararam trinta presídios naquele dia. A audácia dos integrantes do PCC vai além de celulares, PABX’s, agora eles possuíam uma página na internet, por sinal muito bem feita. Feita por um detento de Osasco que, por ter uma ficha com bom comportamento, trabalhava para o diretor da cadeia, fazendo a parte burocrática no escritório do presídio e usando do computador, os chefões do PCC tiveram a idéia e mandou o preso criar a página que foi logo tirada do ar pela polícia. Criatividade não faltava à facção. Policiais, para fazerem investigações sem levantar suspeita usava de carros frios, o PCC fazia o inverso, clonavam carros da polícia para por em execução suas ações, como por exemplo, em abril de 2001, onde 120 presos fugiram do Cadeião de Pinheiros. Além de viaturas clonadas, clonavam-se veículos da Justiça e até alvará de soltura falso, com isso conseguiram levar um detento embora oficialmente. Uniformes das polícias Militar, Civil, GOE (Grupo de Operações Especiais da Polícia Civil), e Federal também eram clonados, como por exemplo, na falsa blitz que armaram para o seqüestro do empresário e publicitário Washington Olivetto, onde vestiram uniformes da Polícia Federal. Uniformes de enfermeiros também eram usados, como aconteceu em 6 de março de 2000, no Complexo do Carandiru, Zona Norte de São Paulo. Presos que recebiam tratamento médico, com bisturis e estiletes, renderam enfermeiros e carcereiros e ali saíram pela porta da frente do Hospital Central do Departamento de Saúde do Sistema Penitenciário. 16 SOUZA, Fátima. PCC, a facção. Rio de Janeiro: Record, 2007. pag 52 29 Quem pensa que o Primeiro Comando da Capital se limita a atuar somente na Capital e no interior de São Paulo se engana. O maior assalto a banco da história do país no Ceará, lá estavam integrantes do PCC, agindo mais uma vez. Através de um túnel de 78 metros, que ia da rua 25 de Março até a sede do banco em Fortaleza, e trabalho de todo um fim de semana levaram, em valores, 168 milhões de reais. Fato ocorrido nos dias 6 e 7 de agosto de 2005. As mulheres do PCC também não ficam atrás, vão para a guerra, lutam pela liberdade, ou se do lado de fora, lutam pela liberdade e resgate de maridos, amantes. Orquestram planos de fugas, auxiliam nas organizações de operações da facção, operam centrais telefônicas, assaltam, seqüestram, traficam. E as histórias do PCC não param por aqui. Serviços terceirizados também eram usados em seqüestros, por exemplo. Tudo bem planejado. Selecionam um primeiro grupo que arrebata a vítima, esse grupo entrega a vítima a um outro grupo de bandidos (o primeiro grupo desconhece o local onde a vítima será levada, tudo por precaução caso a polícia prenda algum dos bandidos que atacaram a vítima, o cativeiro não será revelado). Já no cativeiro há outras pessoas esperando o seqüestrado para dar-lhe comida e água. O que planeja o seqüestro nunca fala direto com a vítima. O que é encarregado das negociações não participa da ação de seqüestro e nem sabe onde é o cativeiro. Sua missão é exclusiva de convencer a família a pagar o resgate. O PCC vende até os seus seqüestrados quando percebem que o seqüestro vai lhe render uma grana alta. Oferece a vítima a outras quadrilhas como se objeto lucrativo fosse. O PCC selecionava os que iam ser seqüestrados. Listas grandes feitas depois de analisarem toda a vida da vítima ou de alguém da sua família para saber se a operação seria rentável. Fornecem também bolsas de estudo a estudantes de direito, para que depois de formados, defendam a organização. Concursos Públicos também era alvo da facção. E assim, comprando gabaritos das provas, conseguiam infiltrar seus integrantes dentro dos órgãos públicos e assumir estratégias em órgãos judiciários e policiais em todo país. O PCC ia mais longe, mostrando cada vez mais o seu poder. Membros das Farc (Forças Armadas Revolucionárias da Colômbia) vieram ao Brasil para passar técnicas de guerrilha e táticas de seqüestros para os integrantes do Primeiro Comando. “O PCC mantém laços estreitos com as Farc”, disse o Juiz Odilon de Oliveira, de Mato Grosso do Sul. 30 Na Penitenciária Central do Paraná, para onde foram transferidos de São Paulo, Cesinha e Geléia, lideraram a maior e mais longa rebelião da história do Estado do Paraná. Forma 144 horas de motim. O Objetivo seria reivindicar melhorias nos presídios e a volta deles para São Paulo. Objetivo alcançado. Os líderes da facção voltaram para a Capital Paulista e voltando a assustar a Capital o Secretário queria enviá-los a outro estado, porém nenhum os aceitavam. Foram enviados para Florianópolis, mas retornaram. Um acordo foi feito com o governo do Rio de Janeiro de levar os líderes do Primeiro Comando ao Presídio de Bangu. Outro erro do Sistema Prisional. Lá, Gê e Cesinha conheceriam melhor o Comando Vermelho. Segundo Wagner Giudicce, chefe da Delegacia Anti-Sequestro no fim de 2003 o PCC é uma grife. Antes no anonimato, agora orgulhoso em divulgar sua sigla. A febre do PCC se espalhava. Presos queriam fazer parte da facção, pois iriam ser mais respeitos em dizer que faziam parte desse grupo e a polícia também se orgulhava em divulgar que os detidos pertenciam à facção. Virou moda. Chamava a atenção de todos e com isso crescia em tamanho, audácia e em caixa. Detentos faziam de suas celas, escritórios de onde negociavam todo o narcotráfico do lado de fora. Com “funcionários” leais, conseguiam enriquecer e fazer crescer seu patrimônio do lado de dentro da prisão. A polícia já não tinha controle. O bando cresceu de uma forma assustadora e o que eles tinham em seu poder eram somente números. Em agosto de 2005, o delegado Rui Ferraz Fontes calculou que naquele período, dentro das cadeias, havia pelo menos 2 mil celulares em poder dos bandidos do PCC. Possuíam arsenal de armas que a nossa polícia nem sonha em possuir. 1.4.3. Terceiro Comando Surgiu com a união da Falange Zona Sul com a Falange da Córeia, ambas com domínio da Galeria C do Presídio da Ilha Grande, logo quando estoura a guerra que deu a hegemonia do Comando Vermelho dentro da penitenciária. Cesinha que foi líder do PCC até 2002, quando foi expulso e jurado de morte pela nova chefia, fundou o TCC, quando estava no presídio de Oswaldo Cruz. A 31 base do TCC foi montada por ele quando foi transferido para Sorocaba onde ficou por quase 2 anos. Cesinha foi morto, em 13 de agosto de 2006 pelos próprios integrantes de sua facção porque, segundo eles, seu chefe era muito arrogante. 1.4.4. União CV e PCC A união das duas principais facções do nosso País começou quando Gê e Cesinha, líderes do Primeiro Comando, foram transferidos para o Rio de Janeiro, para o Presídio de Bangu. A união era explosiva. Os dois fundadores do PCC continuavam comandando seus negócios mesmo de outro estado. Cada dia que passava mais se tornavam conhecidos e faziam amizades com os bandidos cariocas de Bangu. Muito mais unidos dia após dia essa amizade ia crescendo até que as fronteiras entre eles foram rompidas e ali estavam: PCC e CV prometendo amizade e solidariedade mútua. O Estatuto do PCC foi alterado acrescentando o nome do Comando Vermelho: [...] em coligação com o Comando vermelho – CV e PCC – iremos revolucionar o país de dentro das prisões e nosso braço armado será o terror dos poderosos, opressores e tiranos que usam o Anexo de Taubaté e o Bangu do Rio de Janeiro como instrumento de vingança da sociedade, na 17 fabricação de monstros. Bem como o Estatuto do Comando Vermelho: “... e deixamos clara nossa amizade pelo PCC.” 18 Pronto. As duas facções estavam unidas através de acordos entre si. CV autorizou o PCC a instalar pontos de drogas em alguns morros do Rio de Janeiro. E o Primeiro Comando passou a negociar explosivos e armas para o Comando Vermelho. A demonstração de tal união era nítida. Suas ações eram conjuntas. Tanto no Rio de Janeiro quanto em São Paulo o terror espalhado era simultâneo. Em novembro de 2002, por exemplo, as duas facções roubaram granadas de uma fábrica de explosivos em São Paulo, com o objetivo de usar os explosivos para 17 18 SOUZA, Fátima. PCC, a facção. Rio de Janeiro: Record, 2007. pág. 126 SOUZA, Fátima. PCC, a facção. Rio de Janeiro: Record, 2007. pág. 126 32 derrubar os muros de Bangu I, onde Fernandinho Beira-Mar estava preso e ao mesmo tempo, os muros de Bangu IV para resgate de presos ligados ao CV. Sua audácia era tremenda que além de se unirem também queriam que essa união fosse divulgada para isso compuseram várias músicas falando da coligação CV/PCC. Músicas que foram tocadas em diversos bailes funk e gravadas em CD e depois distribuídos entre os presos e jovens nas favelas. Foi um sucesso. A população sabiam as letras de cor. As letras faziam apologia ao crime, à violência, às drogas e exaltavam os traficantes. CV e PCC firmaram compromisso muito além de traficar drogas e armamentos em conjunto. Abriram, com o controle do poder de seus estados, abriram as portas dos mesmos para abrigar bandidos procurados pela polícia. Um exemplo foi a captura de Elias Maluco suspeito da morte do Jornalista Tim Lopes. Enquanto a polícia procurava-o em todo o Estado do Rio de Janeiro ele estava confortavelmente numa casa no interior de São Paulo. Bandidos do PCC depois de matarem o Juiz Antonio José Machado dias, receberam guarida e proteção de membros do Comando Vermelho no Rio de Janeiro. Para que a união ficasse cada vez mais forte as duas facções se uniram a Norambuena, apontado como cabeça do seqüestro do Empresário Washington Olivetto. Norambuena e seu bando foram presos no presídio de Presidente Bernardes e ali, juntamente com membros das duas facções, ensinou novas técnicas para seqüestros e de como explodir bombas, experiências e conhecimentos foram trocados entre eles. Agora Comando Vermelho, Primeiro comando e MIR (Movimento Revolucionário de Esquerda do Chile) estavam juntos. Mais forte ainda! O Comando Vermelho se uniu ao PCC para manter a hegemonia do tráfico de drogas em todo país. 33 Capítulo 2 - A Segurança Nacional e a Segurança Pública Medo, pânico da população, crise no Sistema Carcerário, mortes, rebeliões em diversos presídios, crescimento da criminalidade organizada, envolvimento de jovens cada vez mais cedo no mundo do crime, falência da justiça, mercado ilegal se alastrando é o cenário pelo qual o Republica Federativa do Brasil tem se deparado, levando o cidadão a se refugiar em suas casas, atemorizados. A declaração Universal dos Direitos Humanos estabelece, em seu artigo 3°, que todo indivíduo tem direito à segurança de sua pessoa e, em seu artigo 7º, que todos têm o direito de ser protegidos. Segurança é uma necessidade, um direito inalienável, um bem comum, um valor primordial. Por “segurança” pode-se entender como uma noção de garantia, proteção e tranquilidade dada a sociedade diante de ameaças ou ações contrárias à pessoa, à instituições, à bens e etc. Um dos mais difíceis problemas que os dirigentes de uma nação enfrentam é obter o exato equilíbrio entre as obrigações e as responsabilidades do Estado – votado para o interesse coletivo e detentor do monopólio da coercibilidade – e as do cidadão, possuidor, de um lado, de direitos naturais inalienáveis e, de outro, subordinado à vontade nacional, com obrigações 19 nos limites de uma legislação justa. A Segurança abrange a proteção do individuo, da comunidade e da Nação. Porém, dizer que a segurança é absoluta torna-se uma utopia, pois, segundo o professor Oliveira Júnior “onde há vida, há perigo, onde há perigo, há temor, onde há temor, há insegurança. A insegurança é, portanto, conseqüência do fato de viver.” Em qualquer Nação ou Estado encontram-se conceitos diferentes de segurança e insegurança, tanto é que o entendimento de segurança em determinados ordenamentos jurídicos de um Estado pode constituir nítida razão de insegurança para outros. Os principais motivos de que uma nação não desfrute de uma segurança plena é, internamente, a luta pelo poder, as limitações dos meios do Poder Nacional, e no campo internacional pode-se observar que à medida que uma Nação se 19 Manual Básico. Escola Superior de Guerra. Rio de Janeiro: ESG, 1988. p. 163 34 desenvolve, adquirindo maior influência política, crescendo nos assuntos internacionais, desperta, conseqüentemente ambições e a criação de novos conflitos de interesses, dos quais podem resultar conflitos, brigas pelo poder, que em última análise, gera razões de insegurança tantos para os diretamente envolvidos quanto à população indiretamente. Sem falar da soberba que observa-se no mundo atual onde os bens materiais se sobressaem aos espirituais. A era dos confrontos de gerações, de ideologias e de classes sociais, a insatisfação, o preconceito, o radicalismo, a cultura, a crença, que leva o homem a ver o mundo sob ângulos diferente, tudo isso, envolve milhões de seres humanos concorrendo para o aumento progressivo da insegurança no mundo, pois faz com que o homem olhe somente para os seus interesses não importando a conseqüência deles para o restante dos indivíduos a sua volta. O lema é cada um por si. E assim a humanidade caminha para um mal que se alastrado poderá causar sérias conseqüências para as gerações presentes a para as vindouras. 2.1. Segurança Nacional A Segurança Nacional é uma função do Estado uma vez que ele é detentor do poder coercitivo. E tendo a responsabilidade de assegurar ao povo/população de determinado Território sua proteção e preservação dos interesses nacionais contra qualquer tipo de atentado, agressão ou ameaça. É importante salientar que tal responsabilidade não é exclusiva do Estado vez que há a necessidade da cooperação de toda a Nação. Logo, concluí-se que: Segurança Nacional é a garantia, em grau variável, proporcionada à Nação, principalmente pelo Estado, por meio de ações políticas, econômicas, psicossociais e militares, para, superando os antagonismos, conquistar e 20 manter os Objetivos Nacionais Permanentes. A função primária do Estado é garantir a sobrevivência e a segurança de sua sociedade, com o compromisso de realização dos objetivos vitais da nação, mas imaginar um Estado poderoso, capaz de solucionar todos os problemas, seria inócuo, vez que o Poder dado a ele para defender o bem comum é restrito, baseado 20 Manual Básico. Escola Superior de Guerra. Rio de Janeiro: ESG, 1988. p. 168 35 na parcela do Poder Nacional que a própria Nação coloca em suas mãos. Para que esteja inteiramente capacitado a enfrentar todos os problemas maiores do País, é necessário que o Governo, responsável pela segurança, através do poder que lhe foi atribuído ao Estado, conte com a colaboração da sociedade que o representa, conciliando o direito da pessoa humana com o interesse da coletividade, o que seria mais importante se cada indivíduo tivesse consciência e desenvolvesse seu próprio papel dentro da sociedade ao encontro do direito do seu semelhante. Talvez seja por essa cooperação da sociedade ante a Segurança do País que a Escola Superior de Guerra (ESG) acredita absolutamente no homem brasileiro e na sua capacidade de construir uma sociedade livre e justa. Conclui-se que segurança nacional não é mais responsabilidade somente do Estado em sentido estrito nem ao menos um questão dos militares. O problema saiu do campo exclusivo do Estado e passou a ser um problema da população como um todo, cada um contribuindo com o que lhe está em seu dispor. “... não pode ser resolvido nem “fora” do Estado ou “sem”o Estado, nem exclusivamente pelo Estado.21 A Segurança Nacional talvez exista para algo superior a ela e não para um fim em si mesma, pois é ela que tem o poder coercitivo por excelência, logo o seu objetivo principal é exercer o comando, claro que respeitando o direito de cada individuo, mas em prol da sociedade como um todo. A Lei número 7.170/83 “define os crimes contra a segurança nacional, a ordem política e social, estabelece seu processo e julgamento e dá outras providências.” Para enfrentar o crime organizado não só em São Paulo, mas em todo o Brasil, é preciso que o governo federal adote um plano de segurança nacional, com ações unificadas e permanentes envolvendo os três entes da Federação (União, estados e municípios). Senador César Borges (PFL22 BA). Foi na Escola Superior de Guerra que se formulou os princípios da Doutrina de Segurança Nacional, com o objetivo de aprimorar uma Doutrina de Ação Política 21 NOGUEIRA, Marco Aurélio. Segurança Nacional, Soberania e Sociedade Civil. UNESP. , Perspectivas, São Paulo, 30: 99-120, 2006. Disponível em <http://www.fclar.unesp.br/seer/index.php?journal=perspectivas&page=article&op=viewFile&path%5B %5D=366&path%5B%5D=251> Acesso em 29 janeiro 2009. 22 AGÊNCIA SENADO. César Borges defende plano de segurança nacional para combater o crime organizado. 15 de maio de 2006. Disponível em <http://www.direito2.com.br/asen/2006/mai/15/cesarborges-defende-plano-de-seguranca-nacional-para-combater-crime> Acesso em 29 janeiro 2009. 36 norteando os passos que devem ser dados pela Nação, onde segurança e desenvolvimento andem sempre juntos. Tais decisões não se basearam apenas em doutrinas e princípios, mas buscou-se um paralelo entre a teoria e a realidade vivida, visando com isso, balancear a eficácia e a ética. A Doutrina de Ação Política formulada pela ESG não deve ser confundida com a Doutrina de Segurança Nacional, seu objetivo é sistematizar os estudos e criar estratégias para a implementação que conduzem à formulação da Política de Segurança Nacional. Doutrina de Segurança Nacional é o conjunto de valores, princípios, conceitos, normas, métodos e processos que permitem a sistematização dos estudos, a formulação e os desdobramentos da Política e da Estratégia de Segurança Nacional. Política de Segurança Nacional é a arte de estabelecer um conjunto de opções, princípios, normas e diretrizes com vistas a, superando os Antagonismos, assegurar a conquista e a manutenção dos Objetivos Nacionais Permanentes. Estratégia de Segurança Nacional é a arte de preparar e aplicar o Poder Nacional para, superando os Antagonismos, conquistar e manter os Objetivos Nacionais Permanentes, de acordo com a orientação estabelecida 23 pela Política de Segurança Nacional. A segurança pode ser dividida em Segurança Interna, Segurança Externa, Segurança Coletiva, Segurança Comunitária e Segurança Individual sendo as duas últimas o alicerce da Segurança Nacional, como bem salientou o Presidente Médici: “A Segurança de uma comunidade não prospera na desigualdade entre os homens, na floração de privilégios, na injustiça social, nem na desagregação entre raças e gerações.” 2.2. Segurança Pública [...] o estado de garantia que o indivíduo e a comunidade deve assegurarse, precipuamente pela ação do Estado, pra que as violações não contestatórias à lei e à ordem sejam prevenidas e minimizadas e para que, ante a violação, a ordem pública seja rapidamente restaurada. Os danos 24 reparados e o transgressor punido e reeducado para a convívio social. Numa sociedade que tem como base a democracia, a segurança pública vem com o objetivo de proteger os direitos individuais contra possíveis ameaças e 23 Manual Básico. Escola Superior de Guerra. Rio de Janeiro: ESG, 1988. p 170 Gen Ex Euclydes de Oliveira Figueiredo Filho. Escola Superior de Guerra. A Segurança Nacional e as Forças Armadas. Brasília, 1985. 24 37 violações de direito e também assegurar o pleno exercício desses direitos, buscando a qualidade de vida dos seus cidadãos. As forças de segurança buscam se aperfeiçoar a cada dia para atender, de modo eficaz, a sociedade como um todo, com o foco voltado para à defesa dos direitos fundamentais do cidadão sabedora de que é competência do Estado garantir a segurança das pessoas, de seus bens, garantindo a paz e a ordem pública, trabalhando pra inibir ou reprimir a prática de atos socialmente reprováveis. A segurança pública é responsável por criar ações de repressão para oferecer ao cidadão condições para conviver em sociedade, trabalhar, estudar, se divertir, ou seja, protegê-lo dos riscos a que estão expostos. A de se observar então, que segurança pública não se limita à política do combate à criminalidade e nem somente à atividade policial. É um conjunto que age em harmonia: Sociedade, polícia, Ministério Público e Poder Judiciário. Caso tudo isso deixe de atuar em conjunto favorece o crescimento das práticas criminosas com mais audácia e poder. A impunidade promove injustiças, que estimulam a violência, que levam ao crime, que geram gastos, difundindo o medo em toda a sociedade levando a deteriorização da confiança no convívio social. As instituições responsáveis pela segurança perdem a credibilidade na medida em que é ofuscada a sua base, o fim ao qual se destina, pois diante de tanta violência não conseguem trazer o mínimo de conforto à sociedade brasileira, perdendo assim a confiança que o cidadão teria que ter para viver uma vida melhor e mais tranqüila. A Segurança Pública tem se resumido em histórias que seus personagens, os brasileiros, tenham vivido ou tenho escutado falar. Cada um em particular tem uma história a ser contada. Já foi vítima de assalto dentro de ônibus, na porta de dentro de escolas, já teve seus carros roubados ou furtados, sua residência arrombada, fora os que já foram protagonistas de dias de maus-tratos, confinados em cubículos por serem vítimas de um seqüestro que durou dias até o desfecho final depois de uma série de negociações entre policiais, bandidos e família, sem contar quando o desfecho culminou na morte da vítima. Outros foram submetidos a experiências da dor, da vergonha, da humilhação da experiência de terem sido vítimas de estupro. Casos mais graves como homicídios com requintes de crueldade, sobretudo com vítimas, como crianças e adolescentes. 38 Fatos como esses são cada vez mais prováveis de acontecer na vida de um cidadão comum. Tudo tem se tornado comum, muito mais próximo do que se possa parecer, levando-o a perder a confiança que uma vez foi depositada nos responsáveis pela segurança pública. Fatos, esses, que alcançam tanto favelas, quanto bairros de classe alta, tanto interior, como capital, tanto escolas públicas como particulares. As conversas em bares, festas, restaurantes, ruas, casas é a falta de tranquilidade, falta de uma segurança pública mais acessível, que proporcione uma certa paz, por mais remota que seja, mas que garanta o que lhe é de direito: uma vida segura! 2.3. Grande impacto causado pelo Crime Organizado na Segurança Nacional “Por segurança nacional, entende-se aqui uma condição relativa de proteção coletiva e individual dos membros de uma sociedade contra ameaças plausíveis à sua sobrevivência e autonomia.” 25 O grande impacto que o crime organizado causa na Segurança Nacional é, uma ameaça ao próprio fim da Nação: a democracia, base de nossa Sociedade, uma sociedade democrática de direito. O governo brasileiro reconhece que o crime organizado tem causado sérios problemas sociais e econômicos no país, e esse problema tem se alastrado de uma forma muito grande em todos os níveis sociais. O crime e a violência levam a sociedade brasileira às maiores preocupações. Há uma série de programas, os quais o Brasil tem se filiado, em busca do combate ao crime organizado para estudar como melhorar a capacidade de investigação, meios mais ágeis e modernos para a análise de situações, treinamento de agentes e etc. O governo brasileiro tem cooperado também com outros países e em ações conjuntas tem realizado trabalhos em prol do combate ao tráfico internacional de drogas e de armas e lavagem de dinheiro. A SENAD (Secretaria Nacional Anti-drogas) e o Ministério da Justiça estão pondo em prática uma 25 CEPIK, Marco. Segurança Nacional e Segurança Humana: Problemas Conceituais e Conseqüências Políticas. Security and Defense Studies Review. Vol. 1 Spring 2001. Disponível em: <http://www.ndu.edu/chds/journal/PDF/cepik.pdf> Acesso em 24 fevereiro 2009. 39 aproximação com o UNDOC. Também, o Brasil participa das comissões da UNDOC e da Organização dos Estados Americanos/Comissão Interamericana para Controle do Abuso de Drogas (OEA/CICAD). Sendo a Polícia Federal que exerce papel primordial na luta contra o crime organizado, lavagem de dinheiro e a corrupção no setor público. Diversas ações de governo mostram a preocupação com a sociedade diante de um problema tão grave que tem elevado a níveis mais sérios a cada instante que passa, porém observa-se uma certa resistência e dificuldade em combater esse tipo de crime que se mostra tão bem aparelhado e tão bem organizado, que muitas vezes consegue intimidar as forças que o estão combatendo de uma força tão singela que nem mesmo percebe-se que a segurança, do papel de dominante está passando para o papel de dominada. Mesmo diante de tantos projetos, programas para erradicar a criminalidade organizada o Brasil ainda mostra o despreparo, a fragilidade do aparato de segurança em situações emergenciais e consequentemente vê-se o fortalecimento do poder paralelo e sua mobilização em busca de se tornar estado onde o Estado é ausente ou frágil diante do domínio de que é posto, pois suas táticas, seus aparelhos são cada vez mais modernos, mais ousados. Talvez um dos problemas que faz com que a segurança nacional possa estar ameaçada é o fato de o Estado dar maior importância ao crime de rua sem se preocupar com o crime organizado, os crimes mais luxuosos praticados por aqueles das camadas privilegiadas, como a corrupção, lavagem de dinheiro e outros. Quando o poder público nega a prestar serviço, por achar que seja mais um crime “comum” abre-se maior domínio para os traficantes que se acham no poder e domínio da região e os seus moradores ficam submetidos às regras de um poder paralelo, sem poder reivindicar o que lhe é de direito: a Segurança Nacional. De um lado o poder paralelo, o crime organizado, tomando à frente quando o Estado se mostra ausente, do outro lado, por causa dessa inércia, o sistema penitenciário constantemente perdendo suas forças, esgotando as possibilidades de recuperação dos indivíduos encarcerados e a sua ressocialização quando libertos. Cadeias superlotadas, inibindo o trabalho das forças de segurança e a falta de incentivo a esses profissionais para darem ao sistema as soluções rápidas exigidas pela população. Seja o Estado bem ou mal organizado sempre iremos encontrar no interior do poder, conivência, solidariedade, apoios recíprocos entre as autoridades do poder e 40 a criminalidade organizada. Porém quando há uma desestrutura estatal a conseqüência gerada é sempre um fator corroborante para a proliferação da criminalidade e isso faz com que surta efeitos bem mais graves por três motivos, como bem abordado na dissertação de mestrado elaborada por Anderson Fonseca Machado (2006): a) as organizações criminosas atuam com desenvoltura exatamente nos pontos falhos da atividade estatal, provendo com atividades privadas substitutivas os serviços públicos que o Estado deixa de prestar à população; b) a desestrutura do Estado representa como conseqüência lógica o seu s desaparelhamento material, sendo ele é a única entidade capaz de enfrentar de forma as organizações criminosas, a falta de recursos materiais facilita a atuação criminosa organizada; c) a criminalidade organizada somente se estabelece mediante uma simbiose com o poder público estabelecido, normalmente pela corrupção, o desaparelhamento material do Estado sob o aspecto humano é representado pela ausência de respeito às instituições estabelecidas e os baixos salários geram o descrédito e a ineficiência dos agentes públicos responsáveis pelo combate à criminalidade organizada. A Organização Criminosa, diante de um terreno fértil para se expandir, adapta-se diante do posicionamento que o Estado se apresenta, enraizando-se na sociedade, procurando, como alvo principal, o seu crescimento e a dominação de toda a sociedade. A garantia de Segurança Nacional tem que promover o restabelecimento do equilíbrio que os agentes estatais estão perdendo frente ao crescimento gigantesco e centrado da criminalidade organizada. As instituições estatais têm que romper as fronteiras tradicionais e jogar o jogo do Estado Paralelo e não deixar que organizações criminosas atuem em substituição ao Estado. Diante da propagação das facções criminosas o poder estatal há que encarar o medo que acirra a sociedade e não fazer vistas grossas diante de um poder que já foi entregue aos malfeitores, ou seja, fingir que não vê o poder que é visto por todos, pois é o Estado que possui o monopólio da coerção organizada. 41 Capítulo 3 - Principais tipos de delito a que as Organizações Criminosas no Brasil se dedicam 3.1. Lavagem de dinheiro O Sistema Financeiro Global tem se expandido de forma gigantesca nos últimos anos. O volume de moeda movimentada pelas instituições monetárias das principais nações do mundo tem tido um alargamento cada vez maior. Transações financeiras reúnem parceiros dentro do mesmo território como entre países, dificultando o controle de monitorar de modo periódico e contínuo todo o dinheiro circulado. A maioria das atividades criminosas existentes tem por fim a obtenção de lucro, e o dinheiro daí proveniente necessita tornar-se limpo para ser incorporado na economia de cada país e assim, circulado no Território Nacional sem deixar sombra de dúvidas que venha ser dinheiro proveniente de atividades ilícitas. Moíses Naím, em seu Livro denominado “Ilícito”, (página 131) cita que: “A lavagem de dinheiro não é simplesmente um comércio, mas um mecanismo insubstituível para qualquer tipo de negócio ilícito. O dinheiro lavado é um espelho do submundo da economia global.” A Lei 9.613/98 dispõe sobre os crimes de "lavagem" ou ocultação de bens, direitos e valores; sobre a prevenção da utilização do sistema financeiro para os ilícitos da citada Lei; cria o Conselho de Controle de Atividades Financeiras – COAF que tem como função precípua promover a aplicação da referida Lei dentro da sua respectiva área de atuação, contando com a valiosa colaboração do Banco Central do Brasil – BACEM, da Comissão de Valores Mobiliários – CVM, da Superintendência de Seguros Privados – Susep e da Secretaria de Previdência Complementar – SPC, do Ministério da Previdência, que atuam na regulamentação e supervisão dos setores 26 obrigados. Para que haja o Crime de Lavagem de Dinheiro é necessário crimes antecedentes a este como, por exemplo, tráfico ilícito e uso indevido de substâncias 26 Lavagem de dinheiro: legislação brasileira. Organizado por Conselho de Controle de Atividades Financeiras, Federação Brasileira de Bancos, 2ª ed. Ver. Brasília: COAF; São Paulo: FEBRABAN, 2005. Disponível em <https://www.coaf.fazenda.gov.br/downloads/LivroCoaf2005.pdf>. Acesso em 23 outubro 2008 42 entorpecentes, crimes contra a segurança nacional, a ordem política e social, posse e comercialização de armas de fogo e munição e etc. Um dos métodos de lavagem de dinheiro no Brasil seria o jogo com máquinas eletrônicas programadas – a forma predileta de lavagem de dinheiro do narcotráfico: o jogo com moedas ou notas em milhares de máquinas caça-níqueis. Segundo Marcelo Batlouni Mendroni (2001:481), o êxito de uma organização criminosa depende do sucesso na lavagem do dinheiro, uma vez que aquelas sempre atuam no eixo dinheiro/poder. Isso significa que toda organização criminosa necessariamente precisa da lavagem de 27 dinheiro e a pratica, mas o inverso nem sempre é verdadeiro. 3.2. Corrupção Um dos delitos que se espalha e que ouvimos falar constantemente é o crime de corrupção. Esse tipo de crime é encontrado principalmente no alto escalão da sociedade. Entre os membros dos poderes. Aqueles, mesmos, em que o cidadão brasileiro entregou nas mãos o poder de representá-lo. O crime organizado aproveita da fragilidade dos órgãos institucionais, dos baixos salários que são pagos aos agentes do Estado e aos órgãos de repressão, para ganhar sua simpatia, apresentando-lhes uma proposta bem interessante e um estado de bem estar sem muito esforço ou uma garantia de vida e um presente e um futuro bem mais promissor, com menos esforço e em curto período de tempo se trabalhado licitamente para o Estado. Este, inerte, provoca o Estado paralelo que aproveita para se mostrar como algo encantador e totalmente oposto do que lhe é proposto às autoridades. Há uma disparidade entre o Estado e o estado criado pela Criminalidade Organizada. Os crimes praticados por essas facções, são bem planejados, estruturados, antes de se-los executados. Preparação, articulações e pessoas recrutadas são algumas das preocupações dos agentes se infiltrarão ou infiltrará pessoas aonde o crime de corrupção será praticado. 27 GOMES, Alzeni Martins Nunes. Lavagem de dinheiro. Notas relevantes. Jus Navigandi, Teresina, ano 8, n. 153, 6 dez. 2003. Disponível em: <http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=4498>. Acesso em: 23 outubro 2008. 43 3.3. Pirataria Bono Vox teve seu álbum, How to Dismantle na Atomic Bomb, pirateado e disponível na Internet antes mesmo do lançamento oficial. Microsoft descobriu cópias do seu sistema de operação Long-horn, meses antes do seu lançamento mundial e assim acontece a pirataria, pratica tão comum nos dias atuais conhecida também como falsificações, réplicas, adulterações, cópias ou simplesmente imitações de relógios, perfumes, roupas, tênis, medicamentos, softwares, música, filmes e etc. Nada disso foge do alvo da pirataria Os compradores de produtos pirateados correm poucos riscos, ou quase nenhum, pois a compra é de fácil acesso, não tendo, porém, a idéia fixa de que as falsificações adquiridas por eles não deixam de ser produtos roubados, vez que resultam de uma apropriação indevida da marca, do projeto ou da idéia de alguém e também não há consciência da associação desse tipo de comércio ao crime organizado e da sonegação de impostos que o comércio desses bens envolve. A intensa vontade por produtos de marca leva o consumidor a deixar de lado a idéia de crime para se satisfazerem uma vontade própria. Não importando com as empresas que detêm os direitos da marca que esperam que os compradores paguem integralmente o preço de seus produtos. Os novos métodos de produção e reprodução levam a rápida expansão das falsificações, uma vez que a inovação e tecnologia representam novos produtos beneficiando assim os fabricantes ilícitos que têm em suas mãos produtos e equipamentos que revolucionam a arte de reproduzir o que se quer em um curto espaço de tempo. A grande maioria dos produtos falsificados vem da Ásia. China, Taiwan e Vietnã são fontes prováveis, embora não as únicas. As empresas correm o risco de fecharem as portas diante de tal situação, pois os produtos pirateados são de baixo valores atraindo assim, o consumidor, e para milhões deles, a combinação menor preço e qualidade compatível são simplesmente irresistível. O Presidente do Conselho Nacional do Combate à Pirataria e também Secretário-Executivo do Ministério da Justiça Luiz Paulo Barreto que após a invasão de camelôs nas ruas brasileiras vendendo produtos falsos, agora esse tipo de mercado migra para a Internet, com potencial ofensivo muito maior. Verdadeiras redes estão se estruturando e há vinculação de várias 44 delas com o crime organizado, como o tráfico de drogas e de armamentos.A pirataria provoca uma redução de dois milhões de postos de trabalho no mercado formal. O Brasil, de acordo com o secretário, perde, por ano, R$ 30 bilhões em arrecadação de impostos. No mundo, a Interpol (polícia internacional) já considera a pirataria o crime do século, movimentando U$ 522 bilhões/ano, bem mais do que o tráfico de entorpecentes, de U$ 360 28 bilhões/ano. O dia Nacional de Combate à Pirataria (3/12/2008) foi lembrado pelo Ministério da Justiça com uma série de ações previstas para o ano de 2009 para combater esse tipo de Crime. O plano do CNCP tem por objetivo articular medidas junto aos comerciantes buscando alternativas para a venda de produtos ilegais, fechar parcerias com provedores de Internet para maior controle de vendas de seus produtos, abertura de novas delegacias especializadas no assunto. Diante da falsificação de remédios pirateados, foi, também assinado convênio com a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa). 3.4. 3.4.1. Tráfico Tráfico de Seres Humanos Para entendermos melhor o que seja o Tráfico de Seres Humanos teremos que saber a diferença dos termos Contrabando humano e Tráfico Humano. Vejamos: No Contrabando humano, o imigrante paga ao contrabandista pela travessia. No tráfico, o traficante decide, coage o imigrante e o vendo como mão-de-obra. Muitos imigrantes contraem dívidas exorbitantes e para paga-las são obrigados a aceitar trabalhos aviltantes e condições de trabalho indignas. O contrabando humano e o tráfico humano acabam por se confundir. Ambos são aspectos de uma vasta nova indústria que prospera graças às aspirações daqueles que buscam uma vida melhor em algum lugar e aos obstáculos que os governos colocam no seu caminho. O Tráfico de pessoas é o mais moralmente repugnante comércio ilícito da atualidade é a forma mais sórdida de circulação do trabalho na nova economia 28 Pirataria, o crime do século. 1 julho de 2008. Disponível em: <http://www.mj.gov.br/combatepirataria/data/Pages/MJ3E7529ECITEMID6F9F0D552AF24645BE811 1EFD24CD0DDPTBRIE.htm>. Acesso em 23 de outubro 2008. 45 global, pois pessoas migram pelo mundo movidos por oportunidade, esperança, desespero ou até mesmo necessidade de sobrevivência. E os traficantes aproveitam-se desses impulsos e driblando os obstáculos interpostos pelos governos, transformam esses seres humanos em um mercado lucrativo fazendo com que as vítimas acabem em locais com péssimas condições de trabalho. Não se pode esquecer-se do Comércio Sexual. Números intermediários de escravos sexuais prosperam atualmente no mundo e a trajetória de mulheres exploradas por recrutadores geralmente com promessas falsas, em geral a promessa de se tornarem modelos, secretárias ou balconistas em um país rico, são cada vez maiores. Algumas delas são simplesmente raptadas e depois de cruzarem as fronteiras com a conivência de funcionários corruptos, são armazenadas em “depósitos” e condicionadas à exploração sexual pelo uso de drogas, espancamentos e seguidos estupros. Uma mulher poderá passar por isso de um ou mais anos e depois, como lixo, o traficante decidir que ela não mais serve para o trabalho que lhe trás lucro e solta-la. As operações do tráfico sexual são tão eficientes quanto sórdidas. Há casos que traficantes negociam crianças pequenas utilizadas como pedintes profissionais ou vendidas para adoção no Ocidente. Outros negociam a compra da criança antes mesmo do parto, outros oferecem à famílias certo valor ou bem, como um televisor por exemplo, em troca de um recém-nascido. Segundo a Dra. Arinda Fernandes, “A definição mais ampla de tráfico de seres humanos e aceita internacionalmente está prevista no protocolo para prevenir, suprimir e punir o tráfico de pessoas, especialmente mulheres e crianças, em suplemento a Convenção das Nações Unidas contra o Crime Organizado Transnacional, conhecida como Convenção de Palermo (2000). Essa Convenção, já ratificada no Brasil, considera o tráfico de seres humanos como ‘recrutamento, transporte, transferência, abrigo ou recebimento de pessoas, por meio de ameaça ou uso da força ou outras formas de coerção, de rapto, de fraude, de engano, do abuso de poder ou de uma posição de vulnerabilidade ou de dar ou receber pagamentos ou benefícios para obter o consentimento para uma pessoa ter controle sobre outra pessoa, para propósito de exploração. Exploração inclui, no mínimo, a exploração da prostituição ou outras formas de exploração sexual, trabalho ou serviços forçados, escravidão ou práticas análogas à escravidão, servidão ou a 29 remoção de órgãos.” 29 FERNANDES, Arinda. Tráfico e escravatura de seres humanos. Jornada Anual da Fundação Internacional Penal e Penitenciária da ONU. Manaus/AM:21-25 setembro 2004. 46 3.4.2. De drogas e Armas O Tráfico de drogas pode ser considerado a principal atividade do crime organizado no Brasil, mercado consumidor e rota de drogas dos países andinos para os Estados Unidos e para a Europa. Apesar de a Polícia Federal ser recordista em apreensão de drogas, o mercado de narcotráfico supera o da construção civil e grandes indústrias. O tráfico de drogas pode ser considerado uma das atividades ilícitas mais rentável do mundo. E é preciso ser muito inteligente, audacioso, ambicioso para se manter neste mercado. “[...] o comércio das drogas faz emergir especialistas que tiram vantagens dos lugares, da língua, do conhecimento local ou da habilidade para desaparecer na multidão” 30 Fuzis, metralhadoras, granadas, foguetes são algumas das armas que os profissionais do crime usam para enfrentar seus rivais. Em 2002 a polícia descobriu uma fábrica de granada do crime organizado com equipamentos importados para recarregar balas de fuzis, pois uma simples bala de fuzil custa mais ou menos um dólar e como em suas ações usa-se várias é bem mais lucrativo a fabricação de sua próprias balas. 30 NAÍM, Moisés. Ilícito: o ataque da pirataria, da lavagem de dinheiro e do tráfico à economia global. Rio de Janeiro: Jorge Zahar Ed., 2006. p. 46 47 Capítulo 4 - Como funcionam as organizações 4.1. Diversos mecanismos que regem as relações dos criminosos 4.1.1. Como se estruturam Geralmente, uma organização criminosa estrutura-se em cinco áreas principais: um Centro de Comando, um Centro de Inteligência, Coordenação e Controle, Unidades Operacionais e Unidades Periféricas. A primeira, o Centro de Comando, compõe-se, de regra, de um único membro ou de um número reduzidíssimo de pessoas, e o que vai definir esse modelo é o tipo de atividade ilícita desenvolvida pela organização. A segunda, Centro de inteligência deve constituir-se de um número limitado de integrantes, dificultando o acesso à zona de tomada de decisões que é representada pela cor vermelha, justamente por ter a função de fechar, trancar, bloquear o acesso ao centro de comando e, ao primeiro alerta que ocorrer na faixa amarela de coordenação e controle, acionar os mecanismos de defesa da organização, e sendo o caso, o seu desmonte ou acorbertamento. Já a área de Coordenação e Controle executa a função de manter interligada a estrutura da organização e é o elo entre a parte superior e mais importante da estrutura e a parte inferior, em que se aglutinam as pessoas que vão desenvolver as atividades criminosas que exigem menos qualificação intelectual e menor capacitação para a realização de operações fraudulentas. Exerce também, a função de tocar a sirene de alerta para os órgãos superiores, daí a cor amarela; uma vez acionado o alarme, a organização começa a operar o sistema de defesa. A quarta área que é a de Unidades Operacionais desenvolve as operações criminosas da organização. É nela que são desenvolvidas as tarefas de planejamento operacional dos delitos mais comuns, delitos que podem ser praticados por qualquer indivíduo, independentemente de ligação a uma organização criminosa. Nas Unidades periféricas, participação dos indivíduos que as integram restringe-se à efetiva prática de delitos comuns, encontra-se nela a “mão-de-obra” que está a serviço da organização criminosa. É a parte da organização mais visível e, por conseguinte, mais vulnerável, concentrando-se na faixa de livre contato com os órgãos de fiscalização e repressão; é a faixa verde. 48 A estrutura de uma organização criminosa e seu funcionamento se assemelha ao modelo de empresa. Em torno de um Centro de Comando, onde emanam as regras, objetivos, decisões que interagem com os demais setores que completam o sistema organizacional. Cada uma de suas unidades possuem tarefas e funções específicas com pessoal qualificado para o desempenho da tarefa que lhe é atribuída. Cada um deve exercer sua função de maneira bem definida para que haja o entrosamento com os demais ramos e não passe nada desapercebido ou com falhas ou deixando abertura para algum erro no resultado final, fazendo com que tal resultado seja o mais satisfatório possível. O Centro de comando e o centro de inteligência são as duas unidades que menos pessoal possuí, visto que quanto maior o número de pessoas interligadas diretamente ao Centro de Comando, mais vulnerável se torna a segurança da “organização”. Observa-se a total organização desses grupos criminosos que numa estrutura bem sólida revestem-se de legalidade os seus “negócios”, desenvolvendo atividades empresariais lícitas que têm a finalidade de processar os recursos provenientes das operações criminosas, fazendo com que tais recursos entrem na economia do país sob o manto da legalidade.”31 (OLIVEIRA FILHO, 2002. p. 102/103). 4.1.2. Como são feitos os recrutamentos O Crime organizado possui duas modalidades diferentes: o tradicional que o relacionamento entre os membros é baseado no apadrinhamento. O indivíduo só entra no grupo por indicação de um indivíduo que o avaliza e se responsabiliza por ele, passando, daí, a carreira dos dois interligada. E o empresarial onde as relações entre os membros são apenas de trabalho, sem qualquer vínculo mais forte, visto que são grupos especializados, que atuam em determinado tipo de crime. No que tange o tráfico de drogas, os traficantes têm investido muito em jovens de comunidades sem perspectiva de trabalho e estudo. Esses vêem uma saída rápida de prática para ganhar dinheiro. O crime organizado patrocina treinamento e 31 Oliveira Filho, Edemundo Dias. O Vácuo do poder e o cirme organizado: Brasil, início do século XXI. Goiânia: AB, 2002. pág. 102/103 49 apoio àqueles que entrarem para suas organizações. Dão prioridade aos que já tem experiências anteriores em guerrilhas, experiência em adquirir informações, conduzir armamentos e arsenal de armas e munições, por ser cada vez mais sofisticado, tem que ser manueado por quem já conhece do material. Infiltram pessoas das Forças Armadas, tudo isso para que o custo com treinamento seja reduzido. O Primeiro Comando da Capital, por exemplo, se infiltram em albergues, onde encontra-se moradores de ruas para, ali, fazerem seus recrutamentos. Esses, geralmente, quando selecionados se transformam em “mulas”, pessoas que, em troca de um bom dinheiro, transportam drogas, para onde o seu “chefe” mandar. Aos que são recrutados e os que já foram, porém estavam na prisão e quando ganham a liberdade geralmente são oferecidas casas, porém em troca de gerenciar um pontode-venda de drogas, por exemplo. E é na população carente que as facções se infiltram mostrando um modelo cheio de futuro e assim encontram um terreno fértil para selecionar àqueles de que necessitam para prosseguir seu trabalho. Nas favelas e periferias quem manda são os traficantes. São eles que cobram pedágios, decretam feriados quando da morte de colegas, aliciam menores no mercado do crime, organizam matanças. E a população dessas áreas obedecem ao regime imposto por tais pessoas A organização montou uma hierarquia com postos propositadamente chamados de “soldados” e “generais”. Com estatuto. Com batismo. Com rituais de entrada. Com pagamento de mensalidade. Com garantias de apoio para quem estivesse fora ou dentros dos cárceres. Com investimentos. Com compra de pessoas que atuam profissionalmente em vários níveis, inclusive o jurídico, providenciando a graduação daqueles que seriam os doutores do crime. Criou-se, aos poucos, uma irmandade, ao estilo mafioso, na qual todos passaram a ser tratados e compromissados 32 como irmãos. O Crime Organizado também infiltram seus agentes na Máquina Pública através de concursos públicos. Preparam os seus, dão forte base de estudos para que quando preparados possam prestar os certames e assim entrarem de uma forma lícita no poder. Muitas vezes Curso de Direito são pagos para que após a conclusão as pessoas possam entrar em diversos órgãos da cúpula do poder. Infelizmente, diante do quadro de inércia do Estado diante do caso, e mais especificamente, do aparelho policial, que não vemos nem o crescimento qualitativo 32 SOUZA, de Percival de. Sindicato do Crime. São Paulo: Ediouro, 2006. pág. 21 50 nem o quantitativo para o combate ao crime, logo seus executores encontram terreno fértil em busca de mão de obra disposta a gerir e fazer crescer o crime organizado de forma, como o próprio nome já sugere, bem organizado. O governo oferece aos presidiários que saem das cadeias cartilhas de orientação de como retornar ao convívio social, a se reintegrar à sociedade, porém resta colocar em prática tais condutas a serem seguidas logo que deixarem a cadeia, porém, muitos saem sem perspectivas e já em dívidas com grupos criminosos e para quitá-las aliciam-se novamente ao crime. Esses mesmos expresidiários encontram no crime organizado o que dificilmente encontrará na sociedade devido a sua condição de ex-detento: emprego. O que mais uma vez leva às facções criminosas a conseguirem maiores adeptos, pois muitos precisam trabalhar e encontram nelas uma porta profissional bem maior e fácil do que encontrariam se batessem na porta do Estado em virtude da discriminação e por não serem aceitos pelos demais membros da sociedade. Vínculo estabelecido dentro dos grupos criminosos 4.1.3. Sob qual lógica operam O Crime Organizado funciona no sistema de holding: armas ilegais são trocadas por drogas; o dinheiro obtido com as drogas é “lavado”, contribuindo para a compra de mais drogas e armas. E esse tipo de prática contribuirá, ainda, para o terrorismo. O Estado paralelo tem suas leis próprias, se apóiam nos direitos e deveres por eles elaborados. Possuem seus regimentos internos e que cada qual que faça parte do seu mundo tem que obedecer as regras que lhe são impostas sob pena de ser julgado, não pelas leis da República Democrática de Direito, mas pelas suas próprias regras de julgamento. Um exemplo disso foi a morte de um jornalista que foi sequestrado, julgado, condenado e morto por um bando. 51 4.1.4. O sentido de cada ação, de cada gesto O objetivo é vencer e acertar contas com seus desafetos, porém disfarçado por reivindicações por melhores condições de vida dentro dos presídios. É assim que agem. Usam os maus tratos, superlotações, poucos defensores públicos, enfim as condições sub humanas que vivem dentro das muralhas somente como desculpa para rebeliões, para mostrar-nos o seu poder diante de, muitas vezes, uma segurança inerte. Demonstração de poder é o que querem. Demonstração de ousadia diante das forças que foram criadas para recriminá-los é o que necessitam. Os poderosos mandam e são obedecidos. E quanto mais o governo faz vistas grossas, não acreditando numa organização forte ali estão eles, se estruturando, tomando territórios, crescendo clandestinamente até agirem mostrando que são mais do que o Estado pensa que são. Isso trás a eles uma sensação de domínio, de força. Com suas leis próprias querem dominar a lei da Nação. Quando cada rebelião explode, pessoas são seqüestradas, instituições roubadas, faz com que se sintam mais fortes, mais dominantes, e mostrando a ineficaz atuação do governo e suas políticas públicas. 4.1.5. Mesmo presos, continuam a exercer comando dentro da organização Mesmo presos e encarcerados em presídios ditos de segurança máxima, presos, condenados ou não, continuam a exercer influência em esquemas fora das quatro paredes. Seja através de amigos, seja através de familiares, esposa(o), companheira(o), amantes, advogados e até representantes corruptos da segurança. Não são intimidados por estarem trancafiados dentro de muros e grades, pois mesmo lá continuam exercendo seu poder de mando, de coerção aos contribuintes do Crime organizado do lado de fora das cadeias. Muitas vezes não há a necessidade de intermediação, pois com todo o aparelhamento que chegam em suas mãos são suficientes para controle de seus negócios de dentro da prisão. 52 Celulares, armas, drogas entram nas cadeias a hora que o bandido necessitar, videoconferências são feitas entre presídios, assassinatos são orquestrados, roubos são planejados, fugas tramadas, rebeliões em vários presídios simultaneamente, recrutamento dos aliados, armas e todos os meios suficientes para comunicação com o lado de fora dos muros, tráfico de drogas, libertação de presos, que muitas vezes são pagos valores altíssimos por sua libertação, tudo isso mostrando, mais uma vez a falência do sistema penitenciário e a organização de um grupo em controlar tantos presos, em diversos lugares e com tamanho poder. E todo esse aparato ilegal entra na cadeia com a conivência de funcionários que são comprados, corruptos em oposição ao papel que o Estado lhe confiou: a segurança da sociedade, ou seja, a entrada de aparelhos celulares dispensa os intermediários dentro das cadeias, muitos desses telefones são alugados àqueles detentos que não têm condições de possuí-lo. Agentes penitenciários chegam a cobrar dos detentos certa quantia para permitir a entrada daqueles. Na verdade existe uma sociedade dentro dos presídios, muito bem administrada e concisa com isso seus representantes conseguem de uma simples ordem de dentro de um presídio mobilizar diversos outros ao mesmo tempo. Ordem emanadas de estabelecimentos prisionais onde os detentos deveriam manter-se isolados da sociedade e sem condição alguma de prosseguirem com suas atividades criminosas, fazem com que uma rebelião seja deflagrada em diversos estados ao mesmo tempo como citado por este trabalho em seu capítulo próprio. 53 Capítulo 5 - Demonstração de poder das facções criminosas em detrimento do poder do Estado Como o Estado em suas diversas esferas de governo tem atuado para enfrentar o fenômeno da criminalidade e da violência no País? Grupos cada vez mais organizados e estruturados têm mostrado o domínio que podem e querem exercer no País se o Estado estiver ou permanecer inerte. Grupos que na atualidade mostram-se capazes de fazer o Sistema Prisional refém onde o mesmo deveria incapacitá-los. Fazendo um paralelo do Sistema Carcerário e das Políticas Públicas a ele relacionado observa-se que sua eficiência, eficácia e efetividade mostra-se equívocos da sua gestão causando conseqüências desastrosas para a Administração Pública e para a sociedade brasileira que assistem atônita as organizações criminosas desafiarem o Estado a gerir a questão do Crime Organizado de forma democrática. 5.1. Organizações criminosas se tornam o Estado onde o Estado é ausente No dia 12 de maio de 2006, a população de são Paulo se viu refém de uma rede criminosa que o sistema prisional deveria incapacitar. Paralisada e aterrorizada, a cidade testemunhou vários dias de violência e destruição sem precedentes, largamente orquestrada por trás das grades pela maior organização criminosa do estado, o Primeiro Comando da Capital (PCC). Os líderes do PCC, a maioria dos quais condenados a longos períodos em prisões de segurança máxima, usaram seu controle das prisões e acesso a telefones celulares contrabandeados por guardas corruptos ou parentes para dar início a uma série de rebeliões e capturas de reféns coordenadas em 82 prisões em todo o estado e em estados vizinhos, e para atacar alvos da justiça criminal e da economia da cidade. Uma semana depois, a contagem dos mortos estava em torno de 170 e subindo. A gangue matou 23 policiais militares, 7 policiais civis, 3 guardas civis metropolitanos, 8 agentes penitenciários e 4 civis; houve também morte de prisioneiros durante as rebeliões, Nas batidas policiais que se seguiram, 109 supostos membros do PCC forma mortos a tiros. Houve cerca de 300 ataques à propriedade, incluindo casas de 56 policiais, 17 bancos e caixas 24 horas, uma garagem de ônibus e uma estação de metrô, 82 ônibus forma queimados ou danificados em toda a cidade. Sob o peso da violência, na segunda-feira, dia 15 de maio, São Paulo se viu virtualmente paralisada quando o sistema de transporte público foi reduzido pela metade, causando quase 200 quilômetros de congestionamento; estabelecimentos comerciais 54 e educacionais fecharam, e rumores de um grande arrastão ou de um toque de recolher varreram a cidade. Esse incidente ilustra graficamente a inabilidade do sistema prisional brasileiro em contribuir para a redução da violência e da criminalidade e em assegurar a segurança dos cidadãos brasileiros. Perversamente, esse sistema parece ter conseguido exatamente o contrário. A situação foi resultado de duas décadas de crescimento vertiginoso da população prisional, da perda do controle dos estabelecimentos penais por parte das autoridades públicas e da negligência institucional diante de um sistema 33 prisional que exigia investimento e políticas coerentes. A crise carcerária que o cidadão brasileiro tem presenciado ultimamente desde pequenos furtos até a chacina de milhares de pessoas inocentes faz com que o cidadão creia na falência da justiça. Um país que tem como um dos seus pilares a democracia se vê refugiado num país cercado não pela segurança nacional, mas por grupos praticantes de atividades ilícitas ditas lícitas e que, por mais drástico que pareça se organizam de uma forma tal que subestimam o poder do Estado. Tentam mostrar através se suas práticas que sua estabilidade e efetividade vão além da inteligência policial e estatal. Grupos que comandam rebeliões, assaltos, chacinas de dentro das prisões através de mecanismos cada vez mais assustadores como corrupção de agentes do Estado, celulares clandestinos que adentram aos interiores dos presídios ditos de Segurança Máxima de uma forma tão natural confirmando com isso o pensamento de milhares de brasileiros em que a justiça do próprio país está falida. A descrença nos parlamentares que o próprio povo elegeu em uma votação direta cresce ao saber que diversos desses "homens" eleitos para representar o Estado agem de forma ilícita, corruptos em prol de seres humanos que hoje ocupam celas de penitenciárias, delegacias e presídios. Estamos tão envolvidos, que a velha máxima de “Big” Paul Castellano, o poderoso chefão da Família Gambino, a maior e mais influente da Máfia de Nova York, tem por aqui um significado profético: - Não preciso mais de 34 pistoleiros. Agora eu quero deputados e senadores.” Gente eleita pelo povo, para representar o povo se envolve com tráfico, com mortes. A expansão da criminalidade está se alastrando de tal forma que o ministrochefe do Gabinete de Segurança Institucional da Presidência da República afirmou ao Jornal O globo que o problema da violência no Brasil está muito avançado, e que estamos perto de um ponto de não-retorno. 33 LIMA, Renato Sérgio de. PAULA, Liana de (organizadores). Segurança pública e violência: o Estado está cumprindo seu papel? São Paulo: Contexto, 2006. p. 15/16 34 AMORIM, Carlos. CV-PCC: a irmandade do crime. 5ª Edição. Rio de Janeiro: Record, 2004. p.16 55 Estamos diante de uma guerra civil não declarada onde o bandido tem orgulho de dizer quantos matou, o que roubou porque causa-lhe a ele uma sensação de poder. Um sentenciado tem orgulho de dizer que tem uma larga ficha criminal, porque na cadeia ele irá ser respeitado. Usa-se como método de sobrevivência, pois o outro vai pensar duas vezes antes de tentar algo contra. O poder já subiu tanto à cabeça dos traficantes que Dionísio de Aquino Severo, assaltante de bancos e seqüestrador do PCC fugiu da cadeia em São Paulo por um helicóptero seqüestrado, e ainda abriu a sua boca em uma entrevista e disse: “Não me chamem de bandido nem de marginal; eu sou um criminoso, um elemento da criminalidade”. Em uma outra entrevista com “Macalé”, um dos líderes do PCC, ele afirma com categoria e muita firmeza: Os irmãos agora estão unidos e vamos mostrar nossa força. Se a gente quiser, podemos fazer rebeliões em várias cadeias ao mesmo tempo. Estamos organizados e fortes [...] A rebelião em Hortolândia foi uma amostra do que podemos e vamos fazer daqui para frente. Agora nós temos uma comunidade com líderes em todas as cadeias de São Paulo. Unidos 35 para o que der e o que não der. Antigamente os presos lutavam entre si dentro dos presídios, se organizavam em grupos e guerreavam pelo poder na cadeia. Agora se observa um grupo único e forte que já está dominando diversas cadeias. Uma liderança única que através de suas ações além de mostrar seu poder de mando e controle diz que tudo é em favor da luta contra as injustiças, contra o sistema carcerário, contra o judiciário e pelos seus direitos que domina a massa carcerária. “Somos presos mas somos gente. Agora somos uma fraternidade, um comando que se espalhou pelas cadeias. A semente cresceu.” 36 Em 1997 foi ao ar no Jornal da Band matéria sobre o PCC, pela primeira vez a sociedade brasileira ouviu tal sigla e ações, objetivos, estatuto, funcionamento, chefes e hierarquia dessa organização e que por trás das grades existia um comando que já estava agindo, em silêncio, e crescendo sem deixar à vista e que já dominavam muitas cadeias. O governo veio e desmentiu tudo, tratando o assunto com tom de brincadeira e negando a existência do PCC. Para se ter uma idéia de 35 36 SOUZA, Fátima. PCC, a facção. Rio de Janeiro: Record, 2007. p. 9 SOUZA, Fátima. PCC, a facção. Rio de Janeiro: Record, 2007. p. 9 56 como o Estado não levou a sério tal denúncia o então Secretário da Administração Penitenciária, João Benedito de Azevedo Marques afirmou que o PCC era uma organização imaginária e falou: “Uma ficção, uma bobagem. Balela. Estou absolutamente convencido disso. Sou secretário há quase dois anos e nunca vi qualquer manifestação desse grupo.” Até que uma rebelião explodiu no interior do Estado e o secretário foi chamado para tentar controla-la e lá, do alto do presídio, uma faixa gigante foi aberta na cara do secretário, escrita à tinta negra a sigla PCC. Era a primeira vez que o nome era mostrado durante um motim. A então repórter Fátima Souza, responsável pela matéria citada acima, não se calou e fez com que o Ministério Público se interessasse pela denúncia. Promotor experiente, Gabriel Inellas, fez um dossiê e o entregou à Justiça, denunciado, mais uma vez, a existência de um grupo organizado que tomava conta das cadeias paulistas. Infelizmente o juiz da causa também não levou o assunto a sério e mandou arquivar a denúncia. Mais uma vez o Estado frágil e omisso estava dando as costas para um problema que nem sabia da sua existência e que muito menos se alastraria de uma forma gigantesca como nos dias atuais. O governo não acreditou em nós mas nós ta aqui, na firmeza. E vamos mostrar aí, pras autoridades, que nós existe sim! (voz de um bandido numa fita gravada de dentro de um presídio) Diversos distritos e delegacias de São Paulo, por exemplo, assustados e acuados pelo Crime Organizado, mandou construir paredes mais reforçadas, grades, paredes duplas ao redor das delegacias, com grossas chapas de aço, portas giratórias, campainha para que os visitantes se identificassem. E assim é a polícia se escondendo dos bandidos. Os celulares veio, também, para demonstrar a fragilidade do Estado quanto ao que entram e saem de presídios. Através de funcionários e policiais corruptos, os aparelhos entram nas dependências de celas onde presos têm a possibilidade de conversar, planejar fugas, resgates, organizar crimes, executar ordens e fazer, pasmem, teleconferências com 4 ou 5 detentos de presídios diferentes e os que, fiéis à Organização, estão do lado de fora. Sem falar nas “Centrais Telefônicas do PCC”, uma espécie de PABX que é montado na casa de alguém ligado à organização que, como telefonistas, atendem as ligações do crime e repassam a chamada para outros presídios ou para bandidos ligados ao PCC que estão nas ruas. A idéia do PABX veio de um projeto feito pelo então canadense David 57 Spencer, ex-integrante do Movimento de Esquerda Revolucionária, o MIR, do Chile, e um dos dez presos e condenados pelo seqüestro do empresário Abílio Diniz. Todo projeto foi bolado e apresentado para os chefões dentro da Penitenciária de São Paulo. Todo material necessário foi comprado pelos filiados que estavam do lado de fora e seguindo passo a passo o projeto de Spencer, conseguiram montar o sistema, que, de cara, espalhou doze centrais telefônicas instaladas fora dos presídios. Contas altíssimas, prejuízos para as companhias telefônicas, aparelhos que funcionavam via satélite, compra de aparelhos com documentos falsos, corrupção de funcionários das empresas de telefonia, mensalidades que os que desejam usar têm que pagar, os detentos pensam em tudo, driblam tudo para conseguir se manter no poder. E o Estado, e a Segurança onde estão? O objetivo da megarrebelião que aconteceu em 18 de fevereiro de 2001 e que parou 30 cadeias em todo o Estado de São Paulo, era, segundo os detentos: O objetivo da paralisação simultânea nas cadeias, tinham me dito Gê e Cesinha, não era fugir ou quebrar presídios. Queriam peitar o Estado, mostrar que tinham força, que estavam organizados, que eram capazes de parar trinta cadeias ao mesmo tempo. Queriam mostrar que eram os donos dos prédios e, acima de tudo, mostrar de uma vez por todas ao governo e à sociedade que o PCC existia sim. A partir daí o governo passou, oficialmente, a admitir a existência e a realidade do Primeiro Comando da Capital. Observa-se que foram 8 anos da fundação da facção até o governo admitir a sua existência, pois o governo, por ser detentor do poder coercitivo do Estado tem em mente que ter tal poder na teoria seja suficiente, logo não acreditava em um grupo tão forte e tão bem estruturado. Curioso, em 6 de março de 2001, o secretário da Administração Penitenciária, Nagashi Furukawa, declarou: “As organizações criminosas são minorias dentro dos presídios.” E Geraldo Alckmin, governador à época, em exercício em São Paulo o apoiou: ”O PCC não representa a maioria dos presos do sistema penitenciário.” Fátima Souza salienta: Ao ouvir as declarações das autoridades, pensei: o que deu destaque à facção foi o Estado fingir que ela não existia. Ignorado pelas autoridades, o PCC foi crescendo e se fortalecendo. Quando denunciei sua existência, em março de 1997, eles eram cem [...] Agora, em 2001, formavam um 37 verdadeiro exército, capaz de parar trinta cadeias! 37 SOUZA, Fátima. PCC, a facção. Rio de Janeiro: Record, 2007. p. 56 58 Outro episódio que retrata a falta de estrutura do Estado em combater o crime organizado está na fuga de um dos membros do PCC, Adilson da Guia, apontado como homem de confiança de Fernandinho Beira-Mar. Em 19 de março de 2001 foi levado para o Hospital Penitenciário para fazer exames dizendo que não estava muito bem e de lá fugiu. Os responsáveis pela Sistema Prisional Paulista só descobriram que ele não estava mais no Hospital e nem tinha voltado para a Cela 5 meses depois da fuga e mais, o prontuário dele havia desaparecido, também sumiu parte do livro de controle de saída e entrada de viaturas, funcionários e visitantes, entre eles, a página que continha registros do dia 19 de março. O mesmo Adilson da Guia em fevereiro de 2003 junto com um bando e a mando do PCC, participou do Plano que assassinaria o juiz Machadinho, em Presidente Prudente, dirigindo o carro que dava cobertura aos dois executantes do juiz. Maria do “Pó”, considerada a mulher mais importante do crime paulista, também fugiu, sem deixar vestígios da sua fuga e sem deixar pistas de como conseguiu se infiltrar às outras mulheres de bom comportamento e desaparecer. Em 2005 ali continuavam a demonstração de controle, entraram em uma cadeia pública de Itanhaém e em duas fugas libertaram 179 bandidos; Em 2006, dentro de tambores de lixo dois detentos, escaparam da Penitenciária de Marabá Paulista, no Oeste do Estado de São Paulo. É o crime organizado desafiando e enfrentando ostensivamente o Sistema prisional. Sejam disfarçados, sejam na cara-de-pau ali estão os bandidos para o que der e vier. Inteligência não falta, criatividade muito menos e assim vão invadindo cadeias, resgatando seus companheiros, rendendo e corrompendo carcereiros, enfim, espalhando medo, terror, e o mais assustador, a força e a organização diante de um Estado com políticas mal estruturadas, um verdadeiro vácuo do poder. Outra questão séria, mas que o Estado não fiscaliza de forma eficiente é o que diz respeito ao regime semi-aberto. As autoridades não têm um controle que acompanha a vida do preso, como: se realmente vai para o trabalho quando sai do presídio, se os documentos apresentados por ele comprovando a empregabilidade das empresas são verdadeiros e etc. Muitos bandidos subornam funcionários dos presídios, dos fóruns a fim de falsificarem suas fichas, indicando que eles já cumpriram o tempo necessário para receber tal benefício. O Primeiro Comando da Capital (PCC) já abriu uma empresa de fachada, com razão social e tudo a qual mandava cartas para as varas de execuções criminais de várias cidades paulistas 59 garantindo vagas para presos em regime semi-aberto com a finalidade de levar o juiz a assinar autorização para o detento sair do presídio. Saídas temporárias, que acontecem 5 vezes por ano: Dia das mães, Dia dos Pais, Finados, Natal e Ano Novo é outro ponto que o governo deixa de ter o controle, que já é mínimo, sobre o detento. Muitos saem, poucos voltam! No dia da Inauguração do Cadeião de Pinheiros, ouviu-se dizer que as portas eram à prova de fogo, o que impediria que fossem usados maçaricos para abrir buracos. Que um portão só abriria quando o outro fechava. Que os altos muros e a vigilância 24 faziam dele um presídio ideal. Só que esqueceram de uma coisa, o telhado, telhado feito de telhas de barro! Alguns dias depois estoura no “presídio ideal” a primeira rebelião do Cadeião. E lá estavam os presos em cima do telhado, equilibrando-se na estrutura de madeira armada para segurar as telhas, que estavam sendo jogadas na direção de funcionários e policiais. O tal portão seguro foi arrebentado por um caminhão que levava membros do PCC para a liberdade. Junto com os presos estavam armas e uma dinamite. Depois do motin um delegado parou para dar entrevista e questionado como que a dinamite foi parar dentro do presídio, respondeu que estão investigando e acreditavam que o material poderia estar entrando nos presídios em papagaios; O que? Seriam papagaios treinados como pombos-correio? – Como, delegado? Papagaios? Ele confirmou: papagaios, pipas, essa de empinar, que as crianças soltam! ...essa era demais! Imaginem o tamanho que uma pipa teria que ter, e a resistência da linha, para que nela fosse colocado um revólver calibre 38, uma pistola ou uma dinamite?E a paciência para ficar empinando suas pipas-armas, pipas-celulares, pipas-dinamites... E a pontaria necessária para fazer com que elas descessem, dentro das muralhas, nas mãos de quem tinha encomendado os papagaios do crime. E a segurança do presídio? E os guardas das muralhas, no alto, em posição privilegiada, nunca perceberam as pipas do PCC voando sobre suas cabeças e pousando nos pátios? Nunca a segurança desconfiou de marmanjões empinando ao redor do presídio? Só falta agora o delegado anunciar a criação de um esquadrão de caça a papagaios e pipas, pensei. Os policiais, armados de linhas com cerol, atacariam todos os papagaios 38 suspeitos ao redor das cadeias. Enquanto os membros das facções criminosas pensam e colocam à tona suas estratégias mirabolantes, como em 23 de julho de 2005, em que um detento foi amarrado ao corpo de uma garota de 19 anos, dando a impressão de que ela estava grávida. No Carandiru, em 8 julho de 2001, um engenheiro preso, usando de um 38 SOUZA, Fátima. PCC, a facção. Rio de Janeiro: Record, 2007. p. 75/76 60 GPS muito ajudou na sofisticação de um túnel que libertaria 101 presos (túneis que não eram simplesmente um buraco embaixo da terra, mas túneis que tinham além ventiladores para melhorar a qualidade do ar lá embaixo, guias para orientar até o local de saída, bússolas), um delegado, responsável pela segurança da sociedade, vem à televisão dizer que a Segurança Pública acredita que armamentos chegam aos presídios através de pipas? Que absurdo! A arte da guerra é de importância vital para o Estado. É uma questão de vida ou morte, um caminho tanto para a segurança como para a ruína. Assim, em nenhuma circunstância deve ser negligenciada. [...] dessa maneira, apenas o governante esclarecido e o general criterioso usarão as mais dotadas inteligências do exército para a espionagem, obtendo, dessa 39 forma, grandes resultados. 5.2. Medidas eficazes para combater o Crime Organizado A efetividade da prevenção e do controle da Criminalidade Organizada está em fazer valer os direitos humanos fundamentais estabelecidos na Constituição Federal e em pactos e convenções internacionais 5.2.1. Ações policiais e a inteligência policial Logo após o cair da noite, o rádio da polícia começa a noticiar atentados contra policiais em todo o estado. Simultaneamente têm início rebeliões em metade dos presídios paulistas. Durante todo o final de semana os organismos policiais ficam sem ação, assistindo aos acontecimentos e tentando se defender dos ataques e ao mesmo tempo cercar os presídios para controlar as fugas. No terceiro dia, o Primeiro Comando da Capital, responsável pelos ataques, surpreende os órgãos de segurança novamente. Numa cidade sem policiamento, já que parte da polícia cercava presídios enquanto outra cuidava da própria segurança, os criminosos passam a queimar ônibus e metralhar bancos. No final do dia, em meio a boatos de todos os tipos, se estabelece o pânico na capital. A população corre para suas casas e causa o maior congestionamento da história paulista. A situação só começa a voltar ao normal quando uma comissão de policiais é enviada para conversar com um líder da organização criminosa. 39 CLAVELL, James. A Arte de Guerra. 13ª Edição. Rio de Janeiro. p. 7 61 Como num passe de mágica as rebeliões terminam em todos os presídios e 40 os ataques na rua também cessam. O relato acima revela a forma ágil, eficiente e estratégica com que uma Organização Criminosa age em oposição a um sistema policial, frágil “não armado”, desprevenido para qualquer ataque inesperado. Um aparelho repressivo que diante de uma situação não esperada não soube como agir, ou melhor, sem uma polícia de inteligência deixou-se ser comandado por um Grupo de Criminosos o qual seria o Estado o responsável pelo seu comando. Observa-se que sem se utilizar adequadamente de todo um aparato não é possível enfrentar as organizações criminosas. A Lei nº. 9.883/99, art. 1º, § 2º descreve o objetivo do que seria inteligência como sendo “a atividade que objetiva a obtenção, análise e disseminação de conhecimentos dentro e fora do território nacional sobre fatos e situações de imediata ou potencial influência sobre o processo decisório e a ação governamental e sobre a salvaguarda e a segurança da sociedade e do Estado.” Temos que ter em mente que o Crime Organizado chegou para ficar, que não irá acabar após uma ou outra operação policial. E que para manter o controle desses grupos é somente através de informações confiáveis e seguras munindo Policias e Ministério Público para que elaborem 41 estratégias eficientes para confrontá-los. Um Brasil que mostra na TV bairros e favelas do Rio de Janeiro e São Paulo dominados por bandos armados com metralhadoras antiaéreas, foguetes e armamentos que se vê em conflitos no Oriente, armas essas que deveriam estar em mãos do Sistema Carcerário, do policial, estão nas mãos de pessoas que praticam ilícitos dando a elas a sensação de poder e de mando cada dia maior em relação ao Estado, mostra-se que o Brasil não está preparado para enfrentar o crescimento do Crime Organizado. Às polícias faltam treinamentos específicos para toda e qualquer situação que diga respeito a crimes comuns ou organizados, equipamentos adequados, salários capazes de não levarem policiais à corrupção e envolvimento 40 LIMA, Renato Sérgio de. PAULA, Liana de (organizadores). Segurança pública e violência: o Estado está cumprindo seu papel? São Paulo: Contexto, 2006. p. 41 41 LIMA, Renato Sérgio de. PAULA, Liana de (organizadores). Segurança pública e violência: o Estado está cumprindo seu papel? São Paulo: Contexto, 2006. p. 45 62 direto com esses grupos ilícitos, leis adequadas, visto que o Código Penal é dos anos 40 do século passado. “O Código Penal é de um tempo em que as maiores ameaças à segurança pública eram a navalha e a capoeira.” (Fernando Mitre) Em julho de 1999 Flávio Trindade, o cérebro, integrante do PCC realiza sua maior façanha – roubar o Banco do Estado de São Paulo – Banespa. Era tanto dinheiro que deixou os policiais ávidos em colocar as mãos nos bandidos e no dinheiro. Um investigador de uma delegacia da Zona Sul de São Paulo conseguiu chegar na casa de um dos bandidos e consequentemente, no dinheiro roubado, porém, veio a descrença nas autoridades policias. O investigador usando do dinheiro do Estado comprou carro novo, deu presentes à família, fez churrasco para amigos e tinha orgulho de dizer que tudo era por sua conta. O tal investigador, corrupto, foi entregue à Corregedoria da Polícia Civil. E enquanto o Estado perde praticamente o controle sobre presídios, delegacias, distritos, as facções continuam demonstrando que não estão na história para brincar. Continuam usando suas riquezas para infiltrar seus membros em Grupos especializados das Polícias como o Garra (Grupo Armado de repressão a Roubos e Assaltos). Um dos investigadores, Paulo Humberto Mangini, era agente duplo: trabalhava para a polícia e para o PCC, até uniformes, coletes do Grupo eram fornecidos para os bandidos. À época, a corregedoria investigava a denúncia de que o investigador teria entrado na polícia patrocinado pelo PCC. A organização teria pago o seu concurso. Riquezas que faz a polícia, em suas buscas e apreensões encontrar um dos maiores arsenais já encontrado na história. 5.2.2. Sociedade A sociedade está entre o fogo cruzado, entre o crime organizado e a ineficiência do Estado. A população se mostra insegura e assiste atônica a proporção que o caso tem tomado. Assaltos, mortes, seqüestros, corrupção policial, narcotráfico, tudo tem levado à população ficar acuada em suas casas se privando do direito que lhe é garantido pela Constituição Federal, de ir e vir. A segurança que 63 o Estado nos garante sede lugar para grupos muito mais organizados os quais têm espalhado o medo e o terror por onde passa. A violência que antes ficava somente entre os muros dos presídios agora está do lado de fora causando um verdadeiro caos à sociedade brasileira e afetando claramente os direitos fundamentais. 64 Capítulo 6 - O papel da ONU no combate ao Crime Organizado 6.1. Nações Unidas para a Droga e Criminalidade – UNODC O Escritório da UNODC (Nações Unidas Contra Drogas e Crimes, em português) tem como objetivo a prevenção e combate ao crime organizado em território brasileiro e em todo o Cone Sul. A missão do Escritório das Nações Unidas sobre Drogas e Crime (UNODC) é de contribuir para o desenvolvimento socioeconômico dos países ao promover justiça, segurança, saúde e direitos humanos. O mandato do UNODC é prestar cooperação técnica aos Países-Membros da ONU para reduzir os problemas na área de saúde (como o HIV) e social (como a violência) que têm relação direta ou indireta com drogas ilícitas e o crime. O Escritório busca prevenir e controlar o crime organizado, incluindo corrupção, lavagem de dinheiro, tráfico de pessoas e terrorismo, sempre 42 baseado em ações de respeito e garantia dos direitos humanos. 6.2. Convenção de Palermo É de grande importância a criação da Convenção de Palermo pela Organização das Nações Unidas diante do crescente índice de criminalidade organizada que tem se alastrado devido à falta de cooperação e de coordenação de ações entre os Estados e quando se fala em criminalidade organizada transnacional verifica-se esta falta de cooperação entre os Países, pois há uma falta de interação entre os órgãos nacionais de repressão. A ONU sempre esteve preocupada com o crescimento do fenômeno do Crime Organizado e que o seu combate só poderá acontecer se houver uma cooperação internacional, visto que esse fenômeno tem se alastrado de uma forma gigantesca tanto no âmbito nacional quanto no internacional. E está convencida de que a Convenção de Palermo é de suma importância para o seu combate. 42 Escritório das Nações Unidas sobre Drogas e Crime. em:<http://www.unodc.org/brazil/pt/about_us.html>. Acesso em 24 novembro 2008. Disponível 65 a implementação da Convenção de Palermo por parte dos estadosmembros deverá representar um passo decisivo no combate ao crime transnacional. O documento institui diversos mecanismos de cooperação internacional e define novos conceitos sobre esse tipo de crime, visando a preencher uma lacuna da qual as organizações criminosas se utilizam para 43 fugirem da repressão e da lei. A importância da Convenção para o Brasil foi reconhecida e foi integrada a estrutura jurídica nacional em 2004 sendo até hoje objeto de estudo. A Convenção de Palermo é resposta clara ao crime internacional. A razão desse sucesso é clara. O nível e a intensidade do crime internacional foram além do que os governos e a população em geral estão preparados para 44 aceitar. (Pino Arlacchi) http://www.scribd.com/doc/7392941/Coibicao-DoCrime-Internacional Um dos seus objetivos primeiro é fazer com que os países signatários promovam a cooperação para o exercício e prática da prevenção eficaz contra a criminalidade organizada transnacional. “O objetivo da presente Convenção consiste em promover a cooperação para prevenir e combater mais eficazmente a criminalidade organizada transnacional”.45 Da leitura do seu texto pode-se verificar que tem-se força repressiva a qualquer atitude ou conduta delituosa no que se refere a Criminalidade organizada transnacional, tendo força de Lei Ordinária dentro do ordenamento jurídico interno, logo sendo-lhe atribuído força repressiva a este tipo de crime, bem como se apresenta como uma norma programática, isto é, uma diretriz a ser seguida no combate ao Crime Organizado tanto internacional como nacionalmente. Antes da criação da Convenção de Palermo, o legislador Brasileiro já havia editado a Lei n. 9.034/95, dispondo “sobre a utilização de meios operacionais para a prevenção e repressão de ações praticadas por organizações criminosas”, porém em todo o seu texto não observou-se a definição do que seria a terminologia para a 43 QUAGLIA, Giovanni. Crime Organizado Internacional: a resposta das Nações Unidas. Palestra proferida no Simpósio Internacional “Combate ao Crime Organizado: Defesa da Ordem Democrática”. 4 junho 2003. Disponível em: <http://www.unodc.org/brazil/articles_speechs_simposio_crime_organizado.html> Acesso em 24 novembro de 2008. 44 <http://www.scribd.com/doc/7392941/Coibicao-Do-Crime-Internacional> Acesso em 24 novembro 2008. 45 Decreto n. 5.015 de 12 de março de 2004 – Promulga a Convenção das Nações Unidas contra o Crime Organizado Transnacional. Artigo 1. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2004-2006/2004/decreto/d5015.htm> Acesso em 30 novembro 2008 66 compreensão do que possa ser “organizações criminosas”. A de se observar que em nenhuma parte de nosso ordenamento jurídico há a definição do que seja “organização criminosa”, considerando assim um conceito vago, totalmente aberto, pois o legislador não oferece sequer a descrição típica mínima do fenômeno. Nesse ponto o professor Luiz Flávio Gomes conclui que a lei passou a ser letra morta. Desta forma o ilustre Professor diz que “se as leis do crime organizado no Brasil (Lei 9.034/95 e Lei 10.217/01), que existem para definir o que se entende por organização criminosa, não nos explicaram o que é isso, não cabe outra conclusão: desde 12.4.2001 perderam eficácia todos os dispositivos legais fundados nesse conceito que ninguém sabe o que é, por isso perde-se a eficácia. Ainda, anteriormente à edição da Convenção, o legislador brasileiro editou a Lei n. 9.613/98 dispondo sobre “os crimes de lavagem ou ocultação de bens, direitos e valores, a prevenção da utilização do sistema financeiro para os ilícitos previstos nessa lei”, a qual se reporta, também, a “organização criminosa”, mas sem a sua definição. Com a Convenção das Nações Unidas (Decreto n. 5.015/2004), mais particularmente em seu Artigo 2, conseguiu-se a definição terminológica do que tanto se fala em nosso ordenamento jurídico sobre “crime organizado”, porém sem conceituá-lo, mas agora tem-se tal definição, dentre outras, como; a) “Grupo criminoso organizado” – grupo estruturado de três ou mais pessoas, existente há algum tempo e atuando concertadamente com o propósito de cometer uma ou mais infrações graves ou enunciadas na presente Convenção, com a intenção de obter, direta ou indiretamente, um benefício econômico ou outro benefício material; b) “Infração grave” – ato que constitua infração punível com uma pena de privação de liberdade, cujo máximo não seja inferior a quatro anos ou com a pena superior. c) "Grupo estruturado" - grupo formado de maneira não fortuita para a prática imediata de uma infração, ainda que os seus membros não tenham funções formalmente definidas, que não haja continuidade na sua composição e que não disponha de uma estrutura elaborada; d) "Bens" - os ativos de qualquer tipo, corpóreos ou incorpóreos, móveis ou imóveis, tangíveis ou intangíveis, e os documentos ou instrumentos jurídicos que atestem a propriedade ou outros direitos sobre os referidos ativos; 67 e) "Produto do crime" - os bens de qualquer tipo, provenientes, direta ou indiretamente, da prática de um crime; f) "Bloqueio" ou "apreensão" - a proibição temporária de transferir, converter, dispor ou movimentar bens, ou a custódia ou controle temporário de bens, por decisão de um tribunal ou de outra autoridade competente; g) "Confisco" - a privação com caráter definitivo de bens, por decisão de um tribunal ou outra autoridade competente; h) "Infração principal" - qualquer infração de que derive um produto que possa passar a constituir objeto de uma infração definida no Artigo 6 da presente Convenção; i) "Entrega vigiada" - a técnica que consiste em permitir que remessas ilícitas ou suspeitas saiam do território de um ou mais Estados, os atravessem ou neles entrem, com o conhecimento e sob o controle das suas autoridades competentes, com a finalidade de investigar infrações e identificar as pessoas envolvidas na sua prática; j) "Organização regional de integração econômica" - uma organização constituída por Estados soberanos de uma região determinada, para a qual estes Estados tenham transferido competências nas questões reguladas pela presente Convenção e que tenha sido devidamente mandatada, em conformidade com os seus procedimentos internos, para assinar, ratificar, aceitar ou aprovar a Convenção ou a ela aderir; as referências aos "Estados Partes" constantes da presente Convenção são aplicáveis a estas organizações, nos limites das suas competências. Mesmo que a Convenção da ONU se refira à Criminalidade Organizada Transnacional, nada impede que os conceitos acima sejam utilizados para grupos criminosos nacionais latu sensu e stricto sensu (regionais e locais). O Brasil assinou a Convenção de Palermo em 12 de dezembro de 2000 e a ratificação junto à ONU em 29 de Janeiro de 2004. Com a edição do Decreto n. 5.015 de 15 de março de 2004, este tratado internacional foi internalizado no ordenamento jurídico brasileiro, sendo agora, parte da legislação brasileira. 68 CONCLUSÃO A Segurança Nacional está ameaçada pelas facções criminosas. Por mais que o nosso ordenamento jurídico não tenha definido o que venha a ser o Crime Organizado, e por não ter um conceito majoritário, podemos observar e defini-lo baseado em todo um histórico de vida essas organizações criminosas. O crime organizado tem se estruturado e criado um Estado paralelo. Facções criminosas invertendo equações, ou seja, é o Estado onde o Estado é ausente. Atualmente, o Estado tem ficado desorientado diante da audácia com que esses grupos criminosos agem. A segurança do Brasil está cada vez mais comprometida todas as vezes que nos deparamos com a ousadia de bandidos que eram para estar nas mãos do Estado mostram-se como um estado paralelo, desafiando a Segurança com seus atos de requinte e crueldade que crescem a cada dia. Acrescente-se ao fato de inexistir uma política de prevenção e repressão rígidas, que levem o bandido a recuar. Há exatamente o contrário, bandidos usam do sistema carcerário debilitado, da falta de especialização e da fácil corrupção dos agentes penitenciários para, revoltados, se organizarem e demonstrarem sua força diante de um Estado que se mantém inerte diante das situações precárias e falidas do sistema penitenciário. A falta de estrutura na segurança leva o bandido a ter a sensação de poder em suas mãos. A ausência estatal cria um ambiente perfeito para o surgimento e o crescimento da criminalidade organizada, que audaciosos criam suas próprias leis e mostram ao Estado que podem fazer o que quiserem, onde e a hora que quiserem. Por conseguinte, constata-se que as facções estão crescendo à medida que os agentes políticos fecham os olhos para um problema que só é estudado na integra no momento em que se explode uma rebelião, como a que aconteceu em 2006 no estado de São Paulo, em que a população se viu acuda, nas mãos e no controle de bandidos. Quando surge um gigantesco problema é que as autoridades despertam para por fim àquele determinado episódio e, logo depois, não demonstra responsabilidade e interesse na prevenção ao crime e enquanto isso lá está o poder paralelo trabalhando, se fortificando e criando estratégias para mais ações que trazem a eles a sensação de controle, de poder diante do detrimento do poder do Estado. 69 Para que o Brasil enfrente a questão da criminalidade organizada é necessário que o governo crie políticas de segurança e planos com ações permanentes as quais deixem os agentes de segurança atentos e preparados para eventuais ocorrências dos planos feitos por essas organizações. É competência do Estado criar estratégias para que não haja impunidades, violências que levam ao crime, que geram gastos e levam o medo a toda sociedade. Esta está cada dia mais desacreditada no poder que foi dado aos governantes pela sua segurança, pois vê-se que pelo fato dos agentes penitenciários não serem capacitados, não terem estímulos para um trabalho digno, muitos se corrompem e são esses que nutrem os bandidos dentro das cadeias e assim fazendo do sistema carcerário deficiente em quase fracassado se colocarmos ao lado do poder que essas organizações têm alcançado. São grupos influentes, e seus membros são pessoas inteligentíssimas, pessoas que não agem por agir, mas agem com o lema de vencer, de demonstrar poder, logo estudam, buscam táticas até mesmo em grupos criminosos em outras partes do mundo, se especializam, buscam os melhores recursos para atuarem enquanto nossos agentes penitenciários muitos não têm um treinamento sequer para lidar com todos os níveis de bandidos e, de autoridade, passa-se para um refém do crime organizado, ou corrupto por ter acesso mais fácil a um dinheiro que servirá para sua mantença, enquanto que o salário pago pelo poder público não o dignifica. Desta forma, partindo-se da premissa de um Estado não habilitado totalmente para possíveis ações desses grupos criminosos a segurança nacional está cada dia mais ameaçada. “Hoje os bandidos estão mais perigosos, ousados e ricos. Movimentam centenas de milhões de dólares, possuem armas de última geração e aterrorizam a sociedade com atos cada vez mais audaciosos e violentos. Fernandinhos, Marcinhos e outros bandidos param o país com rebeliões em presídios, assassinatos de jornalistas e atentados a juízes e procuradores. [...] sobre o Crime Organizado, que hoje é uma das indústrias mais lucrativas do mundo. Expõe uma sociedade na qual os bandidos estão cada vez mais poderosos, deixando- 70 nos acuados e com medo. [...] Se nada for feito com muita rapidez, em breve poderá ser tarde demais.”46 46 AMORIM, Carlos. CV-PCC: a irmandade do crime. 5ª Edição. Rio de Janeiro: Record, 2004. 71 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS BARCELLOS, Caco. Abusado O Dono do Morro Dona Marta. 7ª Edição. Rio de Janeiro, 2003. NAÍM, Moisés. Ilícito: o ataque da pirataria, da lavagem de dinheiro e do tráfico à economia global. Rio de Janeiro: Jorge Zahar Ed., 2006. SOUZA, de Percival de. Sindicato do Crime. São Paulo: Ediouro, 2006. Arquivos do Ministério da Justiça. Brasília: Imprensa Nacional: 1967. VALDEREZ, Ana. Segurança Nacional; Brasília: Senado Federal, 1980. BECARIA, Cesare. Dos Delitos e das Penas. Editora Martin Claret, 2003. KUHN, Thomas S. A estrutura das revoluções científicas. 9ª Edição. São Paulo, 2006. LIMA, Renato Sérgio de. PAULA, Liana de (organizadores). Segurança pública e violência: o Estado está cumprindo seu papel? São Paulo: Contexto, 2006. OLIVEIRA FILHO, Edemundo Dias. O Vácuo do poder e o crime organizado: Brasil, início do século XXI. Goiânia: AB, 2002. CLAVELL, James. A Arte de Guerra. 13ª Edição. Rio de Janeiro. USTRA, Carlos Alberto Brilhante. A verdade sufocada: a história que a esquerda não quer que o Brasil conheça. Brasília: Editora Ser, 2006. SILVA, Eduardo Araújo da. Crime organizado: procedimento probatório. São Paulo: Atlas, 2003. 72 AMORIM, Carlos. CV-PCC: a irmandade do crime. 5ª Edição. Rio de Janeiro: Record, 2004. LUDEMIR, Julio. No coração do comando. Rio de Janeiro: Record, 2002. SOUZA, Fátima. PCC, a facção. Rio de Janeiro: Record, 2007. PAULINO, José Alves. A produção da prova externa e sua validade contra a criminalidade organizada transnacional. Brasília: Projeto Editorial, 2008. Manual Básico. Escola Superior de Guerra. Rio de Janeiro: ESG, 1988. Gen Ex Euclydes de Oliveira Figueiredo Filho. Escola Superior de Guerra. A Segurança Nacional e as Forças Armadas. Brasília, 1985. MACHADO, Anderson Fonseca. Criminalidade organizada transnacional e a globalização. Brasília, 2006. GOMES, Luiz Flávio. Crime organizado: que se entende por isso depois da Lei nº 10.217/01? (Apontamentos sobre a perda de eficácia de grande parte da Lei 9.034/95). Jus Navigandi, Teresina, ano 6, n. 56, abr. 2002. Disponível em: <http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=2919>. Acesso em: 30 dezembro 2008. NOGUEIRA, Marco Aurélio. Segurança Nacional, Soberania e Sociedade Civil. UNESP. ,Perspectivas, São Paulo, 30: 99-120, 2006. Disponível em <http://www.fclar.unesp.br/seer/index.php?journal=perspectivas&page=article&op=vi ewFile&path%5B%5D=366&path%5B%5D=251> Acesso em 29 janeiro 2009. AGÊNCIA SENADO. César Borges defende plano de segurança nacional para combater o crime organizado. 15 de maio de 2006. Disponível <http://www.direito2.com.br/asen/2006/mai/15/cesar-borges-defende-plano-deseguranca-nacional-para-combater-crime> Acesso em 29 janeiro 2009. em 73 CEPIK, Marco. Segurança Nacional e Segurança Humana: Problemas Conceituais e Conseqüências Políticas. Security and Defense Studies Review. Vol. 1 Spring 2001. Disponível em: <http://www.ndu.edu/chds/journal/PDF/cepik.pdf> Acesso em 24 fevereiro 2009. Escritório das Nações Unidas sobre Drogas e Crime. Disponível em:<http://www.unodc.org/brazil/pt/about_us.html>. Acesso em 24 novembro 2008. 1 QUAGLIA, Giovanni. Crime Organizado Internacional: a resposta das Nações Unidas. Palestra proferida no Simpósio Internacional “Combate ao Crime Organizado: Defesa da Ordem Democrática”. 4 junho 2003. Disponível em: <http://www.unodc.org/brazil/articles_speechs_simposio_crime_organizado.html> Acesso em 24 novembro de 2008. Decreto n. 5.015 de 12 de março de 2004 – Promulga a Convenção das Nações Unidas contra o Crime Organizado Transnacional. Artigo 1. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2004-2006/2004/decreto/d5015.htm> Acesso em 30 novembro 2008